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4 A CIDADE POSSÍVEL / A CIDADE DA REPRESSÃO: o Corpo de

4.4 Garantir a Salubridade

4.4.1 A higiene com os gêneros a serem consumidos na cidade

Prejuízo à saúde pública era a uma das conseqüências da venda de gêneros corruptos na cidade fosse em terra ou em mar. No entanto, no cotidiano da cidade ludovicense essa questão pouco preocupou alguns comerciantes locais, como mostra a tabela a seguir:

TABELA 22

INFRATORES DA POSTURA Nº 34193

GÊNERO CONDIÇÃO JURÍDICA

HOMEM MULHER LIVRE ESCRAVO

03 (100%) 00 (0 %) 00 (0%) 03 (100%)

FONTE: CORPO DE POLÍCIA DA PROVÍNCIA DO MARANHÃO. Partes Gerais das Novidades do Dia. [São Luís], 1842-1866.

Entre eles, o preto Antonio, escravo de Caetano de Souza Pereira, que a 8ª Patrulha prendeu ao meio dia na rua dos Remédios194, por andar vendendo pelas ruas carne porco corrupta195 (CORPO DE POLÍCIA... PGND, 23/09/1848).

Complementando essa questão a tabela abaixo também diz respeito ao tema abordado anteriormente.

TABELA 23

INFRATORES DA POSTURA Nº 83196

GÊNERO CONDIÇÃO JURÍDICA

HOMEM MULHER LIVRE ESCRAVO

00 (100%) 01 (100 %) 00 (0%) 01 (100%)

FONTE: CORPO DE POLÍCIA DA PROVÍNCIA DO MARANHÃO. Partes Gerais das Novidades do Dia. [São Luís], 1842-1866.

Neste caso, a preta Francisca, escrava de Dionizio José de Oliveira e Silva, foi conduzida ao quartel pelo soldado da 3ª Companhia, às 9 horas da manhã no Ribeirão, por mandado do Cabo da 1ª Companhia, “por andar vendendo em tabuleiro uma porção de fato pútrido” (CORPO DE POLÍCIA... PGND, 24/09/1844).

193 Postura nº 34 – Todos os que tiverem em sua loja ou armazém gêneros corruptos que prejudiquem a saúde

pública serão condenados a pagar a pena de seis mil réis e nesta proporção pelas reincidências até ao máximo (MARANHÃO. Edital..., 1842. p. 6).

194 Atualmente denominada rua Rio Branco, “provém da larga estrada que Joaquim de Melo e Povoas (1775-

1779) mandou fazer em 1775 e que, até um século depois, era conhecida como estrada que vai para a ermida

dos Remédios. Até hoje é chamada rua dos Remédios. Começa no largo dos Remédios (praça Gonçalves Dias) e termina no Largo do Quartel (praça Deodoro) (LIMA, 2002, p. 176).

195 Grifos nosso.

196 Postura nº 83 – Todos os gêneros corruptos que forem encontrados quer em terra ou a bordo de qualquer

embarcação, conforme a postura nº 34 serão depois de julgados tais pela Comissão de Saúde, inutilizados ou deitados ao mar, como melhor convier; sendo este trabalho feito à custa dos donos de tais gêneros (MARANHÃO. Edital..., 1842. p. 12).

Essa questão de higiene dos produtos necessários para a alimentação sadia dos moradores da cidade girava também em torno do local em que deveriam ser comercializados. Essa discussão consta do jornal O Século, de 25/11/1859:

A patrulha da Câmara Municipal desta cidade acaba de dar mais uma prova de quanto se interessa pelo bem público, pontificando na praça do novo mercado, 14 talhos para venda de carnes verdes, arranjados em perfeitas condições higiênicas. Aqueles que comerciam com tal gênero encontrarão ali as necessárias comodidades, não só ao que respeita ao asseio e boa ordem como ao módico aluguel.

O local que a Câmara escolheu para o comércio de carnes verdes é o mais próprio por ser em uma praça espaçosa e que oferece todas as proporções para a conservação do asseio, indispensável em tais estabelecimentos.

Consta-nos que a Municipalidade fizera as necessárias posturas para regular semelhante comércio, e que vai pedir ao governo a aprovação visto ser negócio urgente.

Confiamos que a Municipalidade será atendida, em tão justo pedido, pelo Exmo. Sr. Dr. Silveira de Sousa. (A PATRULHA..., 25/11/1859, p. 1).

Porém, consta também no mesmo jornal, que a determinação de um local específico para o comércio de carnes frescas na cidade foi alvo de resistência por parte dos marchantes da cidade em face da disciplinarização do espaço para a comercialização de carne.

Não teve lugar no 1º de janeiro corrente, como estava convencionado, a mudança dos talhos estabelecidos em diversas ruas da cidade para a praça do Açougue Velho, porque os marchantes Fernandes, Guimarães, Costa Neves e Madail endereçaram à presidência uma representação na qual, somos informados, pedem a revogação das posturas que a Câmara Municipal da Capital confeccionou para venda de carnes verdes na referida praça do Açougue Velho e que S. Exc. aprovou provisoriamente, ou a permissão de terem seus talhos em diversos lugares, além dos estabelecidos pela Municipalidade.[...] As posturas que o governo provincial julgo dar sua aprovação provisória foram bem aceitas pela população desta Capital; porque em verdade foram elas confeccionadas unicamente no interesse do bem público, que está acima do particular.[...] Recusar, pois, em tais condições, efetuar a mudança dos talhos que se acham espalhados pela rua da cidade para a praça do Açougue Velho – não pode ter outra explicação – se não o desejo de estabelecer uma luta com a Câmara Municipal, que motivos alguns tem dado àqueles Srs. Para que assim procedam, salvo se os marchantes querem imitar a empresa da Companhia Confiança Maranhense no generoso empenho de combaterem a Câmara que tem feito a referida companhia inúmeros favores. [...] (NÃO TEVE LUGAR, 05/01/1860, p. 1)

Dessa forma, os fiscais do órgão competente comunicaram através do mesmo jornal, a imposição de multas aos marchantes que continuassem a comercializar a carne nos antigos locais.

Imposição de multas – os fiscais da Municipalidade, multarão no dia 18 do corrente aos donos dos talhos estabelecidos em diversas ruas da cidade por continuarem a vender nos mesmo carne, em conseqüência de ter finalizado no dia antecedente o prazo de 30 dias para ter execução as posturas que a Câmara Municipal confeccionou, e o governo provincial aprovou provisoriamente, para que a venda de tal gênero só se possa fazer na praça do Açougue. (IMPOSIÇÃO DE MULTAS, 21/01/1860, p. 1).

O registro desse episódio na imprensa local possibilita a reflexão sobre os conflitos gerados por parte de várias categorias profissionais acerca das mudanças voltadas para o desenvolvimento de determinadas atividades no espaço citadino. Nesse caso, nem mesmo por se tratar de uma mudança em prol da saúde pública, ele foram inevitáveis.

Nessa mesma direção, não era permitida a prática de matar ou esquartejar reses sem ser nos matadouros públicos e particulares com licença da Câmara não era permitido. Porém, a tabela abaixo demonstra que a prática contrária ao determinado para a cidade ideal era uma constante.

TABELA 24

INFRATORES DA POSTURA Nº 38197

GÊNERO CONDIÇÃO JURÍDICA

HOMEM MULHER LIVRE ESCRAVO

03 (100%) 00 (0 %) 00 (0%) 03 (100%)

FONTE: CORPO DE POLÍCIA DA PROVÍNCIA DO MARANHÃO. Partes Gerais das Novidades do Dia. [São Luís], 1842-1866.

Configura-se nessa prática infratora, o caso registrado pela 2ª Patrulha que conduziu as 3 horas da tarde do Trapiche de Jozé dos Reis e Brito, por mandado do Cabo da 3ª Companhia, “um couro e dois quartos da carne de uma rês que estava beneficiando na

197 Postura nº 38 – Toda pessoa que matar ou esquartejar reses sem ser nos matadouros públicos e particulares

com licença da Câmara será multado em dez mil réis pela primeira vez e nesta proporção pelas reincidências até o máximo, o que se entende só com as reses mortas para negócio (MARANHÃO. Edital..., 1842. p. 6).

praia próxima ao mesmo trapiche, sem que para isso tivesse a competente autorização” (CORPO DE POLÍCIA... PGND, 20/05/1847).

Outro cuidado importante a ser tomado com o animal destinado ao abate para consumo na cidade era que, se fosse vaca, não deveria estar prenha. Mesmo assim, a tabela a seguir demonstra que esse cuidado nem sempre era tomado pelos comerciantes de carne na cidade possível.

TABELA 25

INFRATORES DA POSTURA Nº 48198

GÊNERO CONDIÇÃO JURÍDICA

HOMEM MULHER LIVRE ESCRAVO

02 (100%) 00 (0 %) 01 (50%) 01 (50%)

FONTE: CORPO DE POLÍCIA DA PROVÍNCIA DO MARANHÃO. Partes Gerais das Novidades do Dia. [São Luís], 1842-1866.

Nesse sentido enquadra-se o caso do preto Aleixo, escravo do paisano Patrício José da Silva preso pela 1ª Patrulha, às 10 horas da manhã na Praia Grande199 por infringir a postura nº 48, sendo preso também o seu proprietário por oferecer mil réis à Patrulha para soltar o escravo (CORPO DE POLÍCIA... PGND, 09/07/1844). A atitude do proprietário registra a tentativa de burlar o estabelecido pelos legisladores locais.

Por outro lado, o corte de carnes verdes para o consumo dos moradores da cidade não deveria ser feito nos espaços públicos da cidade ideal para garantir-lhes estar sempre limpos, assim como para evitar a poluição do ar citadino, que deveria estar sempre puro. Porém, casos em que essa preocupação não era tida como relevante deram ensejo às ocorrências constantes da tabela adiante:

198 Postura nº 48 – Fica proibida a matança nos talhos públicos de vacas prenhas e os contraventores pagarão

vinte mil réis e na reincidência quarenta mil réis; e a mesma pena terá o empregado pela Câmara em tais administrações que tal consentir (MARANHÃO. Edital..., 1842. p. 7).

199 “[...] espaço que medeia, mais ou menos, do atual Shopping do Cidadão até o final da rua do Trapiche

(Portugal), em contraposição à praia Pequena, ou praia da Trindade, na altura da rua do Ribeirão (também conhecida como praia do Caju) e praia de Santos Antonio, em direção à antiga Estação da Estrada de Ferro S Luís-Teresina, hoje a Gerência de Segurança Pública” (LIMA, 2002, p. 23).

TABELA 26

INFRATORES DA POSTURA Nº 97200

GÊNERO CONDIÇÃO JURÍDICA

HOMEM MULHER LIVRE ESCRAVO

00 (0%) 07 (100 %) 00 (0%) 07 (100%)

FONTE: CORPO DE POLÍCIA DA PROVÍNCIA DO MARANHÃO. Partes Gerais das Novidades do Dia. [São Luís], 1842-1866.

Entre esses casos, há o registro feito pela 3ª Patrulha, que conduziu pres[as] ao quartel às 8 horas da noite da Praça do Açougue Velho, por mandado do fiscal do 1º distrito, as pretas Thomasia, escrava de Thiago José Salgado de Sá Moscoso; Eugênia, escrava de Joaquim da Costa Barradas; e Bernardina, escrava de Augusto Garcia, por estarem limpando fato na mesma praça (CORPO DE POLÍCIA... PGND, 03/02/1848).

Por ser prejudicial à saúde era abusiva a prática de vender carnes verdes na cidade fora do horário determinado pela Câmara. Em função do clima, depois de morta a rés só deveria ser vendida até vinte e quatro horas depois de morta a rés, devendo o seu comércio ser feito somente até as duas horas da tarde. No entanto, tal disposição foi burlada na cidade conforme a tabela abaixo:

TABELA 27

INFRATORES DA POSTURA Nº 108201

GÊNERO CONDIÇÃO JURÍDICA

HOMEM MULHER LIVRE ESCRAVO

02 (100%) 00 (0 %) 01 (50%) 01 (50%)

FONTE: CORPO DE POLÍCIA DA PROVÍNCIA DO MARANHÃO. Partes Gerais das Novidades do Dia. [São Luís], 1842-1866.

200 Postura nº 97 – A pessoa alguma d’ora em diante limpar os fatos verdes das reses na Praça do Açougue

Público ou ainda mesmo em outros quaisquer lugares, que não sejam no interior de suas casas ou beiradas do mar, sob pena de cinco mil réis de multa pela primeira vez para o cofre da Câmara e na reincidência na de dez mil réis e três dias de prisão, sendo, portanto, esta Postura em toda a sua plenitude aplicável aos que abusiva e escandalosamente costumam lançar na referida Praça do Açougue e outros lugares as pontas, sabugos, ossos e unhas das reses (MARANHÃO. Edital..., 1842. p. 15).

201 Postura nº 108 – Sendo prejudicial à saúde e abusiva a prática de vender-se neste clima carnes verdes até

vinte e quatro horas depois de morta a rês, fica proibida a venda deste gênero das duas horas da tarde em diante; pena aos contraventores de dez mil réis e nas reincidências de vinte mil réis e oito dias de prisão (MARANHÃO. Edital..., 1842. p. 17).

Para essa situação é pertinente pontuar o registro da infração praticada pelo preto Januário, escravo de João José, preso pela 1ª Patrulha às 3 ½ horas da tarde na rua do Egito202, por andar vendendo um cofo com carne verde àquela hora (CORPO DE POLÍCIA... PGND, 02/12/1847).