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3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

3.4 Diferentes Tendências Pedagógicas

3.4.3 A História da Matemática como uma atividade de pesquisa

Observando os currículos escolares do município de Três Coroas, percebe-se que durante o Ensino Fundamental as atividades envolvendo a história da matemática ficam à escolha do professor, uma vez que não há uma indicação para a proposta dessas atividades. Assim, em muitos casos, os conhecimentos que os alunos apresentam a respeito do desenvolvimento matemático surge das experiências que eles têm a respeito da sua própria aprendizagem, crendo que os conceitos surgiram de uma “inspiração” de um certo autor, sem nenhuma explicação para a solução apresentada.

Assim, o principal objetivo da aplicação de uma atividade envolvendo a história da matemática é desestabilizar este conceito criado pelos alunos, fazendo com que eles percebam que o conhecimento matemático é utilizado desde a pré-história, evoluindo de acordo com as necessidades dos povos e gerando em muitos momentos grandes mudanças, inclusive culturais.

Quando se trata da educação matemática, vários aspectos devem ser levados em conta antes de indicarmos o interesse ou desinteresse dos alunos pela aprendizagem. Um deles está na aplicação de uma metodologia que torne a aula interessante aos olhos dos alunos, outro

está na contextualização dada ao conteúdo ensinado; e neste item surge o uso da história da Matemática como uma opção.

Vários autores defendem o uso da história da Matemática para dar significado ao ensino de diversos conteúdos. Este uso pode, além de possibilitar maior motivação à aprendizagem, auxiliar também na mudança das concepções que os alunos apresentam em relação à Matemática. De acordo com Miguel e Miorim (2004):

(...) a forma lógica e emplumada através da qual o conteúdo matemático é normalmente exposto ao aluno, não reflete o modo como esse conhecimento foi historicamente produzido. Então, caberia à história estabelecer essa consonância desmistificando, portanto, os cursos regulares de matemática, que transmitem a falsa impressão de que a matemática é harmoniosa, de que está pronta e acabada (p. 52).

A história da Matemática se apresenta como mais um auxilio ao professor, possibilitando a desmistificação de que ela deve ser aceita e aprendida como uma disciplina cujo conhecimento precisa ser apenas decorado pelo aluno enquanto é repassado pelo professor. Em diversas situações o professor tem dificuldades em contextualizar o uso de determinados conteúdos, pois se apresentam como conhecimentos matemáticos puros, utilizados somente para o desenvolvimento da Matemática. Nestes casos, em que o conteúdo representa conceitos que precisam ser compreendidos para que a matemática possa ser vista como ciência em constante desenvolvimento, a história da Matemática surge como opção importante para a compreensão de como se constituiu e como se utiliza este conceito.

Quando se trata de assuntos como Álgebra, Teoria dos Números, entre outros, vários alunos questionam o sentido da necessidade de compreensão de determinadas teorias. Aqueles alunos que não têm interesse na busca pelo conhecimento matemático ou que não pretendem seguir profissões que envolvam este conhecimento, acabam não compreendendo e não buscando a compreensão do tema. Apresentando como este conceito foi concebido e de que formas já foi utilizado ao longo dos anos, o que foi produzido a partir dele, buscando assim despertar o interesse para sua aprendizagem, apresentando um contexto ao mesmo pode-se então desmistificar esta idéia absolutamente abstrata do conhecimento matemático, mostrando ao aluno uma diferente forma de observar os conteúdos desenvolvidos nas aulas.

A História da Matemática também nos fornece informações a respeito de como se dá a curiosidade dos matemáticos, através de que questionamentos surgem diferentes teorias e

pensamentos. Podemos nos utilizar de problemas historicamente conhecidos e que serviram como base de inspiração a diferentes autores. Vianna (2000) completa indicando que

(...) a história da matemática pode ser uma fonte relevante de problemas para serem trabalhados na resolução de problemas, o estudo da solução dada aos problemas reais que foram enfrentados em épocas diversas pode fornecer contribuições relevantes para o desenvolvimento de técnicas de modelagem e para o aprimoramento de modelos já elaborados, o conhecimento da história da matemática dos diversos povos entrelaça-se com os trabalhos de Etnomatemática...(p.4)

Porém, para que isso seja possível, há vários obstáculos a serem superados. Segundo Vianna (2000), um dos obstáculos diz respeito aos livros didáticos atuais que trazem poucos itens relacionados à história da Matemática, e geralmente separados do conteúdo, como forma de curiosidade relacionada ao mesmo, informando de maneira muito simplória, despertando dúvidas a respeito de sua constituição.

Muitos deles transmitem a idéia errônea de que o conceito é formado a partir de uma inspiração quase que divina, que o matemático resolve com uma simplicidade incrível, tendo credibilidade de toda a sociedade. Geralmente não apresentam as idéias originais do autor, como estas foram desenvolvidas nem como foram comprovadas, aumentando assim a idéia de que a Matemática é realmente algo que já nos vem pronto e que alguns “abençoados” dominam com facilidade. Anglin (traduzido por VIANNA e GOMES, 2001) indica:

Ao invés de selecionar um único indivíduo para o teorema, o historiador poderia assinalar as capacidades tecnológicas ou as necessidades sociais que foram responsáveis pelo fato. Ao invés de glorificar a pessoa de sorte que conseguiu ser a primeira a realizar a descoberta, o historiador poderia exaltar as idéias éticas da comunidade que a conduziram a educar as pessoas de modo que chegassem inevitavelmente a essa descoberta (p.3).

Assim, as fontes de pesquisa que poderiam ser utilizadas com maior profundidade, ficam restritas a alguns sites de pesquisa, que tratam da biografia de certos autores, enfatizando mais sua vida pessoal e possíveis fatos de sua vida privada. Raros são os dados indicativos do desenvolvimento de alguma teoria ou conceito. Pouco se trata do contexto onde ocorreu determinada descoberta, como o autor pôde alcançá-la e o que o levou a buscar o desenvolvimento dessa teoria.

Já nas publicações conhecidas como “A História da Matemática”, de Carl Boyer, por exemplo, utiliza-se uma linguagem não acessível a estudantes do ensino fundamental ou médio, sendo mais indicada a estudantes universitários. Devido a isso, os trabalhos envolvendo a pesquisa e estudos relacionados à história da Matemática representam grandes desafios aos educadores dos níveis fundamental e médio. Miguel e Miorim (2004) tratam também desta questão, indicando que

(...) a natureza da literatura histórica disponível a torna particularmente imprópria à utilização didática. Isso porque é uma característica específica das publicações matemáticas destacar unicamente os resultados matemáticos e ocultar a sua forma de produção. Devido a isso, aquilo que poderia ter alguma importância pedagógica – isto

é, os métodos extralógicos subjacentes aos processos de descoberta – estariam

irremediavelmente perdidos, e a reconstituição deles constituiria um empreendimento extremamente complexo mesmo para um historiador profissional (p.65).

A dificuldade na busca pelo material de pesquisa faz com que o trabalho com a história da Matemática seja um pouco mais efetivo durante os cursos específicos de Matemática (licenciatura ou bacharelado), geralmente em forma de uma disciplina, que vise compreender o desenvolvimento do conhecimento matemático, não necessariamente analisando criticamente como este se dá em cada época.

Para a elaboração de materiais pedagógicos relacionados à história da Matemática, é necessário que pesquisadores da história da Matemática analisem o contexto e indiquem através de uma linguagem compreensível quais são as situações pelas quais um autor passou até organizar determinada teoria, como ela foi caracterizada, constituída. Miguel (1997) indica que

Para poderem ser pedagogicamente úteis, é necessário que histórias da matemática sejam escritas sob o ponto de vista do educador matemático. Tais histórias, a meu ver, tentariam e tenderiam a privilegiar certos temas e não outros, determinados problemas e métodos e não outros, enfatizar a reconstituição, não apenas dos resultados matemáticos, mas sobretudo dos contextos epistemológico, psicológico, sóciopolítico e cultural nos quais esses resultados se produziram (...) Uma história da matemática pedagogicamente orientada poderia prestar grande auxílio para os professores intencionados em contrapor-se a uma tal tendência tecnicista do ensino (p.101).

Para que a história da Matemática possa ser utilizada pedagogicamente, seria necessário que o pesquisador se pusesse no lugar do educador, produzindo um material útil ao ensino e à aprendizagem matemática. Desenvolvendo este tipo de material, poderíamos substituir os textos adotados nos atuais livros didáticos, respondendo à expectativa de apresentar aos alunos uma matemática embasada na problematização, na contextualização e na solução de problemas.

A análise crítica da Matemática é importante para que se possa comparar passado com presente, organizando assim a ligação entre a motivação que leva ao estudo e ao desenvolvimento de determinado conceito e sua aplicação nos dias atuais, contextualizando tanto a elaboração da teoria quanto sua aplicação prática, nos dias atuais e também no passado. Segundo Miguel e Miorim (2004), é de extrema importância o estabelecimento de vínculos entre a forma da produção do conhecimento e sua atual apropriação, percebendo assim como estas são utilizadas principalmente nas práticas pedagógicas e na investigação acadêmica.

A história da Matemática surge como uma opção para o desenvolvimento de atividades com o objetivo de apresentar a Matemática de um modo diferenciado, proporcionando a mudança de atitudes perante a abordagem da mesma pelo aluno. Quando a motivação pela aprendizagem aumenta, o aluno tende a apresentar melhores resultados, assim, o estudo da história pode surgir como mais uma opção, porém não isolada das demais tendências pedagógicas, auxiliando no desenvolvimento de problemas, na interpretação de fatos e na compreensão do contexto no qual foi descoberto determinado teorema, transportando para os dias atuais a necessidade da aprendizagem de determinados conceitos.