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A história de Luzia

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CAPÍTULO III – TRABALHO E ESTUDO: uma relação contraditória

3.1 A história de Luzia

Com dezessete anos, Luzia nasceu e foi criada em Goiânia. Seus pais migraram da Região Nordeste para Brasília quando crianças, trazidos por seus familiares, atraídos pelas oportunidades de emprego na construção da nova capital. Desde que se casaram, residem em Goiânia. Têm quatro filhos, sendo Luzia a mais velha; freqüentam a Igreja Evangélica. Luzia reside com sua família em um bairro periférico na região leste da cidade, em casa própria (inacabada). O pai é funcionário público de um órgão municipal, exercendo a função de auxiliar de serviços gerais em eletricidade, e tem segundo grau incompleto. A mãe cuida da casa e estudou até as primeiras séries do primeiro grau. Luzia trabalha em um supermercado, próximo à casa em que moram, desde os catorze anos; a outra irmã de Luzia também trabalha e o irmão de catorze anos faz parte de um programa de trabalho de adolescentes, recebendo um pequeno valor mensal. Luzia sempre freqüentou escola pública e estuda no Lyceu desde o ano passado; no início da pesquisa, cursava o segundo ano do segundo grau.

Luzia quase não tem tempo ou dinheiro para se divertir; dedica-se mais ao trabalho e aos estudos e vai à igreja aos domingos. No decorrer da pesquisa,

Luzia engravidou do rapaz que namorava há aproximadamente três anos e decidiram se casar. Recentemente, em um parto complicado, teve uma filhinha e diz sentir-se muito feliz em ser mãe. Durante todo tempo, Luzia recebeu apoio da família, apesar da insatisfação dos seus pais pelo ocorrido (os pais não eram favoráveis ao namoro). Apesar das dificuldades enfrentadas com a gravidez, contando com a ajuda dos pais, Luzia continuou na escola e conseguiu aprovação do segundo para o terceiro ano, mesmo ficando em recuperação no final do ano em três disciplinas. Eis a história de Luzia:

Eu comecei a trabalhar muito nova. Eu acho que com dez anos, eu trabalhava na rua, vendia revista, bolos, doces, sempre eu procurei ser independente. Aos doze anos eu comecei a trabalhar mais firme, foi num armarinho. Eu trabalhei um ano nesse armarinho, sendo atendente. Estudava também. Meu pai nunca aceitou nós pararmos de estudar. Estudava de manhã e quando eu saí de lá, não fiquei, acho, que nem um mês desempregada e arrumei esse serviço de agora; já tem quatro anos que eu estou nele, no supermercado. Só que lá era assim, um botequinho. Hoje já está bem maior, já é bem grande, já está todo informatizado. Comecei a trabalhar, não era carteira assinada, já tem dois anos que eu tenho carteira assinada. Este é o primeiro ano que eu estudo à noite. Mas arrependi demais, nossa. Porque eu estudava de manhã. Sei lá, às vezes era mais difícil, mas era melhor, porque o estudo de manhã os alunos tem mais responsabilidade. Às vezes me dá uma contrariedade, tem dia. Os professores mesmo – gente, cala a boca, não sei quê – o aluno, tudo marmanjo mesmo, aquele meninão, o professor tem que mandar calar a boca! Ainda acha ruim, às vezes. Mas eu acho assim, se você vem para escola para estudar, pelo amor de Deus! Igual o dia que eu pego a segunda aula, me dá uma contrariedade, porque se eu saio de casa para pegar a primeira aula, às vezes esses ônibus atrasam, aí não dá tempo. Meu horário de sair do trabalho é cinco horas, mas eu nunca saí às cinco. Entro às sete e saio às cinco, tenho uma hora de almoço. Minha hora de almoço não dá para fazer nada, só correr.

Ao relatar a forma como começou a trabalhar, Luzia fala sobre si, de como sempre procurou ser independente. Falar sobre si é falar sobre o seu trabalho. Procurar independência com tão pouca idade, contrapõe-se à idéia do pai de que nunca deveria deixar de estudar. Independência e obediência, momentos contraditórios que se fundem e se tornam um aprendizado difícil. Há quatro anos trabalhando no supermercado, acompanhou o crescimento da empresa e pode, com convicção, falar sobre ela – expressa seu contentamento com a conquista de acompanhar a modernização da empresa e do registro em carteira de trabalho.

O preço da conquista, no entanto, parece ser muito alto para Luzia. Passar a estudar à noite é relatado com sofrimento, pois tem clareza quanto às difíceis

condições a enfrentar para estudar no período noturno. Sente isso na correria do dia-a-dia, na falta de tempo para estudar, na sala de aula com os colegas conversadores, indisciplinados (e como ela, exaustos e dispersos), no fato de quase nunca sair no horário previsto do trabalho. Na forma ingênua de analisar a qualidade das aulas, coloca, ainda, sobre os colegas a causa do inadequação – são meninões, marmanjos, imaturos.

Entrei no supermercado com catorze anos e estou lá. Vendo, porque hoje em dia quase não tem oportunidade de emprego, porque você começa a trabalhar, se você escolher demais e um salário muito bom, tem outra pessoa que faz o serviço que você faz, às vezes nem com a qualidade que você faz pela metade do preço. Porque hoje, você exigir um salário, você nunca exige. O patrão fala assim: “Não, mas tem outras pessoas que faz a mesma coisa por tanto”. Eu não vejo chance de negociar, porque direto eu pego solicitação de empregos, enquanto que um pede dois salários, outro fala assim: “Um salário para mim está bom”. Meu Deus, isso me mata! O povo precisa colocar na cabeça que não é assim. No caso, eu trabalho, eu exijo minhas horas extras que eu faço depois das cinco, porque minha hora certa é cinco. Porque se eu passo meia hora aqui eu estou perdendo meu tempo lá fora. Então, eu quero ganhar; aí ele fala assim: “Mas tem outra que fica aqui até as seis horas e não cobra”. Você entende? Então, mexer com funcionário, mexer com gente...

As transformações pelas quais passa o mundo do trabalho são percebidas e expressas por Luzia de forma simples e concreta – a necessidade do trabalho condiciona o comportamento submisso ao ter que aceitar as condições impostas pelo empregador. E a conseqüência disso? Irritação, inconformismo e revolta diante de uma realidade que não pode modificar, por ter perdido aula ao chegar atrasada na escola e ciente de ser explorada em seu tempo tão precioso, o que, certamente, não produz efeitos satisfatórios. A impulsividade contida, o controle do emocional forçam o amadurecimento de Luzia em seus dezessete anos.

Ah! estudar de manhã é muito mais compensador. Eu passei a estudar à noite devido ao meu trabalho. Eu achava também que era uma boa oportunidade, porque eu ia trabalhar só até as catorze horas. Mas aí, devido ao emprego eu tive que mudar de horário, e ficou foi pior. Na época eu recebi uma proposta. Melhor, mas ao mesmo tempo pior. Eu trabalhava de operadora de caixa. No ano passado eu trabalhava das duas até às nove, então eu estudava de manhã. Levantava seis, seis e meia. Levantava, ia para o colégio chegava à uma hora. Aí, eu fiz meu curso de computação; saía do colégio quinze para o meio-dia, entrava no curso meio-dia, saía uma hora, pegava o ônibus, chegava em casa uma e 45, às vezes até duas horas. Mal dava tempo de tomar banho, ia para o serviço. Quando foi este ano, troquei meu horário, para de manhã, trabalhar de operadora de caixa de manhã. No comecinho do

ano, a moça do cadastro saiu. Quando ela saiu, falaram: “Luzia, fica no lugar dela”. Eu ia exercer minha profissão, no caso eu ia mexer com computador. Já era uma oportunidade melhor. Estava bom no computador, porque dava para fazer minhas tarefas, serviço bem mais leve.

Para Luzia, o fato de estar na atividade esperada, possível de ser compatibilizada com a formação pretendida a satisfazia. Com seus dezessete anos e a intenção de se dedicar aos estudos, a jovem não apresenta, nesse momento, ambição profissional maior. No entanto, completa:

Quando eu menos esperava, agora em julho: “Luzia, a moça que era subgerente saiu, vamos colocar você no lugar dela”. Vou eu ficar dois meses em experiência; eu estou levando, mas é meio difícil porque, eu com dezessete anos, eu tenho que ter cabeça de quem já tem trinta! Mexer com gente de outra idade, sabe, bem mais diferente, comunicar com pessoas bem mais elevada às vezes, e às vezes eu sou meio tímida [risos]. De vez em quando eu falo assim: “Ai, meu Deus”. Mas eu estou indo até bem no trabalho, porque eu sou uma pessoa que eu não gosto muito de ficar dependendo, sabe? Até mesmo para me ensinar alguma coisa, igual agora eu estou, porque eu não sabia de nada, no caso, de parte financeira. Lá, pode-se dizer é uma parte financeira do supermercado, que é pagamento de contas, de funcionários, tudo, então, é grande, a responsabilidade é muito grande. Porque você tem responsabilidade com uma coisa que não é sua, tem que estar preocupando com funcionários dos outros que, sabe, exige muito. No caso, chamar atenção de funcionário, conversar com funcionário. Igual às vezes, funcionário mais velho do que eu: “Ah! não Luzia, você tá muito enjoada”. Mas se eles me passam isso! Se eu não cobrar deles, como eu faço? Estou sentindo muito. É bom, porque é mais uma experiência, mas eu acho que esta experiência não vai me levar a muita coisa, não é isso que eu quero.

O relato de Luzia apresenta uma realidade sofrida no modo, em certa medida, violento como é forçada a assumir funções complexas e para as quais não se sente preparada. Assumir a subgerência significa, em seu relato, responsabilizar-se por uma função difícil e que requer amadurecimento. Acompanhar o trabalho de seus colegas com mais idade, cobrar o seu trabalho causam-lhe constrangimento. Pelo fato de trabalhar há vários anos no supermercado e ter desempenhado bem suas funções, passa a ser requisitada para funções estratégicas para o sucesso do empreendimento, em atividades nas quais a confiança e o comprometimento são atributos essenciais. Pede-se que seja flexível, que desenvolva condições para assumir funções diversas de acordo com a necessidade do trabalho. No próprio trabalho prepara-se para a função;

além dos processos técnicos exigidos (como conhecimento sobre pagamento de pessoal, supervisão do trabalho, dentre outros), é também solicitada uma determinada subjetividade, que se produz paulatinamente (segurança, seriedade, comprometimento com a empresa, habilidade no relacionamento, etc.). Aceita o desafio, mas não sem certa resistência.

Reconhece o duplo caráter exploratório do trabalho: em primeiro lugar, porque realiza um trabalho cujo produto não é dela e sim do empregador, e em segundo lugar, pela extrema dificuldade a que se submete na realização da tarefa, que por ser de outro acarreta maior peso, maior responsabilidade. Reluta, quase diz não, no entanto, sente-se coagida a aceitar. A submissão, pelo medo de perder o emprego, é a alternativa que encontra, e é obrigada, então, a priorizar os objetivos de seu empregador e postergar os seus próprios, transferindo-se para o turno noturno, mesmo ciente que não é o melhor para sua vida escolar, que não é o melhor para ela. No entanto, a compreensão da realidade é mediada pela própria atividade na forma em que se processa no modo de produção capitalista, ou seja, fragmentada, alienada, com base na condição fundamental de o trabalhador se constituir em mercadoria.

No ano que vem eu termino o terceiro, mas você acha que se eu prestar o vestibular eu passo? Tenho certeza que eu não passo. Porque, primeiro, o estudo do jeito que eu estou levando, não vai me chegar à nada. Porque eu estudo aqui no colégio, eu não estudo em casa, eu não estudo em outro lugar. Uma hora de almoço que eu tenho, não dá para fazer nada, mal almoçar. E eu saio às cinco horas, tenho que lavar meu uniforme, tomar um banho, sentar pelo menos um pouquinho. Então, não dá. No dia da minha folga eu tenho a casa que também, a minha mãe não dá conta. Aí, eu ajudo. Final de semana é o dia que eu mais trabalho, porque eu vou lavar casa, vou lavar parede. Então não adianta! Aí quando chega domingo, de manhãzinha eu levanto, cedo de novo, seis horas, seis e quarenta. Tomo banho de novo, aí vou trabalhar. Chego à uma hora, duas horas. Que disposição eu tenho de fazer alguma coisa? Estudar? E pior que eu sou assim, eu não dou conta de dormir de dia, aí fico “embromando”. Rodo para um lado, rodo para o outro, não tenho nem disposição de sair. Muito difícil sair de casa, só vou domingo à noite na Igreja [evangélica].

O cotidiano de Luzia retrata uma vida rotineira, repetitiva, na qual não encontra sentido. Todo dia igual, com trabalho e mais trabalho. Marcado pelo relógio, seu tempo não lhe dá tréguas: é como se ele tomasse o controle do seu

dia e dela fizesse um simples marionete. Nesse contexto, o lazer, o passeio, o namoro não têm espaço.

Luzia tem ciência de que a forma como está conduzindo os estudos não é proveitosa, quer dizer, não conseguirá atingir seu objetivo principal, que é preparar-se para o vestibular. No imaginário familiar, o estudo adquire um significado de sucesso, de vitória. E ela não pode abrir mão dessa oportunidade, quase única, que misticamente a escola lhe oferece. Mas, ela deve merecer: estudar (mesmo não tendo tempo no relógio que marca sua semana) e trabalhar, trabalhar. Instala-se o sentimento de culpa: não consegue estudar em seu único horário disponível, não consegue sequer dormir!

Mas, eu vou levando assim. Por exemplo agora, eu estou fazendo o curso de inglês. Sei lá, se eu tiver oportunidade de estudar melhor. Comecei no comecinho deste ano, em fevereiro. Mas é muito difícil você estudar, trabalhar e fazer tudo. Porque por conta do meu pai, ele fala assim para nós: “Minhas filhas, com certeza, fome vocês não passam”. Mas ah! não, depender de uma passagem para ir lá no centro: “Pai, me dá dinheiro”. Depender de uma roupa: “Pai, me dá uma roupa”. Se eu não trabalhasse, eu penso que era desse jeito. Então, ah! não. Eu mantenho meu aparelho (ortodôntico). No caso se eu não colocasse, meu pai não ia ter condição de colocar em mim agora. Já é lucro do meu trabalho. Paguei meu curso de computação, estou pagando o de Inglês. Então, são coisas que meu pai fala que a gente passa sem, mas que, vai precisar do pai depois lá na frente. Então eu acho que não compensa, por isso que eu acho bom trabalhar, ter meu dinheiro.

A importância de obter o seu próprio dinheiro revela-se como fundamental para Luzia. Uma nova roupa, a passagem para o transporte, enfim suas necessidades atendidas, sem precisar pedir ao pai. Em uma sociedade que apela continuamente para o consumo, tendo a seu serviço, especialmente a mídia, e como alvo, especialmente o segmento jovem, é difícil esgueirar-se. Até mesmo no que se refere à própria formação: com o mercado de trabalho se tornando cada dia mais exigente, não há tempo (novamente o relógio domina) para perder, quanto mais competências e mais rapidamente, melhor. É preciso o Inglês, que a escola não oferece com qualidade. O fato de conhecer outro idioma certamente vai ajudá-la no vestibular ou para conseguir melhor emprego. Mesmo que não tenha tempo para estudar as disciplinas da escola.

Eu tenho uma irmã de doze anos que é doida para trabalhar, eu falo para ela: – “Minha filha, não faz assim não, deixa meu pai cuidar de você, porque é tão ruim ter responsabilidade nova”. Ela fala assim: –

“Ah! É porque você já está trabalhando, já tem seu dinheiro”. Porque ela é dessas, ela é caçula e tem uma diferença muito grande, quatro anos, ainda mais adolescente nos dias de hoje, não pensa, só exige. Não sei se é porque, a gente antigamente, an-ti-ga-men-te [fala pausada], três anos atrás, nós pensávamos totalmente diferente. Que dia nós tínhamos coragem de exigir alguma coisa do meu pai, uma roupa, uma sandália! Agora ela não, ali exige assim, como se pudesse mesmo. Aí nós falamos: –“Não senhora minha filha, não é assim não”. Agora, eu tenho um irmão também de quinze anos que ele trabalha. Também o dinheiro dele, diz que é para academia, natação. Só coisa que não presta, eu falo para ele. Ele colabora em casa, mas é pouco.

Embora apresente certo ressentimento em seu relato por perceber a maneira diferente como os irmãos mais novos são educados, Luzia opõe-se firmemente à idéia da irmã começar a trabalhar. Parece, com essa forma de se posicionar, reconhecer o quanto o trabalho precoce interfere negativamente na vida escolar e na constituição de sua própria personalidade. E expressa a preocupação com a irmã, procurando protegê-la das condições adversas a que foi submetida em sua curta existência.

Meu dinheiro, eu dou um pouco para minha mãe, eu falo para ela que é para ela lavar minhas roupas e ajudo na despesa; no caso, cem reais do meu salário eu dei para minha mãe. Eu estou ganhando agora dois e meio salários; antes eu ganhava só 220 reais. Mas eu fico pensando, que o salário que eu estou ganhando hoje não compensa, porque se eu tivesse depositando, só nos meus estudos, se eu tivesse deixando meu pai me manter, com certeza, sem estudar ele não ia deixar nós ficarmos. Passagem, com certeza, igual ele fala, é que não ia faltar. Direto ele vira para nós assim: “Oh! Minhas filhas, porque vocês não param de trabalhar um pouco. Dedica mais nos seus estudos, porque depois na frente as conseqüências vêem”. Mas depois que você aprende a trabalhar, ser mais independente, você não dá conta de depender de pai. Você acostuma ter seu próprio dinheiro, administrar sua própria vida. Tem filho que depende do pai em tudo. Tem filho que exige de pai, não ajuda os pais em nada. Eu acho que o que ele fez até hoje, o que ele faz é o apoio de pai, o amor de mãe que eles dão. Eu sei que é difícil trabalhar e estudar; eu acho bom porque ao mesmo tempo eu não estou dependendo de tudo.

No discurso de Luzia, a importância do trabalho é reafirmada continuamente, relacionada à conquista de autonomia e valorização pessoal, exprimindo uma ética moral que sedimenta a construção que se faz em torno do empenho, do esforço dispendido, que é colocado como um ato abnegado, na forma concreta de poder contribuir, em alguma medida, para o orçamento familiar, como a querer recompensar os esforços dos pais, que sabe ser relevante.

Traduz, ainda, em seu relato, o significado especial de ser pai e mãe, constituído na própria dinâmica da família que, no dia-a-dia, apóia, sustenta e ampara os filhos. Esses elementos expressam uma ética própria da família, que paulatinamente vai se constrói, e, ao mesmo tempo, é internalizada pelas gerações sucessivas. É como se uma silenciosa cumplicidade existisse sob uma adversa condição de vida, o que exige uma luta constante na qual o vencedor precisa contar com as forças que puder aglutinar, e ainda assim, sem garantir vitória alguma.

Igual este ano. Ah! meu Deus, eu acho que se eu estivesse estudando de manhã eu estaria melhor. Eu não estou bem na escola; eu sempre fui uma aluna assim, não é estudiosa, mas sempre eu tentei não depender de nota, chegar no final de ano, não ficar de recuperação. E do jeito que eu estou indo, este ano eu fico. Eu acho assim, muito difícil porque você tem que estudar, estudar, e prestar vestibular. Eu penso terminar o terceiro e já prestar um vestibular para mim ter uma noção de como é que é. Depois fazer um cursinho, pelo menos uns seis meses e depois tentar de novo, porque eu acho que depois que você pára, faz o terceiro ano e depois descansa, eu acho que você não volta a estudar mais não. Eu quero fazer o vestibular para Medicina; desde pequena eu falava para minha mãe: “Olha mãe, eu quero ser médica”. Mas do jeito que vai indo, o salário que a gente ganha, passar para universidade, no caso uma Anhangüera [faculdade particular] ou até mesmo uma federal, é difícil, porque a concorrência hoje é muito grande. Para mim entrar no Lyceu este ano, eu tive que pagar, comprar a minha vaga! 25 reais. No

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