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A Importância da Irmandade dos Cossacos em Prudentópolis

No documento NIKOLAS CORRENT (páginas 117-139)

Mapa 2 Prudentópolis e suas divisas

1 DA UCRÂNIA AO BRASIL: O IMIGRANTE EM PRUDENTÓPOLIS/PR

2.5 OS COSSACOS EM PRUDENTÓPOLIS/PR

2.5.2 A Importância da Irmandade dos Cossacos em Prudentópolis

O município de Prudentópolis é conhecido como território das cachoeiras gigantes73. Mesmo assim, entretanto, os turistas são atraídos, em grande parte, pela influência da cultura ucraniana, especificamente pela Irmandade dos Cossacos. O turismo é um setor que movimenta a economia da cidade e, de acordo com a gerente do Departamento de Cultura e secretária de Turismo, Nádia Morskei (2017), ―[...] a cultura ucraniana é o carro chefe do turismo de Prudentópolis‖. Consoante sua narrativa, os turistas ali comparecem em busca das tradições dos ucranianos, visitando, em especial, o Museu do Milênio74 e a Igreja de São Josafat75, conforme se vê na Ilustração 21, arquitetada em estilo bizantino e tombada como patrimônio artístico e cultural paranaense em 1979.

Ilustração 21- Igreja de São Josafat de Prudentópolis/PR.

Fonte: Metropolia Católica Ucraniana (2015)

73 As belezas naturais de Prudentópolis se enfatizam, sobretudo, nas cachoeiras, com registro de mais de 100

delas, com uma variação entre 80 e 196 metros. Dentre elas, o Salto São Francisco é destaque, sendo considerado o maior do Sul do país e o quinto maior do Brasil, com 196 metros de queda livre.

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O Museu do Milênio dispõe de um acervo histórico, cultural e religioso da contribuição dos primeiros imigrantes ucranianos na colonização e no desenvolvimento do município.

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Questionada sobre os eventos culturais no município de Prudentópolis, Morskei (2017) relata que ―[...] são importantes pra cultura ucraniana aprofundar suas raízes, deixar bem firme e não esquecer mais‖. Nota-se que a secretária de turismo enfatiza a relevância para os descendentes de ucranianos, no entanto, sua narrativa expõe implicitamente a influência para os brasileiros, os quais conhecem os costumes e traços culturais ucranianos em sua própria nação. Neste segmento, Morskei explana que ―[...] na Semana Ucraniana76 são feitas Sessões na Câmara, estudos sobre os ucranianos, oficinas de culinária pra preservar a gastronomia, oficinas pra crianças e diversas coisas, a semana toda no pavilhão ucraniano‖. Os eventos citados pela depoente possibilitam ao turista uma apreciação e admiração daquilo considerado distinto de seu natural. Ademais, ressalta a importância da religiosidade na cultura, visto que ―[...] estavam caindo muitas tradições, e mais uma vez a igreja firme fazendo parte disso, resgatando a cultura‖. (MORSKEI, 2017).

Desta forma, é evidente que os cossacos, bem como os descendentes de ucranianos, contribuem intensamente para o desenvolvimento da municipalidade não apenas para a economia, mas também para a cultura e os eventos, que abordaremos no próximo capítulo. A Irmandade dos Cossacos é uma referência para os indivíduos no que diz respeito à valorização humana, pois os integrantes se vangloriam de sua liberdade, bem como da luta e da defesa daquilo que lhes pertence. Krevei (2017) relata que Prudentópolis recebe turistas de diversas regiões do mundo. Elucida que alguns destes não demonstram interesse, no entanto, ―[...] o turista que tem uma visão mais profunda do que é um ser humano, do que é uma pátria, do que é uma religião é bem diferente‖, ou seja, interage com o universo contemplado. Acerca da importância da cultura ucraniana, Krevei (2017) narra que ―[...] é bem importante, porque é ela que vai segurar esse povo‖, referindo-se aos turistas. Complementa valorizando que ―[...] Prudentópolis se expande e se torna conhecido mundialmente graças à cultura ucraniana‖.

No ano de 2016, a Irmandade deslocou-se para Curitiba, onde foi premiada pelo embaixador ucraniano no Brasil, Rostyslav Tronenko, com uma Honra ao Mérito do governo ucraniano, devido aos trabalhos realizados no Brasil. Além disso, foi sancionada a Lei Estadual nº 19.006, datada de 9 de maio 2017, que confere à Irmandade seu dia oficial. A solicitação da embaixatriz ucraniana, Fabiana Tronenko, à deputada estadual Maria Victoria Borghetti Barros resultou na inserção do dia ao Calendário Oficial de Eventos do Paraná como uma data comemorativa, sendo consumada no Sábado de Aleluia. Na apresentação do

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Mediante a Lei Federal nº 12.209/10, o dia 24 de agosto foi introduzido no calendário da República Federativa do Brasil como o Dia da Comunidade Ucraniana no Brasil. Assim, foi criada em Prudentópolis a Semana da Comunidade Ucraniana, a qual se comemora com a realização de diversas atividades durante uma semana, com o intuito de reconhecer e valorizar as tradições ucranianas.

projeto de lei, a deputada ressaltou a importância da Irmandade para o município, enfatizando as festividades pascais, que são aguardadas pelos descendentes ucranianos da região, bem como por muitos turistas. A ilustração 22 representa o sentimento de satisfação dos cossacos ao serem reconhecidos, sob posse da bandeira ucraniana, bem como utilizando as vestes e os armamentos cossacos. De casaco preto, vê-se o cossaco Marcos Boiko portando a supracitada legislação.

Ilustração 22 - Cossacos comemorando a Lei Estadual nº 19.006/2017.

Fonte: Ukrainian Cossacks (2016)

Eventos como esses enfatizam o município de Prudentópolis perante os outros municípios paranaenses. Suchodolak (2017) relata que a Irmandade expede convites a autoridades políticas para os conhecerem de perto e expõe uma nova visita: ―[...] ano que vem provavelmente o embaixador e a embaixatriz‖. Destaca ainda, o vínculo dos cossacos com esses personagens, os quais ―[...] se aproximaram muito da gente, mandam mensagens toda semana perguntando como estamos e se precisamos de ajuda‖ (SUCHODOLAK, 2017).

A Irmandade proporciona ao município uma intensa visibilidade, especialmente mediante divulgações com fôlderes e informações nas redes sociais, convidando turistas a conhecer Prudentópolis. A Páscoa atrai um grande número de visitantes. São pessoas que frequentam restaurantes, hotéis, lojas, dentre outros estabelecimentos comerciais. Dessa maneira, o que fica para a Irmandade dos Cossacos é admiração e respeito, sendo que o remanescente da atividade turística é proveito para a cidade: ―[...] a parte mais importante é a

Irmandade trazer o turista pra Prudentópolis. Essa é a importância dos Cossacos‖ (SUCHODOLAK, 2017).

De acordo com os cossacos, a visibilidade é tamanha que até na Ucrânia os jornais e os meios de comunicação fazem referência à Prudentópolis, assim como também no YouTube são encontrados inúmeros vídeos sobres os cossacos de Prudentópolis. Makohin (2017) expõe que ―[...] até o presidente da Ucrânia77

assistiu um vídeo daqueles‖. Muitos turistas chegam à cidade na Páscoa para conhecer o acampamento dos cossacos, vindos de diversos países, como Canadá, Ucrânia, Estados Unidos, Paraguai, Argentina e Japão. Dessa forma, é notória a importância da Irmandade dos Cossacos para Prudentópolis e, por extensão, para o Paraná e o Brasil.

3 A ATUAÇÃO DA IRMANDADE DOS COSSACOS DE PRUDENTÓPOLIS

“Alma e corpo doaremos por nossa liberdade. E mostraremos que nós, irmãos, somos da linhagem dos Cossacos”. (Tarás Chevtchenko)

A formação da Irmandade dos Cossacos de Prudentópolis para a vigília do Santo Sudário - na Igreja de São Josafat repercutiu com grande efeito em outros santuários. Desse modo, surgiram as ramificações, como a Irmandade da Paróquia Assunção de Nossa Senhora, em Guarapuava, sob a iniciativa de soldados pertencentes à Irmandade dos Cossacos de Prudentópolis e atualmente com 20 soldados, e a Irmandade da Catedral Nossa Senhora Imaculada Conceição, com a primeira vigília realizada em 2016. O jovem estudante e integrante na Irmandade da Catedral, Felipe Bobalo Soares (2017)78, narrou como se originou essa ramificação. Segundo o depoente, ele e seu pai integravam a Irmandade responsável pela vigília na Igreja de São Josafat, no entanto, a ausência de iniciativa e de guardas em outras catedrais estimulou o interesse de ambos e, assim, ―[...] surgiu a ideia de tirar guarda na Catedral Imaculada Conceição‖, conta Soares (2017). Explana que: ―[...] a gente veio trocar uma ideia com os capitães e o presidente da Irmandade da São Josafat e foi convocada uma assembleia extraordinária com quem tinha vontade de participar na Catedral‖ e, mediante a manifestação dos interessados, ―surgiu a extensão da Irmandade na Catedral‖, relata Soares (2017).

Os termos ―tirar guarda‖ e ―trocar uma ideia‖ empregados no depoimento de Soares, se concebem como uma linguagem coloquial, que se refere à cultura e à identidade de uma população ou um grupo social. Dessa forma, a utilização da história oral consiste em uma fonte de pesquisa extremamente rica, que emprega esse tipo de linguagem visando uma confirmação dos depoimentos obtidos e atua ―[...] como instrumento de construção de identidade de grupos e de transformação social‖ (FERREIRA, 2002, p. 322). O vínculo estabelecido entre a rememoração e o discurso torna o depoente o principal ator de sua cultura, bem como a de seu grupo, construindo a história em que ele se encontra inserido. A fala do entrevistado torna-se uma narrativa. Alessandro Portelli (2010, p. 19) acredita que ―[...] história e memória toma forma na narração oral‖. Assim, as narrativas se configuram como mecanismos de preservação e uma difusão das heranças de identidade, cultura e tradição.

Em 2016, ano de sua fundação, a Irmandade da Catedral contava com 54 cossacos e, em 2017, esse número se ampliou para 64. Soares (2017) reitera que a previsão para o ano de 2018 é que sejam acrescentados 50 integrantes ao grupo. De acordo com o presidente da Irmandade de São Josafat, Ricardo Suchodolak (2017)79, ―[...] a gente sempre diz que nossa Irmandade é a árvore, e começou produzir ramificações. A gente espera que dê muitas, mais ramificações. Quanto mais, melhor‖. O relato do cossaco evidencia o apoio da primeira Irmandade com as demais, emanando o princípio de que as ramificações surgiram para agregar forças na manutenção das tradições cossacas de Prudentópolis.

Acerca da regulamentação interna do grupo, o artigo 4º e parágrafo único do estatuto (2012, p. 1)expõem que ―[...] a associação poderá ter Regimento Interno que, aprovado em Assembleia Geral, discutirá o seu funcionamento‖. Assim, este deve ser seguido rigorosamente pelos membros da Irmandade dos Cossacos de Prudentópolis. Conforme exposto, a aprovação do regimento interno fica a critério da Assembleia Geral, de acordo também com o artigo 12 do estatuto (2012, p. 3), o qual define as competências da Assembleia Geral. Nesse regimento consta a obrigação do juramento, constituído como condição essencial para que um indivíduo se torne um cossaco. Esse ato consiste na obrigatoriedade de o membro participar das festividades religiosas na Sexta-Feira Santa80 e no Sábado de Aleluia81 em Prudentópolis. Boiko (2015)82 afirma que, para os candidatos à Irmandade, ―[...] basta apenas uma coisa, como era na época dos Cossacos da Ucrânia: crer em Cristo. Então aquele que crer em Cristo pode ser um membro cossaco‖. Destarte, fundamentado na reinvenção da tradição dos cossacos ucranianos e ressaltando a religiosidade, o indivíduo torna-se um cossaco e pode desempenhar a função de vigília ao Santo Sudário na Igreja de São Josafat. O juramento é explanado por Suchodolak (2017), que narra que o candidato realiza um juramento informal dentro da igreja e que, no entanto, ―[...] não vai prestar juramento aos onze capitães nem à Irmandade, mas o juramento dele é pra alguém maior que a gente: Deus‖. Em síntese, o juramento dos cossacos não é formal, sendo uma cerimônia pessoal, particular e subjetiva.

Faz-se importante ressaltar que atualmente um dos cossacos da Irmandade não é católico, no entanto, mesmo sendo evangélico, pôde tornar-se um membro, haja vista que o

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Entrevista concedida ao autor em 6 de setembro de 2017.

80 A Sexta-Feira Santa ou Sexta-Feira da Paixão é a sexta-feira antes do domingo de Páscoa. Nas religiões

cristãs, é o dia em que se recorda a morte de Jesus Cristo.

81 Sábado de Aleluia ou Sábado da Semana Santa, é o primeiro dia depois da crucificação e morte de Jesus

Cristo. É o dia anterior ao Domingo de Páscoa, onde ocorre a preparação espiritual dos cristãos para a ressurreição de Cristo.

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necessário para adentrar a Irmandade é apenas a fé em Cristo e, assim, esse indivíduo se inseriu no grupo como cossaco. O sentimento de pertença os une por uma crença maior, em Cristo, independentemente do templo religioso em que propagam a sua fé. Dessa forma, esse cossaco não participa da vigília do Santo Sudário na Igreja de São Josafat e, nesse momento, permanece na sitch, onde, posteriormente, atua nas apresentações da Irmandade.

Os cossacos de Prudentópolis entrevistados expuseram que constantemente são abordados por indivíduos com interesse em participar da Irmandade. São questionados acerca das competências necessárias para o ingresso, evidenciando se existe a necessidade em ser descendente de ucranianos. Makohin (2017) narra que ―[...] a Irmandade é aberta pra qualquer um participar, desde que cumpra o juramento. Tem gente que pergunta: tem que ser descendente? Não, a gente tem vários que não são‖. Suchodolak (2017) corrobora a última afirmação de Makohin relatando que nem todos os cossacos da Irmandade são descendentes, ―[...]mas tem o sangue de ucraniano‖. Ou seja, o sentimento de pertença dos indivíduos é mais importante que sua descendência. Suchodolak (2017) explana que existe candidato que ―[...] nunca dançou, nunca participou efetivamente da Igreja ucraniana, não fez nem a catequese ucraniana, mas a gente não pesa pra isso‖. As falas dos entrevistados são respaldadas pelo estatuto em seu artigo 34º, o qual prevê a participação de indivíduos em ―pleno gozo dos direitos civis, ucranianos e seus descendentes [...] e demais amantes da cultura e da arte ucraniana‖ (2012, p. 8). Assim, seguindo a tradição dos cossacos ucranianos, qualquer homem pode tornar-se um cossaco, desde que siga os princípios e desempenhe o juramento.

Em vista disso, o indivíduo interessado é avaliado pelos capitães da Irmandade, ressaltando suas informações básicas, como ―[...] daonde ele é, daonde ele vem, se alguém conhece, se ele tem um bom histórico‖, segundo o relato de Suchodolak (2017). Com a sua aprovação, a iniciação do cossaco é efetivada por meio da aprovação em assembleia geral, que é realizada no primeiro trimestre de cada ano. Suchodolak (2017) elucida que os novos cossacos são apresentados aos mais experientes, recebendo seus trajes e, posteriormente, ocorre à iniciação no Sábado de Aleluia. O depoente explica que a iniciação ocorre de maneira informal, sendo assim: ―Ele vai na igreja na sexta-feira santa e o capitão dele vai explicar, é a tua primeira guarda, você é um cossaco trajado, passou a tua primeira guarda, agora você é um cossaco efetivado e agora não pode sair da Irmandade‖. (SUCHODOLAK, 2017).

Ao tornar-se um membro da Irmandade, o cossaco perde a liberdade de se desvencilhar, tendo em vista que sempre pertencerá a ela. Entretanto, em condições de extrema necessidade, serão avaliadas as possibilidades. A expulsão de um integrante ocorre

devido ao rompimento do juramento e à ausência do cossaco na igreja e nas festividades da Páscoa. Destarte, os capitães são reunidos efetuando uma votação acerca da retirada do membro. Suchodolak (2017) afirma que ―[...] sempre foi unânime a votação‖ e, na Irmandade de Prudentópolis, ―[...] esse tipo de exclusão já aconteceu duas vezes‖. Acerca dessa conjuntura, os entrevistados não quiseram relatar os casos de exclusão, tendo em vista que isso desqualificaria a Irmandade. Segundo Pollak (1992, p. 4), nossa ―memória é seletiva. Nem tudo fica gravado. Nem tudo fica registrado‖. Nesse caso, a exclusão dos membros permaneceu gravada na memória dos entrevistados, no entanto, os cossacos preferem não se lembrar do ocorrido, pois foi um evento que deve ser esquecido ou, até mesmo, incide em uma lembrança vergonhosa. Pollak (1989, p. 08) reitera que as memórias ―[...] vergonhosas são zelosamente guardadas em estruturas de comunicação informais e passam despercebidas pela sociedade englobante‖. Quando um acontecimento ruboriza a Irmandade, possibilita-se a rejeição, a negação e o esquecimento do acontecido, ocorrendo, destarte, o silenciamento da fonte oral na história −assunto que é analisado por Pollak (1989) como ―silêncios‖ e ―não- ditos‖.

[...] existem nas lembranças de uns e de outros, zonas de sombra, silêncios, "não-ditos". As fronteiras desses silêncios e "não-ditos" com o esquecimento definitivo e o reprimido inconsciente não são evidentemente estanques e estão em perpétuo deslocamento. Essa tipologia de discursos, de silêncios, e também de alusões e metáforas, é moldada pela angústia de não encontrar uma escuta, de ser punido por aquilo que se diz, ou, ao menos, de se expor a mal-entendidos. (POLLAK, 1989, p. 8).

O silenciamento ou o ―não-dito‖, citado por Pollak, isto é, o ato de omitir um acontecimento negativo, ocorre mediante as conjunturas que causam desconforto, traumas e até mesmo dor a um indivíduo ou ao grupo. No caso da Irmandade, não se sabe ao certo o motivo do silenciamento −o que se evidencia é que os integrantes preferem não recordar e, tampouco, expor o ocorrido.

Regressando ao contexto da Irmandade, de acordo com a narrativa de Mazur (2018) acerca da atuação dos cossacos, evidencia-se que tornar-se um cossaco em Prudentópolis é adquirir um status, ou seja, uma posição de prestígio no município, ponderando o reconhecimento tido pela população local e inclusive pelos turistas. Além disso, a prática dos cossacos pode ser entendida um fato criador de distinções sociais, colocando-os como especiais e essenciais, visto que não representam a maioria da população, pois senão perderiam a importância. Dessa forma, o orgulho desses indivíduos em participar e manter a

tradição cossaca é claramente notado nas palavras do integrante Ernani Dolney (2017)83, que, ao ser indagado sobre o que é ser um cossaco, asseverou: ―[...] o arrepio que sinto já é a resposta‖. Transferindo essa indagação para a década de 50, Michalouski (2018) narra que ser um cossaco ―[...] era ser um brasileiro com determinadas obrigações fora da profissão [...]. Era incrível [...]. É ser um verdadeiro ucraniano, um verdadeiro brasileiro. Então o mais certo seria um ucraniano abrasileirado, mas com as obrigações de sua pátria, de sua religião‖. O emprego da história oral nessa presente narrativa possibilita uma apreensão mais aguçada dos fatos, tendo em vista que, quando o entrevistado narra, ele emprega entonações, pausas, silêncios, significados, sensações e sentimentos, conforme se verifica no relato de Dolney e Michalouski. Esses aspectos permanecem à margem da historiografia, caracterizando-se como privilégios da história oral.

Nesse cenário, faz-se importante ressaltar que os cossacos estão presentes em distintas ocupações no município de Prudentópolis, empregados em cargos administrativos e governamentais, assim como em profissões como contador contábil, advogado, secretários, administradores, estudantes, aposentados, professores e policiais, além das ocupações agrícolas. Com relação à igreja, Suchodolak (2017) relata que a Irmandade ―[...] é a única agremiação da Paróquia que consegue reunir pessoas ligadas a todas as pastorais‖, possuindo membros no coral, no apostolado, nos marianos, no Vesselka, bem como na contribuição do dízimo. Expõe ainda que ―[...] é na Irmandade que todas as ramificações da Paróquia se reúnem em uma só‖.

Mediante a transmissão hereditária dos costumes, as crianças, isto é, os filhos homens dos cossacos também têm possibilidade de participar da Irmandade, seguindo os caminhos de seus pais. Salienta-se, no entanto, que essas crianças não atuam na chamada "vigília" e nas apresentações, porém permanecem na sitch com as devidas vestimentas, adquirindo o conhecimento imprescindível. Suchodolak (2017) evidencia o bom funcionamento da Irmandade e a forte transmissão hereditária, expondo que seu ―[...] menino de nove anos está desde os cinco anos na Irmandade‖. Assim, reforça a importância dessa transmissão de costumes, pois ―cada pai que tem um filho menorzinho já está trazendo e ensinando‖, sendo ―todos eles trajados, todos eles representando, vivendo esse clima, pra trazer de berço‖ e se espera que essa transmissão continue com os posteriores. Em assim sendo, os costumes não se perdem, como relata Morskei (2017): ―[...] não tem como se perder, porque tudo que se investe na criança vai ter um retorno futuro‖, mas se modificam, se recriam e se reinventam.

A Ilustração 23 mostra a participação das crianças na stich, onde se vê que estão todas trajadas, assim como o cossaco Ânderson Alexandre Lemos, que as acompanham.

Ilustração 23 - Filhos de Cossacos na Sitch.

Fonte: Élio Kohut (2013)

Por meio dos relatos de descendentes de ucranianos que residem em Prudentópolis sabe-se que o exército cossaco sempre foi integrado por soldados homens, isso na mesma medida em que as mulheres eram responsáveis pelos seus cuidados, os quais incluíam alimentação, confecção de vestes e zelo pelos descendentes. Morskei (2017), esposa de um cossaco, ao ser questionada sobre a relação das mulheres com a irmandade relata que: ―[...] a mulher não se encaixa na Irmandade, pois eles representam os soldados guerreiros. São eles que fazem. A mulher fica em casa fazendo outras coisas, enquanto eles lutavam nas batalhas. Eles que são os guerreiros‖. Seguindo essas considerações, temos a justificativa da participação apenas dos homens na Irmandade. Zakalugem (2017) elucida melhor:

No exército Zaporozhian não era permitida a entrada de mulheres, somente homens faziam parte. Estava o pessoal lutando, a mãe e a irmã ficavam em casa. Ficavam em um regime fechado, isoladas. As mulheres não podiam entrar na área das aldeias cossacas. Na nossa Irmandade há livre-arbítrio, mulheres, crianças, senhoras, meninas têm liberdade pra entrar e sair, visitar, tirar foto, porque aqui não é um exército, a gente está só simbolizando, não

estamos prontos pra sair pra guerra. Mas na Ucrânia, em Zaporozhian, na

No documento NIKOLAS CORRENT (páginas 117-139)