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O surgimento da Irmandade dos Cossacos de Prudentópolis

No documento NIKOLAS CORRENT (páginas 106-117)

Mapa 2 Prudentópolis e suas divisas

1 DA UCRÂNIA AO BRASIL: O IMIGRANTE EM PRUDENTÓPOLIS/PR

2.5 OS COSSACOS EM PRUDENTÓPOLIS/PR

2.5.1 O surgimento da Irmandade dos Cossacos de Prudentópolis

Os primeiros grupos de cossacos que habitavam a cidade de Prudentópolis foram os emanados da imigração ucraniana e, de acordo com Lemos (2013), ―[...] datando em torno de 1955, o primeiro grupo desempenhava a Vigília do Santo Sudário na igreja ucraniana de São Josafat, localizada na cidade‖. Dessa forma, houve uma recriação dos cossacos fora do contexto hostil europeu, sendo estes, agora, habitantes de terras brasileiras e denominados apenas de ―guardas‖.

A igreja de São Josafat de Prudentópolis, local onde os cossacos da Irmandade atuam, está subordinada à Eparquia da Imaculada Conceição, criada em 12 de maio de 2014. Utilizando-se do rito ucraíno, o governante é o eparca Meron Mazur, conforme expusemos anteriormente.

Por intermédio da religiosidade dos imigrantes ucranianos que residiam em Prudentópolis, a igreja de São Josafat foi edificada no município entre os anos de 1922 e 1932, em alvenaria e sob o estilo bizantino, contendo 30m de altura, 28m de largura e 38m de comprimento. O monumento permanece atualmente da mesma forma em que foi projetado e construído. Salienta-se que essa igreja é a matriz das igrejas ucranianas no Brasil e, no ano de 1979, ela foi tombada como Patrimônio Artístico e Cultural do Paraná pela Secretaria de Cultura do Estado.

Nessa linha de raciocínio, os ditos guardas de Prudentópolis desempenham uma releitura das tradições dos cossacos ucranianos, realizando, de acordo com Eric Hobsbawm e Terence Ranger (1984, p. 9), uma invenção das tradições, caracterizada como:

Um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras tácita e abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica, automaticamente, uma continuidade em relação ao passado (HOBSBAWM e RANGER, 1984, p.9).

Conforme os autores, a tradição necessita exercer uma ―[...] continuidade com um passado histórico apropriado‖ (HOBSBAWM; RANGER, 1984, p. 10). Tal continuidade, no entanto, não se refere a algo perpétuo, podendo conter determinada distância ou, até mesmo, uma ausência de tal passado nas memórias dos indivíduos, carecendo então de uma invenção do passado que modele o presente. Destaca-se ainda que, embora ―invenção‖ seja um termo empregado que recorre ao passado, as proposições são do presente e objetam uma conjuntura atual. Assim, as tradições inventadas incidem em:

[...] reações a situações novas que ou assumem a forma de referência a situações anteriores, ou estabelecem seu próprio passado através da repetição quase que obrigatória. É o contraste entre as constantes mudanças e inovações do mundo moderno e a tentativa de estruturar de maneira imutável e invariável ao menos alguns aspectos da vida social [...]. (HOBSBAWM; RANGER, 1984, p. 10).

Salienta-se que os antigos cossacos (ucranianos e russos) não realizavam a Vigília do Santo Sudário, pois, mediante a historiografia, sabe-se que, em suas práticas, predominava a defesa de seu povo e de seus territórios, algo de suma importância perante o nacionalismo exacerbado. Assim, os primeiros guardas de Prudentópolis idealizaram tal tradição semelhantemente, porém com o intuito de proteger aquilo considerado sagrado para eles: o Santo Sudário.

A criação do grupo de guardas para a vigia do Plastianetchia – плащаниця, em ucraniano −, o Santo Sudário, foi um empreendimento do ucraniano Vasyl Kostachuk, que chegou ao Brasil fugido devido à perseguição dos comunistas aos cossacos. Kostachuk, por meio de uma tubulação de esgoto, se evadiu de sua terra natal, privando-se da convivência dos de seus familiares e dos seus companheiros que permaneceram na Ucrânia. Em uma entrevista concedida à Revista Exclusiva, Marcos Antônio Boiko (2013, p. 14), diretor administrativo e ex-presidente da Irmandade dos Cossacos de Prudentópolis, relatou que ―[...] Vasyl Kostachuk nunca mais teve notícias de sua família, o que não lhe permitiu despertar, no decorrer de sua vivência em Prudentópolis, um sorriso sequer nos seus lábios, até o dia de sua morte‖.

Acerca das vivências de Kostachuk, empregaremos a metodologia da história oral visando à possibilidade de obtermos maiores informações sobre seu passado, mediante o diálogo com pessoas próximas a ele. A história oral opera em conjunto com a memória dos indivíduos, sendo essa memória um fato do presente. Nesse entendimento, Portelli (2010, p. 11) assevera que ―[...] o conteúdo da memória pode ser o passado [ponderando que é no] agora que recordamos, é hoje que falamos do passado‖. A narrativa de um entrevistado ocorre no tempo presente, no entanto se refere a algo que se sucedeu em tempos passados, distantes ou não.

Portelli (2010, p. 11) reitera que ―[...] a memória não é só um espelho de fatos, mas um fato histórico: a própria memória é um fato histórico em si. Não há apenas uma memória da História, há também uma história da memória: como muda, no curso do tempo, a maneira de recordar fatos históricos‖. Evidencia-se então que a memória sofre influências, considerando as experiências tidas por uma pessoa no transcurso do tempo. É, entretanto, mediante essa nova visão que o narrador vai rememorar aquilo que passou. Assim, com esse entendimento, é que nos utilizaremos da memória e dos relatos de Michalouski59, um amigo de Vasyl Kostachuk, fundador da guarda e vigia dos Cossacos em 1955.

Michalouski (2018) narra que, ao conhecer Kostachuk, o imigrante falava apenas a língua ucraniana, sendo ―totalmente fechado‖ e se ―[...] aparentava muito aborrecido, muito triste‖. Justifica a condição do ucraniano afirmando que ―ele estava totalmente aterrorizado [...]‖ em vista das experiências que o conduziram até o Brasil e a ausência de seus familiares. Consoante ao relato de Boiko (2013), o depoente nos conta que ―[...] arrancar um sorriso dele era difícil. Não arrancava. Tanta tristeza que ele tinha‖ (MICHALOUSKI, 2018). Mediante tais narrativas, evidencia-se a consternada situação de Kostachuk no Brasil.

Embora vivendo de maneira complicada e com inúmeras dificuldades, Michalouski (2018) assegura que o imigrante era muito religioso e ―andava nas igrejas‖ buscando reforçar sua fé, que o condicionaria em sua nova pátria. Mediante a religiosidade dos amigos, foi criada a guarda do Santo Sudário em Prudentópolis no ano de 1955, com o intuito de assemelharem-se às práticas de guerra dos cossacos ucranianos, visando uma afirmação da identidade dos novos guardas e da respectiva comunidade de imigrantes ucranianos. Questionado acerca do surgimento dessa prática, Michalouski conta que não sabe sobre a existência da guarda do Santo Sudário na Ucrânia, acreditando ser uma criação de Kostachuk, fundamentada em seus conhecimentos referentes aos cossacos. Ressalta que ―[...] pode ser

que não existisse, mesmo que ele soubesse, mas de algumas outras coisas ele montou isso aqui e fez conosco isso aí‖ (MICHALOUSKI, 2018). Nesse seguimento da narrativa, Michalouski evidencia a invenção da tradição criada por Kostachuk, a qual segundo Hobsbawm e Ranger (1984, p. 10), ―[...] na medida em que há referência a um passado histórico [como o passado dos cossacos ucranianos, a invenção da tradição caracteriza-se] por estabelecer com ele uma continuidade bastante artificial‖. Destarte, Kostachuk desempenhou uma ressignificação da cultura cossaca, reagindo à nova conjuntura em que se encontrava e adequando-a ao seu presente.

Assim sendo, foram convidados determinados indivíduos da comunidade, sobretudo os integrantes do grupo de dança folclórica Vesselka60 e da Congregação Mariana61. Michalouski (2018) expõe que a Congregação Mariana auxiliou intensamente na promoção do grupo de guardas, bem como o Vesselka, os quais emprestaram as vestimentas para a vigília.

A atividade de instituir esse serviço de guarda também se deu em meio a dificuldades. De acordo com Boiko (2013), o grupo de guardas emprestou do Vesselka uma vestimenta análoga a dos cossacos ucranianos, definida por Michalouski (2018) como ―roupas ucranianas‖, com a ―calça vermelha, aquele brim62

desbotando e blusa de cima‖, todas disponibilizadas pelo grupo Vesselka.

Embora estivessem com vestimentas aludindo aos ucranianos, desproviam-se dos calçados, como as botas, as quais também foram emprestadas de outros indivíduos. Michalouski (2018) conta que emprestavam as botas dos funcionários da atual Casa de Carnes Alvorada63, designado pelo depoente como ―Açougue Opuchkevitch‖, devido ao nome do então proprietário, Dionísio Opuchkevitch. Assim, as botas utilizadas pelos funcionários ―por causa de barro de buscar gado‖ eram lavadas e engraxadas para serem utilizadas pelos guardas na ―Sexta-Feira Maior‖. O depoente relata ainda que aqueles com numeração diferente das botas emprestadas utilizavam o próprio calçado, no entanto, com ―[...] uma meia mais comprida um pouco‖. (MICHALOUSKI, 2018).

Os armamentos eram escassos, utilizando-se apenas de espadas feitas em madeira e, posteriormente, obtiveram espadas feitas em aço. Cabe ressaltar que, embora ocorressem

60 O Vesselka é um grupo de dança folclórica fundamentado na história e cultura da imigração ucraniana em

Prudentópolis. O grupo foi fundado pelo bispo Dom Efraim Krevey em 1º de agosto de 1958, tornando-se conhecido pelo mundo por meio de suas apresentações em festivais, congressos e em outros eventos, sob o lema da preservação do amor a Deus e a fidelidade às tradições ucranianas.

61

Refere-se a um grupo de cristãos católicos com devoção a Nossa Senhora.

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Brim incide em um tipo de tecido forte e duro, composto por linho ou algodão.

63 O antigo açougue foi revitalizado recebendo o nome de Casa de Carnes Alvorada, sob a administração de Inez

esses problemas, bem como muitos outros, o grupo de guardas se manteve resistente ao longo dos anos em sua missão no município, sendo esta a de adorar e de vigiar o Santo Sudário− retratado na Ilustração 19− no período da Páscoa.

Ilustração 19 - Plastianetchia ou Santo Sudário.

Fonte: Nikolas Corrent (2014)

Para explanar a atuação dos guardas, empregamos novamente a história oral, por meio da qual os indivíduos procuram estabelecer uma identidade subjetiva que, em certas circunstâncias, se diferencia daquela empregada no passado. Na medida em que os entrevistados descrevem algumas circunstâncias de suas vivências, eles podem se beneficiar para reconstruir o passado e desenvolver um novo, miscigenando com episódios verídicos e ou imaginários, mas mais coerentes com o presente (BOSI, 1994). No que concerne às observações de Bosi asseveramos, no entanto, que ―[...] a veracidade do narrador não nos preocupou: com certeza seus erros e lapsos são menos graves em suas consequências que as omissões da história oficial. Nosso interesse está no que foi lembrado, no que foi escolhido para perpetuar-se na história de sua vida‖ (BOSI, 1996, p. 37).

Dessa forma, a atuação é narrada por Michalouski (2018), elucidando que quatro homens, sendo o depoente e mais três amigos falecidos, seguiam as ordens e as instruções do capitão Kostachuk. A vigília iniciava-se entre as 19 e 20 horas e, de acordo com Michalouski, o capitão ensinava: ―[...] ó, nós vamos fazer assim, eu vou na frente, você fica observando

meu pé. Quando tiver com o pé direito no degrau, põe tudo vocês, no mesmo passo. Daí, chegando lá eu paro, vocês passam por mim, se abram e param dois assim e dois assim de cada lado‖. Destaca-se que a vigília acontecia com intervalos de 15 minutos cada, observando o reduzido número de guardas. Michalouski conta que ―[...] tudo isso foi muito difícil, pois eram poucos integrantes e a noite ficava longa, porém valeu a pena‖. Ademais, o depoente explana que o vigário, padre Efraim Krevey, orgulhava-se do trabalho desempenhado pelo grupo. Dessa forma, iniciou-se a prática inventada da guarda do Santo Sudário em Prudentópolis, sendo considerada como ―de arrepiar a população‖ (MICHALOUSKI, 2018).

A entrevista com Michalouski, sendo uma ferramenta de trabalho básica da História Oral, possibilitou uma troca de experiências entre os envolvidos no diálogo, o que constitui, de acordo com Bosi (1994), uma metodologia em que o depoente é ―[...] o sujeito protagonista da história e, desta forma, o ato de 'contar' é o registro‖ (BOSI, 1994, p. 405). Acerca da transcrição, essa é integrante da história que está sendo edificada pelo entrevistado e pelo entrevistador/historiador. O entrosamento na entrevista provoca lembranças no narrador, tendo em vista que determinadas ações ou palavras nos transportam de volta aos tempos remotos. Afirma-se então, conforme Bosi, que a lembrança ou

A memória é um cabedal infinito do qual registramos um fragmento. Frequentemente, as mais vívidas recordações afloram depois da entrevista, na hora do cafezinho, na escada, no jardim, ou na despedida do portão. [...]. Continuando a escutar, ouviríamos o outro tanto e ainda mais. Lembrança puxa lembrança e seria preciso escutar o infinito. (BOSI, 1994, p. 39).

Cingido por lembranças, Michalouski (2018) também rememorou momentos de angústia, expondo a solidão e a tristeza de Kostachuk, sempre visível aos amigos, pois o capitão dos cossacos ―não se abria‖ para que os contíguos pudessem ajudá-lo. O depoente reitera que ―[...] infelizmente dói, também porque podia se abrir também conosco, mas não [...] a gente podia ajudar e tal‖, porém o posicionamento introvertido de Kostachuk alcançou seu apogeu em 1960, quando, com um tiro de espingarda, se suicidou. Michalouski (2018) narra que esse ato foi motivado pela ―saudade‖ de seus familiares, visto que Kostachuk nada sabia sobre aqueles que permaneceram na Ucrânia quando ele migrou para o Brasil. Destarte, questionamentos como ―[...] Onde estão? Como estão? Comem o quê?‖ rodeavam a mente do cossaco, segundo as lembranças de Michalouski.

Após o suicídio de Kostachuk, considerado ―trágico‖ por Michalouski, o depoente assumiu a liderança do grupo de guardas, resultando progressivamente na ampliação dos integrantes e na melhoria dos armamentos. Ocorreu, no entanto, que Michalouski – como ele

mesmo narra − no ano de 1982, foi forçado a afastar-se do grupo por motivos pessoais, e rememora que nessa época já existiam ―quarenta e cinco elementos‖, os quais atuavam todos os anos na Páscoa. Posteriormente à sua saída, outros guardas cossacos assumiram o comando do grupo e eram assessorados por Michalouski quando necessitavam.

Mediante a atuação desses guardas na cidade, no ano de 2007 surgiu a idealização de organizar e formalizar o grupo de cossacos em Prudentópolis. Essa ação contribuiu para a expansão do número de guardas na igreja de São Josafat, bem como na criação de novas vestimentas, como os trajes na cor vermelha e mudança dos armamentos, passando-se a empregar lanças e novas espadas. Michalouski (2018) relata que o planejamento do grupo a partir desse ano se deu, sobretudo, pelo empenho de Marcos Boiko: ―[...] graças a ele que isso aí tá do jeito que está‖. Ademais, expressa que ―[...] o que ele aprontou com os cossacos… é coisa magnífica‖. Assim sendo, faz-se importante ressaltar que, antes da institucionalização dos cossacos, o grupo de guardas funcionava de uma maneira e, mediante o envolvimento e as ações de Boiko, as coisas mudaram intensamente, como com o surgimento das apresentações, assunto que abordaremos posteriormente, e as vestimentas. De acordo com a descendente de ucranianos e responsável pela atual vestimenta dos cossacos, Helena Ternoski Gerei (2018)64, ―[...] antes eles usavam os trajes do Vesselka, era a calça grande igual a de hoje e a parte de cima, a camisa diversificada‖. Depois, no entanto, quando Boiko assumiu, ―[...] ele veio aqui, a gente pensou, estudou, começamos fazer e acabou dando certo. O Marcão65, na verdade, ele já tinha o modelo, ele pesquisou muito e criou o modelo e nós fizemos‖. Instituíram-se, desse modo, novos trajes para a Vigília do Santo Sudário.

Um ano após essa idealização de Boiko, a Irmandade dos Cossacos de Prudentópolis foi fundada, datando em 20 de março de 2008, e registrada em 28 de janeiro de 2013, designada como a pioneira e extraordinária organização cossaca do Brasil. Segundo o testemunho do integrante da Irmandade e administrador de uma gráfica, Sílvio Makohin (2017)66, ―[...] a Ucrânia já reconheceu nossa Irmandade como a primeira e única fora da Ucrânia‖. Michalouski (2018) complementa afirmando que ―você não vê na Ucrânia hoje‖ a guarda do Santo Sudário pelos cossacos. Ademais, Mazur (2018) narra que ―[...] dentro das igrejas da Ucrânia, diante do Sudário não há necessidade deles. Mas eles criaram aqui, só existe aqui‖. A afirmação do eparca justifica-se pelo seu desconhecimento da guarda em outros lugares, sobretudo na Ucrânia, onde o depoente residiu por sete anos. Salienta-se que,

64 Entrevista concedida ao autor em 10 de dezembro de 2018.

65 Marcos Boiko, ex-presidente da Irmandade dos Cossacos de Prudentópolis e atual vice-presidente. 66

de fato, não há outro grupo cossaco registrado que desempenhe a vigília na Ucrânia ou em outros países. Mesmo assim, no entanto, de acordo com fontes retiradas de jornais, alcançamos determinadas informações acerca de outros cossacos na contemporaneidade.

O emprego de jornais na pesquisa historiográfica é fundamental para a consolidação da história, visto que, de uma forma dinâmica, possibilita uma diversificada e potente fonte de informações. Dessa forma, cabe destacar que os jornais promovem intervenções políticas, bem como na vida social da população, mediante a disseminação de percepções, ideias, valores e ideologias, tornando-se fonte inesgotável de estudo e que foge da historiografia tradicional. De acordo com a historiadora Maria Helena Capelato (1988, p. 21), o jornal ―[...] é uma verdadeira mina de conhecimento: fonte de sua própria história e das situações mais diversas; meio de expressão de ideias e depósito de cultura. Nele encontramos dados sobre as sociedades, seus usos e costumes, informes sobre questões econômicas‖.

As pesquisas desempenhadas em jornais apresentam uma abordagem diferenciada para os acontecimentos históricos, tratando de e focando em assuntos antes não citados nos livros. Essa alteração no objeto de pesquisa permite ao historiador uma nova fonte, a qual deve ser analisada, refletida e questionada, considerando que a imprensa não opera de forma imparcial, expondo seu ponto de vista mediante a ―liberdade de imprensa‖. Capelato observa a credibilidade dos jornais como fontes de pesquisa e ―[...] aconselha que se determinem os interesses econômicos e políticos; [...] que se diferencie imprensa e opinião pública‖ (CAPELATO, 1988, p. 20). Dessa forma, cabe ao historiador elucubrar e interpretar as informações obtidas mediante os jornais.

De acordo com o jornal BBC-British Broadcasting Corporation – (2015)67, em Khortytsia, uma ilha na cidade ucraniana de Zaporizhzhya, também designada como ―Ilha dos Cossacos‖, existe um grupo que vive de maneira análoga aos antigos cossacos Zaporozhian, os quais buscam preservar o estilo de vida cossaco. Essa preservação, segundo o jornal, é de suma importância para a constituição de uma identidade nacional, bem como para a construção do futuro do país, considerando que desde a infância, as crianças são treinadas para serem guerreiras e sentir orgulho de suas raízes.

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Matéria do BBC: 'Ilha dos cossacos' tenta preservar cultura milenar em meio a conflito, publicada em 28 de dezembro de 2015. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/vídeos_e_fotos/2015/12/151020_ilhas _ucrania_hb>.

O jornal O Estado de São Paulo (2014)68 publicou o retorno dos cossacos ao cenário mundial, expondo que, na Rússia, mediante uma lei sancionada no governo de Vladimir Putin em 2005, são permitidas organizações cossacas, as quais patrulham as cidades com uniforme militar representando a ideologia nacionalista conservadora. De acordo com o jornal, Putin considera os cossacos mais eficientes que a força policial comum da Rússia. O jornal Gaúcha

ZH (2013)69 reitera essa informação divulgando que ―[...] o renascimento dos cossacos é mais do que uma ideia. Os líderes regionais estão lhes concedendo um papel maior na aplicação da lei‖. Afirma ainda que essa atuação causa temor na população devido aos desempenhos violentos e radicais do grupo. A publicação do jornal Leia Notícias (2018)70 evidencia o forte conservadorismo de extrema direita dos novos cossacos russos, onde, mediante a intolerância aos homossexuais, os soldados irão patrulhar os beijos entre pessoas do mesmo sexo durante a copa. De acordo com o jornal, esse monitoramento ocorreu na cidade de Rostov, a qual sediou alguns jogos da copa. Acerca desse cenário, o cossaco russo Dmitry Voskresov (2018) afirmou, em entrevista ao jornal, que ―[...] os valores europeus são muito diferentes do estilo de vida cossaco‖ – e que, dessa forma, apenas solicitarão aos homossexuais que se ―comportem‖.

Acentua-se o conservadorismo desses cossacos com a matéria do canal VICE (2017)71, elucidando a ameaça e a detenção de feministas pelos cossacos russos. A justificativa para essa ação é a defesa dos valores conservadores da Rússia, os quais, segundo os cossacos, reputam o feminismo como uma fonte de destruição das tradições. Uma das feministas detidas alegou à imprensa que os cossacos desempenharam uma abordagem agressiva com linguagem obscena.

Doravante às informações supracitadas, os estudiosos criticam os cossacos da atualidade, elucidando as diferenças básicas entre os antigos cossacos russos e ucranianos. Ademais, podem-se constatar semelhanças entre ambos, como o conservadorismo e o posicionamento de extrema-direita, considerando que os antigos cossacos eram avessos a

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