• Nenhum resultado encontrado

Fases da Imigração Ucraniana no Paraná

No documento NIKOLAS CORRENT (páginas 37-53)

Fonte: Batista (2009, p. 39)

Para Oksana Boruszenko, na década de 1960 aproximadamente 150.000 mil ucranianos viviam no Brasil. Desse total, aproximadamente 120.000 moravam no estado do Paraná (BORUSZENKO, 1969, p. 427).

Dentre as diversas cidades brasileiras, foi em Prudentópolis --região na época denominada São João de Capanema, na região Centro-Sul do Estado do Paraná -- que os ucranianos se agruparam. Para os que ambicionavam migrar para o Brasil, era a localidade que mais se assemelhava em afinidade ao clima europeu (SENIUK; SKAVRONSKI, 2014, p. 86).

O número de ucranianos que chegaram ao Paraná e, por conseguinte a Prudentópolis, é controverso, uma vez que os ucranianos desembarcavam no Brasil sob diferentes nacionalidades. Nos anos de 1895 e 1896 entraram no Paraná milhares de poloneses, russos e austríacos, mas não aparecem, nos dados oficiais, as denominações ―ucraniano‖ ou ―ruteno‖, visto que os imigrantes dessa nacionalidade eram escriturados juntamente aos russos e aos

poloneses, tendo em vista que os funcionários da imigração não faziam distinção entre eles (GUÉRIOS, 2007, p. 168).

A respeito dessa ação geradora de problemas e praticada pelos funcionários, Andreazza aponta o envio de uma carta por uma mulher de ascendência polonesa ao jornal A

República, de Curitiba, em 1911, aconselhando o periódico que não confundisse poloneses e

ucranianos. Sobre essa situação embaraçosa, Andreazza afirma que ―[...]o esforço de diferenciação dessas duas etnias na sociedade paranaense foi um processo longo. De qualquer maneira, se a sociedade paranaense homogeneizou as duas durante muito tempo, isso não significa que elas não tenham se autodelimitado‖ (1996, p. 93-94).

Um dos principais destinos dos ucranianos foi a colônia de Prudentópolis, criada em 1895, na época município de Guarapuava. De acordo com Guérios (2007, p. 117), ―[...] entre 1896 e março de 1897 cerca de 5200 ucranianos foram destinados a Prudentópolis‖. Segundo dados coletados no site da Prefeitura de Prudentópolis, em 1896 teriam adentrado no município cerca de 1500 famílias, totalizando cerca de 8000 pessoas14. Os números, apesar de conflitantes, demonstram o grande afluxo de imigrantes dessa nacionalidade ao município.

O município de Prudentópolis nasceu a partir da necessidade de se povoarem as vastas áreas de matas da região, mas também surgiu no contexto do esforço do governo estadual na construção de estradas férreas e de linhas telegráficas nos anos 1880 e 1890. A vila de São João de Capanema, posteriormente tornada cidade de Prudentópolis, localizava-se na passagem da linha telegráfica e da estrada a serem construídas para se chegar até Guarapuava. Levando em conta essa circunstância, era relevante a ocupação da região.

Salienta-se que os pioneiros a habitarem esses territórios foram os índios da tribo dos Coroados, denominados de Kaingangs. Segundo Mota (2008, p. 84), ―[...] os campos de Guarapuava eram designados por estes nativos como Koran-bang-rê, traduzido em nossa língua como clareira grande‖. Os povos Kaingang são pertencentes ao tronco linguístico Macro-Jê, com inúmeras subdivisões, tanto linguísticas como grupais.

Em dezembro de 1771, adentra aos campos de Guarapuava a primeira expedição portuguesa, sob a liderança do Tenente Coronel Afonso Botelho de Sampaio e Souza, a quem foi atribuída a destapada dos territórios Kaingang. Mediante o contato inicial, estabeleceu-se o vínculo por interesses, onde os europeus foram possibilitados de penetrar nas moradias indígenas e como permuta, deveriam presentear os nativos. No mês subsequente, a expedição

desloca-se de Guarapuava, mediante um ataque indígena o qual resultou no falecimento de 7 homens brancos.

De acordo com Ribeiro (1982, p. 101), primordialmente esses indígenas ―[...] não despertaram o interesse dos bandeirantes como mão-de-obra escrava‖ devido ao fato de ―[...] serem mais aguerridos e pouco numerosos em relação aos grandes estoques humanos mais dóceis que existiam mais a oeste ou talvez porque, como gente de língua travada e que só conhecia uma agricultura muito primitiva, não dessem escravos de qualidade‖ (RIBEIRO, 1982, p. 101).

No entanto, com o decurso do tempo e mediante as lamúrias que o império vinha padecendo com os intensos ataques indígenas, D. João VI estimula uma nova expedição com o objetivo de colonizar e povoar os campos de Guarapuava. Mota (2008, p. 97) relata que ―[...] em 1809, quarenta anos após as malogradas tentativas das expedições dos anos 70 do século XVIII, o império está disposto a conquistar os territórios Kaingang‖.

Denominada de Real Expedição de Conquista e Povoamento dos Campos de Guarapuava, o grupo comandado pelo Tenente Coronel Diogo Pinto de Azevedo Portugal chegou à região em 2 de julho de 1810, após inúmeras adversidades como o dificultoso percurso de mata fechada, as intempéries climáticas e as doenças comuns ao clima. Dessa forma, edificaram o Fortim Atalaia, o qual acomodou os primeiros soldados com em torno de 300 famílias, visando proteger os elementos dessa expedição dos constantes ataques executados pelos índios que habitavam a região. Nesse cenário, Mota reitera que os expedicionários

Encontraram poucos índios na localidade. Apenas no dia 16 de julho do mesmo ano é que se aproximou do acampamento uma patrulha de reconhecimento Kaingang com cerca de 30 ou 40 índios. Provavelmente vinham seguindo os movimentos da expedição até seu acampamento nos campos de Atalaia. Ali esperaram do dia 2 ao dia 16 de julho observando as ações e as intenções dos brancos, para só então fazer contato e ver, mais de perto, o trem de guerra de Diogo Pinto. (MOTA, 2008, p. 97).

Destaca-se que em 29 de agosto de 1810, os Kaingang realizaram um ataque contra a expedição de Atalaia. Mediante o enfrentamento e a derrota dos nativos, efetivou-se a conquista dos territórios Kaingang nos campos de Guarapuava e com isso, os campos de Koran-bang-rê, transformaram-se na cidade de Guarapuava. Mota (2008, p. 98) ressalta que ―[...] em menos de vinte anos, os campos de Guarapuava tinham-se transformado em fazendas de criação de gado, não havendo mais espaço para novos estabelecimentos‖. Com a conquista, têm início as primeiras movimentações exploratórias, bem como as expedições de

reconhecimento dos novos territórios e a procura por indígenas. Posteriormente, ocorrem as doações de terras visando colonizar e povoar tal região e, concomitante a isto é estimulada a entrada de imigrantes nos territórios brasileiros, por intermédio das campanhas do Estado.

A fundação da Colônia Ucraniana na cidade de Prudentópolis está relacionada às campanhas do Estado no século XIX para a vinda de pessoas que estavam em situações de crise na Europa. As campanhas se davam através de agentes, que

[...] espalhavam pela Europa artigos, livretos e comunicados sobre as condições oferecidas pelo Brasil. Nos países eslavos, tais agentes encontraram campo dos mais propícios para sua atuação, e a propaganda decaía em lamentáveis excessos, que exploravam a credulidade do camponês. [...] A partir de 1895, teve início uma verdadeira debandada de camponeses da Ucrânia para o Brasil, às custas do governo republicano. No decurso de dois anos, mais de cinco mil famílias abandonaram suas aldeias e, na grande maioria, fixaram-se no Paraná; entre 1897 e 1907, mais de mil emigraram às próprias custas. Com a renovação do transporte gratuito em 1907, novas grandes levas de emigrantes dirigiram-se ao Paraná. (BORUSZENKO, 1995, p. 8).

O projeto da elite local era formar a identidade de um novo ―homem paranaense‖, mas esses imigrantes, ao chegarem ao Brasil, encontraram muitas dificuldades de sobrevivência, tendo em vista que o estado se defrontava com a ausência de alimentos. Como a elite pretendia formar um cidadão de acordo com o padrão europeu, os imigrantes eram bem- vindos, pois se acreditava que o imigrante branco era ―[...] portador de bens culturais almejados pelo governo‖ (RAMOS, 2006, p. 7).

Na concepção dos governantes paranaenses, esse era um discurso benquisto, tendo em vista que os processos imigratórios visavam à ascensão e à solidificação do capitalismo. Evidencia-se, de um lado, a contribuição do imigrante com a economia, pois desempenhava o seu trabalho e, de outro, recebia ―[...] bens culturais e aprendeu com a sociedade que o adotou e, ao mesmo tempo, contribui com seus próprios valores culturais para a sociedade de adoção‖ (BORUSZENKO, 1995, p.44).

A vinda desses europeus favoreceu uma oportunidade de no estado serem implantadas novas técnicas de trabalho e agricultura por eles dominadas. Nesse sentido, a chegada dos imigrantes estava relacionada à questão do aprimoramento dos habitantes nativos para desenvolvimento do estado, tornando-o moderno, como já desejava o movimento (NISHIKAWA, 2014; NADALIN, 2001). Há que considerar, no entanto, que o sucesso das campanhas para a imigração, os imigrantes, ao chegarem, se sentiram enganados, porque se falava de

[...] terra livre, altos salários e até mesmo ―ruas pavimentadas com esmeraldas‖, encorajaram e seduziram o povo a sair para o Novo Mundo. Na verdade, os incentivos de passagens pagas e concessões terrestres, que foram inicialmente oferecidas aos potenciais imigrantes pelo governo brasileiro, foram suspensos no final de 1895, embora muitos europeus fossem levados para o Brasil pelas ações de agentes duvidosos que continuaram a fazer estas e outras promessas falsas. (MORSKI, 2000, p. III, tradução do autor).

Ilustração 1 - Navio transportando os imigrantes.

Fonte: Portal Ucraniano (2013)

A ilustração 1 faz referência às viagens marítimas imigratórias, onde se evidencia a superlotação de indivíduos expostos a conjunturas precárias. Nelas inúmeros indivíduos morriam, seja pelas más condições em que se encontravam os navios, seja pela exposição a tempestades, seja por desnutrição, doenças e sede. Na impossibilidade de se fazer um velório, as famílias lançavam os corpos ao mar. Sobre isso, Marcélia Ostapiv15, professora de Biologia no Estado do Paraná, esposa do cossaco Silvio Makohin e descendente de ucranianos radicados em Prudentópolis, relata:

Meus avós paternos vieram de lá da Ucrânia, inclusive meu pai era de lá, veio com um ano. Pequenininho, imagine como minha vó sofreu no navio, trazendo uma criança de um aninho. Muito cruel isso. Eu não tive contato com minha baba16e com o dido17 por parte de pai, mas meu pai falava que

15

Entrevista concedida ao autor em 20 de março de 2018.

16 Traduzido do ucraniano para o português como avó. 17 Traduzido do ucraniano para o português como avô.

vieram pra cá fugindo da guerra, o acesso de imigração era mais fácil. (OSTAPIV, 2018).

Embora Ostapiv não tenha presenciado a vinda de seus familiares para o Brasil, a mesma nos conta como o episódio se sucedeu. Sua narrativa foi criada mediante os relatos de seus antepassados, permitindo que ela pudesse narrar esta memória, que se concebe como a sua própria história. Salienta-se que determinadas interpretações que temos de tempos remotos não vêm de uma vivência concreta que tenhamos tido. Sendo assim, são resultantes de uma herança que nos alcançou mediante as histórias que nossos antecessores nos contaram. Esta herança incide em relatos de outros indivíduos, sendo adotados por nós como ―nossos‖, considerando o significado que eles nos apresentam. Desta forma, se concebem como um componente de nossas memórias, ao passo em que nos identificamos com eles. Acerca deste contexto, o sociólogo Michael Pollak os denomina como acontecimentos ―vividos por tabela‖, definindo-os como:

[...] acontecimentos vividos pelo grupo ou pela coletividade à qual a pessoa se sente pertencer. São acontecimentos dos quais a pessoa nem sempre participou, mas que, no imaginário, tomaram tamanho relevo que, no fim das contas, é quase impossível que ela consiga saber se participou ou não. Se formos mais longe, a esses acontecimentos vividos por tabela vêm se juntar todos os eventos que não se situam dentro do espaço-tempo de uma pessoa ou de um grupo. (POLLAK, 1992, p. 201).

Destarte, a vinda do pai de Ostapiv da Ucrânia incide em um acontecimento que antecede o nascimento da mesma, no entanto, os relatos ouvidos foram ―emprestados‖ por ela, permanecendo em sua memória. Pollak (1992, p. 201) reitera que ―[...] é perfeitamente possível que [...] ocorra um fenômeno de projeção ou de identificação com determinado passado, tão forte que podemos falar numa memória quase que herdada‖.

Neste segmento, a opção pela história oral como fonte e pela entrevista como ferramenta, permite uma valorização da pessoa entrevistada enquanto agente histórico e personagem ativa da história nesse processo de colonização.

A entrevista de História oral deve ser compreendida também como documento de cunho biográfico, do mesmo gênero de memórias, autobiografias, diários e outros documentos pessoais. Trata-se, pois, de uma fonte ajustada a um importante paradigma das sociedades ocidentais contemporâneas: a ideia do indivíduo como valor. O indivíduo único e singular, o ser psicológico, dá sentido a uma série de concepções e práticas em nosso mundo, e o pesquisador que opta por trabalhar com a História oral deve ter consciência de que está lidando com uma fonte que reforça esses valores. (PINSKY, 2008, p. 169).

Após a viagem exaustiva e na incerteza daquilo que encontrariam, os imigrantes sobreviventes desembarcavam na Ilha das Flores, cidade do Rio de Janeiro, e eram alocados em espaços para hospedagem. A Ilustração 2 demonstra o refeitório utilizado pelos imigrantes em Ilha das Flores, local onde estes tinham o primeiro contato com a culinária brasileira. A imagem elucida uma grande proporção de indivíduos em um mesmo ambiente. Ainda que houvesse o movimento para regularização documental dos indivíduos que chegavam, percebiam-se discursos, como:

As condições aqui são terríveis. Não há lei e nem ordem e ninguém se atreve a sair para fora ou no seu vizinho durante a noite sem carregar uma arma ou uma faca. Assassinato era comum e os próprios policiais são ladrões. Todo mundo faz a sua própria justiça. (MORSKI, 2000, p. 25, tradução do autor).

Ilustração 2 - Refeitório de Ilha das Flores – RJ.

Fonte: Hospedaria Ilha das Flores (s.d.)

Após serem regularizados, os imigrantes ucranianos eram encaminhados diretamente para Prudentópolis ou para Curitiba, ou ainda para a cidade de Pinheiro (MORSKI, 2000). Os primeiros grupos de imigrantes

[...] demonstraram que a localização de colônias em áreas de difícil acesso e em terras impróprias para o cultivo, concentrava tantas dificuldades que acabavam por levar o imigrante a abandonar suas terras, procurando meios para sua subsistência junto aos centros mais povoados ou dispersando-se no trabalho em obras públicas. É evidente, assim, a inoperacionalidade das colônias dispersas pelo interior e a prosperidade das estabelecidas nas circunvizinhanças da capital paranaense. (ANDREAZZA, 1996, p. 43).

Durante o início da estadia no Brasil houve, segundo Guérios (2007), o constante desejo dessas pessoas de retornarem à sua terra natal. Isso ocorria porque enfrentaram muitas dificuldades de adaptação à terra nova. Mazur (2018) expõe a dificuldade em viver ―[...] no meio dessas matas aqui, porque não tinha ainda cidades e povoados‖ quando os imigrantes ucranianos chegaram ao sul do país. Desse modo, ―[...] quanto a medicina, quanto a sobrevivência, quanto a alimento, o pessoal sofreu‖, considerando os escassos recursos da nova pátria. Ademais, Ostapiv18 informa que ―[...] muitos não gostavam de morar aqui, tinham que comer raiz, que é mandioca. Depois plantavam milho, trigo. Aos poucos foram avançando‖.

Até chegarem a Prudentópolis, os imigrantes passavam meses residindo em alojamentos do governo. A situação dos ucranianos era de desconhecimento

[...] por completo a língua do país, tiveram ainda que enfrentar dificuldades de transporte e escassez de gêneros alimentícios de primeira necessidade. Vieram quase desprovidos de recursos, com pouca economia, e já ao desembarcar vinham às primeiras provações. Nem o Governo do Brasil, que naquela época era ainda uma nóvel república, achava-se em condições de encaminhá-los a uma vida mais fácil. As revoluções intestinas que marcaram os primeiros anos do novo regime não permitiam que a administração pública desse muita atenção aos problemas menores. A crise financeira que sobreveio com a República, e antes ainda, com a libertação dos escravos, impedia qualquer ajuda mais adequada aos imigrantes que chegavam por essa época [...] A assistência do Governo limitava-se, pois, ao pagamento de transportes marítimos e terrestres até ao destino definitivo, a uma pequena ajuda financeira nos primeiros dias e a distribuição quase gratuita de lotes para aqueles agricultores que se mostravam capazes e dispostos a cultivá-los. (BURKO, 1963, p. 52).

A falta de estrutura e condições básicas para sobrevivência tornava a adaptação mais difícil. Isto ficou expresso em uma carta em que determinado imigrante dizia:

Eu peço para cada um de vocês, meus irmãos, para não emigrar para o Brasil, porque aqui vocês vão morrer em vão. Minha graça salvadora é que não trouxe minha esposa comigo, porque ela teria morrido [...] Eu achei um trabalho na (construção da) estrada e rezo a Deus para ter forças de voltar à aldeia nativa [...] Se Deus me der os meios para retornar, deixarei o Brasil em maio ou junho (carta de 1895 apud MORSKI, 2000, p. 63 apud GUÉRIOS, 2007, p.128).

A carta relata problemas ligados ao desemprego e à sobrevivência que os ucranianos enfrentaram ao chegar ao Brasil. Grande parte deles tentou, mas não conseguiu retornar, conforme o relato abaixo:

Nós já estávamos aqui durante nove meses e o governo brasileiro não forneceu suporte. Rumores estavam se espalhando que os imigrantes seriam enviados de volta para a Galícia. Alguns dos colonos, acreditando nessas histórias, esperaram que os navios a vapor chegassem e com isso perderam um tempo precioso. Todo mundo sofria de terrível pobreza. Não havia comida, nem dinheiro, nem trabalho. As pessoas comiam pinhões e os miolos das palmeiras. Eles também coletavam cogumelos, pois eram tão comuns aqui como no país de origem, mas por vezes eram venenosos e acabavam morrendo. (MORSKI, 2000, p. 27, tradução do autor).

A chegada desses imigrantes a terras paranaenses foi marcada por dificuldades e sofrimentos intensos, tendo em vista a ausência de subsídios do governo, a mortalidade elevada (consequência das más condições nas quais se estabeleceram), distância da colônia em relação aos centros urbanos, as péssimas estradas das regiões interioranas, a mata densa, a carência de experiência para trabalhar em terras despovoadas e inóspitas, o desconhecimento do idioma, bem como das novas condições de vida. Nádia Morskei (2017)19, a gerente do departamento de Cultura, secretária de Turismo de Prudentópolis e descendente de ucranianos relata que ―[...] os imigrantes viviam em simples barracos [...]‖, conforme demonstra a Ilustração3, improvisados com as madeiras encontradas na mata da região.

Ilustração 3 - Moradia dos Primeiros Imigrantes.

Fonte: Museu do Milênio (2018)

Além disso, a depoente afirma que os primeiros imigrantes ―[...] sofreram muito no início, mas como eram trabalhadores, foram tendo sucesso, formando famílias. Na verdade, no início até fomes eles passaram, passaram muitas dificuldades. Pelo trabalho foram conseguindo melhorar‖ (MORSKEI, 2017). Em compensação, com a chegada ao Brasil passaram a possuir alguns benefícios, como destaca o redator-chefe do Jornal Prácia de Prudentópolis, Padre Tarcísio Orestes Zaluski (2017)20: ―[...] podiam possuir mais terras que na Ucrânia, recebiam e pagavam com parcelas chácaras para cultivar, sentiam-se mais livres para trabalhar o que lhes faltava na Europa explorada por grandes proprietários‖.

Ostapiv acrescenta acerca dos contratempos de seus antepassados, os quais a mesma também alcançou mediante o procedimento definido por Pollak, ou seja, os acontecimentos vividos por tabela:

A vida deles no começo foi muito difícil [...]. Quando eles chegaram aqui era tudo mato, imagine como era quando eles chegaram. Pegaram foice, machado e enxada e se viraram. Muitos imigrantes morreram, porque não conheciam o alimento bem certo, viam a petcheretcha21, comiam e morriam envenenados. Na Ucrânia eles comiam bastante, mas aqui não era o mesmo. Era uma dificuldade bem grande quando eles chegaram aqui. [...]. Aos poucos foram avançando e hoje estão aí, 75% de descendente de ucranianos.(OSTAPIV, 2018).

20 Entrevista concedida ao autor em 26 de setembro de 2017. 21 Uma espécie de cogumelo venenoso e que provoca o óbito.

Destaca-se que as mortes deste período eram elevadas, mediante a ausência de informações e de recursos para se tratarem as doenças. O descendente de imigrantes ucranianos, ex-cossaco, um dos responsáveis pelo surgimento da guarda do Santo Sudário em 1955 – a qual abordaremos posteriormente – e dirigente de um Centro Automotivo - Antônio Michalouski (2018)22, narra que dos seis filhos de sua mãe, apenas dois sobreviveram, visto que ―[...] qualquer doencinha matava‖. O depoente expõe a carência de médicos e remédios, relatando que ―[...] medicação era tudo do mato‖.

A memória coletiva, alcançada por meio das entrevistas concedidas ao autor, é o objeto de estudo do sociólogo Maurice Halbwachs (1990). Esse autor emprega o termo ―memória coletiva‖ para designar que a construção dos fatos históricos não se concretiza individualmente, mas no emaranhado de indivíduos que rememoram o passado e, assim, contribuem para que as narrações se complementem ao longo da pesquisa. Nesse

No documento NIKOLAS CORRENT (páginas 37-53)