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A importância dos outros significativos pais, irmãos e amigos

CAPÍTULO I Revisão da literatura

URSS (citado por

2. A multidimensionalidade no desenvolvimento do talento

2.4. A importância dos outros significativos pais, irmãos e amigos

Os estudos retrospetivos com atletas de elite nos últimos 30 anos têm revelado a importância do apoio dos pais no processo de desenvolvimento da sua carreira desportiva.

Um dos primeiros estudos efetuados nesta área foi proposto por Bloom (1985). O autor analisou 120 indivíduos com talento em três domínios: música, artes e desporto, demonstrando que o talento individual não atinge um nível excecional de performance por si só. O papel e as tarefas realizadas pelo treinador e pelos pais são decisivas, dependendo a sua importância da etapa da carreira onde o atleta se encontra. Os autores reportaram ainda que os pais podem aliviar a exigência a que o filho está submetido no processo de treino, ao providenciar uma atmosfera de suporte diminuindo o stress psicológico inerente ao treino e à competição. Ainda Rosenfeld, Richman, e Hardy (1989) num estudo com atletas Americanos em idade escolar referiram que o suporte emocional é providenciado pelos amigos e pelos pais e a informação técnica pelos treinadores e colegas de equipa.

Côté (1999) prosseguiu o estudo de Bloom (1985) e desenvolveu um modelo de desenvolvimento da participação desportiva. O autor estudou famílias de remadores e tenistas de elite Canadianos, dividindo a carreira desportiva de um atleta em três momentos, conforme explicado na Tabela 1. Similarmente ao modelo de Bloom, o papel dos pais é diferente em cada etapa.

Durante os anos de diversificação os pais providenciam oportunidades para os filhos praticarem diversas atividades desportivas, não sendo importante a escolha da modalidade. Ou seja, os pais são decisivos para o início da prática desportiva da criança (Bois, Sarrazin, Brustad, Chanal, & Trouilloud, 2005). Nos anos de especialização os pais têm um papel de suporte financeiro e de disponibilidade, suportando o acesso aos melhores treinadores, às instalações desportivas e à participação em competições. Finalmente nos anos de investimento quando o atleta se compromete com um elevado nível de treino e competição os pais têm fundamentalmente um papel de orientação e guia, providenciando um suporte emocional contínuo.

Mais recentemente no futebol Holt e Dunn (2004) estudaram 34 atletas (20 internacionais Canadianos e 14 jovens profissionais Ingleses) e seis treinadores profissionais de futebol Ingleses, com o objetivo de identificar e analisar as competências psicossociais em futebolistas jovens de forma apresentarem uma teoria fundamentada com os fatores que influenciam o sucesso na modalidade. Os autores encontraram quatro competências psicossociais que se revelaram como centrais no sucesso de jovens atletas de elite: i) a disciplina (e.g. a dedicação à modalidade e a capacidade de sacrifício); ii) o compromisso (e.g. motivação e planeamento dos objetivos da carreira); iii) a resiliência (e.g. a capacidade de lidar com os obstáculos); iv) o suporte social (e.g. a capacidade de utilizar o suporte emocional, informacional e real). Uma das conclusões interessantes deste estudo indica que os treinadores não são citados como fonte de suporte emocional (que este era providenciado pelos pais). Ainda no ténis Wolfenden e Holt (2005) num estudo qualitativo realizado com três atletas de elite, os seus pais e dois treinadores pretenderam investigar a perceção do desenvolvimento do talento no ténis, identificando seis categorias associadas com a influencia dos adultos (suporte emocional, suporte real, suporte informacional, sacrifícios, pressão e relação com os treinadores). Os autores reportaram que tanto a pais como aos atletas são requeridos enormes sacríficos, que os pais parecem assegurar os papéis mais significativos no suporte emocional e real do atleta mas que também são

percecionados como fonte de pressão quando se envolvem demasiado na competição.

Em 2010, Gublin, Oldenziel, Weissensteiner, e Gagné efetuaram um estudo sobre as experiência mais importantes e marcantes de 673 atletas de elite australianos (incluindo 51 Olímpicos), pertencentes a 34 desportos. O questionário desenvolvido pelos autores foi baseado no visão holística sobre o desenvolvimento do talento do modelo de Gágne (2009). Os autores concluíram que os atletas de elite tiveram uma participação desportiva muito elevada antes da especialização na sua modalidade, e que desde esse momento houve um grande investimento e compromisso com a prática, acesso a treinadores de elite, um suporte muito importante por parte dos pais, e uma capacidade de resiliência para ultrapassar os obstáculos. Os autores reportaram ainda que os atletas demonstraram uma paixão pelo desporto desde muito cedo na sua carreira desportiva.

Observamos portanto que as componentes mais importantes no desenvolvimento da carreira desportiva de um atleta de elite são o contexto de aprendizagem a que este está exposto (o tipo de oportunidades e a possibilidade de adquirir um instrução de qualidade), e as relações sociais (pais, treinadores e pares) que os afetam durante a sua experiência desportiva (e.g. Allen & Hodge, 2006; Brustad, 1993, 1996; Bloom, 1985; Gurland & Grolnick, 2005; Ullrich-French & Smith, 2006; Vazou et al., 2005). Os estudos que analisam os comportamentos dos pais e o sucesso da prática desportiva nos jovens, reportam que grandes quantidades de suporte parental, encorajamento, envolvimento e satisfação está associado com maior divertimento, motivação intrínseca e gosto pelo desafio (Brustad, 1992, 1993, 1996; Fraser-Thomas, Côté, & Deakin, 2008; Kirk, Carlson, O’Connor, Burke, Davies, & Glover, 1997). Mas por outro lado grandes quantidades de pressão parental, expectativas demasiado elevadas, críticas, e baixo suporte afetivo por parte dos pais, estão associados com a diminuição da alegria, o aumento da ansiedade, o abandono precoce da modalidade e o sobretreino (Barber, Sukhi, & White, 1998; Brustad, 2011; Coakley, 1992; Leff & Hoyle, 1995; Gould et al.,

2002; Gould, Udry, Tuffey, & Loehr, 1996). Os pais parecem assim poder auxiliar, como impedir, o desenvolvimento do talento dependendo do tipo de papel que assumem na carreira desportiva dos filhos (Wolfenden & Holt, 2005).

No que respeita à influência dos irmãos e dos pares, apesar da literatura ser ainda limitada, alguns estudos sugerem que estas relações podem ter um papel muito importante na carreira desportiva de um jovem atleta de elite, estando ligada ao seu autoconceito de competência física, às suas atitudes morais e a outros fatores afetivos (Côté, 1999; Smith, 2003). Se relativamente aos irmãos os estudos apresentam resultados diversificados (e.g. Côté, 1999; Greendorfer & Lewko, 1978; Wold & Anderssen, 1992), no que respeita aos pares há já algumas conclusões esclarecedoras. Por exemplo Patrick et al. (1999) reportaram para além do que foi atrás exposto, que se o jovem sentir que o desporto colide com o seu desenvolvimento social fora da modalidade, o seu comprometimento e motivação para a prática decresce. Ainda, outros estudos referem que se o/a melhor amigo/a também praticar a desporto, este é um fator preditor muito forte de continuação da prática desportiva do/da adolescente (Fraser-Thomas et al., 2008; Weiss & Weiss, 2004).

Da análise da literatura decorre que à medida que a criança cresce a importância da influência da família decresce e aumenta exponencialmente a importância dos pares, devendo os treinadores criar condições para manter os atletas dentro do seu grupo etário e facilitar uma comunicação eficaz com os pais (Côté & Fraser-Thomas, 2007; MacPhail & Kirk, 2006).