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A imprensa no Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher

No documento Joao Pereira Paulo.pdf (páginas 75-87)

A imprensa no Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher

A imprensa e os canais de comunicação nas práticas do Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher

Promover festivais de música, rodas de samba, apresentações de peças teatrais, entre outros eventos que tinham com o propósito aglutinar as pessoas da comunidade dos bairros distanciado do centro da cidade de São Paulo, era a principal preocupação de Gilson Vitório, Walter Hilário e Maria da Penha - responsáveis por organizar eventos pela entidade Fala Negão Fala Mulher. Desta maneira, buscavam também refletir sobre o pertencimento à região e passaram a produzir folhetos ou boletins para divulgar as idéias sobre a negritude

Eu comecei a pensar no jornal, e também devido as amizades que a gente tinha, comecei a consultar algumas pessoas de, eu também já escrevia no jornal aqui de Itaquera, no começo. Um amigo meu abriu espaço pra escrever sobre samba no jornal dele, o jornal bem feito, eu comecei escrevendo sobre samba, e depois tive a oportunidade de escrever no jornal “Espalha Fatos110”111 (VITÓRIO, São Paulo, 2007). O jornal “Espalha Fatos” circulava na comunidade de Itaquera e neste periódico as principais propostas eram divulgar o comércio e os eventos da região. Tal canal de comunicação se abriu para o Movimento Negro Fala Negão

Fala Mulher a partir do convite recebido por Gilson Vitório para escrever uma

coluna no jornal. Isso lhe propiciou uma nova experiência ao divulgar as idéias sobre a negritude e a importância do Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher como instituição organizada e reconhecida em um Estatuto Social.

Os artigos escritos por Gilson Vitório chamaram a atenção do jornalista Tarcísio Geraldo Faria, que também escrevia o jornal “Espalha Fatos”. Dos encontros entre Gilson Vitório e Tarcísio G. Faria surgiu a idéia do Jornal “Hora X Consciência Negra.”

110 Jornal Espalha Fatos – não há registros sobre a veiculação e exemplares para pesquisa desse

jornal. As informações foram obtidas a partir do depoimento de Gilson Nunes Vitório

A comunicação a partir da impressa passou a ser umas das principais preocupações do Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher. Em 1995, Gilson Vitório e Walter Hilário abrem um novo canal de comunicação para o Movimento

Negro Fala Negão Fala Mulher, as rádios comunitárias, que surgiram na região da

Zona Leste de São Paulo entre 1994 e 1995. As discussões para fundar uma rádio do Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher não foram adiante, pois esbarraram nos procedimentos burocráticos e na legislação sobre a rádio e difusão.

No final de 1995, o Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher foi convidado para fazer um debate sobre a questão da cidadania em uma rádio comunitária no bairro de São Matheus, a rádio “Esperança”. Com essa participação, o Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher passou a ter programação diária de uma hora nesta emissora. Durante 60 (sessenta) minutos o programa divulgava as notícias da região como o clima, o trânsito e atendia aos pedidos dos ouvintes, também havia debates sobre a questão de racismo e preconceito.

Mesmo sem ter direitos a possuir uma rádio-difusão pelo Movimento Negro

Fala Negão Fala Mulher, Walter Hilário e Gilson Vitório passaram a fazer parte da

ABRAC - Associação Brasileira de Rádio Comunitária.

Essas práticas deram-lhes experiências para discutir o Movimento Negro

Fala Negão Fala Mulher não só na Zona Leste deste município, mas também em

âmbito nacional, pois participavam de congressos nacionais de rádio comunitária. Este fato leva-nos a refletir sobre a participação da imprensa engajada - tanto escrita como falada - nas discussões e sobre seu comprometimento com o

Movimento. A imprensa negra no Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher

evidenciou se como uma das maneiras mais eficazes de promoção do reconhecimento da negritude por dedicar se a relatar as experiências e discernir sobre assuntos de interesse da etnia em suas ações e tendo o compromisso de discutir temas que envolvam a convivência da comunidade negra entre si e externamente. Assim como os outros assuntos que merecem uma reflexão de suas vivências e experiências, como discutido na já citada pesquisa sobre a Revista “Raça Brasil”112.

Na temática sobre o negro na imprensa escrita, bem como nos estudos referentes à sua produção impressa, raras vezes foram pauta de uma discussão ampla e comprometida que desse conta de sua participação e de sua importância no que diz respeito à reflexão sobre o negro. Mesmo exercendo um papel fundamental para a compreensão do ser afro-brasileiro, poucos foram os estudos que versaram suas preocupações sobre este assunto. A imprensa escrita, conforme Lindomar Alves de Oliveira, se expressa em atender as necessidades de um público alvo que se transforma de acordo com as tendências e suas necessidades.

Na comunidade onde está inserido o Movimento Negro Fala Negão Fala

Mulher, na Zona Leste de São Paulo, foi criado o Jornal “Hora X Consciência

Negra113” com o intuito justamente de divulgar as ações dos indivíduos bem como as atividades e eventos culturais ligadas à negritude.

O Jornal “Hora X Consciência Negra” teve um papel importante, pois foi criado com o intuito de divulgar os valores do Movimento Negro. Nos periódicos publicados entre 1997/2001 encontramos temas que embora relacionados exclusivamente as ações da etnia negra, dão amplitude aos discursos e ações de questões gerais, com a postura de divulgar eventos que refletissem sobre temas ainda complexos e atentos às dificuldades apresentadas pela comunidade.

Propondo uma forma de conscientizar a comunidade quanto aos valores da etnia negra, discutia o desempenho dos indivíduos na própria comunidade, contribuindo com o movimento de integração social dos negros, da etnia negra e como se demarcavam o desempenho dos indivíduos na melhoria da própria comunidade, participando com maior eficácia dos movimentos de integração social dos negros.

Na fala de Gilson Vitório

E o jornal, ele começou com a idéia de, em 1996, nós começamos a ter uma influência política na região e as pessoas achavam que o Movimento Negro tinha que ter um candidato na política pra poder trabalhar a questão racial, política dos partidos, a exceção, porque até aí nós já tínhamos, tínhamos conseguido uma grande vitória, que era a participação de 30% de mulheres nas candidaturas, a gente achava que tínhamos que ter candidaturas negras.

[...]

Aí juntei o algumas pessoas e tal, pedi opinião, e consultei alguns amigos, se eles iam ajudar a gente a patrocinar, da uma, cada um dava

ali uma quantidadezinha, aí o pessoal topou e nós fizemos o jornal, fizemos o primeiro, lançamos na praça114 (VITÓRIO, São Paulo, 2007)

A idéia era publicar textos acerca da história e dos fatos que atendessem aos temas mais recentes que poderiam de algum modo influenciar a comunidade a entender, aceitar e ter orgulho de sua etnia, como por exemplo, os encontros da juventude negra. Gilson salienta que a idéia surgiu justamente da necessidade de divulgar idéias e no início esta missão foi realizada através de folhetos que eram distribuídos com pouco conteúdo, já que o espaço era pequeno.

Como houve reciprocidade nesta ação, foram feitas fotocópias de textos alusivos à etnia negra e distribuídos juntamente com os panfletos. A resposta da comunidade foi tão positiva que exigiu um tratamento melhor das informações acarretando a necessidade de elaborar um instrumento ainda mais coeso, tanto na composição dos textos como em seu teor, devendo ser politicamente trabalhado, possuindo ações que atendessem a demanda da própria comunidade. Assim, em 1995, quando se comemorou os 300 anos de Zumbi de Palmares115, houve um grande movimento nacional acerca da importância de sua

imagem e da preservação de sua memória para os movimentos de resistência. Foi neste contexto que se deu a criação do primeiro número do Jornal “Hora X Consciência Negra”, contando com o apoio de várias entidades ligadas ao

Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher e com a ajuda imprescindível das

escolas de samba do município de São Paulo, criando letras de enredos que enalteciam esta figura dentro da comunidade negra. Assim foi realizada uma grande pesquisa encomendada pelo Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher sobre o tema. A elaboração do protótipo do Jornal “Hora X Consciência Negra” deparou-se ainda com um empecilho, os custos de publicação. O apoio da Universidade Camilo Castelo Branco - UNICASTELO116, foi fundamental ao se interessar em ajudar a manter uma publicação periódica com exemplares estruturados, já no formato de jornal foi decisivo.

114 Cf. VITÓRIO, 2007, referência 67 da página 54.

115 MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus

identidade negra, dá a seguinte definição sobre a importância de Zumbi dos Palmares – conseguiu, há mais de 300 anos, mobilizar números expressivos de escravizados fugitivos das senzalas e organizou uma oposição que se concretizou na fundação da República dos Palmares.

116 Universidade Camilo Castelo Branco - UNICASTELO, situada na zona leste de São Paulo, no

Gilson Vitório comenta ainda que após a circulação destes exemplares foi realizada uma pesquisa de opinião pública junto aos jovens da comunidade, indagando sobre com tinham tomado conhecimento da personagem Zumbi. Os resultados da pesquisa revelaram que 77% dos jovens declararam ter contato com o tema, com maior profundidade, através das escolas de samba.

Estes jovens declararam que tiveram maior conhecimento sobre Zumbi por meio de enredos das escolas de samba, e não através dos ensinamentos nas escolas de ensino fundamental e médio, principalmente na rede pública de ensino oficial do Estado de São Paulo. A pesquisa realizada pelo jornal “Hora X Consciência Negra” detectou o papel exercido por meios de comunicação, onde o conhecimento sobre as questões de resistência e cultura vinculam-se às práticas culturais ligadas a comunidade, contribuindo para desenvolver os laços de afetividade e de ancestralidade.

No periódico “Hora X Consciência Negra” havia a divulgação de eventos que envolviam a comunidade negra Fala Negão Fala Mulher, além de fazer alusões concretas que mencionam a valorização da liberdade de discutir sobre todos os temas, mesmo os mais reacionários e comprometedores. Esta ação contribui também para buscar um posicionamento político evidente e objetivo.

O jornal é muito citado por Gilson Vitório, que o considera como sendo uma ferramenta para disseminar, não apenas a consciência negra, mas também abrir espaço de discussão sobre o processo histórico e a participação dos negros, desde o tempo do Zumbi dos Palmares até os dias atuais, com grande destaque às atividades da comunidade que passaram a mostrar os aspectos culturais da etnia negra.

Gilson Vitório ainda fala que o Jornal “Hora X Consciência Negra” possui entre outros aspectos positivos, a dedicação aos temas de interesse dos jovens, incluindo-os na discussão dos mais variados assuntos que envolvem a etnia negra, e a busca de desconstruir a imagem negativa do negro veiculada pela impressa escrita de grande circulação. Era um de seus objetivos desconstruir a imagem negativa do negro, construída e veiculada pela impressa escrita de grande circulação de São Paulo, principalmente em sua paginas policiais, que historicamente vêm relacionando-o à práticas de crimes e à violência.

Os diversos jornais, no entanto, não só se utilizavam das teorias evolucionistas para informar os diferentes artigos como buscavam mostrar que na verdade compactuavam com essas novas idéias. Ou seja, principalmente a Província de São Paulo, que como vimos parecia representar a ascendente elite paulista vinculada ao café, aparentava manipular cotidianamente esses conceitos que a “aproximavam dos países mais desenvolvidos”. Nesse sentido, a noção de civilização transformava-se aos poucos num dos valores mais “caros”, sendo que São Paulo parecia ter, nesse ponto, uma de suas grandes metas117 (1987, p. 109).

Lilia Mortiz Schwarcz118, a partir da análise dos jornais do século XIX “Correio Paulistano (1874 a 1890), A Província de São Paulo (1875 a 1889), O Estado de São Paulo (1890 a 1900), Redempção (1887 a 1889), Platéia (1888 a 1900), Diário Popular (1884 a 1900), O Tabor (1883 a 1887), O Constitucional (1871 a 1889)119 (1987, p. 284)” entende que a grande imprensa desenvolvia um duplo movimento: ao mesmo tempo que focalizava o negro como participante de uma sociedade desigual, podendo ser lido como uma denúncia, ao se utilizar de teorias evolucionistas, articuladas a noção de civilização criava uma imagem do negro como inferior e primitivo, o que poderia remetê-lo a uma imagem negativa de si mesmo.

Assim, é importante notar que a partir da década de 1990 surgem novos estudos destinados a fornecer maior visibilidade à imprensa negra, evitando-se que caiam no esquecimento, trazendo à memória social momentos significativos de outras experiências de vida e de luta do negros.

Identifica-se, desta maneira, a grande valia de um periódico com distribuição gratuita à comunidade, que toma conhecimento dos temas e dos eventos dedicados a divulgar os assuntos relacionados à comunidade negra. É importante destacar a posição de Ferrara120 quando define que a imprensa negra é aquela feita por negros para os negros, garantindo que ocorra uma articulação social, fazendo com que fixe novas idéias e reflexões sobre a negritude.

Mesmo com as características de suma importância nos grupos que discutem as questões da negritude nos Movimentos Negros, tais como Corrente

117 SCHWARCZ, Lilia Moritz. Retrato em branco e negro: jornais, escravos e cidadãos em São

Paulo no final do século XIX. - São Paulo: Companhia das Letras, 1987, p.109.

118 Ibid. 119 Ibid., p.284.

120 FERRARA, Miriam Nicolau. A Imprensa Negra Paulista (1915-1963). São Paulo: FFLCH/USP,

Viva121, Casa de Cultura da Mulher122, MOCUTI123, Fala Negão Fala Mulher, Afro

II124, Ogban125, Gueledés126, e outras comunidades do gênero, ainda é extremamente escasso o material dedicado a aprofundar algumas das reflexões sobre temas e questões significativas que poderia tornar compreensível à maioria dos negros o papel do afro-brasileiro na sociedade.

121 Corrente Viva – Rede de compromisso social que visa fortalecimento de identidades sociais.

Com sede na rua Cancioneiro de Évora, nº 125, São Paulo/SP. Ligada ao Movimento Negro Fala Negão Fala Mulher, por meio de eventos e ações relacionadas à negritude e as carências dos bairros da cidade de São Paulo.

122 Casa de Cultura da Mulher – Entidade direcionada a atividades de assistência e orientação

jurídica para mulheres jovens e meninas sobreviventes da violência racial, violência domestica e direitos das mulheres no encaminhamento para o serviço público e dando assistência nos processos dos anos anteriores em andamento. http://www.casadeculturadamulher.org.br, acesso feito em 05/06/2008

123 MOCUTI – Movimento Cultural da Cidade Tiradentes.

124 Afro II - O trabalho do Grupo Cultural Afro II busca uma fusão entre os movimentos da dança

afro-tradicional e da contemporânea. No ritmo marcado pelos instrumentos de percussão, as coreografias resgatam ritos de passagem, cerimônias tribais, danças primitivas de guerra e de caça, divindades africanas, como os orixás, e toda uma cultura que vem se recriando através dos tempos. No trabalho do Afro II, a tradição da dança negra, que tem sua origem na religiosidade e na magia, ganha novos elementos, em coreografias que retratam o caos urbano e as contradições da modernidade. O resultado é uma dança expressiva e contagiante. Energia, beleza, sensualidade. No diálogo do corpo com o espaço, numa linguagem inusitada, o Grupo Cultural Afro II utiliza a dança como veículo de comunicação, resistência e afirmação cultural, mantendo viva a raiz negra africana. O Grupo Cultural Afro II completará agora em maio, 16 anos de atividade. Com coordenação de Rita Mesquita, o grupo reúne profissionais e alunos de dança em um trabalho social, artístico e cultural com crianças carentes, jovens e adolescentes da periferia de São Paulo. Nos últimos anos, o Grupo Cultural Afro II têm se apresentado em diferentes espaços culturais, festas e eventos. Com apresentações na Europa, começa a fazer história também fora do país.

125 Ogban – Movimento Negro que está vinculado à questão da moradia, dos sem tetos, nos

bairros da zona leste de São Paulo.

126 Gueledés – Movimento Negro relacionado às mulheres e as ações de afirmações em defesa de

Ao refletir sobre o significado da impressa negra127, é importante salientar

que, embora tenha como meta fundamental discutir as questões específicas do

Movimento Negro, ela não se limita a problematizar os sentidos da existência do

grupo étnico negro, mas aborda inúmeros outros tópicos da vida política e social do país, utilizando uma linguagem de fácil compreensão por parte daqueles que tiveram baixa escolarização e estimule a discussão dos aspectos mais fundamentais da discriminação, que surge como um estigma presente em cada uma das etapas de sua trajetória. Acompanhando a história da imprensa negra, é possível apreender em cada uma de suas etapas os processos que a engendraram, identificando sujeitos, projetos e formas de organização.

A criação de um periódico destinado a comunidade negra fala negão fala mulher não é apenas uma estratégia de manter sempre em voga assuntos que envolvem o negro e a valorização de sua etnia, ou a simples difusão de idéias e de informações, mas um modo de participação e intervenção na historia do país, uma forma de luta, isto é, de formalização de proposta de mobilização e debate. A partir disso, percebe-se a ocorrência de um maior número de trabalhos dedicados a esclarecer tais pontos, como por exemplo, o racismo, a discriminação e a atitude de pertencimento à etnia, favorecendo aos indivíduos se identificarem no interior do grupo social onde vivem e agindo de forma desafiadora no mundo externo, defendendo os princípios da igualdade e eqüidade.

127 Definição de imprensa negra que se pretende trabalhar nesta pesquisa: A revolta dos

marinheiros de João Cândido termina em 1911. Quatro anos depois tem início, em São Paulo, uma relevante manifestação de identidade étnica, das mais importantes pra conhecermos a trajetória do negro brasileiro na luta pela cidadania. Referimo-nos à chamada imprensa negra paulista, cujo primeiro jornal intitula-se O Menelick e começa a circular em 1915. Fenômeno dos mais significativos para se analisar o comportamento e a ideologia desse segmento negro urbano, os jornais editados por negros paulistas sucedem-se até 1963, quando é fechado o Correio d’Ébano. Os negros paulistas, sentindo a necessidade de um movimento de identidade étnica, e enfrentando as barreiras de uma imprensa branca (Grande Imprensa) impermeável aos anseios e reivindicações da comunidade, recorreram à solução mais viável, que era fundar uma imprensa alternativa, na qual os seus desejos, as denúncias contra o racismo, bem como a sua vida associativa, cultural e social se refletissem. No entendimento de MOURA, Clovis. Sociologia do negro brasileiro, p. 204. A chamada imprensa negra de São Paulo, pouco conhecida e divulgada, sendo apenas relacionada em circuitos universitários abarca um período que vai de 1915, quando surge O Menelick, até 1963. Essa extensão de atividades no tempo, bem como o papel social e ideológico que desempenhou na comunidade negra da época em que existiu, vem colocar em evidência e discussão a sua importância e, ao mesmo tempo, indagar por que em um país que se diz uma democracia racial há necessidade de uma imprensa alternativa capaz de refletir especificamente os anseios e reivindicações, mas, acima de tudo, o ethos do universo dessa comunidade não apenas oprimida economicamente, mas discriminada pela sua marca de cor que os setores deliberantes da sociedade achavam ser um estigma e elemento inferiorizador para quem a portasse.

Uma abordagem que merece destaque é a apontada por Bonfigli128 ao

demonstrar a existência da dupla consciência negra e refletir sobre a imprensa a partir do estudo da Revista “Raça Brasil”, questionando a idéia de negritude e o desejo de conquista do direito à igualdade pela adoção de comportamentos vinculados à cultura européia como a etiqueta e a moda que nada têm a ver com a cultura brasileira, buscando constituir uma imagem do negro como cidadão de consumo.

Assim, mesmo de forma precária, a ação da impressa negra deve ser valorizada, pois traça uma linha de união da etnia negra através da exploração de inúmeros pontos positivos encontrados no indivíduo que se manifesta a partir de suas vivências, principalmente pelo fato de que não se quer o negro se apresentando como melhor que indivíduos de outras etnias, mas sim, que esteja no mesmo patamar de igualdade, intelectual, moral e cultural de uma etnia forte e lutadora.

Podemos refletir que o uso de um periódico de livre circulação nas comunidades e grupos de Movimento Negro se torna um instrumento fundamental

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