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A indução em Hume

No documento MARIA DE LOURDES BACHA (páginas 46-110)

1.2 A Indução em Bacon

1.3. A indução em Hume

A grande questão da indução é colocada por Hume: Como se sabe se o sol nascerá amanhã? Como se justificam as inferências indutivas? Qual o fundamento de nossas conclusões a partir da experiência?88 Configura-se com tal questão o problema da indução na

forma da legitimação da causalidade ontológica. A partir de uma observação de casos particulares, constroem-se juízos gerais na forma lógica da indução. Hume mina este procedimento indagando como é que de uma observação de casos particulares pode-se construir uma regra geral?

Examinando-se uma parte de um universo, dizemos que o universo tem as mesmas características que a parte tem. Isto é indução. Hume pergunta: como é que daquilo que foi examinado se admite como propriedade do não examinado? Qual o fundamento lógico para esta passagem?

86 P. Rossi (1992), A Ciência e a Filosofia dos Modernos, São Paulo: Unesp., p. 211.

87 Para P. Rossi (1992), op. cit. p. 206., é Galileu, o verdadeiro fundador do método científico. Para B. Russell (1962), op. cit., 11, “a ciência data,

aproximadamente, de trezentos anos, uma vez que ela como força importante só existe a partir de Galileu. Com Galileu o método científico toma uma característica nitidamente experimental, e o processo indutivo desenrola-se em três fases: observação, hipótese e verificação. “O método científico, tal como o entendemos hoje, surgiu com Galileu (1564-1642) e, em menor escala, com o seu contemporâneo Kepler (1571- 1630) [...] Ele e Galileu ainda mais, possuíam o método científico em sua integridade. [“...] Eles passaram da observação de fatos particulares ao estabelecimento de leis quantitativas rigorosas que permitiram a previsão de acontecimentos futuros.”

Estas duas proposições não são de nenhum modo iguais: encontrei que tal objeto sempre tem sido acompanhado por tal efeito, e prevejo que outros objetos que são em aparência semelhantes, serão acompanhados por efeitos semelhantes. [...] Mas, se vós insistis em que a inferência é feita por uma cadeia de raciocínios, desejaria que vós construísseis este raciocínio. A conexão entre estas proposições não é intuitiva.89

Ou, também:

Poder-se-ia dizer que, de certo número de experimentos uniformes, inferimos uma conexão entre as qualidades sensíveis e os poderes ocultos; o que, devo confessar, parece enunciar a mesma dificuldade, em termos diferentes. A questão reaparece: sobre qual processo de argumentação se funda esta inferência?90

O que legitima construir juízos indutivos? Hume propõe que se investigue qual seria a natureza dessa evidência “que nos dá segurança acerca da realidade de uma existência e de um fato que não estão ao alcance do testemunho atual de nossos sentidos ou do registro de nossa memória”. Segundo Hume, é preciso “frisar que este aspecto da filosofia tem sido pouco cultivado tanto pelos antigos como pelos modernos; e, portanto, nossas dúvidas e nossos erros ao realizar esta investigação tão importante são certamente os mais desculpáveis, já que marchamos através de difíceis caminhos sem nenhum guia ou direção” (IEH:48).

Em outras palavras Hume nos desafia a provar dedutivamente ou necessariamente que o sol nascerá amanhã. Para Hume, todos os nossos raciocínios acerca dos fatos ou crenças derivam unicamente do costume, “pois, ao termos vivido por algum tempo, nos acostumamos com a uniformidade da natureza, adquirimos um hábito geral pelo qual transferimos sempre o conhecido para o desconhecido e concebemos que o último se parece com o primeiro”.91 Este

tipo de raciocínio parece fundar-se na relação de causa e efeito, apenas por meio dessa relação ultrapassamos os dados de nossa memória e de nossos sentidos. No entanto, para Hume a regra da causalidade não tem fundamento lógico, seria apenas psicológica, gerada pelo costume.

Ousarei afirmar, como proposição geral, que não admite exceção que o conhecimento desta relação não se obtém, em nenhum caso por raciocínios a priori92, porém nasce inteiramente da experiência quando vemos que quaisquer

89 Idem ibidem p. 55 90 ibidem p. 56.

91 D. Hume (1996), op. cit., p.108.

92 Este é um ponto muito importante, a impossibilidade do raciocínio a priori com relação à causalidade, como veremos no desenvolver deste

trabalho, principalmente no capítulo. Com base nesta afirmação de Hume, posteriormente Kant vai perguntar “Como são possíveis os juízos sintéticos a priori”, que se transforma na pergunta mais importante da filosofia e Peirce estende esta pergunta para “como são possíveis os juízos sintéticos em geral?‟”. Ver R. Fogelin (1993), “Hume‟s Scepticism”, in The Cambridge Companion to Hume, Cambridge: Cambridge University Press, pp. 90-116.

objetos particulares estão constantemente conjuntados entre si. Apresente-se um objeto a um homem dotado, por natureza, de razão e habilidades tão fortes quanto possível; se o objeto lhe é completamente novo, não será capaz, pelo exame mais minucioso de suas qualidades sensíveis, de descobrir nenhuma de suas causas ou de seus efeitos. [...] Nenhum objeto jamais revela, pelas qualidades que aparecem aos sentidos, tanto as causas que o produziram como os efeitos que surgirão dele, nem pode nossa razão sem o auxílio da experiência, jamais tirar uma inferência acerca da existência real e de um fato. 93

Os fatos induzem à regra geral, se as relações estiverem nas coisas experimentadas, isso não quer dizer que estarão nas coisas não experimentadas, muito menos que permanecerão no futuro. Então, a natureza nos “adestra” a determinadas regularidades, com isso geramos determinados hábitos. Nossa idéia de uma conexão necessária não é nada mais do que um hábito dos efeitos esperados. A relação necessária está na nossa mente e não nos objetos. Qual a ligação real entre nossas generalizações que permita legitimar sempre a extencionalidade das propriedades da parte para o todo e a extensionalidade das partes no tempo?

O costume é, pois, o grande guia da vida humana. É o único princípio que torna útil nossa experiência e nos faz esperar, no futuro, uma série de eventos semelhantes àqueles que apareceram no passado. [...] Portanto, todas as inferências tiradas da experiência são efeitos do costume e não do raciocínio. 94

Todos os nossos raciocínios sobre os fatos são da mesma natureza, e constantemente supõe-se que há uma conexão entre o fato presente e aquele que é inferido dele. Se não houvesse nada que os ligasse, a inferência seria inteiramente precária.

Em verdade, todos os argumentos derivados da experiência se fundam na semelhança que constatamos entre objetos naturais e que nos induz a esperar efeitos semelhantes àqueles que temos visto resultar de tais objetos [...] De causas que parecem semelhantes esperamos efeitos semelhantes. É esse o resultado de todas as nossas conclusões experimentais. Ora, parece evidente que se esta conclusão fosse reproduzida pela razão, ela seria tão perfeita desde o início e a partir de um único caso, do que após uma longa série de experimentos.95

Existe uma associação habitual entre o anterior e posterior; o fato de que um fenômeno seja sempre seguido por outro, no tempo, faz com que os dois sejam relacionados como se houvesse uma conexão causal entre eles. Assim, causa e efeito seriam o anterior e o posterior de uma sucessão temporal transformados em elos de uma vinculação necessária. Isso ocorre

93 D. Hume (1996), op. cit., p. 50

94 D. Hume (1996), op. cit., p. 62 Segundo nota do tradutor, Hume faz a seguinte distinção entre razão e experiência: a primeira é considerada

resultado de nossas faculdades intelectuais enquanto que as últimas são supostas derivar inteiramente dos sentidos e da observação.

de forma subjetiva e seu fundamento encontra-se no sentimento de crença, que é muito diferente dos processos intelectuais de inferência lógica96.

De causas que parecem semelhantes esperamos efeitos semelhantes. É esse o resultado de todas as nossas conclusões experimentais. Ora, parece evidente que se esta conclusão fosse reproduzida pela razão, ela seria tão perfeita desde o início e a partir de um único caso, do que após uma longa série de experimentos. [...] Ora, onde está o processo de raciocínio que, de um único caso, tira uma conclusão tão diferente daquele que infere de cem casos que não são de modo algum diferentes do primeiro? Proponho este problema visando, ao mesmo tempo, obter informação e suscitar dificuldades. Não consigo localizar, não consigo imaginar tal raciocínio.97

Como conseqüência, não é possível haver conhecimento científico da natureza. As ciências da natureza corresponderiam a uma necessidade interior de colocar ordem nas coisas, a fim de que a sobrevivência do homem fosse garantida. Os fundamentos da ciência seriam, portanto, de natureza psicológica, pois a crença que está na base de todo o conhecimento natural não teria qualquer estruturação lógica. Hume constrói seu ceticismo tornando a concepção da causalidade e da continuidade uma questão psicológica98, sem fundamentação

lógica visto que a “repetição de um ato ou de uma determinada operação produz uma propensão a renovar o mesmo ato ou a mesma operação, sem ser impelida por nenhum raciocínio ou processo do entendimento, dizemos sempre que esta propensão é o efeito do costume” (IEH:61). Assim, se Hume estivesse certo, todo o edifício da ciência Newtoniana estaria solapado. Segundo Biro99, por mais de dois séculos a filosofia de Hume ficou conhecida

por negar a própria possibilidade do conhecimento.

Há dois aspectos importantes na questão da indução:

1. como é que examinando a parte se chega a uma conclusão sobre o todo?

2. o que é que legitima a passagem das qualidades experienciadas para a totalidade das qualidades do universo que não foram experienciadas

Vários autores tentaram fornecer respostas à questão proposta por Hume. Kant foi um desses autores, chegando a dizer numa passagem: “Confesso abertamente haver sido a advertência de David Hume que, já lá vão muitos anos, pela primeira vez me despertou de meu

96 J. P. Monteiro (1996), “Vida e Obra” in Investigação Acerca do Entendimento Humano, Col. Pensadores. São Paulo: Ed. Abril, p. 10 97 D. Hume (1996), op. cit. p: 56

98Ver M.L. Bacha (1997), “A Questão da Causalidade e Continuidade em Hume e como esta Questão é Resolvida em Peirce”, revista da 1ª

Jornada do Centro de Estudos Peirceanos, pp.71-76.

sono dogmático e incutiu minhas pesquisas no domínio da filosofia especulativa orientação inteiramente diferente”.100

Para Kant, o empirismo cético de Hume e sua crítica da causalidade tornavam incertas as posições do racionalismo dogmático, pois Hume provara “de maneira irrefutável” que a razão é incapaz de pensar, a priori e por meio de conceitos, uma relação necessária tal com a relação de causa e efeito (CRP: 47). A solução proposta por Kant à questão de Hume é a chamada a revolução copernicana, através da qual Kant afirma que não mais a inteligência humana irá se regular por uma suposta estrutura do mundo, procurando decifrar como é que o mundo é em si mesmo e generalizando arbitrariamente os dados sensíveis, porque a experiência jamais dá aos seus juízos uma generalidade autêntica e rigorosa, mas apenas uma generalidade admitida e comparativa (por indução) (CRP: 54).

[...] até agora se supôs que todo nosso conhecimento tinha que se regular pelos objetos; porém, todas as tentativas de mediante conceitos estabelecer algo a priori sobre os mesmos, através do que o nosso conhecimento seria ampliado, fracassaram sob esta pressuposição. Por isso tente-se ver uma vez se não progredimos melhor nas tarefas da Metafísica admitindo que os objetos tenham que se regular pelo nosso conhecimento.101

Durante alguns anos a questão da indução foi esquecida. No entanto, inesperadamente, em meados do século XIX, principalmente na Inglaterra se dá uma reviravolta. Em 1826, Whateley publica Elements of Logic, em que faz uma distinção entre lógica e epistemologia. Em 1830, surge Discourse of Natural Philosophy de Hershell, e em 1837, Whewell, em History of Inductive Sciences, ressalta principalmente “o papel da invenção do espírito na descoberta científica”, e vai se complementar em 1840, com o lançamento do seu outro livro The Philosophy of Inductive Sciences. Em sentido diferente aparecem os trabalhos de Morgan: Formal Logic or the Calculus of Inference Necessary and Probable de 1847 e Syllabus of a Proposed System of Logic, em 1860) e Boole The Mathematical Analysis

of Logic, em 1847 e An Analysis of the Laws of Thought em 1854 de Boole.102 Neste contexto,

tem importância considerável o System of Logic de Mill, cujas idéias serão resumidas no próximo capítulo. A busca de princípios para a indução foi a solução encontrada por autores como Mill, Keynes, Russell, a indução poderia ser justificada se apelarmos para certos

100 I. Kant (1959), “Prefácio” in Prolegomenos, (trad. AP. Carvalho) São Paulo: Ed. Nacional. p.28

101 I. Kant (1996), Critica da Razão Pura, Col. Pensadores, (trad. Valerio Tohden e Udo B. Moosburger), São Paulo: Nova Cultural, p. 48. 102 Para Peirce, os escritos de Whewell, Mill e Herschell trazem algumas das mais belas idéias sobre os métodos de pensamento da ciência (CP

princípios, como por exemplo, o da lei da uniformidade da natureza, ou a lei da causalidade ou os postulados de Russell.

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“Nenhum homem de formação científica afirmaria que o conhecimento científico atual seja rigorosamente verdadeiro; ele apenas afirmará que se trata de um passo no caminho que leva à verdade.” (Russell)

Na questão da indução, Mill (1806-1873) é um dos maiores interlocutores de Peirce. Mill foi herdeiro de uma filosofia que tinha suas origens em Locke, Berkeley e Hume e foi desenvolvida por Hartley, Bentham e por seu próprio pai James Mill. Os escritos de Mill em lógica constituem uma formulação articulada e sistemática dos princípios desenvolvidos na filosofia do empiricismo sensacionalista inglês e do utilitarismo.103

Todavia, grande parte do trabalho publicado de Mill foi fruto de discussões e controvérsias sobre problemas práticos e seu grande objetivo era remover obstáculos que a s falsas filosofias colocavam no caminho do progresso social. Mill exerceu grande influência na oposição às idéias sociais e filosofias vigentes na época, na qual a ciência moderna aliada ao desenvolvimento da tecnologia industrial estava produzindo profundas alterações na vida das pessoas na Inglaterra, principalmente no que diz respeito aos conceitos de natureza, homem, sociedade. Esta nova ordem de instituições e idéias requeria um novo modelo teórico. Esta

103 Para W.L. Courtney (1990), The Metaphysics of John Stuart Mill, London: Thoemes Antiquarian Books Ltd., p. 14, ”Ele [Mill] é um

sensacionalista- isto é, ele pertence àquela linha da filosofia inglesa que começou com Hobbes, continuou com Locke e Berkeley e culminou em Hume. Mas se nossa revisão do período estiver correta, Hume representou o ápice deste tipo de especulação. Portanto Mill deve combinar Hume com alguns novos elementos. Acima de tudo, vivendo numa época científica, ele tinha que fazer as pazes com a ciência que Hume, no mínimo tinha afrontado gravemente. E Ciência, para muito pensadores tem só um fundamento metafísico- aquele do realismo. Portanto Mill de alguma forma tem que combinar sensacionalismo e realismo. Ele é sensacionalista em seu „Exame da Filosofia ..‟ e realista na sua „Lógica‟”. Ainda segundo Courtney, “ele é um empirista- um elo daquela corrente de pesquisa empírica que foi formulada no século dezoito e vastamente desenvolvida no século dezenove. Mas empiricismo nas mãos de Locke e Hume é individualista, empiricismo nas mãos de Herbert Spencer e George Henry Lewes é universalista. A qual das duas espécies de empirismo Mill pertence? Curiosamente, a „experiência‟ que representa uma parte tão grande na sua filosofia pertence a uma época que o precedeu, não a dos seu contemporâneos. Em outras palavras, em uma época de não-individualismo, ele funda sua filosofia na experiência individual, como Hume e não naquela da raça, como Herbert Spencer. Vivendo no século dezenove, numa época onde concepções tais como „evolução‟ e „desenvolvimento da raça‟ estão no ar, ele ainda se volta para o tempo onde o „senso histórico‟ não havia nascido. Para J. Skorupski (1998), “Language and Logic” in The

Cambridge Companion to Mill, Cambridge: Cambridge University Press, p:37. Mill é um empiricista ao assegurar que nenhuma afirmação

sobre o mundo é a priori. Mill, no System of Logic, distingue entre proposições verbais e reais, entre inferência aparente e real. A afirmação de uma proposição meramente verbal não traz informação sobre o mundo embora possa trazer informação sobre a linguagem na qual é ensinada. Nenhuma proposição ou inferência real é a priori, tais proposições são fundamentadas nos dados e métodos da indução. Mas, o que torna o empiricismo de Mill diferente dos outros é sua demonstração de que a matemática e a lógica contêm proposições reais e se o empiricismo for válido, segue-se que a justificativa da lógica e da matemática são indutivas. Mill diz na sua Autobiografia que escolheu de propósito a matemática, porque se conseguisse mostrar que ela é indutiva, as outras verdades necessárias também deixariam de ser a priori. Por outro lado vale lembrar a frase que tornou Mill famoso como sensacionalista: “A matéria, então, pode ser definida como possibilidade permanente de sensações” (Ham: 263)

seria uma das funções da “filosofia da experiência de Mill”,104 uma missão histórica do

empirismo sensacionalista. Mill é considerado integrante do movimento positivista inglês105. No

entanto, a insistência sobre o papel da observação e da experiência não é algo que seja exclusivo em Mill, outras filosofias também têm esta visão, mas o que é característico de Mill é a sua concepção do que são fatos básicos para os quais a crenças devem ser testadas e quais são as condições essenciais para testá-las, do que decorre que os fundamentos teóricos da lógica são totalmente extraídos da Psicologia. São os pressupostos psicológicos do empirismo sensacionalista que vão dar suporte aos princípios de evidência dos quais emerge a lógica. 106

Mill se tornou um dos líderes do movimento radical, cujos membros denominavam-no “Partido do Progresso”, defendendo o utilitarismo ético de Bentham, a teoria populacional de Ricardo e a psicologia associacionista de Hartley. Entretanto, quando este radicalismo filosófico entrou em declínio, Mill se voltou para os estudos de lógica, sem, entretanto, deixar o jornalismo político e algumas causas polêmicas.

104 Para Mill, a diferença entre as duas escolas, a da intuição e a da experiência não é só matéria de especulação filosófica, mas está cheia de

conseqüências práticas, existe uma grande distância entre os que aceitam a experiência como autoridade final e exclusiva para certificação das crenças. Um dos objetivos de Mill ao escrever o System of Logic seria o de substanciar e expor a filosofia da experiência e diminuir a influência da filosofia da intuição. A ênfase na autoridade final de experiência e a necessidade de verificar as proposições pela observação dos fatos evita especulação fútil. (Ham: 281)

105Segundo o que o próprio Mill nos conta em sua Autobiography, quando leu o Curso de Filosofia Positiva de Comte, ficou muito impressionado

e, de fato, no livro final do System of Logic, adota alguns dos pontos de vista de Comte na questão das ciências sociais, embora na questão na indução, Mill achava que Comte não tinha nada a ensinar. Mill se dizia particularmente em débito a Comte naquilo que Mill chamou de “Método Dedutivo Inverso ou Histórico” (Autob: 131-134). Também, em 1865 Mill publica o livro Auguste Comte and Positivism, onde faz algumas críticas, principalmente relacionadas a ter restringido a investigação científica à busca de leis invariáveis entre fenômenos, condenando qualquer concepção sobre causas geradoras e eficientes, acabou por afastar o termo causa de sua filosofia, segundo Mill haveria uma nova concepção positiva para a noção de causa que Comte teria perdido de vista, ao eliminá-lo por suas conotações metafísicas. Outra crítica se refere ao fato de que Comte só teria tratado da questão referente aos métodos de investigação enquanto instrumentos de descoberta, negligenciando o aspecto que diz respeito às condições e aos instrumentos da prova. Deve-se observar que, para Comte, que é o fundador do positivismo, o conhecimento científico é real, porque parte de fatos tal como se apresentam. Para Comte, não se pode discutir os mecanismos que permitem ao homem conhecer, porque tal discussão pertence à teologia e metafísica, mas podemos estudar as condições orgânicas, fisiologia e anatomia, que levam ao conhecimento. Mas não é uma mera acumulação de fatos que leva à ciência. Os fatos acumulados que são a base e a origem do conhecimento só se transformam em conhecimento científico, porque o homem os relaciona a hipóteses, por meio do raciocínio. O conhecimento científico é, portanto, para Comte, baseado na observação dos fatos e relações entre fatos que são estabelecidas pelo raciocínio, estas relações são, na verdade, a descrição das leis que os regem, estabelece as leis que regem os fenômenos de forma a refletir o modo com tais leis operam na natureza, tem duas características: é um conhecimento sempre certo, não se admitindo conjecturas; e é um conhecimento que sempre tem algum grau de precisão, embora este grau varie de ciência para ciência, dependendo do seu objeto de estudo. Para o positivismo o conhecimento está erigido sobre o conhecimento real, útil, certo, positivo e repousa

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