• Nenhum resultado encontrado

A INFLUÊNCIA DA LINGUÍSTICA COGNITIVISTA SOBRE A LEITURA

1. O ENSINO DE LEITURA

1.3 A INFLUÊNCIA DA LINGUÍSTICA COGNITIVISTA SOBRE A LEITURA

Para compreender os pressupostos da linguística cognitiva, é importante compreender o cenário que caracterizava os estudos linguísticos no momento em que essa nova proposta teórica surgiu.

No final da década de 1950, o gerativismo de Chomsky inaugurou uma tendência de considerar a linguagem como um sistema de conhecimento autônomo, depositado no cérebro dos indivíduos e formado por vários princípios inatos no que se refere à estrutura gramatical. Esses princípios acabaram restringindo as possibilidades de variação na estrutura das línguas, uma vez que se manifestam como dados universais, isto é, estão presentes em todas as línguas do mundo.

Chomsky demonstrou que os fenômenos de natureza cognitiva são importantes para a compreensão da linguagem, ou seja, “relativos ao modo como nossa mente interage com o mundo que nos cerca, bem como os processos que permeiam nossa interação” (MARTELOTTA; PALOMARES, 2008, p. 177). Contudo, ele restringiu sua abordagem a questões relacionadas ao desenvolvimento de uma capacidade biológica, postulando uma estrutura racional e universal inerente ao organismo humano.

Para Ferrari (2011), a teoria gerativa afirma que o significado de uma sentença é definido pelas condições sob as quais se pode interpretá-la como falsa ou verdadeira (o significado é reflexo da realidade), já a linguística cognitiva defende que a relação entre palavra e mundo é mediada pela cognição. O significado deixa, portanto, de ser um retrato do mundo e passa a ser visto como uma construção cognitiva através do qual o mundo é apreendido e experienciado. A partir dessa concepção, as palavras não são dotadas de significados, contudo orientam a construção do sentido.

Martelotta e Palomares (2008) acreditam que para compreender a proposta da linguística cognitiva, alguns de seus princípios básicos devem ser analisados.

A começar, a principal crítica que os cognitivistas fazem aos gerativistas que não é com relação ao inatismo, pois os humanos parecem possuir estruturas e habilidades inatas que os torna capazes de aprender e usar uma ou mais línguas. A crítica é feita contra a proposta de que essas estruturas e habilidades são específicas da linguagem.

Para os cognitivistas, a linguagem não é um componente autônomo da mente, logo depende de outras faculdades mentais. Sua proposta teórica busca uma visão integradora da linguagem com base na ideia de que não é necessário distinguir conhecimento linguístico de conhecimento não-linguístico.

A proposta cognitivista é destacada por Martelotta e Palomares (2008, p. 179) por considerar aspectos relacionados a restrições cognitivas que incluem “a captação de dados da experiência, sua compreensão e seu armazenamento na memória, assim como a capacidade de organização, acesso, conexão, utilização e transmissão adequada desses dados”. Para essa visão teórica existe uma relação sistemática entre linguagem, pensamento e experiência.

Isso nos leva a um outro lado da proposta cognitivista, que incorpora os fenômenos relacionados à interação verbal. A característica de cunho social leva alguns autores a acrescentarem o elemento socio- ao vocábulo designativo da escola linguística, criando o termo “sociocognitivismo”. Esse termo destaca a importância que o contexto exerce nos processos de significação e o aspecto social da cognição humana.

Para o cognitivismo interpretar gestos está associado ao que os cognitivistas chamam de “princípio da escassez do significante”, segundo o qual a forma linguística é uma pista para as complexas tarefas associadas à linguagem. Isso quer dizer que o sentido não é uma propriedade intrínseca da linguagem, mas o resultado de uma ação conjunta.

Se o funcionamento das línguas está associado aos aspectos cognitivos e interativos, podemos dizer que a formação de frases em qualquer língua recebe influência desses fatores. A visão integradora que os cognitivistas propõem faz considerar incoerente o tratamento da estrutura gramatical como algo dissociado do significado, bem como a segmentação da estrutura gramatical em componentes isolados. Logo, eles não concordam com a autonomia da sintaxe.

A linguística cognitivista coloca os usuários da língua no centro de construção do significado, ou seja, ao buscar compreender o fenômeno da significação, os personagens desse processo, falante e ouvinte, não são excluídos. O falante deixa de ser um manipulador de

regras predeterminadas e o ouvinte passa a ser visto como um produtor de significados em situações comunicativas reais cuja interação também ocorre entre interlocutores reais.

Para os cognitivistas, a comunicação é uma atividade compartilhada em que são feitos vários movimentos em conjunto pelos interlocutores em direção à compreensão mútua. Assim, os interlocutores negociam a significação em situações de contextos específicos, o que torna possível a adaptação dos elementos linguísticos às diferentes intenções comunicativas.

A análise cognitivista leva em consideração a captação dos dados da experiência para a construção da significação referente ao nosso universo cultural.

A nossa estrutura corporal é extremamente importante, pois a nossa percepção do mundo é limitada por nossas características físicas. A mente não é separada do corpo. O pensamento é corporificado de tal modo que sua estrutura e organização estão associadas à estrutura de nosso corpo, bem como às nossas restrições de percepção e de movimento no espaço.

Podemos pensar em algum fato que já foi vivenciado e algo que ainda vamos vivenciar em relação a lugares que já passamos e que ainda pretendemos chegar. Quando fazemos isso, às vezes, utilizamos expressões espaciais (por exemplo: atrás, daqui para frente) que são usadas não para se referir a pontos no espaço, mas a momentos de tempo.

Quando isso acontece, pode-se dizer que há uma projeção entre domínios já que compreendemos uma noção mais abstrata (tempo) a partir de uma noção mais básica (espaço). Para os cognitivistas isso só é possível por conta da existência de um processo chamado mesclagem, que estabelece uma conexão entre diferentes domínios conceptuais, ou seja, diferentes áreas de conhecimentos pré-linguísticos que são estruturados por nossas experiências coletivas.

Para Martelotta (2008, p. 183) destacar a importância do corpo e das restrições impostas por ele ao modo como experienciamos o mundo implica admitir a importância da noção de perspectiva no processo de significação e expressão do mundo. [...] “Os cognitivistas tomam os sentidos como sendo entidades conceptuais, e as palavras e as estruturas da língua como recursos para simbolizar a construção que o falante faz de cenas ou fatos da vida cotidiana [...]”. A construção da cena envolve o falante e uma situação que ele leva em consideração.

Segundo Eduardo, “toda informação é posicionada”, ou seja, falamos da visão que temos do mundo e não a respeito do que o mundo é. Os conceitos que cada um constrói se

relacionam à época, à cultura e até mesmo a inclinações individuais caracterizadas no uso da linguagem. O sujeito é, portanto, incorporado ao processo de significação.

A função que os elementos linguísticos possuem é a de garantir a perspectiva que o falante quer transmitir no ato comunicativo. Desse modo os cognitivistas propõem as noções como “ponto de vista”, “alinhamento de figura e fundo” e “conhecimento de base em relação ao qual o conceito é compreendido”.

A noção de ponto de vista está relacionada a diferentes possibilidades de o falante realizar mentalmente a cena, ou seja, de como ele vê mentalmente o sentido da trajetória.

Já a noção de alinhamento de figura e fundo diz repeito ao destaque que atribuímos a um elemento de uma cena, colocando-o em primeiro plano de nossa atenção. Assim, em duas frases que designam a mesma cena, a diferença está em qual dos elementos é apontado como primeiro ponto de atenção (figura) e qual é representado como segundo plano (fundo).

A noção de conhecimento de base em relação ao qual o conceito é compreendido, por sua vez, tem relação com o conceito de linguagem, é um instrumento cognitivo que tem como função fixar e organizar a experiência humana. Desse modo, os significados só poderão ser descritos com base nessas experiências, bem como no conjunto de conhecimentos delas provenientes.

“Subjacente a esses fenômenos está a noção de enquadre ou enquadramento. Por enquadre entende-se a base do conhecimento em relação à qual se impõe uma determinada mobilização atencional” (MARTELOTTA; PALOMARES, 2008, p. 184). O enquadre coloca em destaque aspectos do significado que se quer transmitir e deixa em segundo plano os aspectos que podem ser inferidos a partir da informação transmitida.

Os domínios conceptuais (conjunto de conhecimentos estruturados) são espaços de referenciação ativados ou por formas linguísticas ou de modo pragmático, ajudando na construção dos significados. Eles podem ser de duas naturezas:

a) Domínios estáveis

São conhecimentos armazenados na memória pessoal ou social que foram construídos historicamente, ou seja, são informações partilhadas pelos homens.

Os domínios estáveis subdividem-se em três tipos: modelos cognitivos

Os modelos cognitivos idealizados (MCI) são estruturas por meio das quais nosso conhecimento se organiza. São importantes para a cognição porque diminuem a sobrecarga da memória, uma vez que organizam a quantidade de informações adquiridas no dia-a-dia.

As molduras comunicativas caracterizam-se por serem estruturas de conhecimento relacionadas a formas organizadas de interação. São procedimentos que identificam um tipo de atividade social (uma aula, uma reunião etc.), atividades estas que possuem comportamento estabelecido em que cada participante tem um papel determinado. O mais importante das molduras comunicativas como destaca Martelotta e Palomares (2008, p. 186) é que elas “funcionam cognitivamente como instrumentos indispensáveis à construção dos significados”.

“Os esquemas genéricos são configurações conceptuais de natureza mais ampla, global, abstrata, e, portanto, mais flexíveis em suas aplicações” (MARTELOTTA; PALOMARES, 2008, p. 186). Eles estão relacionados ao processamento de fluxos heterogêneos de informação, pois organizam nosso pensamento, incidindo-se nos usos cotidianos da linguagem.

Entre os esquemas genéricos há os esquemas imagéticos. Estes são estruturados, segundo Martelotta e Palomares (2008, p. 186) por “padrões dinâmicos, não-proposicionais e imagéticos dos nossos movimentos no espaço, da nossa manipulação dos objetos e de interações perceptivas”. Para Ferrari (2011, p. 54), nossa experiência do ESPAÇO é estruturada, em sua maior parte, como base nos esquemas imagéticos de “CONTÊNIER, PARTE-TODO, FRENTE-TRÁS, CIMA-BAIXO, ORIGEM-TRAJETO-DESTINO”.

b) Domínios locais

Os domínios locais são denominados espaços mentais e compõem operadores do processamento cognitivo; são dinâmicos e sequenciais, pois são produzidos no momento em que falamos. Os espaços mentais são domínios dinâmicos estruturados por domínios estáveis, o que significa que são elementos oriundos do conhecimento partilhado entre os interlocutores em um determinado ponto do discurso.

Ferrari (2011, p. 109), baseando na teoria dos espaços mentais de Fauconnier, afirma:

[...] tais espaços são domínios conceptuais que contêm representações parciais de entidades e relações em um cenário percebido, imaginado ou lembrado. Assim, o espaço que ancora o discurso na situação comunicativa imediata (falante, ouvinte(s),

lugar e momento da enunciação) é a BASE. A partir da BASE, outros espaços são normalmente criados para alocar informações que extrapolam o contexto imediato: falamos de passado e do futuro, de lugares distantes, de hipóteses, de arte e literatura e também de cenários que só existem na nossa imaginação.

Os espaços mentais se ativam através de conectores, chamados construtores de

espaços mentais que podem, no nível gramatical, ser representados por conectivos, sintagmas

proposicionais ou adverbiais.

A construção de sentido depende do estabelecimento de conexões entre os domínios cognitivos. Essas conexões ocorrem por meio da projeção, que podem ser de três tipos:

a) Projeções de domínios conceptuais estruturados ou MICs (modelos cognitivos

idealizados) – projetam parte de um domínio para outro. O processo de projeção toma a

estrutura de um determinado domínio (domínio- fonte) para falar ou pensar em outro domínio (domínio-alvo). As metáforas e analogias são exemplos desse tipo de projeção.

b) Projeções de funções pragmáticas – “projetam um domínio em outro a ele relevante em consequência de uma relação estabelecida localmente por uma função de caráter pragmático” (MARTELOTTA; PALOMARES, 2008, p. 188). Esse tipo de projeção é característico das metonímias e facilita a organização do nosso conhecimento, possibilitando meios de identificar elementos de um domínio através de sua contraparte em outro domínio.

c) Projeções entre espaços mentais – a partir do contexto discursivo e situacional, construímos significados através de uma rede de espaços mentais, operando um sistema de referenciação entre domínios cognitivos, responsável pela produção e compreensão dos significados. A projeção de um domínio sobre outro é feita através do princípio de

identificação.

É graças à existência do processo de mesclagem que se estabelecem relações entre diferentes domínios conceptuais, isto é, diferentes conjuntos de conhecimentos pré- linguísticos que são estruturados por nossas experiências coletivas ou individuais.

Martelotta e Palomares (2008, p. 190) trazem o conceito de mesclagem defendido por Gilles Fauconnier na década de 1990. A mesclagem é definida como “o espaço que herda estruturas parciais de espaços denominados fonte e que possui uma estrutura emergente própria”. Portanto, o espaço-mescla surge a partir da composição de elementos que provêm de um esquema genérico, dos MCIs ativos e dos espaços mentais locais.

Dessa maneira, um enunciado ativa domínios conceptuais sobre o sentido que veicula. A depender do que é referido, vários domínios podem ser ativados, e informações são transferidas dessas estruturas cognitivas para a construção de novos significados na linguagem. Esses novos significados, por sua vez, “mesclam” informações dos domínios dos quais partiram e o enunciado produzido por essas combinações é pré-organizado na mente pelo processo cognitivo de mesclagem.

O processo de mesclagem envolve a conexão de, no mínimo, quatro domínios: dois espaços-fonte, um esquema genérico, que define a homologia entre eles, possibilitando a saída de parte da informação para o espaço-mescla resultante.

Figueredo e Bizarro (1994, p. 466) consideram que “aprender a ler é aprender a mobilizar conhecimentos de que se dispõe, é reconstruir o texto utilizando procedimentos de probabilidade, de antecipação; é numa palavra, processar informação.”

A atividade psicológica do funcionamento da antecipação é um fenômeno complexo e concomitantemente cultural e linguístico. Inicialmente, o princípio de antecipação envolve a atividade linguística. Ligado a esse grau, embora num outro, a atividade cognitiva do sujeito com os seus condicionamentos, processos, regras e princípios, supõe saberes culturais e sociais. Assim, as autoras têm o leitor como um “constructo” que serve de base para a articulação da competência, da habilidade e da capacidade linguística e cognitiva.

O fator cognitivo exerce, portanto, um papel central na atividade linguística em que estão presentes o sistema linguístico, o conhecimento, a sua representação e suas transformações. O funcionamento cognitivo é, por conseguinte, a variável1 mais relevante e de efeito imediato sobre a atividade linguística.

O processamento da informação que se verifica durante a leitura e que radica uma série de processos constitutivos que atuam, ocorre a partir das representações geradas pelo próprio texto sobre representações prévias do leitor, mudando seu estado de conhecimento. Nessa perspectiva, o texto é visto como um conjunto estruturado de expressões comunicativas que dialoga com o leitor, o qual ajuda na construção de sentidos.

Durante o ato de ler, o processamento de um texto implica articular uma série de processos (linguísticos e não-linguísticos) orientados para a construção de uma representação integrada do conteúdo do texto e para a construção de um modelo mental de referência. Isso é

1

Figueredo e Bizarro (1994, p. 466) entendem como variáveis “(...) as capacidades perceptivas, as atencionais, as de armazenamento e recuperação da memória, de solução de problemas, de criatividade, assim como em função dos conhecimentos que se tem do mundo”.

extremamente importante do ponto de vista pedagógico, pois para se fazer uma leitura compreensiva e adaptar a estratégia ao texto que se lê é necessário ter o domínio de diversos mecanismos indispensáveis à atividade de leitura (linguísticos, pragmáticos, enciclopédicos etc).

As autoras já citadas reiteram que os mecanismos de construção de uma representação linguística do texto incluem procedimentos que o professor deve solicitar do aluno para a realização do processamento textual em vários níveis: processamento lexical, que permite interpretar uma palavra num contexto sintático e semântico; processamento sintático, que afeta a organização das palavras em frases e orações; processamento semântico, que afeta a interpretação das orações e gera proposições que especificam seu conteúdo; processamento textual, que afeta a integração das proposições numa representação linguística integrada ao seu tema, tópico ou macroestrutura; processamento referencial, que permite construir um modelo mental a partir da estrutura correferencial das expressões; e processamento de inferência textual, que relaciona proposições não indicadas explicitamente.

Eco (1984) considera o texto um tecido de lacunas cheio de não-ditos e esses não- ditos dão ao leitor a possibilidade de colaborar para preenchê-los. A partir dessa consideração, pode-se constatar que o texto não é o único responsável pela construção de sentido; e o leitor é peça chave no processo de compreensão dos vazios deixados pelo texto.

Segundo Trevisan (1991) a coerência se refere ao nível macroestrutural do texto, ou seja, ao texto como todo. Todavia, ela só será alcançada se o leitor ativar seus conhecimentos armazenados e realizar inferências. A coerência depende do receptor, de sua cooperação, de sua habilidade em desvendar o sentido do texto e de sua bagagem cognitiva.

Baseando-se no princípio da interpretabilidade de Charolles e Ehrlich, Trevisan (1991) considera que mesmo um texto não seja inteligível, se o leitor conseguir atribuir-lhe um sentido, será considerado coerente.

O conhecimento prévio é o fator que mais influencia na construção da coerência pelo leitor e é considerado essencial para o processo de compreensão. Ele abrange os conhecimentos de mundo, linguístico e textual e é armazenado na memória do leitor, a partir de vivências e experiências acumuladas ao longo da vida. Esse conhecimento é ativado a partir dos estímulos fornecidos pelo texto que possibilita a compreensão e a construção da coerência.

Há fatores que interferem na obtenção da coerência e dependem da existência do conhecimento prévio. Portanto, para conseguir realizar inferências, captar a intertextualidade e atingir a macroestrutura, presumem-seconhecimentos pré-existentes por parte do leitor, dos quais depende o nível de apreensão de sentido.

“As diversas leituras que há no texto aceitas já estão nele inscritas como possibilidades, (...) e não se fazem a partir do arbítrio do leitor, mas das virtualidades significativas presentes no texto” (FIORIN, 1989, p. 81).

É possível, por conseguinte, estabelecer uma ligação entre os conhecimentos difundidos pelo texto e os conhecimentos ativados pelo leitor no momento da leitura. Desse modo, a compreensão baseada no conhecimento prévio consiste numa visão de leitura como interação leitor-texto.

Trevisan (1991) considera que o nível de compreensão está relacionado ao grau de aproximação entre os conhecimentos veiculados no texto e os conhecimentos armazenados na memória do leitor. Quanto maior for o conhecimento partilhado entre produtor e receptor, melhor será a compreensão.

A autora acredita que uma abordagem cognitivista de leitura deve incluir a noção de inferência. O leitor, no ato de leitura, deixa emergir o seu conhecimento de mundo, suas crenças, vivências, além do conhecimento linguístico e textual, ou seja, todo seu conhecimento prévio. Esses conhecimentos vão possibilitar a realização do processo inferencial, que consiste em estabelecer conexões entre os enunciados, ao preencher as lacunas deixadas pelo texto, para chegar à construção de sentido.

Trevisan (1991) cita Brown e Yule (1983) para mostrar a diferença entre o que ele considera o verdadeiro processo de inferenciação- quando, ao estabelecer conexões, é preciso tempo para seu processamento, sendo necessária a realização de uma inferência-ponte – e o processo considerado como inferencial, aquele que consiste em uma conexão automática, compreendida ligeiramente, como se aparecesse explicitamente no texto.

A gramática cognitivo-funcional, segundo Martelotta (2008), refere-se a um conjunto de propostas teórico-metodológicas característico das escolas que, mesmo apresentando uma proposta diferente do formalismo gerativista, apresentam alguns pontos em comum:

 Observam o uso da língua;

 Observam além do nível da frase, englobando o texto e o diálogo;

 Consideram que a linguagem engloba atividades comunicativas, sociais e cognitivas.

A gramática funcional além de analisar a estrutura gramatical, como fazem as gramáticas estrutural e gerativa, ela analisa toda a situação de comunicação (o propósito do evento da fala, seus participantes e seu contexto discursivo). “Segundo a concepção funcionalista, portanto, a situação comunicativa motiva a estrutura gramatical, o que significa que uma abordagem estrutural ou formal não é apenas limitada a dados artificiais, mas inadequada como análise estrutural”. (MARTELOTTA, 2008, p. 63). Isto é, aspectos de caráter cognitivo e comunicativo são atualizados no uso da língua, e se o objetivo é entender o funcionamento da linguagem humana, esses aspectos devem ser considerados.

Desse modo, para essa concepção de gramática não se pode analisar a competência como algo distinto do desempenho, ou ainda, a gramática deve ser considerada como algo dependente do uso concreto da língua, ou seja, do discurso. Pode-se afirmar, portanto, que discurso e gramática estabelecem uma relação mútua: o discurso precisa dos