2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-EMPÍRICA
2.1 Inovação Organizacional
2.1.2 A Inovação em Aglomerados de Empresa
O processo de inovação tem sido objeto de estudo desde a análise de
distritos industriais (MARSHALL, 1985), até o estudo de Arranjos Produtivos Locais
(LASTRES e CASSIOLATO, 2003), evidenciando a propensão à inovação no âmbito
de aglomerados de empresas, ou arranjos de empresas localizadas próximas umas
das outras.
A concentração geográfica de empresas, em indústrias específicas, e suas
relações interorganizacionais são explicadas por uma variedade de teorias
(JUCEVICIUS e PUIDOKAS, 2006).
Um esclarecimento conceitual se torna necessário para a delimitação de
estudos sobre aglomerados de empresas, de forma a estabelecer distinções entre
as proposições de definição, desde a de Distritos Industriais (MARSHALL, 1985),
passando pelo conceito de Cluster (PORTER, 1999), até chegar à proposta de
Arranjos Produtivos Locais (APL) adaptada pela RedeSist (Rede de Pesquisa em
Sistemas Produtivos e Inovativos Locais) para a realidade de países em
desenvolvimento, especialmente o Brasil (LASTRES e CASSIOLATO, 2003).
Marshall (1985) já apontava para o fato de que alguns produtos eram
produzidos em um único lugar ou em poucos lugares, sendo depois distribuídos por
feiras, por mascates profissionais ou pelos próprios produtores. Mais tarde, a
concentração de fábricas formaria indústrias localizadas, com pequenas empresas
especializadas em determinados setores, integrando os chamados distritos
industriais.
A partir desta perspectiva analítica, Marshall propõe o território como unidade
de análise econômica, em vez da empresa isoladamente, desenvolvendo o conceito
de externalidades (ou economias externas). As externalidades são definidas como
um conjunto de benefícios ou vantagens geradas pela aglomeração de empresas,
constituindo o resultado (e não as causas) da concentração industrial. Ou seja, a
aglomeração é uma movimentação prévia ao conjunto de vantagens que irão surgir
depois, como resultado, atraindo ainda mais empresas para o distrito.
Marshall (1985) aponta, assim, para as vantagens da aglomeração, através
do conceito de externalidades geradas e compartilhadas nos distritos industriais. A
partir de então, quatro correntes se destacam nos estudos sobre aglomerações de
empresas, segundo Schmitz (2000):
(1) Nova Geografia Econômica, segundo a qual a proximidade geográfica
gera retornos crescentes (KRUGMAN, 1991; 1995);
(2) Economia de Negócios/Empresas defendendo que fatores locais geram
economias globais (PORTER, 1989, 1998, 1999);
(3) Ciência Regional, que lança uma nova reflexão sobre a geração de
competitividade, destacando-se a proposição de „eficiência coletiva‟ de Schmitz
(PIORE e SABEL 1984; BECATTINI 1990; BRUSCO 1990; PYKE e
SENGENBERGUER 1992; MARCUSEN 1996; STORPER 1995; MAILLAT 1996;
SCHMITZ 1995, 1997, 1999);
(4) Economia da Inovação, discutindo o Sistema Nacional de Inovação (SNI) e
o caráter regional/local da inovação, além da aprendizagem coletiva (FREEMAN,
1982, 1987, 1995; LUNDVAL, 1992, CASSIOLATO e LASTRES, 1999), em que a
inovação pode ser vista como um processo social e político, mais do que uma
sequência linear de pesquisa e desenvolvimento.
No âmbito da Economia de Negócios/Empresas, Porter (1999) define um
novo conceito para aglomerados de empresas, qual seja o conceito de cluster:
Concentrações geográficas de empresas inter-relacionadas, fornecedores especializados, prestadores de serviços, empresas em setores correlatos e outras instituições específicas (universidades, órgãos de normatização e associações comerciais), que competem, mas também cooperam entre si (PORTER, 1999, p. 209-210).
O conceito de cluster enfatiza o papel da localização e da competição, como
dinamizadores da capacidade produtiva e de inovação. A perspectiva de Porter parte
de uma concepção voluntarista da capacidade de ação humana, considerando a
possibilidade de as empresas atuarem competitivamente no mercado local ou
nacional, a partir de ações específicas (cooperativas ou competitivas) que
dependem quase que exclusivamente de seu esforço.
Este conceito é bastante utilizado, mas também criticado por atribuir
importância secundária à dimensão social e ao nível de imersão (embeddedness)
das firmas em redes socioeconômicas locais, focalizando aglomerações setoriais
estáticas, em vez de interações dinâmicas entre empresas (JUCEVICIUS e
PUIDOKAS, 2006). Sendo assim, mostra-se limitado para a análise de aglomerados
locais onde as relações sociais e políticas são determinantes (FREIRE e FREITAS,
2009).
Além de apresentar, de acordo com Jucevicius e Puidokas (2006),
inconsistências de definição e metodologia que trazem implicações para decisões de
políticas, sendo que a simples concentração industrial não é suficiente para afirmar a
existência de um cluster.
Partindo da perspectiva de que a inovação é um processo socialmente
imerso, a abordagem da aprendizagem coletiva, no âmbito da Economia da
inovação, parece ser a adequada para vislumbrar o processo de geração de
inovação na carcinicultura potiguar, na medida em que analisa a aquisição de novos
conhecimentos em processos de interação dentro de um contexto cultural e político.
Como conceito alternativo ao de cluster, os teóricos da Rede de Pesquisa em
Sistemas Produtivos e Inovativos Locais (RedeSist) sugerem o conceito de Arranjo
Produtivo Local (APL):
Aglomerações territoriais de agentes econômicos, políticos e sociais - com foco em um conjunto específico de atividades econômicas - que apresentam vínculos mesmo que incipientes. (LASTRES e CASSIOLATO, 2003, p.3-4);
Saindo de uma visão atomizada de capacidade de ação humana
(voluntarismo) sem restrições, contemplada no conceito de cluster, o conceito de
APL confere uma perspectiva social aos aglomerados de empresas, indo ao
encontro da abordagem de inovação como processo socialmente imerso.
Este conceito é, portanto, o que mais se adéqua como parâmetro analítico
para o pressuposto de inovação defendido na análise da carcinicultura potiguar, cujo
aspecto social é evidenciado como fator relevante pelos estudos de imersão social,
inclusive aqueles desenvolvidos no APL de carcinicultura norteriograndense (BALDI,
2006; CÁRDENAS, 2007; BALDI E LOPES, 2008; SILVA FILHO, 2009).
O conceito de APL é desenvolvido para adaptar-se à realidade de economias
em desenvolvimento, como o Brasil, considerando as características das relações e
a maneira como são organizados os aglomerados nestes contextos, adequando-se à
realidade do setor em análise.
Considera-se ainda a possibilidade de um APL avançar para uma forma mais
„evoluída‟ ou consolidada das relações em um aglomerado produtivo, de onde surge
a definição do conceito de Sistema Produtivo e Inovativo Local (SPIL):
Arranjos produtivos em que interdependência, articulação e vínculos consistentes resultam em interação, cooperação e aprendizagem, com potencial de gerar o incremento da capacidade inovativa endógena, da competitividade e do desenvolvimento local (LASTRES e CASSIOLATO, 2003, p.4).