2.3 0 PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE E AS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA
3.1 A INSTITUIÇÃO DAS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA
Os conflitos envolvendo empregadores e empregados têm crescido
numa progressão alarmante, enquanto a Justiça do Trabalho no Brasil permanece
praticamente com a mesma estrutura de funcionamento desde a sua criação há
mais de 60 anos.
Assim, apesar da extensa transformação econômica, política e social,
a justiça trabalhista recebe um número infindável de ações reclamatórias,
terminando por prestar um serviço lento e dispendioso, conforme constata-se nos
números já apontados no item 2.2.1.
A busca por outras formas que viessem a “desafogar” a Justiça do
Trabalho já era uma preocupação de muitos doutrinadores e juristas,
principalmente no que diz respeito aos meios de privilegiar a composição
extrajudicial dos conflitos individuais trabalhistas.
A mensagem presidencial n° 952, de 06 de agosto de 1998, resultou
no projeto de lei 4.694/98, originário do Tribunal Superior do Trabalho, que, por
sua vez, fez surgir a Lei 9.958 de 12 de janeiro de 2000.
A referida lei introduziu um novo Título à Consolidação das Leis do
Trabalho (Título VI-A) e acrescentou os arts. 625-A a 625-H à CLT,
estabelecendo regras acerca das comissões de conciliação prévia.
VALERlANO assim argumenta:
“A regulamentação dessas comissões pela Lei 9.958/2000 foi feita com a intenção de desafogar a Justiça do Trabalho. Também, justifica-se a instituição dessas comissões pelo fato de ter sido eliminada, pela Emenda Constitucional n° 24/99, a representação classista na Justiça do Trabalho, já que na prática os juizes classistas nas Juntas de Conciliação e
Julgamento desempenhavam uma importante função de buscar a conciliação entre as partes.”241
O empregado, frente a uma lesão a quaisquer de seus direitos, não
tinha a sua disposição, até a instituição das Comissões de Conciliação Prévia,
outro meio legalizado que não fosse a via judicial para a tentativa de defesa desses
mesmos direitos. No entanto, respeitando a opinião do jurista acima, não é
razoável que as Comissões de Conciliação Prévia tenham vindo com o fito de
substituir a presença dos classistas, que a Emenda Constitucional providenciou a
extinção. É fato que desde 1994 começaram a funcionar Núcleos Intersindicais,
mas ainda não havia um tratamento legal a eles dispensados.
As Comissões de Conciliação Prévia têm a função de tentar conciliar
os conflitos individuais do trabalho, ou seja, estão afastados da competência das
comissões os conflitos de ordem coletiva. A CLT, em seu artigo 613, V, já previa
que as convenções ou acordos coletivos deveriam conter normas para a
conciliação das divergências surgidas entre as partes envolvidas em decorrência
da aplicação dos dispositivos daqueles instrumentos, mas apenas no âmbito
coletivo.
Nesse sentido o art. 621 da CLT está assim redigido:
“As Convenções e os Acordos poderão incluir, entre suas cláusulas, disposição sobre a constituição e funcionamento de comissões mistas de consulta e colaboração, no plano da empresa e sobre participação nos lucros. Estas disposições mencionarão a forma de constituição, o modo de funcionamento e as atribuições das comissões, assim como o plano de participação, quando for o caso.”
Não obstante a existência de tais dispositivos na órbita coletiva, não
se tem notícia de sua implantação no Estado do Espírito Santo, o que acaba
ocasionando a mesma situação dos conflitos individuais, ou seja, a procura pelo
Poder Judiciário.
"41 VALERIANO, S. S. Comissões de Conciliação P révia e Execução de Título Executivo E xtrajudicial n a Justiça do T rabalho p. 18.
legais que vislumbram a tentativa conciliatória, a exemplo dos arts. 764, 835, 846,
850, dentre outros, do referido diploma legal.
No entanto, extrajudicialmente, é a primeira vez que a Consolidação
sofreu modificações no sentido de instituir um procedimento prévio à via judicial.
Não há que se confundir também o teor da Lei 9.958/00 com o
estabelecido no art. 11 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
pois conforme se pode observar “nas empresas de mais de duzentos empregados, é
assegurada a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de
promover-lhes o entendimento direto com os empregadores”.
Observar-se-á que a Lei 9.958/00 não fala em empresa com mais de
200 empregados, ao contrário, não estipula número mínimo de empregados para a
instituição da comissão. A proposta inicial da lei era de que comissões seriam
instituídas em todas as empresas públicas e privadas, inclusive os entes públicos
que contratassem empregados regidos pela CLT, desde que somassem mais de 50
empregados. Num segundo momento se pensou em exigir que a empresa tivesse
íio mínimo 200 empregados, mas a lei foi promulgada sem a exigência de um
número mínimo, e a expressão utilizada pelo legislador pátrio “podem instituir”,
demonstra a sua facultatividade.
Ao contrário do que previu o constituinte originário no artigo em
comento, a lei 9.958/00 instituiu um sistema de conciliação dentro da própria
empresa ou sindicato.
Acerca desse aspecto faz-se fundamental elencar as formas de
instituição das Comissões de Conciliação Prévia, conforme previsto no artigo 625-
A da CLT:
“As empresas e os sindicatos podem instituir Comissões de Conciliação Prévia, de composição paritária, com representante dos empregados e dos empregadores, com a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais do trabalho.
Parágrafo único - As comissões referidas no caput deste artigo poderão ser instituídas por grupos de empresas ou ter caráter intersindical”
Quanto à instituição das Comissões de Conciliação Prévia, a escassa
doutrina a respeito já vem questionando a possibilidade de instituição de tais
comissões apenas pela empresa, sem a participação do sindicato da respectiva
categoria.
A Lei traça critérios para a composição da comissão na empresa ao
mencionar, no art. 625-B da CLT, que a comissão instituída no âmbito da empresa
será composta de, no mínimo, dois e, no máximo, dez membros.
Nesse sentido, SAAD, expõe sua opinião, adotando a seguinte
classificação;
“Três são as espécies de Comissões de Conciliação Prévia: a) de empresa; b) de um grupo de empresas; c) intersindical.
São elas formadas: a) diretamente pelo empresário e seus empregados; b) por meio de acordos coletivos de trabalho; e, c) pelos sindicatos patronal e de trabalhadores, por uma convenção coletiva de trabalho atingindo todas as empresas e seus empregados de uma dada base territorial.”242
O autor acima referido entende ser possível a instituição da comissão
na empresa por deliberação apenas do empregador e dos empregados sem a
participação do sindicato. Para ele, a presença do sindicato na comissão da
empresa se justificará apenas quando da eleição dos representantes dos
empregados, onde fará apenas a fiscalização do pleito, conforme estabelecido pelo
art. 625-B, I da CLT. No mesmo sentido entende MARTINS que: “A Comissão,
no âmbito da empresa, não precisa de negociação coletiva para ser estabelecida.
Melhor que ela tenha um estatuto, que estabeleça qual o prazo de existência da
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Comissão e demais regras aplicáveis” .
Entretanto, VALERIANO entende de forma diversa:
“Para instituir uma Comissão de Conciliação Prévia é necessária a intervenção de pelo menos um sindicato: o sindicato representante da categoria profissional, não havendo necessidade da participação do sindicato da categoria econômica, ou dos empregadores, já que pelo
™ SAAD, E. G. ob. cit. p. 20.
243 MARTINS, Sérgio Pinto. Comissões de Conciliação P révia e Procedim ento Sumaríssimo. São Paulo: LTr, 2000, p. 27.
disposto no art. 625-A a Comissão de Conciliação Prévia pode ser criada apenas no âmbito da empresa.”244
E sintetiza de forma concludente: “Conforme disposto no art, 625-Á
da Consolidação das Leis do Trabalho, não haverá possibilidade de criação de
Comissão de Conciliação prévia diretamente entre os trabalhadores e
empregadores. É imprescindível que pelo menos o sindicato representante dos
empregados participe.”245
A opinião do doutrinador acima citado é mais condizente com a
realidade que permeia a relação entre empregador e empregado, pois a posição do
primeiro é privilegiada, e um ajuste direto entre eles poderia ocasionar uma
submissão dos trabalhadores à vontade da empresa.
Assim, conclui-se que é necessária a participação da entidade
sindical, representativa dos trabalhadores da referida empresa, para que haja uma
maior legitimidade da comissão que se quer instituir.
A facultatividade de instituição de tais comissões força a conclusão
de que somente se as partes envolvidas (empregador e empregado, por meio de
seu sindicato) o desejarem, é que tal instituto será criado, seja, no âmbito da
empresa ou do sindicato, tal desejo deve ser externado por meio de um ajuste
normativo diretamente entre a empresa e o sindicato da categoria (acordo coletivo)
ou entre os sindicatos da categoria profissional e econômica (convenção coletiva).
A Lei 9.958/00 estabelece ainda a possibilidade de criação das
comissões através de um acordo coletivo que envolva várias empresas e o
sindicato da categoria profissional, bem como através de um ajuste intersindical
aglomerando os sindicatos de várias categorias econômicas e profissionais.
Assim, como a comissão instituída para funcionar no âmbito da
empresa, as que funcionarão no âmbito dos sindicatos (patronal ou dos
trabalhadores) deverão submeter-se às normas de funcionamento definidas nos
acordos ou convenções coletivas.
244 VALERIANO,. S. S. Comissões de Conciliação P révia e Execução de Título Executivo E xtrajudicial n a Justiça do Trabalho, p. 18.
não cabível para as comissões instituídas no âmbito da empresa. Como já se
salientou, tal posição pertence àqueles juristas que entendem ser possível o acordo
direto entre empregador e empregados, cujas normas seriam definidas por eles
próprios, sem intervenção sindical.
Cabe repetir que tal situação é inviável, pois não se está falando de
sujeitos que se encontram em pé de igualdade jurídica e econômica, ao contrário,
há uma distância entre empregador e empregado e a presença do sindicato deve
tentar ser o fiel da balança.
O art. 625-B da CLT estabeleceu alguns parâmetros de
funcionamento das comissões no âmbito da empresa, mas deixou em aberto o
procedimento nas comissões existentes nos sindicatos. Certamente o
estabelecimento de tais normas ficará a cargo dos sujeitos envolvidos e serão
externadas pelos instrumentos normativos.
Veja-se o seguinte quadro:
COMISSÕES EM FUNCIONAMENTO NOS SINDICATOS247