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2.4 CATEGORIA, CONTINUUM , PROTÓTIPO

2.4.1 A inter-relação entre categoria, continuum e protótipo

Seguindo a linha de abordagem cognitivo-funcional da gramática e levando-se em consideração o objeto de pesquisa nesta dissertação, expõem-se, nesta subseção, as noções de categoria,

continuum e protótipo apresentadas por Givón (1984; 1995; 2001a).

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Como no funcionalismo linguístico tem-se, como diretriz, a análise da língua em uso, afirmar que uma categoria é discreta, limpa, sem ambiguidades e/ou gradações – em aproximação aos conceitos platônicos, por exemplo, – seria uma atitude equivocada. Ao se definir categoria nesses termos, acaba-se assumindo uma visão de língua idealizada, desvinculada do uso.

Em contrapartida, Givón (2001a) argumenta que, se percebemos a língua em uso, com propósito comunicativo, e o sistema linguístico como (parcialmente) não autônomo, deve-se, consequentemente, assumir uma posição contrária quanto a essa concepção de categoria. Na perspectiva funcionalista, as categorias não são discretas, podendo apresentar ambiguidades e sobreposições, e sendo identificadas a partir de gradações. A partir desta definição, já se pode, aqui, conceituar continuum: as gradações que permeiam determinada categoria, tornando seus limites difusos. Uma categoria não poderia ser pré-definida, rígida, sem possibilidades de alteração. Assim, se o sistema linguístico não é autônomo, ou melhor, é parcialmente autônomo, obviamente, suas formas passam, com o decorrer do tempo, por processos de mudança. A língua é dinâmica, não estática. Nessa perspectiva, uma categoria linguística que hoje funciona de uma dada maneira, no futuro, poderá funcionar de outra.

Mesmo as categorias não sendo discretas (GIVÓN, 1984; 1995; 2001a), é possível identificar, no conjunto de elementos que constituem uma categoria, aquilo que o autor denomina de protótipo. Em termos de Givón, para se definir as propriedades de categorias baseadas em protótipo (prototype-based categories), é necessário que os indivíduos que fazem uso de determinada categoria a reconheçam sem esforço cognitivo. Ou ainda, nas palavras de Givón (2001a, p. 33), ―os membros mais prototípicos da categoria tendem a ser processados automaticamente33‖. Além disso, a natureza híbrida de uma categoria baseada em protótipo, assim como nos organismos biológicos, tende a levar, em um primeiro momento, à identificação não de um protótipo, mas sim de estereótipo, que seria aquele membro de determinada categoria mais socialmente compartilhado. É a partir de um estereótipo e da tendência de processamento automático que se chegará, segundo Givón, ao que se chama de protótipo, o representante central de uma categoria.

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―The more prototypical members of a category tend to processed automatically.‖

O tipo de processamento (automático ou lento) envolvido numa categoria é decorrente da frequência de uso de determinada forma em relação à função comunicativa desempenhada: i.e., uma forma linguística só poderia ser considerada prototípica de uma categoria se observada, em termos de alta frequência, em seu contexto de uso e em função de discriminações feitas ao longo de um continuum. Os membros de uma categoria que se posicionem às margens do continuum (posição essa de extrema ambiguidade, em termos de Givón) levariam mais tempo de processamento cognitivo, tenderiam a ocupar um espaço intercategorial, seriam menos frequentes e, consequentemente, não poderiam ser classificados como protótipos de uma determinada categoria. Já aqueles que se encontram em posição central do

continuum, seriam classificados como protótipos. Esses seriam mais

frequentes e seriam processados automaticamente.

Trazendo esse suporte teórico givoniano a respeito de protótipos ao fenômeno em análise nesta dissertação e antecipando alguns resultados, percebe-se que o SN/Complexo, cuja função sintática desempenhada na oração seja de sujeito, no córpus aqui estipulado, apresenta uma frequência maior da configuração sintática linear [(Esp)+N1+SP]34 (em uma amostra preliminar, por exemplo, essa configuração corresponde a 44,1% em um universo de 395 ocorrências de SN/Complexo) e uma frequência relativamente baixa das outras configurações mais complexas. Fazendo-se uma intersecção entre o que a teoria givoniana propõe e os dados apresentados, poderia se supor ser [(Esp)+N1+SP] a forma prototípica de SN/Complexo.

No entanto, mesmo que a frequência de uso da configuração sintática linear [(Esp)+N1+SP] se apresente relativamente mais alta que as outras configurações, não se pode afirmar com precisão ser esta a forma prototípica da categoria SN/Complexo. São necessários outros testes, como, por exemplo, a observação de critérios morfossintáticos sintático-semântico-discursivos que possam levar a categoria a uma margem ou a outra, ou, ainda, ao meio. Vale dizer que esses dados foram mencionados aqui apenas a título de exemplificação do que seriam as noções expostas por Givón a respeito de categoria, protótipo e

continuum.

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Lê-se por Esp = especificador; N = Núcleo Nominal (nome) e por SP = Sintagma Preposicional. Aqui, não interessa a função sintática do SP. Interessa- nos apenas a existência de um sintagma subordinado ao nome-núcleo do SN, o que poderia caracterizar o SN como complexo. Mais detalhes serão fornecidos no capítulo O sintagma nominal complexo sujeito.

Para ficar claro, cabe frisar que defendemos, nesta pesquisa, ser o SN/Complexo uma categoria, levando-se em consideração o que Givón (2001a, p.12) postula: uma categoria gramatical, em termos de níveis mais abstratos de organização gramatical (em uma abordagem tipológica à gramática), pode ser assim identificada: (i) nomes, verbos, adjetivos; (ii) sintagmas nominais, sintagmas verbais. Nessa perspectiva, com a análise dos dados estipulados para esta dissertação, pretende-se identificar a forma prototípica da categoria SN/Complexo através da observação da frequência de uso de cada contexto analisado.