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A interdisciplinaridade: perspectivas teórico-conceituais e metodológicas

2 CIÊNCIAS AMBIENTAIS E INTERDISCIPLINARIDADE

2.2 A interdisciplinaridade: perspectivas teórico-conceituais e metodológicas

O nosso mundo complexo e interligado apresenta inúmeros problemas também complexos e interligados. Tanto a Ciência quanto a Sociedade reclamam uma compreensão e intervenção integradas. A perspectiva e capacidade explicativa dessa Ciência, hoje compartimentada, já não são suficientes para responder às demandas. É urgente encontrar estratégias que permitam a colaboração em áreas afins (PHILIPPI, 2000)

Para Fazenda (2008), a interdisciplinaridade mais que um conceito é uma atitude de ousadia e busca frente ao conhecimento, cabe pensar aspectos que envolvem a cultura do lugar onde se formam os professores. Tomando a pós-graduação como espaço de formação de professores e passagem obrigatória para inserção no mercado docente junto às instituições de ensino superior, faremos recorrência ao artigo por ela elaborado, que remete à fala de Fourez (2001, apud FAZENDA 2008) que identifica duas formas distintas, porém complementares de conceber a interdisciplinaridade.

A ordenação científica conduz à construção de saberes interdisciplinares. A organização desses saberes está alicerçada no eixo do conhecimento científico do ato de formar professores tal que a organização, a dinâmica, a estruturação hierárquica das disciplinas, a interação dos artefatos que as compõem, a mobilidade conceitual, a comunicação dos saberes nas sequências a serem organizadas devem estar interligados. Essa proposição conduz a busca da cientificidade disciplinar e com ela o surgimento de novas motivações epistemológicas, de novas fronteiras existenciais. Cada disciplina precisa ser analisada além do lugar que ocupa na grade, principalmente o saber que ela contempla o conceito enunciado e o movimento que esse saber engendra, próprio do seu lócus científico.

11 Ecosofia é um neologismo formado pela junção das palavras ecologia e filosofia, ou seja, é um conceito que aproxima atitudes ecológicas e pensamento.

Essa cientificidade que teve origem na disciplina, ganha status de interdisciplina no momento em que obriga o professor a rever suas práticas e a redescobrir seus talentos, no momento em que o movimento da disciplina for incorporado ao seu próprio movimento.

A segunda ordenação é social, busca o desdobramento dos saberes científicos interdisciplinares às exigências sociais, políticas e econômicas. Tal concepção coloca em questão toda a separação entre a construção das ciências e a solicitação das sociedades. No limite, diríamos mais, que esta ordenação tenta captar toda a complexidade que constitui o real e a necessidade de levar em conta as interações que dele são constitutivas. Estuda métodos de análise do mundo, em função das finalidades sociais, enfatiza os impasses vividos pelas disciplinas científicas em suas impossibilidades de sozinhas enfrentarem problemáticas complexas.

Quanto à primeira ordenação, Lenoir (2001, apud FAZENDA, 2008) afirma que a cientificidade aqui revelada estaria em conformidade com a forma de pensar, de uma cultura eminentemente francófona na qual o saber se legitima pela beleza da capacidade de abstração e continua, a segunda ordenação, a social, se aproxima de uma cultura de língua inglesa na qual o sentido da prática - do para que serve - impõe-se como forma de inserção cultural essencial e básica - saber fazer.

Duas formas diferenciadas de conceber o conhecimento e organizar seus currículos de formação de professores. Lenoir (2001, apud FAZENDA, 2008) aponta ainda para o surgimento de uma terceira cultura legítima: a do saber ser. Refere-se a uma maneira brasileira de formar professores. Fundamenta-se na análise de pesquisas sobre interdisciplinaridade na formação de professores brasileiros. Sem excluir as ordenações anteriores ressalta um denominador comum: a busca de um saber ser interdisciplinar. Esta explícita nessa busca a inclusão da experiência docente em seu sentido, intencionalidade e funcionalidade, diferenciando o contexto científico do profissional e do prático.

A evolução da humanidade assim como o desenvolvimento da sociedade e suas interações são eminentemente construídas e constituídas de interdisciplinaridade. Não podemos negar a diversidade, particularidades, complexidades, diferenças, múltiplos conceitos, formas, aspectos, práticas, interação de teorias que compõem o homem e consequentemente a sociedade por ele formada.

O homem, todavia, na sua simplicidade de raciocínio, transformou este complexo conjunto de interações em elementos disciplinares para melhor entender e buscar resolver cenários. Enquanto a complexidade dessa sociedade envolvia pequenas interações espaciais e

interdisciplinares, essa tendência foi útil e criou um bom avanço científico-tecnológico. O próprio desenvolvimento humano, no entanto, gerou novas pressões e interações ambientais que exigem da ciência uma indispensável postura interdisciplinar (PHILLIP JR., 2000).

Está comprovado que os conceitos, teorias, paradigmas induzem ao pensamento bem como ao exercício das práticas da sociedade. É notório também que as práticas sociais ao se padronizarem são incorporadas à cultura, à tecnologia e à ciência enquanto produção de conceito. A busca de uma resposta quer seja na academia ou em outros campos do saber, bem como suas variáveis e aplicações, evidenciam a necessidade de uma revisão ou mudança de paradigmas e dos modos de vida.

Por virtude da etimologia, a palavra interdisciplinaridade traduz esse vínculo não apenas entresaberes, mas, principalmente, de um saber com outro saber, ou dos saberes entre si, numa sorte de complementaridade, de cumplicidade solidária, em função da realidade estudada e conhecida. Nem poderia ser de outra forma, porquanto qualquer conhecimento, o mais abrangente que seja, será sempre parcial, jamais expressando plenamente a verdade do objeto conhecido, muito menos a sua inteireza, amplitude e totalidade.

Interdisciplinar consiste um tema, objeto ou abordagem em que duas ou mais disciplinas intencionalmente estabelecem nexos e vínculos entre si para alcançar um conhecimento mais abrangente, ao mesmo tempo diversificado e unificado. Verifica-se, nesses casos, a busca de um entendimento comum (ou simplesmente partilhado) e o envolvimento direto dos interlocutores. Cada disciplina, ciência ou técnica mantém a sua própria identidade, conserva sua metodologia e observa os limites dos seus respectivos campos. É essencial na interdisciplinaridade que a ciência e o cientista continuem a ser o que são, porém intercambiando hipóteses, elaborações e conclusões (PHILLIP JR., 2000).

Convém destacar um aspecto peculiar ao surgimento da interdisciplinaridade. Ela vem como aspiração, como experimentação, como prática antes da elaboração de seus conceitos, fórmulas, pressupostos, teorias. Ela é exercitada em todos os campos do saber, ainda que não se apercebam seus "praticantes". Ela pressupõe a formação acadêmica, profissional, científica, técnica, pessoal, social, afetiva, familiar entre outros, antes de postular-se uma condição/titulação/classificação/categorização/identificação, o sujeito/homem já traz consigo um arcabouço de conhecimentos/valores adquiridos, vivenciados, experienciados, apreendidos, somatizados, subtraídos. Isto também se aplica à ciência.

A interdisciplinaridade não dilui as disciplinas, ao contrário, mantém sua individualidade. Mas integra as disciplinas a partir da compreensão das múltiplas causas ou

fatores que intervêm sobre a realidade e trabalha todas as linguagens necessárias para a constituição de conhecimentos, comunicação e negociação de significados e registro sistemático dos resultados. A proposta da interdisciplinaridade é estabelecer ligações de complementaridade, convergência, interconexões e passagens entre os conhecimentos. O currículo deve contemplar conteúdos, estratégias de aprendizagem que capacitem o aluno para a vida em sociedade, a atividade produtiva e experiências subjetivas, visando à integração. (FAZENDA, 1999)

A interdisciplinaridade é um processo que precisa ser vivido, reclama atitude interdisciplinar que se caracteriza por ousadia de busca, de pesquisa; transforma a insegurança num exercício de pensar, de construir; respeita o modo de ser de cada um e o caminho que cada um empreende na busca de autonomia; exige a elaboração de um projeto inicial que seja claro e coerente para que as pessoas sintam o desejo de fazer parte dele; pode ser aprendida e ensinada o que pressupõe o fato de perceber-se interdisciplinar (GATTÁS, 2006).

Para Japiassu (1976), a interdisciplinaridade caracteriza-se pela intensidade das trocas entre os especialistas e pelo grau de integração real das disciplinas no interior de um mesmo projeto de pesquisa. A interdisciplinaridade define-se e elabora-se mediante crítica das fronteiras das disciplinas, de sua compartimentalização, proporcionando uma grande esperança de renovação e de mudança no domínio da metodologia das ciências humanas. Trata-se de explorar as fronteiras das disciplinas e as zonas intermediárias entre elas.

Ainda não existe uma teoria unificada sobre a interdisciplinaridade ou uma metodologia consensual sobre a forma de praticá-la, o que se tem na literatura é uma plêiade de recomendações e conceitos. De acordo com Gattás (2006), a adesão a um projeto interdisciplinar carece de transformações, desconstrução e reconstrução do que é apresentado tradicionalmente. Nisso está implícito o processo de aprender a apreender e a conviver. Não deixa de ser um desafio para todos aqueles que se sentem atraídos pela sua prática. Respeito, abertura para o outro, vontade de colaboração, cooperação, tolerância, diálogo, humildade e ousadia são aspectos inerentes a esse processo. A interdisciplinaridade é uma questão de atitude.