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A legislação e a proteção jurídica aplicada

Apesar de não haver norma infraconstitucional que regulamente o adicional ao trabalho penoso, pode-se identificar no ordenamento jurídico brasileiro, mais especificamente no Estado de Santa Catarina e de Minas Gerais, decretos que regulamentam o trabalho penoso, em âmbito estadual, conforme menciona-se a seguir.

Prioste (2008) recorda que o primordial objetivo das normas de proteção ao trabalho, como é o caso do adicional devido aos trabalhadores que exercem suas atividades em condições penosas, é justamente o de defender a integridade física, psíquica e a saúde do trabalhador, uma vez que estes bens da vida não possuem preço, e portanto, não podem ser negligenciados em razão de compensação na remuneração do trabalhador.

Primeiramente, faz-se necessário analisar o que o legislador trouxe no artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, capítulo II, “DOS DIREITOS SOCIAIS”, vejamos:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei; grifo nosso

Na última parte do artigo o legislador indica “na forma da lei” o que sinaliza que a regulamentação desses adicionais, já previstos no dispositivo constitucional, dar-se-á na forma que a lei prever. Portanto, trata-se de norma de eficácia limitada, dependente de outra lei, infraconstitucional para regulamentá-la (BOSKOVIC, 2010).

O mencionado texto constitucional, na hipótese do labor em condições penosas, somente indica o pagamento do adicional para tal atividade. O indicativo citado, e como já referido, é norma constitucional de eficácia limitada, porém, até o momento, não há regulamentação, sequer na Consolidação das Leis do Trabalho (MARQUES, 2007).

Mas isso somente ocorre com o adicional de penosidade, pois os adicionais de periculosidade e insalubridade já estavam contemplados pela Consolidação das Leis do Trabalho, muito antes da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (BOSKOVIC, 2010).

Nessa senda, a Consolidação das Leis do Trabalho, no artigo 189, conceitua as atividades exercidas em condições insalubres:

Art. 189 - Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.

Já o artigo 193, também, da Consolidação das Leis do Trabalho, diz que as atividades realizadas em condições perigosas são:

Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:

I - inflamáveis, explosivos ou energia elétrica. II - roubos ou outras espécies de violência física nas atividades

profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.

Desta forma, as Normas Regulamentadoras aprovadas pela Portaria n. 3.214/79, relacionadas à Medicina e Segurança do Trabalho, foram editadas pelo Ministério do Trabalho na NR 15 a qual estabelece, em seus anexos, quais operações ou atividades são consideradas insalubres e, na NR 16 que estabelece as operações ou atividades consideradas perigosas (BOSKOVIC, 2010).

No entanto, ao contrário das atividades insalubres e perigosas, no que deveria se referir a atividade penosa a legislação é omissa, tanto na Consolidação das Leis do Trabalho quanto em legislação esparsa, não havendo qualquer disposição geral, que possa se aplicar aos trabalhadores, de maneira mais ampla, acerca do trabalho exercido em condições penosas, como também não há Norma Regulamentadora (NR) sobre o tema (BOSKOVIC, 2010).

Boskovic (2010, p. 8826) salienta uma exceção ao que foi exposto até agora:

Excepciona-se desta realidade a Lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Esta categoria bastante específica de trabalhadores faz jus ao adicional de penosidade em uma restrita circunstância fática: o exercício das atividades profissionais em zonas de fronteira ou em condições de vida que o justifique.

Outra exceção, apontada por Boskovic (2010), é a do trabalhador menor de 18 anos, o qual é expressamente proibido que tais indivíduos exerçam atividades em condições penosas, insalubres ou perigosas, dispositivo estabelecido no artigo 67, II, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Ressalta-se que, não se trata de pagamento do adicional e sim de vedação expressa à realização de tais atividades.

Na esfera estadual, mais precisamente, no âmbito da Administração Pública, destaca-se a legislação dos estados catarinense e mineiro, nos quais existe a regulamentação do adicional devido ao trabalhador que exerce suas atividades em condições penosas (BOSKOVIC, 2010).

Em Santa Catarina, conforme destaca Boskovic (2010), observa-se o Decreto N. 4.307, de 28 de fevereiro de 1994, que dispõe acerca dos critérios para a concessão da chamada gratificação, de penosidade, insalubridade e risco de vida. Ressalta-se que o legislador denomina o adicional de remuneração como gratificação e não adicional. Neste caso, a conceituação usada para a atividade penosa está expressa no artigo 1º:

Art. 1º - O servidor público estadual fará jus à gratificação por prestação de serviços em locais penosos, insalubres ou com risco de vida, de acordo com o disposto no art. 36, da Lei Complementar nº 081, de 10 de março de 1993 e nos artigos 10 e 15, da Lei

Complementar nº 93, de 06 de agosto de 1993.

§ 1º - Para efeitos deste Decreto, entende-se: I - por atividades consideradas penosas, o trabalho árduo, difícil,

molesto, trabalhoso, incômodo, doloroso, rude e que exige a atenção constante e vigilância acima do comum;

No artigo 2º, do referido decreto-lei, o legislador se refere a base de cálculo da gratificação de penosidade:

Art. 2º - O valor da gratificação a que se refere o art. 1º será de até 60% (sessenta por cento), tendo por base de cálculo o valor de vencimento equivalente ao coeficiente da referência "A" do nível "9", do Grupo Operacional II - ONO II, constante da Tabela de Unidade de Vencimento, observados os percentuais abaixo enumerados: I - 40% (quarenta por cento) para grau máximo;

II - 30% (trinta por cento) para grau médio; III - 20% (vinte por cento) para grau mínimo.

§ 1º - Para os servidores lotados e com efetivo exercício na Colônia Santana, da Secretaria de Estado da Saúde, e no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, da Secretaria de Estado da Segurança Pública, ficam assegurados os seguintes percentuais: I - 60% (sessenta por cento) para grau máximo;

II - 45% (quarenta e cinco por cento) para grau médio; III - 30% (trinta por cento) para grau mínimo.

Em sentido semelhante, Boskovic (2010, p. 8826), cita o Decreto n. 39.032/1997, do estado de Minas Gerais, por meio do qual, o legislador prevê “o pagamento do adicional de penosidade aos servidores públicos da administração direta, das autarquias e das fundações públicas do Estado sem, contudo, conceitua- la”. Apenas limita-se, nos artigos 1º a 3º, a informar que o referido adicional obedecerá às disposições pelo Ministério Público regulamentadas, e, a vedar a cumulação dos adicionais.

Ângela Márcia Ferreira Petrus (2017, p. 63 e 64, grifos da autora), salienta as seguintes observações do referido Decreto:

a) Impedimento de acumulação de adicionais: diante da exposição do trabalhador a mais de uma das condições de trabalho previstas pelo decreto, este deverá optar pelo adicional correspondente a uma delas, sendo vedada, sob qualquer hipótese, a acumulação; b) Identificação, classificação e caracterização do risco: deverá ser feito laudo pericial contendo os itens: o local de exercício ou a natureza do trabalho realizado; o agente nocivo à saúde ou o identificador do risco; o grau de nocividade ao organismo humano(especificar o limite de tolerância conhecida, quanto ao tempo de exposição ao agente nocivo; a verificação do tempo de exposição aos agentes nocivos); a classificação dos graus de insalubridade e de periculosidade (com os respectivos percentuais aplicáveis ao local ou atividade examinados); e as medidas corretivas necessárias para eliminar ou neutralizar o risco, ou proteger contra os seus efeitos; c) Determinação das Normas Regulamentadoras para identificação do risco: para caracterização das atividades insalubres (NR15), perigosas (NR16) e penosas, as disposições regulamentadas pelo Ministério do Trabalho.

Além dessas observações, o documento, ainda “determina que o pagamento dos adicionais cessa mediante a eliminação dos riscos nas condições de trabalho ou com o afastamento do trabalhador do ambiente que contenha condições de insalubridade, periculosidade ou penosidade.” Muito embora, o Decreto regulamente a obrigação de pagar o adicional de penosidade, o mesmo não traz nenhuma definição a respeito da atividade penosa em sua redação (PETRUS, 2017, p. 64).

Na atual condição do Brasil, no campo do trabalho e, enquanto não é regulamentada a situação do trabalho penoso e do seu respectivo adicional, Prioste (2008 apud PETRUS, 2017, p. 64), entende que o adicional pode ser concedido a partir de uma liberalidade ou meramente estabelecido através de acordos entre patrões e trabalhadores, por ações sindicais, negociações coletivas ou até mesmo, por decisão judicial, firmada jurisprudência pelos Tribunais.

Prioste (2008, p. 233) elenca, a título exemplificativo, perspectivas positivas, que possam surgir, quando da implementação da proteção ao trabalho penoso, como se verifica:

a) a melhora geral da saúde do trabalhador, evitando-se até casos de óbitos relacionados a extrema fadiga[...] depressão e acidentes no trabalho, certo que isso representa benefício também para os empregadores e empresas, pois haverá menos afastamentos do trabalho por motivo de doença; b) melhora na qualidade de vida, o que certamente reverterá em maior disposição para o desempenho das tarefas diárias, e com isso maior produtividade; e c) maior compromisso do empregado – pela satisfação que passa a sentir no ambiente de trabalho – com os objetivos e metas da empresa.

José Martins Catharino (1994 apud MARQUES, 2007, p. 118), classifica as normas de proteção do trabalhador em:

[...] assistencial, preventiva ou higiênica (constituem matéria própria da regulamentação do trabalho) ou compensadora, retributiva (com outros aspectos jurídicos, tais como: redução de horário de trabalho, com aumento indireto deste; imposição do pagamento de uma compensação, porém ainda sujeito ao risco).

O legislador estabeleceu nas normas trabalhistas medidas de proteção especiais em variadas atividades, com fundamento no art. 200 da Consolidação das Leis do Trabalho, sendo que, cabe ao Ministério do Trabalho e Emprego estabelecer outros critérios (MARQUES, 2007).

Ressalta-se que, com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o legislador procurou elevar e garantir a proteção à saúde do trabalhador, a nível constitucional, conforme prevê o art. 7º, inciso XXII, quando proferiu o dever de redução dos riscos através de normas de segurança, saúde e higiene (MARQUES, 2007).

Quanto aos equipamentos de proteção individual, que são entregues pelos empregadores para os trabalhadores, a empresa é responsável pelo monitoramento do uso, além disso, deve guardar os recibos de entrega, com a assinatura do trabalhador. Podendo, diante do não uso ou negligência, o trabalhador ser punido com advertência e/ou demissão por justo motivo. Cabe a Delegacia Regional do Trabalho e ao Ministério do Trabalho e Emprego fiscalizar o que tenha pertinência aos riscos e prevenção de acidentes de trabalho, como também, o cumprimento da legislação protetiva (MARQUES, 2007).

Desta forma, poucas são as categorias profissionais que possuem legislação própria que regulamente o adicional ou, como é denominado no estado de Santa Catarina, gratificação de penosidade. Ficando, o restante dos trabalhadores, sem respaldo legal, infraconstitucional, portanto, sem qualquer eficácia ao dispositivo constitucionalmente garantido.

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