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A música no ensino fundamental: concepções da SEDUC

4 PRÁTICA PEDAGÓGICA, FORMAÇÃO DE PROFESSORES E POLÍTICAS

5.1 A música nos anos finais do ensino fundamental da rede pública municipal de

5.1.1 A música no ensino fundamental: concepções da SEDUC

O papel da música na educação básica foi objeto de discussão nas várias instâncias da rede pública de educação do município de Petrolina–PE durante a realização desta pesquisa. Uma das discussões englobou a entrega e apresentação do projeto de pesquisa na secretaria de educação do município, onde nos deparamos com questionamentos e concepções específicas sobre a área de música. As gestoras, após a leitura do projeto, estabeleceram uma compreensão

própria de que esta pesquisa buscava verificar aulas que trabalhassem conteúdos específicos de música e outras especificidades dessa área, tais como aprendizado de instrumentos musicais, notação de partitura e teoria musical. Esse entendimento ocorreu devido à problemática que emerge da compreensão das aulas de música no ensino básico do município, uma vez que essa área artística não possui caráter curricular nos anos finais do ensino fundamental das escolas públicas da rede. Apesar dos Descritores de Arte contemplarem um leque variado de conteúdos musicais, esses conteúdos pedagógicos não estavam sendo considerados como uma forma de oportunizar o processo de ensino e aprendizagem na área de música na rede pública de ensino do município.

Sob esse aspecto, Silva (2009, p. 02) reforça que “[...] padrões culturais exercem papel significativo na constituição do ser humano e interferem no desenvolvimento do pensamento e do raciocínio orientador de suas condutas”. Dessa forma, “o contato dos agentes com as instituições modernas faz com que tenham outras referências culturais; todavia, essas relações não são suficientemente consolidadas no universo simbólico social para serem permanentemente recuperadas no cotidiano” (SILVA, 2009, p. 12).

Apesar da existência de uma prática pedagógica musical na rede, baseada em conteúdos da área de música dentro da disciplina de arte nos anos finais do ensino fundamental – além das atividades de projetos extracurriculares musicais –, a correlação dessas atividades com outras referências culturais tradicionais mitigaram a compreensão das gestoras da secretaria de educação de que havia, de fato, aulas de música, mesmo não aparentadas com aulas que visem um aprendizado de instrumentos musicais ou leitura de partitura. Dessa maneira, o pensar das aulas de música sob o aspecto do aprendizado de instrumentos para uma prática coletiva específica é, em certa medida, reproduzida no discurso das gestoras. Talvez essa questão se explique pela tradição que as escolas municipais de Petrolina–PE, tanto públicas como particulares, fomentam: a existência de bandas marciais em seus espaços – formadas basicamente por instrumentos de percussão e metais –, as quais desfilam em evento comemorativo no dia 21 de setembro, data do aniversário da cidade.

A manutenção desses agrupamentos instrumentais pode dar a impressão às gestoras de que esta seja a única maneira de se trabalhar música nas escolas, reforçando o que Couto e Santos (2009) falam sobre a falta de tradição do que é ensinar música nas escolas do Brasil. Na opinião da autora e do autor, há uma “[...] falta de compreensão sobre o que é educação musical, o quê ela aborda e como o faz” sendo uma das principais “[...] causas da dificuldade que se tem em justificar sua presença na educação formal básica do indivíduo” (COUTO; SANTOS, 2009, p. 111, grifo dos autores). Dessa forma, aprender e ensinar a tocar um instrumento musical é

tomado como o modelo de ensino de música, enfatizando o domínio da leitura musical e técnica instrumental, objetivando descobrir dentre os alunos novos virtuoses, em conformidade com o pensamento de Penna (2007, p. 51, grifo nosso). São ignoradas as demais educações musicais possíveis, gerando a reprodução de modelos advindos do ensino específico de música em ambientes tais como os conservatórios musicais.

Uma possível ausência da música nas escolas públicas denota o valor que a área possui diante o currículo. A prevalência conceitual de que o intelectualismo está ligado a conteúdos que valorizem o racional e o lógico, em contrapartida ao subjetivo e afetivo, faz das artes e da música um componente curricular associado ao lúdico, cuja função seria dar suporte aos demais conteúdos (COUTO; SANTOS, 2009, p. 114). Logo, o aprendizado de instrumentos, dentre as práticas educativas musicais, obedeceria aos padrões estabelecidos pelos valores, pois “para uma sociedade que não possui uma tradição no ensino musical escolar, a concepção acerca do que seria uma educação musical quase sempre se restringe à ideia da prática musical que ocorre em escolas especializadas” (COUTO; SANTOS, 2009, p. 121).

Na análise de Silva (2009, p. 03), “[...] os padrões culturais não são imutáveis, mas têm determinadas continuidades e permanências em seu processo de transformação”. Portanto,

[...] a crença incondicional que a instituição do processo de municipalização do ensino reverta determinados elementos culturais enraizados não se concretiza na realidade; pelo contrário, a municipalização tende a reforçar as relações engendradas no universo simbólico dos agentes e, em determinados contextos sociais, a dificultar a construção de práticas mais democráticas (SILVA, 2009, p. 03).

Verificamos no depoimento de uma gestora um exemplo das permanências desses padrões culturais relativos à prática pedagógica musical. Ela exemplificou um trabalho desenvolvido por uma professora tutora da rede, que buscou trabalhar aspectos da alfabetização com alunos do ensino de jovens e adultos a partir das canções de um compositor regional. Mesmo que essa atividade apresentasse contextualizações, atividades interdisciplinares e aspectos da cultura regional dos grupos sociais envolvidos, a gestora acredita que elas não possuem relação com o “verdadeiro” ensino de música. Ou seja, a caracterização da prática pedagógica musical não estaria em sua integralidade, de acordo com os conteúdos musicais tradicionais que objetivam o desenvolvimento de habilidades musicais específicas, geralmente ligadas ao aprendizado de instrumentos musicais. Nesse sentido, pouco se avança na municipalização do ensino quando os sujeitos da prática pedagógica, através da ação coletiva institucional, reiteram esses padrões.

Portanto, essa conduta e pensamento sobre a tradição do ensino musical se revelam ao manifestar a preocupação com a possível ausência de aulas de música. Nesse contexto, as aulas de música se firmariam através da instrução de teoria musical, do aprendizado de instrumentos e da manutenção de grupos instrumentais. Relega-se a um segundo plano outras práticas, que não necessariamente estão atreladas às mesmas estruturas tradicionais sedimentadas no universo simbólico dos agentes e gestores.

Por outro lado, essa compreensão não foi identificada na escola onde se realizou o aprofundamento desta pesquisa, verificada nas falas das entrevistadas. Dessa maneira, denota- se uma heterogenia de olhares para os elementos culturais ligados ao ensino de música no campo estudado, o que permitiu a realização de uma reflexão crítica acerca do papel da escola na formação dos indivíduos.

5.1.2 A música no currículo dos anos finais do ensino fundamental na rede pública de ensino