• Nenhum resultado encontrado

A matematização aplicada à resolução de problemas da vida real

3. REVISÃO DE LITERATURA E CONTEXTUALIZAÇÃO DO ENSINO

3.5. O estudo PISA

3.5.5. Domínio da Matemática

3.5.5.2. A matematização aplicada à resolução de problemas da vida real

Relativamente ao estudo PISA 2003, no âmbito da Matemática, optámos por realçar as diferenças em relação ao primeiro ciclo do PISA e por clarificar alguns dos conceitos abordados, uma vez que o enquadramento conceptual que presidiu à elaboração dos itens de matemática aí incluídos baseou-se no esquema teórico do PISA 2000, tendo sido introduzidas

apenas ligeiras alterações (OECD, 2003). Neste estudo o processo fundamental que os alunos aplicam para resolver problemas da vida real é referido como matematização e é descrito em cinco passos, apresentados na tabela 3.6 (ME-GAVE, 2004, p. 16).

Contudo, recolher informação sobre a capacidade para matematizar situações complexas do mundo quotidiano em que os cinco passos estejam evidentes não é objectivo do PISA 2003 dado que se tornaria impraticável. Porém, considera-se que todos os alunos com 15 anos de idade deveriam compreender os aspectos matemáticos necessários para a resolução de problemas com tal complexidade.

Tabela 3.6 – Matematização no PISA (adaptado de ME-GAVE, 2004, p. 4) OS CINCO ASPECTOS DA MATEMATIZAÇÃO

1. Partir de um problema situado na realidade;

2. Organizá-lo de acordo com conceitos matemáticos e identificar a matemática relevante; 3. Clarificar gradualmente a realidade, através de processos tais como colocar hipóteses,

generalizar e formalizar, os quais põem em evidência as características matemáticas da situação e transformam o problema do mundo real num problema matemático que representa fielmente a situação;

4. Resolver o problema matemático;

5. Validar a solução matemática em termos da situação real, incluindo a identificação das

limitações da solução.

Consequentemente, os itens criados pelos especialistas destinados a avaliar se os alunos conseguem fazer uso do conhecimento matemático que foram acumulando e das competências que foram sendo desenvolvidas ao longo dos anos (até aos 15 anos de idade), pretendem avaliar o desempenho dos estudante em diferentes partes do processo de matematização, através das respostas por eles apresentadas aos problemas matemáticos que encontram no seu mundo quotidiano. Aliás, aquando da resolução de problemas, os cinco passos do processo matematização poderão ser abordados em três etapas como se pode observar na figura 3.2. Neste ciclo, a primeira etapa implica a tradução do problema, da realidade para a matemática; em seguida o processo poderá prosseguir no âmbito da matemática e por último, o processo de matematização passa de uma solução matemática para uma solução real e esta é relacionada com o problema inicial (ME-GAVE, 2004). Contudo, ao criar os itens foi seguida uma determinada estratégia de modo a que uma amostra desses itens

cobrisse os cinco aspectos de matematização. “O objectivo é, a partir das respostas a esses itens, localizar cada um dos alunos numa escala de proficiência matemática criada pelo PISA.” (ME-GAVE, 2004, p. 6).

Figura 3.2 – O ciclo da matematização (adaptado de ME-GAVE, 2004, p. 16)

A base teórica para o enquadramento conceptual da matemática no PISA que conduziu ao perfil da matematização traçado é descrita em seguida. Aliás a operacionalização da definição de literacia matemática (em particular a descrição da estratégia utilizada para criar um conjunto específico de itens como atrás referido) passou obviamente pela organização do domínio da matemática avaliado, tendo sido identificadas três componentes com naturezas diferentes: situações ou contextos; conteúdo matemático e competências (figura 3.3).

De acordo com o estudo PISA, a “situação” é a parte do mundo do aluno em que se encontra a tarefa. O “contexto” de um item é o seu enquadramento mais específico dentro de uma situação e contém todos os elementos usados aquando da formulação do problema. As situações ou contextos em que os problemas são apresentados são relevantes para a vida do estudante e definem áreas de problemas do mundo real. Por outras palavras, os problemas (e a sua solução) ocorrem numa variedade de situações ou contextos e são baseados na experiência de vida do indivíduo. As questões são classificadas em quatro situações-tipo: “vida privada”, “vida escolar” e de “lazer”, “vida pública e ainda científica”, que diferem em termos de distância das mesmas em relação às vidas dos indivíduos. Procura-se que, preferencialmente, os problemas apresentados, em cada situação da vida real, estejam baseados num contexto específico e autêntico para o uso da matemática (contexto “extramatemático” que tem de ser

MUNDO MATEMÁTICO Problema matemático Solução matemática Solução real 1, 2, 3 5 4 5 Problema do Mundo real

MUNDO REAL MUNDO MATEMÁTICO

Problema matemático Problema matemático Solução matemática Solução matemática Solução real Solução real 1, 2, 3 5 4 5 Problema do Mundo real Problema do Mundo real MUNDO REAL

traduzido pelo aluno para uma forma matemática), que influencia a solução e a interpretação da solução. No entanto, são também incluídas, em número limitado, tarefas classificadas como situação-tipo “científica”, as quais estão mais afastadas do mundo do estudante, referem-se a objectos, estruturas ou símbolos matemáticos e não fazem nenhuma alusão a assuntos exteriores ao mundo matemático. Neste caso, o seu contexto é considerado “intramatemático” uma vez que a ligação entre problema e a matemática subjacente é tornada explícita no contexto do problema. Neste estudo faz-se ainda referência a contextos hipotéticos, mas que apresentem alguns elementos reais e não se afastem muito de uma situação do mundo real.

Figura 3.3 – As três componentes que definem o domínio da Matemática no PISA

Na figura 3.3 as setas que ligam o “contexto” e o “conteúdo ao problema” mostram como no mundo real, envolvendo a matemática, surgem problemas (passíveis de tratamento matemático).

Neste sentido, outra componente a ter em conta quando se pensa em literacia matemática é o “conteúdo” matemático que se tem de evocar para resolver cada um dos problemas (figura 3.3). Sendo objectivo do estudo PISA 2003 (ME-GAVE, 2004) avaliar a capacidade dos jovens resolverem problemas do mundo real, e dado que tais problemas mobilizam frequentemente mais do que uma área da matemática, foi adoptada uma abordagem em que a ênfase está na organização fenomenológica do conteúdo matemático a ser avaliado – o conteúdo é descrito em relação aos fenómenos e aos tipos de problemas para

 Quantidade;  Espaço e forma;  Mudança e relações;  Incerteza. CONTEÚDO Ideias abrangentes Situações CONTEXTO PROBLEMA E SOLUÇÃO Formato do Problema CONSTELAÇÕES DE COMPETÊNCIAS Processo Competências  Vida privada;  Vida escolar e de lazer;  Vida pública;  Científica.  Constelação Reprodução;  Constelação Conexão;  Constelação Reflexão.  Quantidade;  Espaço e forma;  Mudança e relações;  Incerteza. CONTEÚDO Ideias abrangentes Situações CONTEXTO PROBLEMA E SOLUÇÃO Formato do Problema CONSTELAÇÕES DE COMPETÊNCIAS Processo Competências  Vida privada;  Vida escolar e de lazer;  Vida pública;  Científica.

 Constelação Reprodução;  Constelação Conexão;  Constelação Reflexão.

os quais foi criado – é consistente com a definição de domínio e cobre o que encontramos no currículo nacional de Matemática. Recorde-se que “os conceitos, estruturas e ideias matemáticas foram inventados como instrumentos para organizar os fenómenos do mundo natural, social e mental” e, nas escolas, o currículo Matemático tem sido organizado tipicamente em redor de linhas de conteúdo – aritmética, álgebra, geometria, etc. – e dos seus tópicos, espelhando historicamente ramos desta ciência que por sua vez facilitam o desenvolvimento de syllabus de ensino, ainda que, no mundo real, os fenómenos próprios de tratamento matemático não apareçam organizados de forma tão lógica (ME-GAVE, 2004, p. 11). Assim, no estudo PISA 2003, o conteúdo matemático enfatiza temas amplos e organiza- se nas quatro categorias – quantidade, espaço e forma, mudança e relações, incerteza – anteriormente referidas, as quais envolvem naturalmente os tipos de problemas que surgem na interacção com fenómenos quotidianos, e conceitos que fazem sentido e que podem ser encontrados em imensas situações, transversalmente a todas elas. Acresce dizer que no âmbito do enquadramento conceptual deste estudo as categorias fenomenológicas dos problemas adoptadas são designadas por ideias abrangentes que “reflectem a forma como olhamos para o mundo com óculos matemáticos.” (ME-GAVE, 2004, p. 8) não podendo ser completamente demarcadas umas das outras.