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3. REVISÃO DE LITERATURA E CONTEXTUALIZAÇÃO DO ENSINO

3.2. O currículo de Matemática desde os anos 50 do século XX e a integração da

3.2.4. Os anos 80 e a renovação curricular

Em 1980 as experiências que estavam a ser realizadas cessaram após os resultados das eleições legislativas (Matos, 1989). Por conseguinte, anteriores programas com pequenos reajustes (principalmente com o objectivo de diminuir a sua extensão), mantiveram-se em vigor desde o início dos anos 70 até à nova reforma – a reforma de Roberto Carneiro – concebida nos anos 80 e posta em prática a partir do ano lectivo 1989/90.

Houve um importante movimento de reforma no ensino da Matemática a nível internacional na década de 80 (Porfírio, 1998). O seu início ficou marcado pela publicação do documento “An Agenda for Action: recommendations for school mathematics of the 1980s”, pela “National Council of Teachers of Mathematics – NCTM”, nos Estados Unidos da América. Esta Agenda para a Acção, para além de atribuir um papel fundamental à resolução de problemas no ensino da Matemática, realça a importância do desenvolvimento da capacidade de realização das operações fundamentais, da utilização do computador e da utilização de aplicações ligadas à realidade como caminho para a aprendizagem (NCTM, 1980). Em 1980 realizou-se uma conferência internacional intitulada “Comparative Studies of

Mathematics Curricula – Change and Stability 1960-1980”, em Ohrbeck, RFA, onde foi feita a revisão mais extensiva dos currículos de matemática até à data (Steiner, 1980). Seguiu-se a publicação do relatório “Mathematics counts” de Cockcroft (1982), o qual se tornou uma influência fundamental no currículo oficial inglês; comprovou as orientações de um projecto de desenvolvimento curricular que surgiu no fim da década de 70, promovido pela “Schools Council”, onde a Estatística era principalmente considerada como “trabalho com dados” (Ponte e Fonseca, 2001a). É ainda de destacar a publicação da obra “Curriculum and evaluation standards for school mathematics”5 em 1989, propondo uma alteração nos métodos

e nos conteúdos dos currículos de matemática vigentes nos EUA. [veja-se a tradução portuguesa – NCTM (1994)].

Em Portugal, nessa mesma década, à semelhança do que se passava a nível internacional, gerou-se também um movimento que pretendia uma renovação curricular e mudança no ensino. Realizaram-se diversos encontros sobre o ensino da Matemática, dos quais destacamos pela sua grande importância: em 1980, o primeiro encontro nacional da Sociedade Portuguesa de Matemática6, onde foram analisados os programas de Matemática em vigor, em algumas das comunicações apresentadas (Matos et al., 1981); em 1982, o colóquio de homenagem ao Professor José Sebastião e Silva, onde várias das intervenções incidiram sobre aspectos curriculares, resolução de problemas e formação de professores (SPM, 1982) e em 1985, o primeiro encontro ProfMat, tendo sido abordado o ensino da Matemática e a utilização de computadores (Fernandes et al, 1985). Seguiram-se os trabalhos preparatórios da criação da Associação de Professores de Matemática7 com a formação de vários grupos de trabalho (Guimarães, 1986), um dos quais sobre programas.

Em 1986 foi aprovada a nova Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, alterada posteriormente pela Lei n.º 115/97, de 19 de Setembro).

A par da temática renovação curricular e mudança no ensino da Matemática, outros temas como: (i) problemas da aprendizagem em Matemática, (ii) computadores e Logo no

5 Publicada pelo NCTM e muitas vezes designada, abreviadamente, por STANDARDS.

6 A Sociedade Portuguesa de Matemática, SPM, foi constituída em 1940 (SPM, 1941) e relançada em 1977

(Matos et al., 1981).

7 A Associação de Professores de Matemática, APM, foi fundada em Setembro de 1986, durante o segundo

ensino da Matemática e Estatística, foram alvo de várias intervenções no encontro ProfMat realizado em Portalegre, em 1986 (Ponte, 1986). No ano seguinte, no ProfMat em Bragança, as comunicações apresentadas e as sessões práticas realizadas incidiram essencialmente nos temas mais abordados no ano anterior, atrás referido, aos quais foi acrescentado o tema “Estatística e Probabilidades no Ensino Básico”. É também de realçar que, o tema “renovação dos currículos de Matemática” foi considerado prioritário em 1988.

Ainda em 1986, o Departamento dos Ensinos Básico e Secundário – DEBS – do Ministério da Educação, tendo como Ministro da Educação Roberto Carneiro, constituiu um grupo de trabalho, coordenado pelo Professor Doutor Fraústo da Silva, que ficou incumbido de produzir uma proposta de reorganização dos planos curriculares do Ensino Básico e secundário, com vista à posterior elaboração de propostas programáticas específicas para as diferentes áreas disciplinares, por equipas a escolher por este grupo. Em 1987, foi divulgado o documento “Proposta de reorganização dos planos curriculares dos ensinos básico e secundário” que recomenda uma maior ênfase no cálculo para os primeiros anos de escolaridade e uma valorização do operacional em detrimento do conceptual (Silva et al., 1987, p. 104).

Em 1988, a APM promove e organiza um seminário sobre a renovação do currículo de Matemática, que se realizou em Vila Nova de Milfontes. O grupo de trabalho convidado pela APM, constituído por vinte e cinco professores de todos os níveis de ensino e por investigadores, discutiu, durante quatro dias, vários problemas essenciais referentes ao objecto do seminário e elaborou o documento “Renovação do Currículo de Matemática”, posteriormente editado pela APM, onde foram traçadas o que considera serem as principais orientações curriculares dos anos 80 (APM, 1988) a saber:

(i) o ensino da Matemática deve orientar-se para valorizar os objectivos que são relativos à capacidade de resolver problemas e de raciocinar e comunicar matematicamente, e ao desenvolvimento de atitudes positivas nos alunos face à matemática;

(ii) o programa e o manual não devem ser vistos como uma sequência de conteúdos para transmitir aos alunos, mas sim como instrumentos de trabalho orientadores das tarefas matemáticas a serem realizadas;

(iii) o elemento central da renovação do ensino da Matemática deve ser a mudança da natureza das actividades principais na sala de aula, na perspectiva de valorização das actividades de resolução de problemas, de investigação e de aplicação da matemática a situações da vida real que impliquem pensamento matemático e comunicação por parte dos alunos;

(iv) o professor desempenha o papel principal na renovação do ensino da Matemática e, por isso, deve ser dada prioridade à sua formação;

(v) as condições na escola devem ser consistentes com as orientações curriculares.

Destas recomendações curriculares destacam-se a importância central a conferir à resolução de problemas e a possibilidade de utilização de tecnologias – calculadoras e computadores – no processo de ensino/aprendizagem. Também se defende que os currículos devem dar relevo aos temas: matemática discreta, estatística e probabilidades. Considera-se, ainda, que os resultados da investigação matemática acerca de processos de aprendizagem devem influir no modo como se organiza o trabalho com os alunos. Deste modo, deve ter-se em atenção que se o ensino for fortemente orientado para a resolução repetitiva de exercícios, os alunos aprenderão um determinado número de técnicas que lhes irão permitir resolver essencialmente exercícios-tipo, e será essa a imagem com que eles ficarão da Matemática (Porfírio, 1998). Por fim, é de salientar que devem ser criados ambientes de aprendizagem que sejam significativos para os alunos. No entanto, nos finais dos anos 80, estas tendências para a renovação curricular contrastavam fortemente com os programas que estavam em vigor.