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A microestrutura do artigo de opinião: os operadores argumentativos

1 A FERRAMENTA COMPUTACIONAL DLNOTES2 E AS RELAÇÕES ENTRE

2.2 A MICROESTRUTURA E A MACROESTRUTURA DO GÊNERO ARTIGO DE

2.2.3 A microestrutura do artigo de opinião: os operadores argumentativos

Na microestrutura do gênero artigo de opinião há recorrência de alguns elementos linguísticos que marcam as intenções argumentativas do produtor, como o uso de verbos no presente do indicativo, como forma de expressão permanente do tema, de teor polêmico em dada cena discursiva; auxiliares modais (poder, querer, dever); predicados cristalizados (é certo, é preciso, é necessário); modalizadores (expressam um estado psicológico diante de um fato ou ponto de vista, por exemplo, o advérbio “certamente”); seleção lexical; operadores argumentativos; entre outros (ANTUNES, 2010; PESSOA, 2002). Nesta pesquisa, será dado enfoque ao emprego dos operadores argumentativos e à relação deles com os tipos de argumentos na construção do discurso persuasivo.

Segundo Antunes (2010), os operadores (ou conectores) argumentativos estabelecem a função gramatical de ligar orações, períodos e frases. No entanto, a autora ressalta que esses elementos, além da função conectiva, fundam-se “nas relações semânticas e nas pretensões argumentativas que elas estabelecem entre os seguimentos textuais” (ANTUNES, 2010, p. 136). Ou seja, ao mesmo tempo em

que ligam as sentenças, os operadores argumentativos são recursos linguísticos capazes de explicitar as relações de sentido entre as proposições, indicando o caminho da argumentação. Conforme explica Antunes (2010, p. 137):

os conectores argumentativos cumprem a função de expressar a orientação argumentativa dos enunciados, conforme seja pretendido exprimir uma oposição, uma concessão, um contra-argumento, uma explicação, uma justificativa, uma hipótese, o acréscimo de um argumento, entre outros. São fundamentais na interpretação dos textos, sobretudo naqueles gêneros que têm propósitos eminentemente argumentativos ou persuasivos [...]. [grifo nosso].

Nesse sentido, Cain e Nash (2011) afirmam que a compreensão do texto pressupõe uma representação coerente de seu significado e, para estabelecer essa coerência, o leitor precisa relacionar os diferentes eventos no texto. De acordo com os autores, os conectivos, desde que os leitores compreendam os seus significados, podem auxiliar nesse processo, apontando a direção das conexões estabelecidas. Essas relações de coerência são expressas por diferentes grupos de conectivos, direcionando o encadeamento entre as informações. Ainda, ao realizarem um estudo sobre a influência dos conectivos para compreensão do texto por jovens leitores, os autores asseguram que “a interpretação e uso de conectivos durante a leitura são cruciais para a construção de um modelo de situação coerente de um texto, a marca da compreensão bem sucedida11” (CAIN; NASH, 2011, p. 30, tradução nossa).

Apesar na ampla classificação e discussão na literatura sobre a função operadores argumentativos, com fins metodológicos, no Quadro 2 é apresentada a classificação dos operadores argumentativos de Antunes (2010), com a descrição do tipo de marcador e o valor semântico. O quadro elaborado pela autora apresenta uma versão condensada dos usos dos operadores, e possível de ser aplicada didaticamente.

“The interpretation and use of connectives when reading is crucial to the construction of a coherent 11

Quadro 2 – Operadores argumentativos Expressões conectivas do tipo

argumentativo

Valores semânticos em primeiro lugar, primeiramente,

notadamente, antes de mais nada, antes de tudo, acima de tudo, em particular,

principalmente, sobretudo, prioritariamente

Prioridade ou relevância

Ex.: “Em primeiro lugar, é preciso ter algum

dinheiro para investir se você quiser se tornar um investidor. Por isso, junte dinheiro por um tempo e tenha ciência que ele não poderá ser gasto, não pelo menos enquanto estiver investido.”

mais... (do) que, menos... (do) que, tão... quanto

Comparação

Ex.: “Em 15 anos, capital paulista terá mais velhos

do que jovens; atual geral de idosos é mais ativa do que anteriores”. (FAGUNDEZ, 2015).

assim, desse modo, portanto, dessa forma, dessa maneira; isto é, quer dizer, a saber, por exemplo, pois, que

Confirmação, ilustração, justificação

Ex.: Projeto de regulamentação do UBER: “Para o

Poder Executivo o projeto é bom, pois reforça a visão de que esse tipo de serviço é uma concessão pública, que precisa ser organizado e poderá gerar receita, por meio das diversas taxas que serão impostas. Para as empresas, os desafios organizacionais serão maiores, pois terão de lidar com diferentes legislações municipais”

(FIORAVANTI, 2017). E, ainda, assim como, até, além do mais,

além de tudo, até, não só (...) mas também, não apenas (...) mas ainda, enfim, nem

Acréscimo de um dado novo, de um argumento, adição, enumeração de itens

Ex.: “O acesso à rede de água e esgoto traz mais

dignidade para a vida das pessoas, além de gerar uma série de avanços econômicos e sociais para o país” (FOLHA DE SÃO PAULO, 2015).

ou, seja Alternância ou disjunção (podendo ser inclusiva exclusiva)

Ex.: “Quando uma universidade tem paúra de

constituir, consolidar e promover sua comunicação jornalística própria, das duas uma: ou está sonegando da sociedade a riqueza de sua vida intelectual, livre e sem receio do ‘perigoso’ contraditório, ou na verdade está paralisada pelo medo, a intolerância e a mediocridade (se não estiver já melancolicamente morta por dentro).”

(MUNIZ, 2018). de fato, na verdade, na realidade, com efeito,

efetivamente, afinal, com certeza

Confirmação, admissão

Ex.: “Ainda hoje é bastante comum a prática

escolar de se tratar isoladamente a leitura, a escrita e a gramática, como se essas fossem instâncias que pouco dialogam. Nessa perspectiva, a escola tem conferido à leitura e à escrita um tratamento cada vez mais distanciado do que, de fato, são essas atividades, socialmente”. (LIMA, 2016)

mas, porém, contudo, no entanto, entretanto, por outro lado, em compensação, enquanto que, ao passo que

Oposição, contraste, restrição

Ex.: “A vida do imigrante na Inglaterra não é fácil. A

maioria mora em residências pequenas e frequentemente é lembrada de que ele é imigrante, não cidadão nacional. O país é organizado, a violência urbana é quase nula, o povo é educado, as coisas funcionam e há muito que admirar na Inglaterra. Mas o imigrante é sempre um estrangeiro e, mais adiante, muitos podem ser instados a deixar o país” (MARTINS, 2012).

porque, como, pois, porquanto, por causa de, em virtude de, uma vez que, em vista de, dado que, desde que, visto como

Causalidade

Ex.: “A principal causa crises de depressão na

universidade é a mudança da adolescência para a vida adulta, que ocorre bem na fase em que o jovem está na graduação. Por causa das cobranças, o estudante se sente pressionado e confuso e o resultado é a falta de motivação para estudar, dificuldade de concentração, baixo desempenho acadêmico, reprovação, trancamento de disciplinas e, na pior das hipóteses, evasão”

(SIMAS, 2012). de modo que, de maneira que, de sorte que,

de forma que, a tal ponto que, por conseguinte, por essa razão, por esse motivo, por isso, consequentemente, em consequência disso, com isso

Consequência

Ex.: “O voto é um direito do cidadão, e não um

dever. Sua obrigatoriedade revela uma faceta autoritária da política brasileira e torna a ida às urnas um mero cumprimento das leis, e não um ato de consciência. Por essa razão, os candidatos sentem-se menos comprometidos com o eleitor. Essa é a posição da Folha”. (Folha de S. Paulo,

2014). a fim de que, para que, com o propósito de,

com a pretensão de, com a intenção de, com o objetivo de, com a finalidade de, com o intuito de

Finalidade

Ex.: “A população negra foi escravizada no Brasil

por muito tempo e a escravatura abolida há pouco (em termos históricos). O Estado também não concedeu políticas a fim de dar oportunidades mínimas de sobrevivência – moradia e emprego – a essa população” (MERELES, 2016).

Embora, conquanto, ainda que, apesar de que, ainda assim, mesmo que, a despeito de, não obstante, malgrado, em que pese, se bem que, por mais que, por muito que

Concessão

Ex.: “Emigrar para Londres, cidade glamourosa e centro importante da história mundial, e lá viver é o sonho dourado de muitos. Mas, quando se tornam reais, os sonhos revelam seus espinhos. A Inglaterra, apesar das vantagens, apresenta vários problemas para o imigrante” (SIMAS, 2012).

Fonte: adaptado de Antunes (2010, p. 138-139).

Com a classificação desses diferentes grupos, os quais farão parte da ontologia para leitura dos processos argumentativos no gênero artigo de opinião, espera-se que a anotação dos conectivos na ferramenta computacional DLNotes2 contribua para compreensão do gênero ao estabelecer uma relação entre os

operadores argumentativos e os tipos de argumentos no texto, quais são os operadores mais recorrentes para cada tipo de argumento e como essas relações auxiliam na compreensão das relações de sentido estabelecidas entre as partes textuais. Durante a prática de leitura e anotação, nas atividades aplicadas no curso sobre argumentação, espera-se que os participantes consigam relacionar o operador argumentativo ao tipo de argumento, por exemplo, ao identificarem um operador de causalidade, reconheçam a relação de sentido expressão por esse operador; o contrário também pode ocorrer, por exemplo, ao reconhecerem um argumento de exemplificação, identifiquem o operador que insere e articula esse tipo de argumento com os demais no texto.

2.3 ONTOLOGIA PARA O GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO NA FERRAMENTA