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1 A FERRAMENTA COMPUTACIONAL DLNOTES2 E AS RELAÇÕES ENTRE

2.1 ARGUMENTAÇÃO NA NOVA RETÓRICA

2.1.1 As premissas da argumentação

Na construção dos argumentos, os quais serão descritos no item 2.2.2 deste capítulo, há raciocínios que são aceitos como ponto de partida, assim, os parceiros de uma discussão iniciam de uma ideia em comum para defender teses opostas. O desenvolvimento e o ponto de partida da argumentação pressupõem um acordo entre orador e auditório. Para Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005), a análise da argumentação deve verificar o que é presumidamente aceito pelos ouvintes. Os autores do Tratado explicam que há diferentes tipos de acordos que desempenham um papel distinto no processo argumentativo e servem de ponto de partida para argumentação, são eles os que correspondem à categoria relativa ao real (fatos, verdades, presunções) e à categoria relativa ao preferível (valores, hierarquias, lugares do preferível). As categorias do real e do preferível são objetos do acordo, a primeira corresponde à pretensão de validade diante de um auditório universal e a segunda é referente ao ponto de vista direcionado a um auditório particular.

Em relação aos elementos da categoria do real, os fatos estão relacionados a um acordo com um auditório universal, aquilo que é aceito por todos, e não a uma classificação de concreto/real. Por exemplo, “A dengue é transmitida pelo mosquito Aedes aegypti” (FIORIN, 2015, p. 91). De acordo Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005, p. 75-76), “só estamos em presença de um fato do ponto de vista argumentativo se podemos postular a seu respeito um acordo universal, não controverso”. Dessa maneira, se um acontecimento for questionado pelo auditório, ele pode perder o estatuto de fato ou são acrescentados membros especializados do auditório para julgá-lo. Já as verdades correspondem aos sistemas mais complexos, como as teorias científicas, concepções filosóficas ou religiosas, os quais vão além da experiência. As presunções, por sua vez, também são ligadas de acordo com auditórios universais. No entanto, a presunção não é a máxima, mas pode ser tomada como princípio na argumentação, aquilo que é razoável ou provável, por exemplo, pressupõe-se que todos os juízes são honestos até que se prove o contrário. Assim, elas são relacionadas ao normal e ao verossímil, por exemplo, presume-se no ponto de partida de uma argumentação que, até que se prove o contrário, o normal ocorrerá.

Na categoria do preferível, os valores dizem respeito aos modos particulares de agir, vinculados à multiplicidade de grupos, e estão presentes no conjunto de

ideias e opiniões. Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005, p. 84) explicam que estar de acordo com um valor “é admitir que um objeto, um ser ou um ideal deve exercer sobre a ação e as disposições à ação uma influência determinada, que se pode alegar numa argumentação, sem se considerar, porém, que esse ponto de vista se impõe a todos”. Por exemplo, “o abuso de mulheres é inadmissível”. Os valores são divididos em abstratos, como a justiça e a veracidade; e concretos, relativos a grupos e instituições concretos e particulares, como uma nação ou instituição religiosa. Ainda, as hierarquias dizem respeito à relação de superioridade de um ser, valor ou coisa sobre outra, por exemplo, “pela sua própria natureza, os homens são superiores aos animais”. As hierarquias são divididas em concretas, conforme exemplo anterior, ou abstratas, como em “o justo sobre o útil”.

Por fim, os lugares correspondem aos locais em que podem ser retiradas premissas de ordem geral para fundamentação dos valores, definidos como rubricas nas quais se pode classificar os argumentos para agrupá-los e encontrá-los com maior facilidade (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2005). De acordo com Fiorin (2015), o princípio da arte retórica é a invenção, expressão derivada do latim, inuentio, que significa “ação de encontrar”, ou seja, o orador busca argumentos em um inventário de materiais já dados. Os argumentos disponíveis são chamados de tópoi (lugares). Os lugares comuns definidos como figuras recorrentes, ou seja, estereótipos ou algo que é reconhecido por todos, os quais podem servir a qualquer ciência e, ao mesmo tempo, não dependem de nenhuma. Já os lugares específicos são correspondentes a uma ciência particular ou gênero oratório, por exemplo, os lugares próprios do campo discursivo jurídico.

Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005) apresentam a classificação, principalmente, dos lugares de quantidade e qualidade. O lugar de quantidade corresponde à superioridade pelo número, ou seja, uma coisa é melhor que a outra por razões numéricas, por exemplo, um número maior de bens é melhor que um menor. As democracias também se valem dos lugares de quantidade para fundamentar os seus princípios. Por outro lado, os lugares de quantidade contestam a superioridade dos números e recorrem àquilo que é único e insubstituível, correspondem a uma forma de estabelecer oposição ao comum e corriqueiro a partir do valor do único. Conforme exemplo de Fiorin (2015), a publicidade dos produtos de luxo se vale do lugar de qualidade.

Além disso, há os outros lugares, definidos como o lugar de ordem, correspondente a superioridade da causa sobre o efeito, por exemplo, o direito ao território brasileiro pelos índios, pois eles já estavam aqui antes da chegada dos portugueses. O lugar de existente, relativo à superioridade do que é concreto sobre aquilo que é possível, do existente ou real sobre o imaginário, (im)possível ou eventual. O lugar de essência considera que o essencial é preferível ao fortuito, isto é, a representação de um padrão, por exemplo, o valor atribuído a um coelho que apresenta todas as características de um coelho, considerado, assim, como um “belo coelho”. O lugar de pessoa apela para o valor da pessoa, para princípios como mérito, autonomia e dignidade. Por fim, o lugar de justa medida, no qual se considera que a virtude está na justa medida, ou seja, evita-se a insuficiência ou os excessos. Alguns comportamentos sociais são ponderados pela justa medida, por exemplo, como se comportar em uma festa de maneira que é esperada como adequada (FIORIN, 2015; PERELMAN E OLBRECHTS-TYTECA, 2005).

De acordo com Costa (2002), é a seleção prévia das premissas que servirão como ponto de partida para a argumentação, estabelecendo o acordo com o auditório com o intuito de influenciá-lo. Conforme explica Fiorin (2015), é por meio do acordo prévio que a argumentação será desenvolvida, pois os parceiros de uma discussão iniciam de um ponto em comum para defenderem posições opostas no desenvolver da argumentação. Ao se negar um ponto mínimo de partida, ele torna- se uma proposição em desacordo e inicia-se uma nova discussão. Os pontos de partida podem ser acordados explicitamente no início da discussão, mas, normalmente, eles estão implícitos, por meio de uma suposição. Essas premissas da argumentação também são tomadas como base para a construção dos tipos de argumentos que se valerão a defender uma tese, conforme será explicitado nos itens seguintes deste capítulo.

2.2 A MICROESTRUTURA E A MACROESTRUTURA DO GÊNERO ARTIGO DE