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A microrregião da Chapada do Apodi e do Seridó Ocidental

2.1 O ESPAÇO E A REGIÃO EM CONSTRUÇÃO

2.1.1 A microrregião da Chapada do Apodi e do Seridó Ocidental

Pensar o Brasil como projeto nunca foi tarefa fácil. No processo de redemocratização, não bastavam mudanças legislativas ou algumas transformações institucionais, também foram fundamentais a construção e o fomento da produção de informação e análise de dados públicos que pudessem subsidiar pesquisadores e tomadores de decisão sobre como organizar e impulsionar o desenvolvimento do país. Nessa direção, as universidades e, especialmente, o fortalecimento do IBGE serão importantes parâmetros para a criação de bases comuns para subsidiar o conhecimento e as políticas públicas do Brasil. Entre as tarefas fundamentais estão: dar mais robustez às divisões e subdivisões do país. Para além do recorte político- administrativo, é fundamental entender padrões socioeconômicos e ambientais que criem relações de complementaridade e possam, assim, construir políticas que fortaleçam não apenas uma divisão política mas ainda toda a região.

Como será apresentado adiante no trabalho, a construção das redes sociais cumprirá um papel chave no processo de estabelecer a região e a ligação com outros espaços. Porém, é fundamental ter como ponto de partida um lócus recortado com determinada integração dos mais diversos elementos. Para facilitar essa tarefa, buscaram-se as divisões do IBGE, tomando as áreas em que há o interesse de se estudar.

Desde o processo da colonização, passando pelo império até a república, autores clássicos como Furtado (2007) e Prado Júnior (2006) apontam para as formas como o processo de desenvolvimento do capitalismo em território brasileiro afetou a organização da produção e a sociedade brasileira de forma muito desigual de forma geral. A ocupação do território e a relação com o meio ambiente, no processo citado anteriormente, criaram regiões muito distintas em todo o país. As divergências se dão pelas grandes diferenças ambientais, de ocupação econômica e tradição social, mas

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também no plano mais micro, com base na relação entre as cidades, os fluxos de mercadorias e os polos regionais. Amarrar esses diferentes recortes espaciais a fim de estudar e promover políticas públicas sempre foi um grande desafio.

No que diz respeito ao IBGE, desde 1968, ele busca dividir o país para além dos recortes administrativos de unidades federativas, como estados e municípios. A fim de avançar nos estudos, foram criadas as macros, meso e microrregiões, tendo em vista, especialmente, os processos de produção e organização do espaço, comparando elementos ambientais econômicos e sociais. As regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul são as macrorregiões constituídas historicamente pelos elementos históricos, sociais, econômicos e ambientais. As mesorregiões são subdivisões dos Estados, que congregam diversos municípios com base nas similaridades econômicas e sociais. Apesar de essa divisão intermediária já apontar para municípios que têm características em comum, ela pouco diz sobre a articulação entre eles. Por isso, foram criadas as microrregiões. Elas são definidas como municípios que fazem parte de uma mesma mesorregião que detêm grande articulação entre si. Isso não significa homogeneidade entre os atributos ou autossuficiência na relação entre eles, mas uma integração a partir de fluxo de mão de obra, mercadorias ou estruturas produtivas complementares (BRASIL, 1990).

Ao utilizar como recorte inicial do objeto de estudo a microrregião da Chapada do Apodi e do Seridó Ocidental, considerando os municípios que o IBGE seleciona, já se observam, de antemão, diversos elementos comuns da estrutura produtiva, assim como o deslocamento de mercadorias e de pessoas internamente nessas regiões. Além disso, facilita o início do trabalho com os dados secundários a partir da produção de dados do próprio Instituto.

Os estudos realizados pelo LabRural-UFRN, durante vários anos, vêm demonstrando a capacidade de se reinventar e de convivência com o semiárido dessas duas regiões (BASTOS, 2011; ROZENDO, 2017). Além disso, o elemento identitário que permeia toda essa área e a capacidade de articulação para fora delas sempre se destacou. Essas características foram os primeiros elementos a atrair a atenção para a pesquisa sobre a Chapada do Apodi e o Seridó, buscando entender os processos de desenvolvimento de duas áreas próximas no interior do Rio Grande do Norte com características distintas, mas que, apesar das diferenças socioambientais, os indicadores sociais são relativamente bons, ainda mais se

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comparados a regiões periféricas. Essas características nos levaram a colher os primeiros dados com base no Censo do IBGE (conforme Tabelas 1 e 2).

Tabela 1 – População residente, total, rural e urbana, em números absolutos e relativos, e população economicamente ativa e que nem trabalha nem estuda, segundo Brasil, Nordeste, RN e

microrregiões escolhidas – Censo (2000)

População Rural Urbana PEA(18+) Nem Nem3 Brasil 169 798 885 18,75% 81,25% 42,10% 15,4 Nordeste 47 741 426 30,93% 69,07% 36,88% 22,19 RN 2 776 497,00 26,65% 73,35% 36,28% 22,41 Chapada 70290 46,17% 53,83% 32,40% 25,73 Seridó 89562 20,32% 79,68% 40,53% 22,37

Fonte: BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2000. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/. Acesso em: 10 jan. 2019.

Tabela 2 – População residente, total, rural e urbana, em números absolutos e relativos, e população economicamente ativa e que nem trabalha nem estuda, segundo Brasil, Nordeste, RN e

microrregiões escolhidas – Censo (2010)

População Rural Urbana PEA(18+) Nem Nem

Brasil 190 755 799 15,64% 84,36% 46,90% 11,61 Nordeste 53 081 950 26,87% 73,13% 41,32% 17,86 RN 3 168 027 22,19% 77,81% 41,77% 19 Chapada 72447 42,14% 57,86% 38,90% 24,02 Seridó 97680 14,29% 85,71% 44,96% 16,86

Fonte: BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/. Acesso em: 10 jan. 2019.

Ao analisar os primeiros dados do Censo, notamos que as duas regiões que são tidas como exemplo de desenvolvimento no Rio Grande do Norte, no último período, apresentam características muito distintas da composição. Além das diferenças reforçarem características distintas, enquanto a primeira tem o centro na agricultura, a segunda tem na pecuária e no comércio o centro da sua atividade econômica. O centro da análise deste trabalho é mostrar como, historicamente, foi se moldando cada uma das regiões para chegar hoje numa configuração na qual a população se concentra nas cidades, no Seridó; enquanto na Chapada do Apodi, ela ainda está localizada no campo. Esses atributos vão revelar muito da história e da atual organização econômica e social de cada lugar, como será desenvolvido ao longo

3 Refere-se à população de 15 a 29 anos que está fora do mercado de trabalho e de instituições educacionais (nem trabalham, nem estudam).

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desta tese. O mapa da Figura 2, a seguir, mostra um pouco desse contraste que será discutido ao longo do trabalho.

Figura 2 – Porcentagem da população urbana sobre a população total por município no Estado do RN, BR

Fonte: Censo, 2010

Um elemento de destaque neste estudo são os indicadores. Nesse caso, será apresentado o de Desenvolvimento Humano Municipal como referência para o estudo dos objetos, conforme apresentado nas Tabelas 3 a 5.

34 Tabela 3 – GINI, Índice de Desenvolvimento Humano Municipal Médio, Educação, Longevidade e

Renda, segundo Brasil, Nordeste, RN e microrregiões escolhidas – Censo (1991)

GINI IDHM IDHM_ E IDHM_L IDHM_R

Brasil 0,63 0,493 0,279 0,662 0,647

Nordeste 0,64 0,393 0,198 0,583 0,528

RN 0,63 0,428 0,242 0,591 0,547

Chapada 0,535 0,3395 0,164 0,5305 0,451

Seridó 0,481 0,406 0,21 0,644 0,506

GINI: Índice de Gini mede o grau de desigualdade existente na distribuição de indivíduos segundo a renda domiciliar per capita. Seu valor varia de 0 (quando não há desigualdade, a renda domiciliar per capita de todos os indivíduos tem o mesmo valor) a 1 (quando a desigualdade é máxima, apenas um indivíduo detém toda a renda).O universo de indivíduos é limitado àqueles que vivem em domicílios particulares permanentes.

IDHM: Índice de Desenvolvimento Humano Municipal é a média geométrica dos índices das dimensões renda, educação e longevidade, com pesos iguais.

IDHM_ E (IDHM Educação) – Índice sintético da dimensão educação, que é um dos 3 componentes do IDHM. É obtido através da média geométrica do subíndice de frequência de crianças e jovens à escola, com peso de 2/3, e do subíndice de escolaridade da população adulta, com peso de 1/3.

IDHM_L (IDHM Longevidade) – Índice da dimensão Longevidade que é um dos 3 componentes do IDHM. É obtido a partir do indicador esperança de vida ao nascer, pela fórmula: [(valor observado do indicador) - (valor mínimo)] / [(valor máximo) - (valor mínimo)], onde os valores mínimo e máximo são 25 e 85 anos, respectivamente.

IDHM_R (IDHM Renda) – Índice da dimensão renda, que é um dos 3 componentes do IDHM. É obtido a partir do indicador renda per capita, pela fórmula: [ln (valor observado do indicador) - ln (valor mínimo)] / [ln (valor máximo) - ln (valor mínimo)], onde os valores mínimo e máximo são R$ 8,00 e R$ 4.033,00 (a preços de agosto de 2010)

Fonte: BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/. Acesso em: 10 jan. 2019.

Tabela 4 – GINI, Índice de Desenvolvimento Humano Municipal Médio, Educação, Longevidade e Renda, segundo Brasil, Nordeste, RN e microrregiões escolhidas – Censo (2000)

GINI IDHM IDHM_ E IDHM_L IDHM_R

Brasil 0,64 0,612 0,456 0,727 0,692

Nordeste 64 0,512 0,338 0,68 0,583

RN 0,65 0,552 0,396 0,7 0,608

Chapada 0,525 0,4725 0,3235 0,6665 0,491

Seridó 0,51 0,516 0,335 0,751 0,553

Fonte: BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/. Acesso em: 10 jan. 2019.

Tabela 5 – GINI, Índice de Desenvolvimento Humano Municipal Médio, Educação, Longevidade e Renda, segundo Brasil, Nordeste, RN e microrregiões escolhidas – Censo (2010)

GINI IDHM IDHM_ E IDHM_L IDHM_R

Brasil 0,60 0,727 0,637 0,816 0,739

Nordeste 0,6 0,66 0,565 0,779 0,653

RN 0,62 0,684 0,597 0,792 0,678

Chapada 0,515 0,626 0,547 0,765 0,588

Seridó 0,439 0,642 0,553 0,778 0,618

Fonte: BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/. Acesso em: 10 jan. 2019.

Sem dúvida, o que chamou a atenção foi o salto nos indicadores sociais, que, assim como no Brasil, melhorou como um todo nas duas regiões estudadas. A

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diferença é que a melhora dos índices não está correlacionada diretamente ao salto na renda, como era de se esperar. Houve uma melhora na renda, mas o salto educacional, por exemplo, é muito mais significativo. Além disso, o aumento da renda não significou um aumento da desigualdade, como bem destaca o GINI durante esse período. Esses elementos apontam que se deve explorar o desenvolvimento da região a partir de aumento das capacidades humanas, conforme faz Sen (2010). Depois de anos tendo o consumo como centro da estratégia de crescimento nacional, olhar para o sertão e ver o capital social a partir das redes sociais e como elas impactaram nas oportunidades das regiões pode demonstrar outras formas de desenvolvimento, não apenas para pensar a região mas também para pensar o país. Assim, na subseção a seguir, abordaremos como a ideia de desenvolvimento foi construída ao longo do tempo para chegar à forma como será abordada nesta pesquisa.