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Origens do debate de crescimento econômico e as vantagens

2.2 MODELOS E ESCALAS NO DEBATE DO DESENVOLVIMENTO

2.2.1 Origens do debate de crescimento econômico e as vantagens

Inicialmente, a ideia de desenvolvimento econômico esteve ligada ao acúmulo de riquezas e de terras. Na realidade, como contraposição à estagnação e à manutenção da ordem feudalista, a necessidade de grandes transformações herdadas no século XVI, XVII e XVIII criou uma política econômica diversa do sistema anterior, o mercantilismo, como fundamento teórico para a mudança de um regime para o outro. Esse modelo tem como principais as seguintes características: um papel decisivo de um Estado forte, relação intrínseca entre o Estado e os produtores e mercadores, utilização de forma central da tributação e do endividamento público como geradores de poder e de riqueza (BRESSER-PEREIRA, 2006).

Apesar de traços distintos, o mercantilismo e o liberalismo consolidam dois eixos estruturantes para o mundo contemporâneo: a acumulação de riqueza e o aumento do poder da nação. Um dos maiores críticos a essas ideias na transição é Adam Smith (1996) que, em seu clássico, já exalta que os dois elementos centrais para a riqueza das nações são esses postulados no período anterior. Depois de Smith, o principal intelectual que advoga pelo livre mercado é David Ricardo, no seu clássico

Princípios de Economia Política, de 1817, que constrói o principal pilar da ideia de

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Nessa direção, os processos de independência nas Américas, a necessidade de expansão dos mercados consumidores, o avanço da revolução industrial foram o substrato para o fortalecimento econômico. A ideia das vantagens comparativas mostra que assim como os indivíduos, os países também têm vocações. Desse modo, cabe a cada território descobrir a sua e avançar no desenvolvimento de sua atividade. A seleção natural provocada pelos mercados fará com que os melhores se desenvolvam independentemente do tipo de produto ou de serviço realizado. Os países avançados entenderam a sua especialidade e passaram a desenvolvê-la.

Nesse ínterim, uma nova divisão do trabalho internacional estava sendo feita e o papel dos países e territórios estava sendo pensado pelas ciências sociais. No caso da geografia, não é diferente. Pensar a organização do espaço, no seu surgimento como disciplina institucionalizada ao final do século XIX, era trabalhar conceitos como região, paisagem ou região natural. Nessa perspectiva, a questão morfológica e a homogeneidade da paisagem eram características fundamentais para delimitar e circunscrever uma determinada região. Essas referências podem muito bem identificar como as influências naturalistas descreviam o semiárido (CORRÊA, 2000).

A ligação entre imperialismo e divisão internacional do trabalho não é feita apenas pelo mercado, mas principalmente pela política e legitimada pela teoria liberal. Nesse caso, processos “civilizatórios”, implantação de uma cultura tida como superior se misturavam com liberalização de mercados e aprofundamento das relações econômicas entre metrópole-colônia, centro-periferia (GOMES, 2000).

No Brasil, não foi diferente. Desde a segunda metade do século XIX, o país se reconstruiu com base na grande fazenda de café. A política de exportação de um produto agrícola não apenas fortaleceu uma nova elite no centro em São Paulo, que se manteve por décadas, até a crise de 1929, como ainda se tornou o setor mais dinâmico da economia (FURTADO, 2007). Com o advento da república, veio a necessidade da manutenção dos acordos políticos entre as elites, já bem desenvolvidos por muitos autores por meio do voto de cabresto e da política do café com leite, mas também era necessária uma legitimidade para a política econômica implementada pelo governo. A teoria liberal, especialmente das vantagens comparativas, foi o centro do debate de condução da economia brasileira. Além do preço do câmbio valorizado, garantindo melhores rendimentos para os exportadores e piores condições para a indústria nacional, um grande número de institutos que

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visavam à melhoria da produtividade do café foi criado no início do século XX. Essa economia altamente especializada despencou na crise de 1929, depois de passar por anos de oscilação com o preço garantido pelas compras governamentais.

Além disso, o desastre das duas guerras mundiais fez com que inúmeros estudiosos passassem a refletir sobre as teorias liberais. No campo das instituições, foi Karl Polanyi (2000) o intelectual que inovou na forma de tratar esse novo tempo. Para ele, as guerras foram resultado de um sistema que aliena o ser humano numa lógica da racionalidade individualista cujos valores hegemônicos são mercantis. Um exemplo evidente é o consumismo. Nesse sentido, existe um processo de desumanização da sociedade e da política, de forma que a democracia e a negociação ficam para um segundo plano, ou seja, o fundamentalismo de mercado provoca uma erosão nas instituições democráticas, o que ocasiona as duas guerras mundiais por território.

Essa desconfiança com a lógica de mercado pós-crise de 1929 e a Segunda Guerra Mundial provocam o surgimento de inúmeras agências internacionais de regulação e o fortalecimento de teorias que tinham como centro o planejamento e uma visão mais estruturalista de nossa sociedade. Somente pós-crise do petróleo, já em meados da década de 1970 e com a queda da taxa de lucro, ressurgem com força as ideias liberais. A base de legitimidade e de crítica já havia sido construída desde o fim da Segunda Guerra. Por mais que estivesse muito descrente durante anos, Hayek (1987), autor de referência, postulava que o “livre-mercado” seria o único sistema social compatível com a prosperidade econômica, a dignidade humana e a liberdade pessoal. Nesse período, diversas agências e instituições que organizavam o mercado foram incorporadas desde 1929, mas a ideia norteadora de que o mercado organiza a vida se manteve como substrato dessa ideologia política.

Como principal consequência dessa ideologia está a ideia de que, independentemente do território ou do espaço que está se construindo, a característica é a mesma e a racionalidade que gera é igual. Sob essa ótica, por mais que cada espaço tenha suas vantagens “naturais”, as regras operam da mesma forma em todos os lugares.

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