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A motivação como pressuposto de validade da norma tributária individual e

4.7 A problemática da prova negativa frente às presunções

4.7.1 A motivação como pressuposto de validade da norma tributária individual e

descrição dos pressupostos de fato demonstrando a prática da infração.333

4.7.1 A motivação como pressuposto de validade da norma tributária individual e concreta

Antes de discorrer acerca do necessário dever de motivação dos atos administrativo, importante salientar de antemão uma análise breve sobre o tema da validade das normas. Segundo Hans Kelsen, “quando se diz que ‘uma norma vale’, admite-se essa norma como existente”. 334Seguindo esse raciocínio, Paulo de Barros Carvalho335 e Lourival Vilanova336

331 No caso a presunção de liquidez e certeza está atrelada à Certidão de Dívida Ativa, título executivo extrajudicial que embasa a execução fiscal.

332 Art. 3º - A Dívida Ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez.

Parágrafo Único - A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do executado ou de terceiro, a quem aproveite.

333 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 219.

334 KELSEN, Hans. Teoria geral das normas. Tradução de José Florentino Duarte. Porto Alegre: Fabris, 1986, p. 3.

asseveram que a validade é relação de pertinencialidade de uma norma com o sistema do direito positivo e não uma característica que qualifica a norma, de modo a entender que caso uma norma exista, pertença ao sistema do direito, ela será válida. Na mesma linha, Tárek Moysés Moussallem leciona que a norma apenas existe se pertencer ao sistema: “Carece de sentido falar em norma jurídica fora do sistema ado direito positivo.”

Observa-se, dessa forma, que existência e validade se confundem, uma vez que ao admitir que uma certa norma “X” existe em um certo sistema “S”, se estará reconhecendo que a citada norma é válida. Tal norma só será perderá a validade no sistema jurídico se outra linguagem prescritiva, por meio de ato de fala, vier a invalidá-la.

Asseverar que um enunciado prescritivo é válido significa dizer que ele foi feito conforme as normas de produção normativa do sistema do direito positivo, fora deste ele sequer existe. Percebe-se, portanto, que a validade de um documento normativo consistirá num conceito que é a relação de subordinação existente entre tal documento e uma norma de produção normativa.337

No que concerne ao ato administrativo, este, para ter validade dentro do sistema do direito positivo, deverá estar em consonância com os requisitos impostos pelo sistema. No entanto, caso esteja viciado, continuará pertencendo ao sistema até que outra norma a retire.

Assim, preenchidos os pressupostos de validade, tais como: sujeito competente, motivo, motivação, requisitos procedimentais, causa e finalidade, o ato administrativo será válido, podendo gozar de sua presunção.

Entretanto, nas demandas que envolvem matéria tributária, há recorrentes problemas em relação ao pressuposto do motivo, sobremaneira quanto à motivação. Esta diz respeito à exposição dos motivos na qual, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, estão a fundamentação em que são enunciados “(i) a regra de Direito habilitante, (ii) os fatos que o agente se estribou para decidir e (iii) a enunciação da relação de pertinência lógica entre os fatos ocorridos e fato praticado.”338

335 BARROS, Paulo de Barros. Fundamentos jurídicos da incidência tributária. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 100.

336 VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2010, pp. 253-254.

337 IVO, Gabriel. Normas jurídica: produção e controle. São Paulo: Noeses, 2006, p. 122.

338 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de direito administrativo. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 404.

Extrai-se, no âmbito tributário, que a motivação do ato administrativo é traduzida na justificação acerca das razões de fato e de direito que culminaram a prática do ato, sempre embasada por meio de provas que confirmem a conduta descrita na norma individual e concreta. Apresentando os elementos probatórios que formam a convicção da autoridade sobre a ocorrência do ato lícito ou ilícito, poderá haver a consideração da norma jurídica, por exemplo, de responsabilidade tributária e, assim, da “relação de pertinência lógica” entre as provas e o ato administrativo feito.

A ideia de motivação, conforme visto alhures, está atrelada a possibilidade do exercício do contraditório a fim de resguardar o devido controle de legalidade do ato. É imperiosa que a norma individual e concreta expedida tenha os elementos comprobatórios que justifiquem sua existência, já que é dever do Fisco se certificar da ocorrência do evento.339 Na falta de tais elementos o impedimento dos efeitos da presunção do ato é imediato a partir do proferimento de um outro ato de fala produzido pelo aplicador do direito que retirará sua juridicidade no caso concreto.

A par disso, está o incisivo entendimento de Marçal Justen Filho340:

Mesmo no tocante aos fatos, no entanto, a presunção depende de a Administração comprovar o cumprimento do devido processo, necessário e inafastável a fundamentar suas afirmativas. Assim, se o ato administrativo afirma a ocorrência de certo fato, não se pode atribuir ao particular o ônus de provar sua inocorrência – até porque não se produz prova de fatos negativos. É impossível provar que um fato não ocorreu; quando muito se pode provar a ausência de condições para sua ocorrência ou a consumação de fatos incompatíveis com sua verificação.

Ademais disso, não existe presunção quanto à ocorrência de fatos se a Administração Pública não seguiu o devido processo legal. Ou seja, a Administração não pode afirmar, de modo unilateral e destituído de fundamento, que um fato aconteceu e pretender invocar uma presunção favorável a si, remetendo ao particular o ônus de provar o contrário.

Como decorrência, a presunção quanto à ocorrência ou inocorrência de fatos não se aplica quando o particular invocar perante o Judiciário a invalidade do procedimento administrativo anterior ao ato questionado (que geraria tal presunção), apontando vícios na atuação administrativa.

Fazendo análise do ato administrativo como norma (ato-norma administrativo), Eurico Marcos Diniz de Santi destaca que “elementos do ato-norma do ato-norma administrativo são

339 De acordo com José Souto Maior Borges: “O Fisco, entretanto, tem o dever – não o ônus – de verificar a ocorrência da situação jurídica tributária conforme ela se desdobra no mundo fático (...)”. (MAIOR BORGES, José Souto. Lançamento tributário, 2. ed., São Paulo: Malheiros, 1999, p. 121).

as variáveis que, preenchendo sua estrutura lógica, lhe conferem existência normativa (validade).”341

Os elementos correspondem aos pressupostos de validade expostos anteriormente. A descrição do motivo342 do ato (motivação) é visualizada na hipótese da estrutura do ato administrativo representada pela proposição-hipótese “F” : D[F → Rp(Sa, Sp)].

Observa-se que sem a motivação não haverá a viabilidade de fundamentar o consequente da norma no qual se constitui a relação jurídica. A construção do fato jurídico na hipótese da norma individual e concreta, através das provas admitidas, é constituída na própria motivação do ato administrativo, pressuposto sem o qual o ato não subsistirá.343

Dessa forma, não provado que o sócio praticou um ato ilícito, o lançamento realizado pela autoridade fiscal deverá ser invalidado, já que está maculado devendo, assim, ser expulso do sistema.