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A multiplicidade de fontes de captação de recursos

2 TERCEIRO SETOR: DO DESAFIO CONCEITUAL AO DESAFIO DA

2.6 A multiplicidade de fontes de captação de recursos

Em virtude da crescente escassez de recursos e do aumento da competitividade para obter fundos, organizações do Terceiro Setor vêem-se obrigadas a aprimorar e inovar nas formas de captação de recursos. Mais do que boa vontade, isso requer planejamento, pesquisa e estratégia.

Pesquisas realizadas por Landim (2001) e pela ABONG (2002), apresentadas em conjunto na TAB. 1, explicitam as diferentes fontes de recursos e seu peso, em percentuais, no orçamento de ONGs filiadas à ABONG. Os dados de Landim (2001) foram obtidos a partir de questionários respondidos por 145 entidades, de um universo de 164, espalhadas por todo o Brasil, em 1993. Já a amostra estatística da pesquisa realizada pela ABONG, durante os

meses de agosto e novembro de 2001, é composta por 163 respondentes, de um total de 248 associadas e refere-se ao orçamento do ano anterior.

TABELA 1

Classificação das fontes de financiamento de ONGs

Fontes de financiamento das ONGs 1993 %

2000 % Agência internacional de cooperação não governamental 75,90 50,61

Órgãos governamentais federais - 7,50

Órgãos governamentais estaduais 3,20 5,93 Órgãos governamentais municipais - 5,03 Empresas, fundações, instituições empresariais 1,80 4,19 Outras fontes de financiamento 5,00 3,99 Comercialização de produtos e venda de serviços 6,90 3,83 Agências multilaterais e bilaterais 7,00 2,40

Fundações nacionais 1,20 -

Contribuições associativas - 1,77

Valor não especificado por fonte - 14,74

Fonte: Landim (2001) e ONGs no Brasil perfil e catálogo das associadas à ABONG (2002).

Os resultados demonstram que as parcerias com o mundo empresarial e com as fundações ainda são relativamente pequenas, embora tenham tido um salto quantitativo de 1,80% para 4,19%. Os recursos provenientes de órgãos governamentais passaram de 3,20% para 18,46%, considerando-se as parcerias com as três esferas - federal, estadual e municipal. A despeito do decréscimo em relação ao ano de 1993, o maior peso foi atribuído à cooperação internacional, indicando, em grande medida, a dependência de recursos internacionais, apesar do esforço de diversificação das fontes de recursos empreendido pelas ONGs.

Falconer e Vilela (2001) realizaram uma pesquisa junto a 31 organizações doadoras ou

grantmakers11brasileiras, com o objetivo de identificar organizações que financiam, por meio

de doações, programas e projetos de interesse público.

Organizações como o Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais – CERIS, a Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE e a Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE, de origem ecumênica, além da Cáritas Brasileira, instituição

11 “Conjunto das organizações privadas, sem fins lucrativos, de origem nacional, que doam recursos para

vinculada à Igreja Católica, são canalizadores de recursos de agências de desenvolvimento, igrejas e ONGs internacionais.

Dentre as organizações pesquisadas, verificou-se a predominância das que têm vínculo direto com empresas: 61,00% são fundações e institutos empresariais. As demais possuem origens e ligações institucionais diversas com organizações de raízes religiosas/ecumênicas, e mista como, por exemplo, o Conselho da Comunidade Solidária, iniciativa governamental em parceria com a sociedade civil. Essa diversidade também se reflete nas fontes de recursos dessas grantmakers, como pode ser visto na TAB. 2.

TABELA 2

Fontes de recursos das organizações

Fontes de financiamento Valores em R$ Percentual

Fontes nacionais 160.119.100,43 68,90

Contribuições de empresas nacionais e multinacionais Recursos provenientes de contratos/repasses do governo Receitas próprias de venda de serviços/mensalidades/taxas Retorno financeiro sobre patrimônio próprio

Doações de indivíduos no país

Doações de outras organizações do Terceiro Setor/ONGs Outras 103.198.568,36 17.432.099,15 13.570.594,32 9.284.845,64 7.564.520,84 6.602.137,07 2.466.335,05 44,40 7,50 5,80 4,00 3,30 2,80 1,10 Internacionais 72.405.919,94 31,10

Agências internacionais de desenvolvimento Doações de indivíduos no exterior

Doações de fundações internacionais Doações de ONGs internacionais Outras

Contribuições de empresas no exterior

25.014.543,82 23.338.728,10 11.291.048,27 10.184.799,75 1.651.000,00 925.800,00 10,80 10,00 4,90 4,40 0,70 0,40

Fonte: Adaptado de Falconer e Vilela (2001, p.52)

Os resultados revelam que a maior parte, ou seja, 68,90% dos recursos das grantmakers brasileiras provêm de fontes nacionais, sendo as empresas nacionais e multinacionais os principais provedores para organizações não-empresariais, seguidas de contribuições do governo e da geração própria de receita por meio de serviços, mensalidades ou taxas. Os recursos internacionais correspondem a aproximadamente 1/3 do total, ou seja, 31,10%.

Com base nos dados da pesquisa realizada por Falconer e Vilela (2001), pode-se dizer que a forma de obtenção de recursos utilizada por organizações do Terceiro Setor está intimamente

associada a sua origem e vínculo institucional. Assim, a presença de contribuições de empresas nacionais e multinacionais no Brasil é mais notória entre as que possuem liame empresarial como, por exemplo, a Fundação CSN para o Desenvolvimento Social e a Construção da Cidadania, a Fundação Odebrecht, o Instituto Ayrton Senna dentre outras. Já as organizações de origem religiosa/ecumênicas são grandemente dependentes de recursos internacionais (GRÁFICO 1). 31,10% Fontes Nacionais Fontes Internacionais 68,90%

GRÁFICO 1 - Fontes de recursos: nacionais versus internacionais Fonte: Falconer e Vilela (2001, p.52)

É bom lembrar que a sustentabilidade está diretamente relacionada à capacidade da organização em cumprir seus objetivos a longo prazo e de se auto-renovar. Renovar a qualidade, a motivação, a direção, a viabilidade, a capacidade e a legitimidade. Silva (2000) chama atenção para o fato de o desafio da sustentabilidade envolver não só o levantamento e a adequada utilização de recursos financeiros, mas implicar também o investimento no desenvolvimento das pessoas que fazem parte da organização, na melhoraria da qualidade dos serviços e na adequação dos mesmos às necessidades das comunidades, buscando-se a adesão da sociedade à causa da organização, além de informar as ações desenvolvidas de forma transparente.

Sustentabilidade é, neste estudo, entendida como o esforço empreendido pelas organizações sociais, mediante a construção de estruturas, práticas e alternativas de geração de renda, diversificação de fontes de recursos e de desenvolvimento de novos produtos e serviços, de forma a garantir a melhoria das condições sociais, políticas e econômicas a curto e longo prazo (ASHOKA EMPREENDIMENTOS SOCIAIS & MCKINSEY & COMPANY, INC., 2001). Concebe-se, pois, sustentabilidade como a capacidade da organização de manter suas operações e abrir seu leque de possibilidades de financiamento, deixando de depender inteiramente de fontes específicas de recursos.

Tendo em vista a necessidade de financiadores, um dos desafios que se coloca às organizações do Terceiro Setor é o de compatibilizar seus programas e sua autonomia com necessidade constante de captação de recursos e imposição de lógicas de eficácia econômico- financeira por parte de agentes financiadores. Compreender o impacto das mudanças ocorridas nos contextos nacional e internacional, nos últimos anos, torna-se estratégico para que essas organizações mantenham e ampliem suas parcerias, tornando-se sustentáveis em termos financeiros.

Desse modo, na luta pela sua sobrevivência, organizações do Terceiro Setor têm utilizado, além da parceria intra e intersetorial, reengenharias internas e externas; têm, ainda, alterado procedimentos e passado a perseguir a auto-suficiência financeira, por meio da busca, construção ou incrementação de novas políticas de financiamento, dentre as quais a diversificação das fontes de custeio - recebimento de doações de pessoas físicas e jurídicas, realização de campanhas de arrecadação junto à comunidade e comercialização de produtos e/ou serviços (http//idac.rits.org.br, 2002). No bojo dessa transformação estão o aumento da concorrência para a captação de recursos, assunto já citado anteriormente, e a falta de articulação entre organizações sem fins lucrativos.

Pelos objetivos e limites deste trabalho, apesar da importância que estes e outros mecanismos de captação de recurso têm para a sustentabilidade das organizações do Terceiro Setor, interessam aqui, em particular, as questões que envolvem as parcerias com financiadores internacionais e com o Estado que serão vistas nos capítulos 3 e 4, deixando-se de fora as demais formas de financiamento.

Sobre o aspecto específico da falta de articulação, Fyvie e Ager (1999) apontam o fato de que, embora teóricos como Meyer12 (1997) afirmem que organizações filantrópicas podem trocar informações livremente, não havendo necessidade de proteger a origem de seus recursos, denotando a existência de articulação entre as mesmas, autores como Kerkhoven13 (1992)

contrapõem essa idéia e relatam que algumas organizações, no intuito de proteger suas fontes de recursos, sonegam informações.

12 MEYER, C. A. The political economy of NGOs and information sharing. World Development 25 (7), 1127-

Dados obtidos em pesquisa conduzida por Fyvie e Ager (1999), junto a dirigentes de ONGs do Gabão, reforçam a visão de Kerkhoven, indicando haver preocupação com referência a competição por recursos e dificuldades quanto ao estabelecimento de relacionamentos, sendo necessário tempo para se construírem redes de relacionamento confiáveis.

O próximo capítulo tratará da parceria, considerada esta como relação existente entre organizações não governamentais de cooperação internacional e ONGs, identificando exigências ou contrapartidas impostas pelos parceiros internacionais e estabelecendo os aspectos a serem considerados na pesquisa.

CAPÍTULO 3