• Nenhum resultado encontrado

diferentemente do que ocorre na lei brasileira, na qual a expressão faz referência

2. O caderno de especificações permite que as

2.2.3 A multiplicidade de sistemas e a proposta de um regulamento único

Além da inexistência de um sistema de proteção para IGs não agroalimentares no âmbito da UE, a questão da manutenção de quatro sistemas autônomos é muitas vezes apontada como situação insustentável no futuro.

Antes da revisão de 2012 do sistema DOP/IGP e com o objetivo de fortalecer a política europeia de qualidade e simplificar a respectiva legislação, começou a ser discutida a possibilidade do estabelecimento de um regulamento único para os sistemas de qualidade de produtos agrícolas, incluídas as indicações geográficas.

A origem dessa iniciativa está, em parte, vinculada ao compromisso assumido pela Comissão Europeia em 2006 de proceder a uma futura revisão da operação das políticas públicas e dos regulamentos de qualidade dos produtos agrícolas e o seu desenvolvimento futuro (EVANS, 2012).

Em seguida, no ano de 2007, todos os sistemas de qualidade foram debatidos em uma conferência em Bruxelas, que deu origem a um Livro Verde sobre a qualidade dos produtos agrícolas que estabeleceu a abrangência para uma consulta pública a respeito do tema, com o objetivo de delinear um quadro estratégico e regulamentar para a proteção e promoção da qualidade de produtos agrícolas. Nesse cenário, a Comissão pretendeu, a partir da consulta, permitir uma discussão ampla a respeito dos instrumentos existentes, como eles poderiam ser

melhorados e quais novas iniciativas poderiam ser consideradas. Tudo isso em três grandes grupos: requisitos de produção, normas de comercialização e sistemas de qualidade e certificação existentes (COMMISSION OF THE EUROPEAN COMMUNITIES, 2008).

A consulta buscava as opiniões de todas as organizações e cidadãos interessados na qualidade dos produtos agrícolas. Foram encorajados a darem sua contribuição: agricultores em geral, produtores, processadores, revendedores, distribuidores, comerciantes, consumidores, organizações não governamentais e órgãos públicos (COMMISSION OF THE EUROPEAN COMMUNITIES, 2008).

Após permanecer aberta por dois meses e meio em 2008, recebeu mais de 500 contribuições, todas devidamente consideradas e discutidas em uma conferência em Praga no início de 2009. As respostas renderam diversos pontos-chave para a Comissão Europeia relativos à forma de conduzir a questão e elaborar um quadro lógico para uma eventual revisão na política de qualidade. Três aspectos principais se sobressaíram como essenciais (COMMISSION OF THE EUROPEAN COMMUNITIES, 2009b):

(i) Informação: melhoria da comunicação entre produtores, compradores e consumidores no que diz respeito às qualidades dos produtos agrícolas;

(ii) Coerência: aumento da coerência da política de qualidade da União Europeia para produtos agrícolas e seus instrumentos; e,

(iii) Complexidade: redução da complexidade de modo a tornar o sistema mais fácil para produtores e consumidores entenderem os vários subsistemas e termos de rotulagem.

As conclusões das discussões sobre essas e outras orientações foram adotadas pelo Conselho de Ministros em julho de 2009. O Parlamento Europeu, por sua vez, adotou resolução para a política de qualidade para produtos agrícolas no início de 2010, quando as opiniões foram adotadas também pelo Comitê Europeu Econômico e Social e pelo Comitê das Regiões. Tudo isso resultou na proposta do Parlamento Europeu e do Conselho do regulamento único para sistemas de qualidade de produtos agrícolas.

Como fatores-chave da proposta, podem ser apontados (EUROPEAN COMMISSION, 2010):

(i) Unificação da estrutura e coerência conceitual;

(ii) Alteração das definições das espécies de indicação geográfica;

(iii) Alteração dos padrões de produção e das especificações do produto;

(iv) Alteração das estruturas de controle e inspeção; e, (v) Alteração das medidas de aplicação/execução.

Nas considerações da proposta, já de início foi afastada a ideia de unificar as denominações de origem protegidas e as indicações geográficas protegidas em um único instituto. No entanto, a fusão dos sistemas existentes (vinhos, bebidas destiladas, produtos vitivinícolas aromatizados e produtos agrícolas e gêneros alimentícios) foi interpretada como positiva pela maioria dos interessados, com exceção daqueles ligados aos setores de vinho e bebidas destiladas59. Nesse sentido, a Comissão foi incentivada a simplificar, esclarecer e facilitar os sistemas, bem como reforçar o reconhecimento internacional das IGs europeias (EUROPEAN COMMISSION, 2010).

Mais tarde, no início de 2011, o Parlamento e Conselho Europeus decidiram por consultar o Comitê Europeu Econômico e Social a respeito da proposta do regulamento único que, em resposta manifestou apoio à iniciativa da Comissão Europeia de aglutinar toda a legislação comunitária relativa à qualidade dos produtos agrícolas em um pacote de qualidade (EUROPEAN ECONOMIC AND SOCIAL COMMITTEE, 2011).

Em síntese, simplificação foi a palavra-chave da proposta. Notou-se a necessidade de reforçar a posição competitiva da UE nos mercados agrícolas mundiais. Além disso, a tentativa da UE de construir um regulamento único para os sistemas de qualidade de produtos agrícolas teve muito a ver com o programa da Comissão para a simplificação da legislação comunitária como um todo (COMMISSION OF THE EUROPEAN COMMUNITIES, 2009a) e também com a Estratégia de Lisboa.60

Nesse contexto, o programa de simplificação foi projetado para oferecer estímulo à inovação por meio da reformulação da legislação, com vistas a melhorar a sua transparência, eficácia e eficiência, reduzindo assim os encargos administrativos decorrentes dos requisitos regulamentares (EVANS, 2012).

59 Esses produtores têm receio de passar a ostentar o mesmo símbolo que estampa todos os demais produtos agroalimentares reconhecidos por DOP ou IGP. Parte deles acredita que se perderá em distintividade no setor de bebidas. 60 A estratégia de Lisboa, adotada no ano 2000, visa lidar com a baixa produtividade do crescimento econômico na União Europeia e seus principais pontos de atuação são: econômico, social, renovação ambiental e sustentabilidade (COMMISSION OF THE EUROPEAN COMMUNITIES, 2003).

À época, era dito que se bem-sucedido, o programa para simplificação da legislação e política de qualidade para produtos agrícolas poderia aumentar a eficácia e eficiência da lei por meio da racionalização da proteção das IGs, fortalecimento da reputação de produtos com qualidade entre consumidores e criação de novos mercados (EVANS, 2012).

Entretanto, mesmo com os esforços registrados, nada se concretizou em relação à unificação dos sistemas no que diz respeito às indicações geográficas. Ao contrário, o sistema DOP/IGP foi atualizado em 2012, o de vinhos em 2013 e as regras para bebidas vitivinícolas aromatizadas em 2014, todos de forma independente.

Todavia, discussões sobre a simplificação continuam ativas.61 Um exemplo interessante é um documento de trabalho não oficial preparado pela equipe da Diretoria Geral de Agricultura com o objetivo de facilitar a discussão do tema pelo grupo especialista em sustentabilidade e qualidade da agricultura e desenvolvimento rural. No documento, de 2014, está expresso que rever o potencial para uma maior simplificação na política de qualidade, incluídas as IGs de produtos agrícolas e gêneros alimentícios, vinhos, bebidas destiladas e vinhos aromatizados, seria uma prioridade para a próxima Comissão. A missão do Comissário para Agricultura e Desenvolvimento Rural pedia explicitamente para que tal tarefa fosse desenvolvida dentro dos primeiros doze meses de mandato (EUROPEAN COMMISSION, 2014).

O mesmo documento de trabalho afirma, ainda, que a opção pela fusão prevê também os melhores resultados no que diz respeito à eficácia, eficiência e coerência para com outros objetivos e estratégias da comissão (EUROPEAN COMMISSION, 2014).

Além disso, estados-membros como é o caso de Portugal, têm manifestado seu apoio à iniciativa. Entretanto, as regras permanecem atreladas a diferentes sistemas. E isso se deve, em parte, ao que é explicado logo no início da proposta do regulamento único, onde consta que a se mantém e reforça o sistema vigente para os produtos agrícolas e gêneros alimentícios, mas não unifica os sistemas de indicações geográficas para vinhos, bebidas destiladas ou vinhos aromatizados. Isso porque, considerando as reformas relativamente recentes no setor de vinhos e bebidas destiladas, os sistemas devem permanecer distintos.

61 Nesse sentido, é possível encontrar diversas manifestações no seguinte

endereço: <http://eur-lex.europa.eu/legal-

Assim, a questão pode vir a ser reconsiderada no futuro. No entanto, as regras vigentes para os produtos agrícolas e gêneros alimentícios podem vir a ser unificadas, se apropriado, com aquelas existentes para os vinhos (EUROPEAN COMMISSION, 2014).

A avaliação de impacto realizada para a preparação da Comunicação da Comissão também apontou como uma das possibilidades para facilitar o processo de registro, a opção de gestão feita por uma terceira parte em relação aos órgãos oficiais da UE. De qualquer forma, a ideia foi rejeitada naquele momento, feita a ressalva de que a possibilidade seria considerada em futuras etapas do processo.

Apesar de não haver atingido a concretização do estabelecimento do regulamento único, incluindo os sistemas de indicações geográficas, o Livro Verde e tudo o que se seguiu mostram claramente que haverá futuras discussões, avaliações e pesquisas com a finalidade de conhecer e avaliar as necessidades das partes interessadas.

Nessa linha, pode-se dizer, inclusive, que a proposta já deixou claras algumas falhas ao não endereçar questões sobressalentes no que diz respeito às IGs, como é o caso das seguintes (EVANS, 2012):

(i) A inter-relação entre as IG e marcas;

(ii) A extensão da abrangência de produtos (não agrícolas); (iii) A definição da área geográfica de produção; e

(iv) A utilização de nomes genéricos.

Resta aguardar os desdobramentos dos trabalhos referentes à unificação dos sistemas de qualidade para produtos agroalimentares, bem como o estabelecimento da proteção para produtos não agroalimentares. Questões que interessam não apenas aos membros da União Europeia, mas a todos os países com indicações geográficas com interesse na proteção comunitária, como é o caso do Brasil que já tem produtos registrados nesse nível e outros por vir.