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REGULAMENTO DE USO E ESTRUTURAS DE CONTROLE E GESTÃO NAS INDICAÇÕES GEOGRÁFICAS

diferente do brasileiro e por isso o termo certificação, na maior parte dos casos,

4 REGULAMENTO DE USO E ESTRUTURAS DE CONTROLE E GESTÃO NAS INDICAÇÕES GEOGRÁFICAS

Como estabelecido, a gestão pós-registro é vista como ponto crítico para uma indicação geográfica bem-sucedida e capaz de gerar impactos positivos para o desenvolvimento. E diretamente vinculados à eficácia e eficiência da gestão estão: o documento conhecido como regulamento de uso e o funcionamento das estruturas de controle e de gestão propriamente dita.

Nesse contexto, portanto, ganham relevância o papel (i) do regulamento de uso, por se tratar do texto dispositivo que documenta o processo de produção que conduziu ao registro como IG; (ii) da estrutura de controle ou conselho regulador, pois responsável pelo acompanhamento da observância das referidas normas; e, (iii) da estrutura de gestão, pois representa a estrutura unificadora do grupo e conta com inúmeras prerrogativas para a defesa, manutenção, melhoria e promoção do produto, da produção e da região em si.

Assim, este capítulo objetiva definir qual o papel do regulamento de uso e das estruturas de controle e gestão nas indicações geográficas, a partir das contribuições legislativas e doutrinárias a respeito do tema e pela interpretação dos dois casos descritos no capítulo anterior.

Além dessas definições, é conferida atenção especial à controversa questão do regulamento de uso nas diferentes modalidades de indicações geográficas brasileiras.

Uma IG resistente no tempo e cujo sinal distintivo cumpra seu papel aos olhos do consumidor, depende fortemente da qualidade, transparência e controle ou execução das normas que regem a sua produção. A IG pode reduzir a assimetria de informações relevantes entre produtor e consumidor, proporcionando um benefício coletivo para os atores da cadeia produtiva, levando credibilidade ao mercado e diminuindo custos de informação. Por outro lado, a IG também pode se tornar apenas uma jogada de marketing superficial e efêmera que não se manterá no mercado a longo ou médio prazo. Uma IG de sucesso requer, portanto, esforço das partes envolvidas para se manter e se projetar positivamente. Caso a cadeia seja mal estruturada ou mal gerida, os recursos investidos serão desperdiçados e o projeto pode, além de não ajudar, ser prejudicial para os produtores, comunidade local e meio ambiente (GIOVANNUCCI et al., 2009).

As estruturas que se criam a partir de um projeto para o reconhecimento de uma indicação geográfica são a chave para o seu

sucesso. Na prática, o registro de uma IG é um processo complexo de identificações e delimitações, de organização das práticas produtivas em normas formais, de estabelecimento de um plano de controle, acompanhamento e comercialização dos produtos, e demanda um compromisso de cooperação para o desenvolvimento institucional de longo prazo entre os atores envolvidos (GIOVANNUCCI et al., 2009).

Nesse contexto, a literatura aponta quatro determinantes para o sucesso de uma IG (BARJOLLE; CHAPPUIS; DUFOR, 2000; GERZ; BARJOLLE; SAUTIER, 2008), especialmente após o registro, e que vão ao encontro dos pressupostos enumerados no primeiro capítulo, conforme se visualiza na figura 7.

Figura 7 – Quatro determinantes da posição competitiva do produto com IG

Fonte: Adaptado de Barjolle, Chappuis e Dufor (2000, p. 24).

Caso uma das pontas da estrutura seja mais fraca, ela pode ser compensada por outra que seja mais forte. É o caso do queijo Comté. Embora o mercado de queijos duros esteja em declínio, a estrutura de

Posição Competitiva do Produto Tipicidade Preço Conveniência Gosto Componentes Simbólicos Regulamento de Uso Estrutura de Governança Gestão da Qualidade Estratégias de Promoção Políticas de Pesquisa Capacidade de Lobby Imagem do Setor Substitutos Imitações Tendências de Consumo Ajuda Financeira

Envolvimento das Instituições Promoção de Pesquisa e

Desenvolvimento

Especificidade do Produto

Atratividade do Mercado

gestão da cadeia produtiva e o suporte público e da comunidade garantem a essa DOP uma respeitável posição competitiva no mercado consumidor.

A ponta da efetividade da coordenação é a mais relevante para este capítulo, seguida dos aspectos relacionados à especificidade do produto, pois é abordada ao se tratar do regulamento de uso. As outras duas, especialmente a do suporte público, são mencionadas ao final, quando se observa o que pode ou deve e o que não pode ou não deve ser tomado como exemplo a partir dos casos apresentados anteriormente.

Nessa linha, a coordenação do processo produtivo e das relações entre os atores do sistema e entre estes e os atores externos pode ser interpretada como capacidade de se alcançar uma gestão coletiva do produto e do mercado eficiente. Logo, são considerados dois fatores básicos na avaliação da eficácia da coordenação e da cooperação da gestão do sistema da IG. São eles: (i) capacidade de expor a diferenciação do produto; e (ii) facilidade com que cada ator da cadeia tem de se apropriar do processo coletivo (BARJOLLE; SYLVANDER, 2002).

Ambos os fatores estão ligados à gestão e ao controle de uma IG. O segundo, especificamente se refere à habilidade dos atores ajustarem as suas estratégias individuais para aproveitar ao máximo a estratégia coletiva. Dessa forma, o estabelecimento das regras do regulamento de uso e o seu respectivo cumprimento, é também um importante passo para que a indicação geográfica seja bem-sucedida. 4.1 ESTRUTURA DE GESTÃO

No caso de uma determinada indicação geográfica não contar com uma estrutura de gestão adequada, eficaz, corre-se o risco do fracasso total do projeto ou, ainda, a IG pode passar a funcionar apenas como consolidadora de um bem público monopolizado pelo setor privado. Isto é, atores da cadeia de produção com mais poder podem passar a controlar a produção e comercialização do produto e a IG passa a figurar muito mais como um sinal distintivo privado do que coletivo (TREGEAR et al., 2007).

Todos os atores de uma cadeia produtiva vinculada a uma IG compartilham de um mesmo bem: a própria IG e sua qualidade, reputação ou outra característica que lhe confere especificidade e diferenciação em relação ao produto similar. Nesse sentido, uma organização coletiva tende a diminuir custos de gestão e aumentar benefícios, a promoção e comercialização da IG.

Por isso, antes de se pensar em elaboração do regulamento de uso e estruturação do sistema de controle é necessário contar com uma estrutura de gestão do sistema de determinada indicação geográfica.

O formato que se tem no Brasil, onde via de regra a entidade representativa da coletividade é uma associação, mas também pode ser uma cooperativa ou um sindicato, entre outras formas de constituição, é replicado em outras partes do mundo, incluindo a Europa.

No cenário brasileiro, especificamente, quando se trata de conhecer os objetivos que essa associação deve ter, o principal deles é a informação expressa, no estatuto da entidade, do trabalho para o reconhecimento e manutenção da IG. Passo seguinte, é importante se ater à composição. A assembleia geral é órgão obrigatório. Frequentemente e por uma questão de lógica na composição, tem-se também: diretoria ou conselho diretivo, conselho fiscal e um órgão responsável pelo controle da IG, que pode ser interno ou externo à associação, mas deve estar previsto em seu estatuto (VELLOSO et al., 2014).

A literatura a respeito do contexto brasileiro sugere que a gestão e o controle funcionem separadamente, de modo a garantir a imparcialidade da análise de conformidade e que façam parte dessa estrutura de controle terceiros não envolvidos diretamente com a IG, mas que a conheçam, como técnicos, especialistas ou consumidores, por exemplo (VELLOSO et al., 2014).

No entanto, ainda que a estrutura de controle esteja formalmente inserida no quadro organizacional da estrutura de gestão, a imparcialidade pode ser garantida se as previsões com relação à forma de atuação e condução dos trabalhos e a composição estiverem bem delimitadas.

Quanto à composição dessa organização, há basicamente dois

modelos mundialmente conhecidos que as entidades podem adotar. O

primeiro deles seria uma organização composta apenas por associados diretamente envolvidos na produção, também chamada de profissional

(UNITED NATIONS INDUSTRIAL DEVELOPMENT

ORGANIZATION, 2010). Nesse caso, quando houver assuntos que ultrapassam a esfera dos associados, mas são de interesse do sistema da IG, a organização precisa buscar alianças e entendimento caso a caso.

O segundo formato é o interprofissional (UNITED NATIONS INDUSTRIAL DEVELOPMENT ORGANIZATION, 2010) e se caracteriza por abranger uma gama extensa de associados, compreendendo não apenas os envolvidos na produção, os chamados associados produtores, mas também os associados não produtores, isto é,

todos aqueles indiretamente ligados à IG. São hoteleiros, proprietários de restaurantes, comerciantes, fornecedores. É o que ocorre no Comté e no Vale dos Vinhedos, para citar dois exemplos.

A figura 8 ilustra a compreensão e as ligações de uma organização que opte pelo segundo modelo, ou seja, tenha em seus quadros os associados não produtores e não apenas os associados produtores.

Figura 8 – Abrangência da entidade representativa com associados não produtores

Fonte: Elaboração própria (2016).

Qual o sentido de se optar pelo formato interprofissional? Trata- se de representatividade. Isso porque "[…] é interessante que diferentes atores da cadeia produtiva participem na organização, como produtores, transformadores, comerciantes e até mesmo pesquisadores e consumidores" (VELLOSO et al., 2014, p. 110).

Ent ida de rep res en ta tiv a da IG V er if ica çã o de conf or m ida de C onsel ho regul ador

Cadeia de valor

da IG

R eg ul am en to de us o

Atores da cadeia produtiva