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Tendo por base a revisão da literatura apresentada nas subseções precedentes (2.1 a 2.7), segue-se o delineamento do modelo de análise dessa dissertação. Para Quivy e Campenhoudt (2008), o modelo de análise constitui a sequência natural do quadro de referências e articula, de forma operacional, as balizas orientadoras das operações de pesquisa e do exame do resultado. Compõe-se de conceitos e das suposições, que devem estar articulados entre si para formar um quadro de análise coerente. Em outros termos, representa, em diagrama, a dinâmica da formação do planejamento governamental. Assim, o modelo conceitual sistematizado ajuda a compreender, de forma simplificada, o processo de planejamento, pois permite identificar seus principais elementos e a maneira como estão integrados e como se interagem e se desenvolvem para tornar realidade a atuação do Estado.

O marco inicial das preferências conceituais desse trabalho diz respeito à natureza do planejamento. Caracteriza-se o planejamento como processo e como instrumento. Processo, porque traduz relações, estabelece vínculos e implica atuação. Instrumento, porque não constitui um fim em si mesmo, mas um meio para se chegar a resultados. Nesse ponto, alinha-se com os conceitos de Martins (1984, p. 13), que “denomina „laboratório de

planejamento‟ o plano de governo elaborado de modo participativo, descentralizado, político

e, consequentemente, mais democrático”; Oliveira (2006, p. 201), para quem é necessário

“aceitar o papel do planejamento como construtor e articulador de relações na sociedade ou na

organização que busca seu bem comum de maneira ética, justa e responsável”; e Domingues Filho (2007, p. 130), ao afirma ser o planejamento “o meio institucional complexo para

solucionar problemas sociais e políticos”. Rejeita-se, portanto, a ideia de planejamento como

mero plano formal, fruto de atividade puramente técnica, construído e implementado de forma centralizada e não participativa e destinado a servir apenas de guia de ação para o futuro. A consequência disso é a aceitação do planejamento em sua dimensão política e técnica, nos termos definidos por Daland (1969), Oliveira (1991) e Cardoso (2003).

Das correntes de pensamento apresentadas por Friedmann (2006), considera-se que o planejamento governamental no Brasil está orientado, ao mesmo tempo, pelas correntes de pensamento da reforma social, da análise política e da aprendizagem social. A corrente da mobilização social não parece se ajustar à realidade atual do nosso País, que vive sob a égide do Estado Democrático de Direito.

A posição cíclica do planejamento governamental é decorrência de seu desdobramento em etapas (formulação, implementação e prestação de contas), de acordo com a doutrina de Cope (1963) e Burkhead (1971) e a interpretação sistemática da Constituição Federal (BRASIL, 2006a) e da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 (BRASIL, 2005a). Assume-se que as vertentes de planejamento delineadas no quadro de referências – planejamento urbano, planejamento econômico e controle da atividade financeira do Estado – integram-se por meio do plano plurianual (PPA), da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) e da Lei Orçamentária Anual (LOA). Em outras palavras, com fundamento na Constituição Federal (BRASIL, 2006a) e na Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 (BRASIL, 2005a), parte-se da premissa de que esses três instrumentos de planejamento governamental, de forma integrada e cíclica, expressam a política econômica, financeira e urbanística da entidade federativa. Nesse sentido, compartilha-se com o pensamento de Modesto (1965), Loeb (2003) e Mukai (2005). Essa integração está, enfim, refletida na compatibilização que deve existir entre o PPA, a LDO e a LOA. Embora cada um desses três instrumentos tenha uma função própria no sistema de planejamento governamental, a Carta Política e a Lei de Responsabilidade Fiscal estabelecem a necessidade de integração e compatibilização entre eles, tanto no sentido vertical (PPA condiciona LDO, que condiciona LOA) quanto no horizontal (PPA condiciona LDO e LOA ao longo dos quatro anos de sua vigência), em todas as entidades da federação.

Infere-se que existe um conjunto de elementos que, de forma combinada, concorrem para a formação do planejamento governamental. Esse mecanismo comporta, na visão do presente trabalho: o propósito do Estado; a formação da decisão político- administrativa; os atores e suas formas de atuação e interação no planejamento; o controle e a responsabilização; e a avaliação de programas. A identificação desses cinco elementos não se deu de forma aleatória. A interpretação sistemática da Constituição Federal e da Lei de Responsabilidade Fiscal conduziu a essas escolhas, na medida em que tais fatores, de forma expressa ou implícita, são referidos como relevantes na atuação do Estado. Conquanto tenham sido localizados muitos estudos para eles, considerados isoladamente, percebe-se uma carência quando se busca verificar algum trabalho que examine essas variáveis de forma integrada. Em outras palavras, é percebida uma lacuna na literatura sobre o papel desses elementos atuando em conjunto na formação do planejamento governamental. Nesse vácuo, está inserido o objeto de pesquisa dessa dissertação.

Para embasar a pretendida análise conjugada dos elementos, buscaram-se as referências de cada um deles de modo a constatar a sua relevância, ainda que individualizada,

para o processo de construção do planejamento. Nessa linha, adere-se às concepções de Burdeau (2005), Santos (2008), Löffer (apud KISSLER; HEIDEMANN, 2006) e Sen (2000) no que diz respeito à finalidade do Estado contemporâneo, na perspectiva nacional. No âmbito local, essa convergência está presente em Abrucio e Couto (1996) e Pinho e Santana (2000). Concorda-se com Dye (2009) quando ele sugere que os seus modelos explicativos e descritivos do processo de formação das políticas públicas sejam considerados em seu conjunto, pois nenhum deles sozinho é capaz de atingir esse desiderato. Considera-se a necessidade de participação e interação dos atores elencados na pesquisa empreendida por Stein e outros (2007), de acordo com as circunstâncias locais, no processo de formação do planejamento (Chefe do Poder Executivo, partido político, legislaturas, equipe de governo, burocracia, jurisdição e a sociedade civil). Os mecanismos de controle e responsabilização dos atos de governo, identificados pelo Conselho Científico do CLAD (2006) e Bresser- Pereira (2006), são de cinco espécies: controle de procedimento, controle parlamentar, controle por resultados, controle por competição administrada e o controle social; e correspondem ao que está definido pela Constituição Federal (BRASIL, 2006a) e Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 (BRASIL, 2005a) para a Administração Pública do Brasil. Não obstante as propostas de Cohen e Franco (2008), Schneider (2009), Worthen, Sanders e Fitzpatrick (2004), Araújo e Loureiro (2005) serem relevantes para a compreensão do modelo de análise em construção, faz-se opção pelos esquemas de monitoramento e avaliação definidos pela União, por meio da Figura 4 (PPA 2005-2007) e Figura 5 (PPA 2008-2011), em razão do princípio de simetria que orienta o sistema de planejamento governamental do País.

Estabelecidos esses parâmetros, apresenta-se, na forma da Figura 6, o modelo de análise que orienta a pesquisa e referencia o exame e a discussão dos resultados.

Figura 6 – Processo integrado de planejamento governamental Fonte: própria

Os conceitos das variáveis que compõem o modelo de análise estão delineados nas linhas precedentes e - mesmo que expressos em caráter geral - são compatíveis com o fenômeno da formação do planejamento no âmbito do governo local (Município), que é o foco da presente pesquisa. Isso é assim em face do caráter simétrico do sistema nacional de planejamento.

Alicerçado no quadro de referências e no modelo de análise construído, o presente trabalho pressupõe, para o âmbito do município de São Luís (MA), que:

a) existe um processo de planejamento governamental, que é composto pelo plano plurianual, pelas diretrizes orçamentárias e pelo orçamento anual, os quais expressam a política econômica, financeira e urbanística do Município, de forma integrada e cíclica, e guardam compatibilidade entre si;

b) concorrem para a formação do planejamento público local, de forma integrada, elementos como: o papel e as atribuições do Município no pacto federativo; a participação de diversos atores (Prefeito, partido político, Câmara de Vereadores, equipe de governo, burocracia, jurisdição e a sociedade civil) no processo de decisão político-administrativa; o controle e a responsabilização dos atos de governo; e a avaliação dos programas.

O modelo de análise pode conter limitações metodológicas, apesar de delimitados os conceitos e formuladas as suposições. É que não houve aprofundamento das especificações recomendadas para a construção dos conceitos. Quivy e Campenhoudt (2008, p. 122) ensinam

que “construir um conceito é precisar os indicadores graças aos quais as dimensões poderão ser medidas”. Minimiza-se essa crítica com a justificativa de que a pretensão aqui foi bem

mais modesta, pois o presente estudo visa somente verificar a existência e o papel atribuído às variáveis no contexto da formação do planejamento governamental. É que o escopo do trabalho, como já definido anteriormente (Seção 1), não contempla a verificação e a mensuração de resultados efetivos e/ou dos eventuais impactos das políticas públicas na sociedade. Assim, não se fez necessária a aplicação de métodos estatísticos na coleta e consolidação de dados. Outra possível limitação está relacionada ao caráter exaustivo dos cinco elementos que participam do processo de planejamento. É admissível que outros fatores, não contemplados no modelo de análise, possam existir e desempenhar papel importante na formação do planejamento, tais como os custos, por exemplo.