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Capítulo 2: Sionismo, progresso e modernidade

2.3 A noção de Progresso e a relação sionismo-New Deal

Ao analisar as respostas sociais à crise dos anos 1930, Alan Brinkley (1999, p. 6) nos diz que não houve uma forma única de lidar com a Grande Depressão. Segundo ele, os norte- americanos deram respostas diferentes à crise que se abateu na sociedade após o crash de 1929. Porém, apesar de poderem ser vistas maneiras distintas de lidar com a Grande Depressão, a forma mais comum foi o que ele chamou de “persistência”, isto é, a manutenção dos valores e das ideias tidas como o centro da identidade americana. Valores como progresso, riqueza, mobilidade social e prosperidade continuaram a ser as bases do comportamento de muitos grupos sociais. Entre a maioria da população, não houve reavaliação ou contestação aos valores e pressuposições comuns antes da Depressão. E uma dessas crenças era a crença no progresso.

Como Clarke Chambers delineava já na década de 1950, embora houvesse críticas, a grande maioria da sociedade norte-americana nutria uma inabalável fé na noção de progresso (CHAMBERS, 1958, p. 214). Como também Brinkley chama a atenção, “a necessidade do progresso, a inevitabilidade do progresso, a importância de perseguir o progresso” raramente eram questionados (BRINKLEY, 1999, p. 13).

Essa noção, segundo Michael Foley, estava enraizada no “credo americano”:

A sociedade norte-americana atribui grande valor à ideia e à materialidade do progresso. O conceito de progresso é altamente estimado como um fato descritivo da sociedade americana e também como prescrição normativa ligada à modernidade ocidental. Nos Estados Unidos, a mudança é amplamente concebida como sendo

sinônimo de vitalidade, propósito e direção. Ela é considerada uma característica integral e imperativa de uma sociedade aberta. Consequentemente, o discurso americano é repleto de referências à benevolência da mudança, da primazia do futuro sobre o passado e sobre o presente e à importância de “seguir em frente”. O instintivo preconceito contra termos tais como “antiquado” [old-fashioned], “retrógrado”, “imóvel” e “fora de moda” [outmoded] é um reflexo de forte ligação cultural ao progresso (FOLEY, 2007, p. 175).

Pode-se argumentar que tal visão era mantida, principalmente, por setores específicos da sociedade, defensores da sociedade industrial, moderna, científica e racional. Porém, estes grupos não estavam isolados. Uma expressiva parcela da sociedade norte-americana nesse período mantinha-se aferrada à ideia de que o progresso, direcionado para o bem-estar material da sociedade, era um valor central americano. Assim, tal valorização fazia parte de um discurso, compartilhado por diversos grupos, sobre uma identidade americana idealizada. Portanto, se essa visão não era a única, tornou-se hegemônica, vencendo as visões de simplicidade agrária presentes no Sul, as interpretações de desencantamento de intelectuais e as visões alternativas indígenas, negras e de imigrantes (BRINKLEY, 1999, p. 14).

Por outro lado, se o progresso era altamente estimado, não significava a mesma coisa para diferentes grupos. Como diz Alan Brinkley o progresso per se não era questionado, mas não podemos ver a noção de progresso na sociedade norte-americana como algo homogêneo. Nas primeiras décadas do século XX, havia, pelo menos, duas formas de ver o progresso, que, na década de 1930, se relacionaram a diferentes respostas dadas à Grande Depressão.

Brinkley apresenta duas visões distintas: a primeira foi a busca por manter-se aferrado às noções advindas da Revolução Americana, da constituição do país, e da ideia individualista. Porém, ao longo de diversas lutas características da Era Progressista uma nova forma de encarar o progresso emergiu na sociedade: aquela que dizia que o progresso deveria ser direcionado para o bem da sociedade, que os frutos da prosperidade deveriam ser melhor distribuídos e que os males sociais deveriam ser resolvidos pela sociedade como um todo. Dessa forma, como vimos, surgiram em meio aos embates políticos da Era Progressista, intelectuais e políticos que defendiam uma ação mais vigorosa do Estado na resolução dos problemas sociais.

Foi dentre esses grupos que saíram os maiores defensores do New Deal. Na verdade, a partir das ações do Presidente Franklin Roosevelt para debelar a Grande Depressão, essa visão incorporou-se, em grande parte, ao próprio Estado norte-americano. Com efeito, o New Deal era um programa moderno. Era um empreendimento baseado em uma modernidade alternativa, mas que de forma alguma constituiu-se como negação do valor da modernidade e de contestação da ideia de progresso.

O New Deal foi visto como a confirmação das capacidades humanas em lidar com as dificuldades que se apresentam. Desse modo, nem mesmo o crash de 1929 e a Grande Depressão dos anos 1930 fizeram erodir a crença compartilhada pela maioria de que o homem é um ser dotado da capacidade de resolver seus problemas por meio de sua atividade racional. Afinal, o New Deal, apesar de críticas recentes sobre sua efetividade, trouxe de volta a confiança no progresso e, sobretudo, nas instituições e na capacidade norte-americana de solucionar graves crises.

O New Deal deu novo alento à ideia de progresso e Franklin Roosevelt se consolidou como o líder da nação nesse empreendimento. Com efeito, já nos primeiros dias de seu governo, Roosevelt conseguiu aprovar leis importantes em seus esforços de pôr fim à crise. Apesar da oposição anti-New Deal que já se articulou nesse momento, Roosevelt conseguiu parecer a uma grande parte da sociedade como o homem certo para vencer a crise. Segundo David Kennedy, a resposta da população às primeiras medidas de Roosevelt foi impressionante e cerca de 450 mil cartas chegaram à Casa Branca, de pessoas comuns que enviavam congratulações ao presidente, em suas primeiras semanas no cargo (KENNEDY, 1999, p. 137). Várias medidas se sucederam, levando à crença de que o governo agia. Era algo que Arthur Schlesinger Jr. (2003, p. 13) chamou de uma “sensação de movimento”, uma sensação de que algo estava sendo feito, o que fez surgir a ideia de que o governo ativo de Roosevelt contrastava com o imobilismo de Hoover.

Na verdade, o New Deal foi um conjunto de medidas reativas, visando salvar o capitalismo e o modo de vida americano do abismo – “proteger a liberdade de oportunidade dos americanos dos males do desemprego e do desespero”. Contudo, a base para a ação do Estado já estava presente anteriormente. E o programa se nutriu principalmente do desejo de construir uma “América melhor”, um desejo que já havia tomado corpo muito antes da depressão. O que a depressão fez foi dar a esse desejo um novo vigor e a possibilidade de execução política (SCHLESINGER, Jr., 2003, p. 319).

Com efeito, muitos dos newdealers chegaram ao cargo governamental com uma experiência de atividade política durante a Era Progressista, em que o debate sobre a maior atuação do Estado na sociedade ganhou proeminência.

Além disso, o New Deal trazia embutido uma ideia, poderosa entre diversos grupos apoiadores do progressivismo, segundo a qual a desigualdade de oportunidades deveria ser compensada pelo Estado, confrontando a noção puritana de que o sucesso seria sinal da graça/eleição, enquanto o fracasso seria indicativo de sua ausência.

Os newdealers precisaram, portanto, enfrentar aqueles que defendiam o princípio da desigualdade natural entre os homens e que afirmavam a inutilidade de iniciativas destinadas a corrigi-las. Desse modo, os newdealers baseavam suas ações seguindo princípios liberais, imbuídos da crença no percurso positivo da história e acreditando ser possível, por meio da ação racional, o aprimoramento do homem e do mundo.

Dessa forma, o New Deal está imerso no processo de construção de uma nova cultura política norte-americana. Era uma expressão política governamental que se seguiu à emergência da percepção progressista de que os problemas sociais não eram advindos de limitações individuais, mas que eram problemas sociais e que o Estado deveria agir para prover algumas das necessidades básicas da população. Os críticos do New Deal se pautavam nesse aspecto para falar de “manipulação” da vida social e econômica dos Estados Unidos e de “engenharia social”. Para eles, o New Deal era um empreendimento “comunista”, alguns afirmando que “New Deal” era o nome americano do comunismo (LIMONCIC, 2003, p. 141). Contudo, o progressismo, que serviu de base para o New Deal era reformista, não revolucionário.

O objetivo dos apoiadores do progressivismo era a cooperação entre os diferentes setores da sociedade. Defendiam que as classes deveriam ser estimuladas a se unirem em prol do bem comum e da produtividade econômica (PERRY, 1999, p. 4; FRASER, 1989, p. 58). Da mesma forma, o New Deal era uma grande coalizão, formada por grandes empresas, sindicatos, profissionais liberais e intelectuais que pensavam em aplicar sua formação acadêmica aos problemas reais da sociedade, uma coalizão que permitiu “acomodar milhões de trabalhadores mobilizados durante uma depressão mundial” (FERGUSON, 1989, p. 6-7). Enfim, o progressivismo e o New Deal foram realidades reformistas, não revolucionárias, mas ambos foram vistos como autênticos vetores de modernidade e de progresso social.

Portanto, o progresso era algo bastante presente nas primeiras décadas do século XX, visto como um progresso das instituições democráticas e, logo, de progresso da sociedade. A noção de progresso trazia em seu bojo a ideia de que era necessária uma ação racional para debelar os problemas sociais (mais antigos que a depressão econômica) e, sobretudo, na década de 1930, para solucionar os graves problemas econômicos que se apresentaram à sociedade norte-americana.

Por todos esses motivos, nem mesmo a Crise de 1929 e a Grande Depressão puderam questionar a ideia de progresso em si. Apesar da crise e da descrença de alguns setores no modelo de progresso, esse principio prevaleceu como central no imaginário político coletivo e

na cultura política liberal heterodoxa que emergiu com o New Deal. E quando a Grande Depressão foi finalmente vencida, com o crescimento econômico sem igual iniciado durante a Segunda Grande Guerra, de alta produção e pleno emprego, essa ideia manteve-se mais firme do que nunca.

Não é surpreendente, portanto, que vejamos inúmeras avaliações que apresentam o sionismo segundo uma visão idealizada de modernidade e progresso, percepção que era ligada, por sua vez, aos modos de determinados grupos norte-americanos perceberem sua própria americanidade – grupos que entendiam a “experiência americana” como a vitória sobre a natureza, a capacidade do ser humano em utilizar sua racionalidade em prol do bem comum e, principalmente, entendendo o progresso e a modernidade como valores intrínsecos à identidade americana que esses grupos queriam afirmar.

Na verdade, percebe-se, em muitos casos, que a valorização do sionismo era relacionada aos próprios debates internos quanto ao papel do Estado e da sociedade em solucionar os males sociais. Muitos aspectos do sionismo foram ressaltados em público pelos newdealers como argumento contra os opositores do New Deal. Embora a organização das colônias sionistas não fosse regulada por um Estado, o trabalho sionista era apresentado como exemplo de ação coletiva em prol do bem comum. Era apresentado como um movimento que vencia o individualismo extremo na construção de uma sociedade renovada.

Foi dessa forma que a Hadassah foi apropriada pelos discursos do governo Roosevelt. Com um discurso coerente com o pensamento do New Deal, o presidente enviou uma carta à Hadassah em outubro de 1936, na qual diz:

Considero que a Hadassah tem feito uma abordagem saudável e sensível de seus problemas ao enfatizar a defesa da saúde. Eu me refiro particularmente à prudente ênfase dada ao trabalho médico preventivo, de hospitalização e ambulatorial, cujas atividades são dedicadas a promover boas condições físicas e mentais.

Qualquer grupo que desfrute de segurança social possibilitada pela boa saúde e do conhecimento de que a doença, quando ocorrer, será combatida vigorosamente, está estrategicamente capaz para lidar inteligentemente com os problemas que surgirem. Durante sua convenção, muitas novas e antigas sugestões serão apresentadas. Eu confio que essas novas ideias se provarão úteis em promover o excelente trabalho humanitário para o alívio do sofrimento humano no qual vocês estão engajados. É um privilégio e um prazer anunciar minha saudação pessoal para a organização sionista feminina da América na ocasião de sua vigésima segunda convenção.184

É interessante notar que Roosevelt utiliza elementos poderosos pensados dentro do contexto cultural, social e político da década de 1930. A ênfase em “aliviar o sofrimento humano” estava bastante presente na percepção de um amplo segmento da sociedade norte-

184 Carta de Franklin Roosevelt à Hadassah. Apud Roosevelt praises Hadassah activity. The New York Times, 20 de outubro de 1936.

americana, que ainda estava lutando para vencer a depressão. Além disso, a ênfase na ação para salvaguardar a boa saúde dos cidadãos encaixava-se perfeitamente em um momento em que se discutia a criação de um sistema de saúde185

e de seguridade social para os norte- americanos. Por isso, o discurso tinha também um direcionamento interno, contra os opositores do New Deal.

Vemos o mesmo discurso em uma carta de Roosevelt à Organização Sionista da América, por ocasião da comemoração de sua quadragésima convenção. Em mensagem a Stephen Wise, presidente da organização, Roosevelt disse:

Peço-lhe o favor de enviar minhas felicitações aos delegados reunidos na quadragésima convenção anual da Organização Sionista da América, marcando a quarta década de atividade em reconstruir a pátria judaica [Jewish homeland] na Palestina. [...]. Os passados quarenta anos na Palestina demonstraram ao povo judeu que ideais apoiados em atividade prática são capazes de realização. Realizações notáveis têm sido registradas na antiga pátria, onde uma vez mais os judeus estão tentando restabelecer uma cultura que tem sustentado e alimentado a humanidade através dos séculos [grifos meus]186.

“Trabalho prático” e “realizações humanas”: justamente os alicerces do New Deal. A ênfase na prática estava ligada à percepção de que o governo agia efetivamente para vencer a crise. Não eram propostas filosóficas abstratas que moviam o New Deal. A visão da gravidade da depressão e a percepção da necessidade de ação imediata para vencê-la é que foram os motores para a grande reordenação do Estado promovida por Roosevelt durante a década de 1930. O sionismo era um movimento, nesse sentido, similar ao trabalho norte-americano para vencer a Grande Depressão.

Dessa forma, o sionismo foi visto por variados grupos sociais norte-americanos como um trabalho prático, voltado para solucionar problemas urgentes e levado a cabo por pessoas valentes, destemidas, vigorosas e dispostas a criar um lar baseado no progresso, na racionalidade e no bem-estar social, e não um conjunto de ideias abstratas e sem contato com a realidade. Era dedicado à “reconstrução” da Palestina, mas também à reconstrução da vida de milhares de pessoas, que fugiam de países opressores na Europa para viver livres de perseguições na “Terra Santa”.

Não é ocasional, portanto, vermos as diversas associações entre ações sionistas na Palestina e as medidas que Roosevelt e os newdealers buscavam executar nos Estados Unidos

185 Vide o discurso do bioestatístico Edgar Syderstricker, proferido em Green Bay, Wisconsin, em 1934, sobre a necessidade de um sistema nacional de saúde ser inserido nos programas do New Deal. Transcrito em:

SYDERSTRICKER, Edgar. Health in the New Deal. Annals of the American Academy of political and social science, vol. 176, Social Welfare in the National Recovery Program (Nov. 1934), p. 131-7.

186 Roosevelt letter felicitates Zionists: congratulates DR. S. S. Wise on re-election and praises work in Palestine. The New York Times, 1º de julho de 1937.

na década de 1930. Segundo Aaron Berman (1990, p. 32), foram várias as ocasiões em que o trabalho dos sionistas na Palestina foi comparado ao New Deal. Com efeito, é interessante notar que pelo menos um projeto do New Deal foi tomado como inspiração e modelo pelo movimento sionista: a Tennessee Valley Authority (TVA).

A TVA foi criada com o objetivo solucionar o problema dos agricultores do vale do rio Tennessee, ao aumentar a quantidade de áreas agricultáveis e resolver o antigo problema da pobreza dessa região. Da mesma forma, na década de 1940, emergiu entre os sionistas nos Estados Unidos uma proposta de criação da Jordan Valley Authority, modelado na TVA, para estimular a racionalização da agricultura do vale do rio Jordão e possibilitar que a Palestina pudesse receber mais imigrantes do que até então era previsto.

A proposta foi delineada pelo conservacionista norte-americano Walter Clay Lowdermilk. Lowdermilk visitara a Palestina entre 1938 e 1939 como Assistente-Chefe do Departamento de Conservação de Solos dos Estados Unidos, para um estudo sobre a utilização do solo no Oriente Médio. Ao retornar, manifestou-se maravilhado pelo trabalho dos sionistas e suas declarações foram amplamente divulgadas na imprensa.

Em janeiro de 1940, Lowdermilk disse durante um encontro do United Palestine Appeal: “[o trabalho sionista na Palestina é] um dos mais impressionantes trabalhos de restauração e recuperação de terras vazias que eu já vi nos três continentes”187

.

Dois meses depois, Lowdermilk divulgava suas impressões ao voltar de uma nova viagem às “terras bíblicas” do Oriente Médio188

. Disse que a “Terra Prometida”, que “havia sido a terra do leite e mel”, estava em uma situação precária; era “um triste comentário sobre a administração da Terra pelo homem”. Disse ainda que a terra produzia apenas um décimo do que produzira dois mil anos antes: “detritos de erosão varreram os montes, junto com as dunas de areia, sufocaram o fluxo dos canais nas planícies costeiras e fizeram com que pântanos se disseminassem sobre planícies anteriormente densamente povoadas”. Além disso, Lowdermilk disse que a terra que havia sido o “Jardim do Éden” se tornara “uma desolação salgada”.

Porém, havia uma exceção a essa desolação: a Palestina sionista. Segundo o Christian Science Monitor189, Lowdermilk “se agradou pela conservação dos solos que viu sendo realizada pelas colônias judaicas na Palestina”. Lowdermilk disse: “O esplêndido trabalho de

187 Bigotry imperils all, Murphy says: expert lauds Palestine farming. The New York Times, 8 de janeiro de 1940, p. 4.

188 Soil conservation held vital to future of the United States. The Christian Science Monitor, 9 de março de 1940, p. 2.

recuperação das colônias judaicas em cerca de 5% da área, demonstrou as possibilidades para a Palestina como um todo”. E, para finalizar, expressando a comparação com sua terra natal, diz que os Estados Unidos estavam realizando um trabalho desse tipo, “onde os conservacionistas começaram a corrigir os abusos de 300 anos de exploração”. Ou seja, ambas as sociedades tinham problemas similares e o mesmo ímpeto racional e científico para resolvê-los.

Vê-se que o sionista é um personagem similar ao norte-americano. Da mesma forma que os sionistas recuperavam o solo árido da Palestina, contra o mau uso feito pelos árabes e pelos turcos, os americanos estavam recuperando o solo depois de séculos de abuso por uma utilização equivocada.

É interessante notar, ademais, o caráter científico das análises do conservacionista. O Dr. Walter C. Lowdermilk era um cientista e em 1940 ocupava o cargo de chefe de pesquisa do Serviço de Conservação do Solo dos Estados Unidos. Desse modo, seu diagnóstico adquiria caráter de verdade científica, de validação acadêmica proveniente de uma “autoridade”.

Diante do potencial das análises de Lowdermilk para o projeto de Estado judeu, os sionistas lhe pediram para escrever uma obra sobre a agricultura na Palestina. Em 1944, após articulações com os sionistas norte-americanos, Lowdermilk publicou a obra Palestine, land of Promisse. Os sionistas foram os grandes financiadores do livro. Empreenderam o levantamento de fundos e publicaram a obra, que obteve grande sucesso, sendo traduzido para o hebraico, iídiche e espanhol (BERMAN, 1990, p. 138).

Quando foi lançado, em 1944, o livro foi alvo de grande atenção. O New York Times dedicou uma extensa e positiva resenha sobre a visão do conservacionista, em que sobressai o elogio ao “trabalho prático”. Assinado por R. L. Duffus, o texto tinha o título “uma visão prática da Palestina”190

. Nele, Duffus diz que o problema da Palestina deveria ser resolvido por homens como Lowdermilk e que a solução deveria ser encontrada na economia, na melhora de vida para os habitantes da Palestina, árabes e judeus.

Duffus concorda com Lowdermilk quando este diz que o progresso criado pelos judeus era benéfico para os árabes. Duffus se questiona:

Como poderia haver conflito [entre árabes e judeus] quando a prosperidade e a população árabes cresceram nas vizinhanças de todos os assentamentos judaicos e levando-se em conta que no lapso de catorze anos (1927-40) a taxa de mortalidade

190 DUFFUS, R. L. Practical view of Palestine. Resenha do livro “Palestine: Land of Promise”, de Walter Clay Lowdermilk. The New York Times, 21 de maio de 1944, review of books, p. BR20.

árabe declinou para um terço? O que quer que tenha feito politicamente, o movimento judaico revitalizou a Palestina de outras formas.

O autor da resenha também concorda com Lowdermilk quando este diz que os judeus

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