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Capítulo 1: representações de sionistas e árabes nos Estados Unidos

1.2 Sionismo e judaísmo

Contudo, para compreendermos adequadamente a percepção favorável aos sionistas nos Estados Unidos, devemos refletir também sobre o papel dos judeus na sociedade norte- americana nas primeiras décadas do século XX. O apoio ao sionismo nos Estados Unidos parece algo um pouco problemático ao ser confrontado com um antissemitismo existente no país nesse período.

Embora estivessem em melhores condições que seus irmãos europeus, os judeus norte- americanos deviam enfrentar um antissemitismo que permanecia presente na sociedade. Ainda que nenhum partido declaradamente antissemita surgisse nos Estados Unidos e nenhuma política similar às da Alemanha nazista tenha sido criada, percepções negativas dos judeus permaneciam muito presentes na sociedade no período entre as duas grandes guerras. Somente com a entrada dos Estados Unidos na Segunda Grande Guerra, o antissemitismo começou a diminuir no país (DINER, 2004, p. 208-13).

No entanto, embora esse antissemitismo estivesse presente, não foi o fundamento a partir do qual se discutiu o sionismo. O sionismo, na verdade, foi afastado de suas origens “raciais”. Assim, o conflito entre sionistas e árabes palestinos não foi visto como uma luta entre a “raça judaica” e a “raça árabe”, mas entre dois povos vistos como racialmente semelhantes, mas extremamente distintos em relação à civilização.

49 Invitation to Islam. The New York Times, 29 de setembro de 1940, p. 11. 50

Palestine prices tripled since ‘39. The New York Times, 18 de fevereiro de 1943, p. 5.

51 SULZBERGER, C. L. King Farouk visits Arab monarch. The New York Times, 26 de janeiro de 1945, p. 8. 52 Palestine: peace feast. Time Magazine, 3 de outubro de 1938.

Diante disso, algo que se destaca nas variantes do Orientalismo presentes nos discursos analisados nesta pesquisa foi a menor ênfase no critério racial, uma importante diferença em relação ao orientalismo hegemônico europeu. Para este último, segundo Edward Said, a noção de “homem branco”, que tinha o direito a controlar o destino das “pessoas de cor”, foi fundamental para dar credibilidade ao imperialismo e ao conhecimento canônico orientalista. Nos Estados Unidos, a percepção era diferente. Na esmagadora maioria dos discursos analisados nesta pesquisa, o “Ocidente” e o “Oriente” eram diferentes não por causa da cor da pele ou por causa do sangue (elementos empregados frequentemente para definir as raças), mas por causa da postura diante do mundo. Assim, o que esse Orientalismo essencializou foi a cultura árabe e não a raça árabe.

Porém, a noção de raça estava bastante presente nos Estados Unidos nas décadas de 1930 e 1940. Muitos ainda consideravam que a raça determinava as características individuais e sociais. Nas primeiras décadas do século XX, a noção da superioridade do homem branco era muito difundida. E esse pensamento era utilizado para advogar ações políticas concretas, inclusive em política externa, o que era confrontado por grupos que entendiam que a raça não definia a postura dos indivíduos. Na verdade, essa discussão estava imersa em um debate mais profundo que esteve presente em grande parte da História dos Estados Unidos sobre o que significava “ser americano” (GERSTLE, 2001, p. 4).

Como demonstra Gary Gerstle (2001, p. 162), na década de 1930, noções racializadas para definir a americanidade eram muito presentes no Sul, onde a supremacia branca permaneceu um componente identitário importante entre os sulistas, e no Oeste, onde o preconceito contra japoneses, chineses e mexicanos se manteve poderoso.

Porém, se o critério racial como definidor da nação não desapareceu completamente, foi, gradativamente, perdendo força à medida que outros elementos identitários eram incorporados à noção de “ser americano” nas primeiras décadas do século XX. Especialmente no Nordeste do país, grupos liberais e progressistas punham ênfase no nacionalismo cívico, que valorizava a postura política e a lealdade aos valores da nação. Tratava-se de uma noção de que a americanidade era definida por “ideais políticos centrais”, e era fundamentada na crença da “fundamental igualdade de todos os seres humanos; nos inalienáveis direitos individuais à vida, à liberdade e à procura da felicidade, bem como no governo democrático que deriva sua legitimidade do consentimento do povo” (GERSTLE, 2001, p. 4).

Assim, novas formas de identificação por liberais e progressistas no início do século XX desafiaram o critério racial na delimitação da identidade americana. Esses grupos

elaboraram ideários que colidiam com o “Anglo-Saxonismo”, uma ideia fundada em uma hierarquia de raças que põe os anglo-saxões no topo da pirâmide racial. Como bem chama a atenção Jonathan Hansen (2006, p. 74-5), diversos intelectuais progressistas dos anos 1910 buscaram redirecionar o significado da americanidade, retirando seus elementos WASP54

, para dotá-la de ideias baseadas no pluralismo cultural55

.

A década de 1930 foi significativa nesse sentido. Esses anos foram marcados pelo fortalecimento do nacionalismo cívico, que punha ênfase nos valores republicanos da nação, ainda que fosse difícil lutar contra o ideal “anglo-saxônico” de identidade. Porém, segundo Gary Gerstle, “a forma dominante de nacionalismo na década de 1930 foi a cívica”. Para ele, esse foi um período em que “[o nacionalismo] insistiu em direitos iguais para todos os americanos e adotou os principais passos para garantir que a discriminação contra minorias raciais e étnicas fosse reduzida” (GERSTLE, 2001, p. 185).

Assim, tais debates influenciaram as diferentes vertentes orientalistas. Dependendo de que “americano” se falava, emergia uma forma específica de ver o Oriente. O Orientalismo norte-americano, assim como o europeu, equivale à busca pelo “outro”, pelo “diferente” que serve de contraponto à sua identidade. É a sistematização da alteridade. Embora influenciados pela Europa, os norte-americanos elaboraram uma forma de enxergar as populações do Oriente Médio com base em seus próprios valores. E, portanto, o Orientalismo nos Estados Unidos diz mais sobre uma determinada identidade idealizada norte-americana do que sobre o “Oriental”. Diante disso, variações sociais e mudanças temporais nos elementos de identidade alteram, entre os enunciadores, o padrão de julgamento de outras sociedades, incluindo os critérios orientalistas.

Dessa forma, a vertente orientalista baseada na raça não desapareceu, mas, nas décadas de 1930 e 1940, não era o que definia a percepção dominante dos árabes e sionistas nos discursos analisados nesta pesquisa. Eram raras as ocasiões em que o critério racial era utilizado na grande mídia para avaliar o sionismo. É verdade que alguns sionistas e pró- sionistas buscaram apresentar a empreitada dos judeus na Palestina como um empreendimento de “brancos” em uma terra habitada por “pessoas de cor”. O Congressista William Irving

54 WASP – White, Anglo-Saxon, Protestant (Branco, Anglo-Saxão, Protestante).

55 Vale destacar que um desses intelectuais progressistas era Louis D. Brandeis, o principal líder sionista norte- americano nas décadas de 1910 e 1920. Foi Brandeis quem cunhou a compatibilidade entre sionismo e americanismo, ao dizer que ser sionista não significava ser menos americano, mas significava reafirmar os valores americanos. A ligação do progressista Brandeis fez crescer, entre muitos setores, a ideia do sionismo como um movimento progressista. Tal dinâmica será apresentada de forma mais aprofundada no capítulo 4.

Sirovich (Democrata, Nova York)56

, por exemplo, defendeu que a Palestina fosse dada aos judeus porque “em menos de uma geração, a parte da Palestina na qual os judeus vivem se tornou terra do homem branco. Seu solo infértil, negligenciado ou abusado pelos árabes, está sendo revitalizado.” Sirovich continuava utilizando o discurso racial, afirmando que “se as reivindicações apresentadas anteriormente pelos árabes forem válidas, então a América e também a África do Sul não pertencem ao homem branco, mas aos índios e aos negros”57

. Porém, não foi esse o critério hegemônico a ser mobilizado nos discursos mais propagados pela imprensa aqui analisada. Ao contrário, a raça como critério de classificação de seres humanos era rejeitada por muitos em prol de critérios civilizacionais. Pode-se ver essa percepção em uma carta enviada ao jornal Christian Science Monitor. Nela, o autor diz:

Supor que uma raça é inerentemente superior a outras, sob fundamentos de sangue, é simplesmente uma ilusão pagã, que pertence, ou deveria pertencer, à infância da raça. [...] Não é a superioridade de uma raça ou civilização determinada pelos seus ideais, e sua fidelidade a esses ideais? Estão eles [os diversos povos] progressivamente buscando o reino da justiça e da retidão na terra – ou os ideais do poder através da agressão e subterfúgio? Este é o único e fundamental teste. E já que está aberto a qualquer indivíduo de qualquer raça melhorar seus ideais e as práticas de seus ideais, ele sempre pode mudar seu status espiritual, embora sua origem racial não tenha mudado. A superioridade racial, portanto, como tal, é um mito58.

Foi com base nessa percepção que a Questão da Palestina foi entendida no âmbito dos discursos analisados nesta pesquisa. Havia, de fato, o entendimento de que a raça era uma categoria diferenciadora dos seres humanos, mas não definidora do comportamento. Embora houvesse várias referências à raça, a luta entre sionistas e árabes não era vista como confronto entre uma raça superior e uma raça inferior. O conflito era percebido como resultado da diferença entre o nível “civilizacional” em que se encontravam ambas as comunidades.

A revista Life, cujo proprietário seguia uma noção política diferente da defendida pelo Christian Science Monitor, diz algo semelhante sobre o conflito entre judeus e árabes:

A vendeta árabe-judaica é racialmente absurda, porque ambos são semitas. A contrariedade dos árabes é muito semelhante à do garoto do campo em relação ao seu primo da cidade. Os judeus já elevaram o padrão de vida dos árabes da Palestina, reduziram as doenças, construíram um expressivo ramo exportador, construíram barragens, estradas, usinas de energia e diques de irrigação, reflorestaram o deserto59.

56 Médico e político judeu-americano; Deputado na Casa dos Representantes pelo Partido Democrata de 1927 a 1939, quando faleceu.

57

SIROVICH, William. Jews in Palestine. Carta enviada ao jornal The New York Times, publicada em 30 de agosto de 1936.

58 A.B.D. Racial Superiority. Carta ao jornal The Christian Science Monitor, 15 de julho de 1939, p. 18. 59 Jews from the world’s cities now farm Palestine. Life Magazine, 5 de julho de 1937, p. 54.

Portanto, os sionistas eram vistos positivamente não por serem uma raça superior, mas porque eram os representantes do avanço da civilização e do progresso. Já os árabes, eram vistos como atrasados, primitivos, ineptos, mas não determinados a viverem assim para sempre. Deveriam ser ensinados a trilhar o caminho da civilização.

Por outro lado, o apoio ao sionismo nos Estados Unidos decorreu de uma melhora na percepção dos judeus entre diferentes grupos no país. Na década de 1940, os judeus, assim como os católicos, foram incluídos positivamente no corpo político do país. Em grande parte, isso se deveu à entrada dos Estados Unidos na Segunda Grande Guerra. Ao apresentar-se como uma nação lutando uma “guerra justa” contra o nazismo, que tinha como vítima principal os judeus, os norte-americanos assistiram ao fortalecimento do nacionalismo cívico, já que a “eliminação do preconceito racial e religioso” era um dos objetivos de guerra dos Estados Unidos (GERSTLE, 2001, p. 187-8).

Com a entrada dos Estados Unidos na guerra, Roosevelt teve sucesso em fortalecer o nacionalismo cívico. Segundo Gerstle, Roosevelt conseguiu “americanizar a vida americana”, ao enfatizar que “todos os americanos pertenciam à mesma comunidade” (GERSTLE, 2001, p. 185). Porém, essa tentativa é anterior à guerra, inserida em uma medida do New Deal. Durante a década de 1930, o governo buscou dotar o nacionalismo com tons de pluralismo cultural, e contratou artistas para pintar a diversidade do “povo americano” (KAZIN e McCARTIN, 2006, p. 5). Tais medidas contribuíram sobremaneira para que algumas minorias étnicas fossem incluídas na noção de América60

. Isso possibilitou que os judeus fossem vistos mais positivamente. E o sionismo, por sua vez, se beneficiou dessa mudança.

Contudo, a fonte principal do apoio ao sionismo foi uma percepção de que a colonização sionista da Palestina era algo diferente do judaísmo. Pode parecer algo surpreendente, mas a noção de que os seres humanos poderiam ser classificados de acordo com seu estágio de civilização fez surgir uma percepção de que sionismo e judaísmo não eram idênticos. Embora os termos muitas vezes fossem tomados como sinônimos, havia uma clara percepção de que judeu e sionista eram categorias analíticas distintas.

60 Porém, essa percepção valia apenas para as minorias étnicas brancas (europeus) e para alguns grupos religiosos (judeus e católicos principalmente), o que foi uma forma de remodelar as fronteiras raciais dentro de certos limites. Os negros continuaram a sofrer preconceito (não serviam na guerra nos mesmos pelotões que os brancos e, em geral, recebiam funções militares consideradas menos dignas) e os japoneses continuaram a ser tratados como “amarelos” perigosos, o que possibilitou que japoneses residentes na Costa Oeste fossem colocados em campos de concentração durante a guerra (GERSTLE, 2001, p. 202-4).

É importante destacar que até a Segunda Grande Guerra, grande parte da comunidade judaica dos Estados Unidos era oposta à criação de um Estado judeu61

. Durante as décadas de 1930 e 1940, a ideia de erigir um Estado judeu foi violentamente combatida entre vários judeus influentes na sociedade norte-americana. Nesse período, o principal opositor desse objetivo era Judah Leon Magnes, judeu norte-americano reitor da Universidade Hebraica de Jerusalém, que defendia a ideia de um Estado bi-nacional para árabes e judeus62

. E até o pós- Segunda Guerra, o jornal The New York Times, de propriedade de uma família judia, era radicalmente contrário à ideia de construir um Estado judeu na Palestina63

. Assim, diante da oposição entre os próprios judeus, emergiu uma percepção clara de que o sionismo e judaísmo não eram idênticos.

Contudo, algo problemático se apresenta: como compreender que o New York Times e diversos grupos judaicos e não-judaicos norte-americanos elogiassem os sionistas como norte- americanos na Palestina e, ao mesmo tempo, condenassem o projeto de construção de um Estado judeu? Somente conseguiremos entender esse aparente paradoxo se percebermos que o que a grande maioria dos defensores do sionismo nos Estados Unidos entendia sobre o movimento sionista era algo difuso e mais imaginativo do que sistemático e organizado. Portanto, o que era muito elogiado entre os norte-americanos era mais uma “ideia sionista” do que o projeto político estatal sionista.

Assim, antes de prosseguirmos, precisamos analisar detidamente o próprio sionismo. O sionismo deve ser compreendido mais como uma ideia, ao invés de vê-lo como um movimento restrito à sua dimensão política, visando à construção de um Estado independente na Palestina. Pode parecer algo óbvio para alguns afirmar que a ideia precede o projeto político, mas, no caso do sionismo, esta relação requer cuidado de análise.

Na maioria das tentativas de conceituação, o sionismo é definido como um projeto político cujo objetivo era criar um Estado judeu na Palestina. De maneira geral, são apresentados como marcos fundadores a publicação do livro Judenstaat64

, de Theodor Herzl, em 1896, e o Primeiro Congresso Sionista da Basileia, em 1897.

Theodor Herzl (1860-1904), jornalista judeu húngaro, é considerado o pai do sionismo político. Na obra Judenstaat, ele elaborou o projeto de um Estado a ser fundado para que os

61 Tal dinâmica será analisada mais profundamente no capítulo 4.

62 Arab-Jewish deal in Palestine urged: Dr. Magnes rebukes extremists on both sides and advocates union in bi- national state. The New York Times, 14 de junho de 1942.

63

Partition of Palestine. The New York Times, 8 de julho de 1937, Editorial; Britain in Palestine. The New York Times, 3 de março de 1939, Editorial.

64 Em geral, o título do livro de Herzl é traduzido como “O Estado Judeu”, mas na verdade, tanto literalmente, como proposta política, o mais correto é traduzir como “O Estado de judeus” (OLIVEIRA, 2002, p. 195).

judeus pudessem viver livres de perseguições. Em seu livro, ele delineia o processo de construção do Estado como um processo científico e racional.

Herzl era orientado por um ideal europeu de Estado moderno. Sua meta não era construir uma entidade político-religiosa com base nos ensinamentos judeus contidos na Torah e no Talmude. O projeto era, segundo ele, uma iniciativa científica de estabelecimento de uma entidade política judaica em uma determinada “porção da superfície terrestre” (HERZL, 2002 [1896], p. 13.), dotada de instituições próprias a um Estado moderno.

Contudo, apesar do impacto atribuído posteriormente à sua obra, a principal realização de Herzl foi reunir todos os grupos sionistas europeus no Primeiro Congresso da Basileia, em 1897, em que foi fundada a Organização Sionista Mundial. Por meio desse encontro, em que foram definidas propostas de ação, o sionismo deixava de ser apenas uma ideia e tornou-se um movimento político, com ramificações em várias partes da Europa e nos Estados Unidos.

No entanto, o sionismo é algo muito mais complexo do que o projeto político (ainda que este também seja complexo e diversificado). O sionismo é, antes de tudo, uma ideia, que somente aos poucos tomou a forma de um projeto político definido.

Decerto o projeto político se alimentou e se articulou com elementos surgidos com a ideia, mas ambos têm especificidades marcantes. Deve-se ter em mente que o movimento político sionista fundado no final do século XIX por Herzl foi precedido da elaboração extremamente profunda de ideias de reavivamento nacional judaico por vários autores, como Moses Hess65

e Leon Pinsker66

, e foi paralelo a um movimento de migração coletiva de judeus que criava focos de uma sociedade judaica renovada na Palestina, bastante diferente da comunidade judaica tradicional que habitava a região há séculos.

Portanto, o sionismo, como ideia, é uma percepção difusa, variada e não plenamente articulada de um revivalismo judaico enquanto povo, um renascimento por meio da

65 Moses Hess (1812-1875), um intelectual judeu nascido em Bonn, é considerado tanto precursor do socialismo como do sionismo. Hess estava preocupado com a situação precária dos judeus na Europa, diante do sempre presente antissemitismo. Ele concluiu que a assimilação não resolveria esse problema e que a única saída era criar um “lar” judeu. Em 1862, escreveu O Renascimento de Israel, obra que se tornou conhecida sob o título Roma e Jerusalém, a última questão de nacionalidade. O lar judaico, para Hess, seria socialista, baseado em cooperativas voluntárias, semelhantes às associações construídas pelo socialista “utópico” Louis Blanc (LAQUEUR, 1972, p. 50-2).

66 Leon Pinsker (1821-1891), um médico russo de Odessa, afirmou em sua obra Autoemancipação, publicada anonimamente em 1882, que o problema do antissemitismo não poderia ser resolvido pela assimilação. Segundo Pinsker, em todos os lugares os judeus eram vistos como estrangeiros. Ainda que vivessem durante gerações em um país, nunca estariam em casa. Além disso, para ele, o antissemitismo, ou, como ele chamava, “judeofobia”, era como uma doença incurável, transmitida de geração em geração por quase dois mil anos. Como médico, Pinsker diagnosticou a doença e propôs a medicação. A única saída para os judeus era a emigração. No entanto, como a maioria dos países do mundo era avessa a abrir as portas para imigrantes, a solução era a compra de um território para o assentamento de vários milhões de judeus (LAQUEUR, 1972, p. 70-3).

reelaboração e reafirmação constante de uma nova identidade judaica frente aos desafios postos diante dos judeus europeus ao longo do século XIX. No bojo desse revivalismo, a ideia sionista pressupõe o judeu como parte de uma coletividade nacional que criaria algo novo na Terra de Israel. Ou seja, o judeu entendido como parte de um grupo humano novo, o “hebreu”, que criaria uma nova cultura hebraica na Palestina, diferenciando-se, portanto, do judeu da Diáspora, o “judeu do exílio”.

Assim, o sionismo emergiu, em primeiro lugar, como uma busca pela renovação do judeu enquanto povo. Mas não se resumia a isso. Se fosse somente um revivalismo judaico, outras correntes de pensamento que defendiam uma renovação na vida judaica poderiam ser definidas como sionismo. O segundo passo da ideia sionista é a reafirmação dos laços judaicos com sua antiga pátria, a “Terra de Israel”. Sião – de onde vem o termo sionismo – é um dos nomes bíblicos e históricos de Jerusalém e uma representação da Palestina como um todo. Assim, a renovação deveria ocorrer na Palestina, que no final do século XIX estava sob controle do Império Turco-Otomano. Como bem aponta Itamar Even-Zohar, o “princípio governante” da imigração sionista na Palestina era “a criação de um novo povo judeu e de um novo judeu na Terra de Israel” (EVEN-ZOHAR, 1998, p. 15).

Por outro lado, para os judeus norte-americanos, o sionismo articulou outros elementos, próprios das identidades judaicas norte-americanas. O que estimulou o surgimento do sionismo como ideia nos Estados Unidos foi a visão extremamente positiva das colônias

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