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5 Análise dos resultados

5.3 As peculiaridades da relação consultor-cliente que influenciam na construção da confiança

5.3.2 A abertura ou a resistência do cliente e consultor às mudanças advindas do trabalho

5.3.2.3 A percepção quanto à entrega dos “produtos” intermediários

No contrato de consultoria este é um importante momento e, muitas vezes, representa um marco inicial de confiança entre as partes, que confirmará as expectativas firmadas no momento da negociação do contrato formal. A credibilidade inicial no cumprimento do acordado é percebido, pela maioria dos respondentes, como um equilíbrio entre risco e confiança, pois os sujeitos escolhem tornar-se vulneráveis ao comportamento do outro, na expectativa de que o resultado seja satisfatório para ambos. Um dos clientes explica esta relação entre os construtos ao afirmar:

A contratação de uma consultoria para fazer um trabalho na empresa é exatamente um equilíbrio entre confiança e risco. Então, a simples contratação de uma consultoria externa para fazer o trabalho, já é um equilíbrio entre confiança e risco, você está com risco total no momento que você contratou. E o projeto inteiro é um balanço entre confiança e risco. O tempo inteirinho. Se você olhar pro projeto e botar essas duas coisas na balança, você vê que elas estão, estão flutuando o tempo todo, não tem nenhum momento que você não esteja numa situação dessas de avaliar o que, qual é o risco que eu tenho de não receber aquilo que eu estou pagando (Cliente C, entrevista em 27.12.06. Grifo nosso).

Contratos bem negociados em que os “produtos” intermediários foram bem definidos favorecem a compreensão de um marco de chegada, dando uma relativa objetividade às partes do que se espera no decorrer do trabalho e ao final deste. O consultor aponta este fato como determinante na percepção da confiança pelo cliente.

Então esse trabalho aqui, ele funcionou bem porque ele tinha um enquadre, né? Tinha propósito específico; tinha também produtos bem delineados, isso é outra coisa importante na geração de uma relação de uma confiança na consultoria. Embora você trabalhe com intangíveis, você precisa ter marcos claros do que é que vai ser produzido, né? Qual é a promessa que está sendo feita, desenhada de uma maneira que você possa avaliar até que ponto ela foi realizada, não foi realizada. Trabalhos de consultoria que perdem esse referencial, também eles rapidamente vão para o limbo e ninguém sabe por que aquilo está acontecendo, só vê o custo (Consultor C, entrevista em 01.11.06. Grifo nosso).

A confiança que vai se construindo, a partir do momento em que as respostas adequadas – na perspectiva de ambos – estão alinhadas com o propósito do trabalho e potencializam a tomada de decisões mais arriscadas pelo cliente e flexibilizam as alterações nas etapas do contrato, tendo o consultor como um parceiro nesta escolha. Nestas situações, porém, a confiança não deve favorecer a transferência de papéis para o outro, conforme relata o consultor.

Numa situação que envolve um risco maior e na situação em que ele não está tão seguro, que esse é um problema sério de decisão; quer dizer, a questão da segurança, muitas vezes o contratante ele quer transferir pra você o ônus de ter segurança na decisão que ele vai tomar e ele quer muito que você diga: “não, vá por aí” [...]. Então, a relação, eu percebia que o aumento da confiança, ela se dava na aceitação, digamos, mais rápida das propostas que a gente fazia. Você percebia, iam gerando resultados, aí você vai criando um capital de credibilidade que o camarada começa a acreditar (Consultor C, entrevista em 01.11.06. Grifo nosso).

Em trabalhos de consultoria, o cumprimento do acordado exige um monitoramento de fatores que são, muitas vezes, situacionais e submetidos a normas institucionais que extrapolam o ambiente organizacional e a possibilidade de controle. Desta forma, o aparecimento de eventos distintos são possibilidades de confirmação ou não da confiança que vem sendo construída, expressa, neste caso, na intenção de ajuda do consultor. Um dos clientes apresenta a suspeita quanto ao comportamento do consultor, por meio de ausência de transparência deste no compartilhamento de problemas no contrato – advindos de falhas do consultor – como uma situação de “quebra de confiança”.

Se a pessoa age de boa fé com você, ela pode até cometer erros, erros são humanos. Se você percebe que existe alguma coisa acontecendo e que poderia ser evitada, mas não está sendo, conscientemente, então aí demoliu sua confiança completamente. E, muitas vezes, você percebe exatamente isso. Por interesses outros, por outras necessidades, ou vontades, ou interesses, ou pressões internas você pode agir de uma forma inapropriada. Inapropriada não é erro, não [...] Mas se você tiver dentro do projeto, você perceber que isso está acontecendo, é uma coisa que quebra a relação de confiança, porque você está vendo que está varrendo pra debaixo do tapete uma sujeira que vai aparecer depois (Cliente C, entrevista em 27.12.06. Grifo nosso).

Episódios de auto-proteção do cliente em relação à sua equipe abalam o processo de construção da confiança e geram comportamentos de precaução de uma das partes em relação ao outro. A consultora aponta esta experiência junto a um cliente:

Uma vez aconteceu uma situação que foi muito desconfortável. Nós combinamos uma coisa e ele tinha que demitir um empregado. Na conversa com o empregado ele resolveu não demitir e aí disse ao empregado que fui eu que recomendei. [...] Mas aí no dia seguinte eu disse: “bem, veja, não ajudou porque eu vou continuar trabalhando com o rapaz, e ajudou a você? Com ele, com seu gerente? então se a gente puder tirar uma lição daqui, será que dá pra tirar uma lição?” Aí ele disse: “não deve acontecer isso”. Ainda hoje, eu sou mais atenta a ele, mais atenta. Ele já avançou em algumas coisas, eu espero que ele tenha tirado a lição, mas eu estou sempre prestando atenção (Consultora B, entrevista em 03.11.06. Grifo nosso).

Esta experiência pode acontecer com o próprio consultor, ao executar tarefas operacionais junto à equipe do cliente numa tentativa de proteger-se e ao seu trabalho, no momento da prestação de contas junto ao comitê, mantendo-se competente no desempenho do papel legitimado pelo cliente. A consultora relata esta experiência em um dos contratos:

[...] como eu estou há três anos lá, então é inevitável, eu bem que tento me policiar, mas eu comecei, em alguns momentos, a me envolver com o operacional. [...] em alguns momentos quando eu estava percebendo que alguém não estava dando conta, aí eu consultava esse alguém e eu dizia: “você quer? Eu posso lhe dar um suporte nisso, porque a gente tem um prazo, o deadline está escrito, a gente está pondo em risco comprometer o cronograma da gente”. Mas o que é que eu queria? Eu queria primeiro salvaguardar minha imagem e o compromisso com o produto que eu estou gerando pra ele. Segundo: não apontar ninguém como o gargalo que é desconfortável (Consultora D, entrevista em 14.11.06. Grifo nosso).

Neste relato, a não revelação daqueles que “não estavam dando conta”, configura-se como mecanismo importante de manter as alianças conquistadas junto a estas pessoas, que garantirão o êxito nas próximas etapas do trabalho. Neste momento, a confiança entre o consultor e o cliente pode ser abalada pelo não cumprimento das cláusulas contratuais que garantem a entrega dos “produtos” acordados.