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A persistência do melos: a canção como comentário do pathos

No documento O melodrama fantasma de Christian Petzold (páginas 92-116)

CAPÍTULO 2: O MELODRAMÁTICO COMO COMENTÁRIO – ELEMENTOS DE

2.2 A persistência do melos: a canção como comentário do pathos

Se as investigações empregadas a partir do melodrama nessa dissertação direcionam-se à análise da presença e variação de elementos do gênero segundo os estudos anteriores sobre sua forma, a presente discussão deve partir de sua etimologia, na qual se expõe um de seus principais componentes: a música. Thomas Elsaesser lembra da definição de melodrama como “uma narrativa dramática na qual um acompanhamento musical marca os efeitos emocionais” (ELSAESSER, 1991, p. 74), lembrando que essa abordagem teria a vantagem de possibilitar a formulação de problemas do gênero como problemas de estilo e articulação:

A música no melodrama, por exemplo, como um instrumento entre outros para dramatizar uma dada narrativa, é subjetiva, programática. Mas porque também é uma forma de pontuação no sentido acima, é tanto funcional (isto é, de significância estrutural) como temática (isto é, pertencente ao conteúdo expressivo) porque usada para formular certos estados de ânimo - tristeza. violência, pavor, suspense, felicidade (ELSAESSER, 1991, p. 74).

Elsaesser observa, no entanto, que a orquestração é fundamental para o cinema americano como um todo, dada a sua essência dramática, espetacular e de amplo apelo, uma vez que a “dimensão melódica” da música e da palavra não agem como um discurso semântico autônomo, e sim como um componente cênico tal como outros94. Observando outras leituras críticas que visaram compreender o envolvimento emocional direto característico da estética de

Hollywood nomeando esse efeito através de termos como identificação e catarse, o autor observa que esse cinema dramático e espetacular:

(…) depende da maneira como o "melos" é dado ao "drama" por meio de iluminação, montagem, ritmo visual, decoração, estilo de atuação, música - ou seja, nos modos como a mise-en-scène traduz o personagem em ação (...) e a ação em gestos e espaço dinâmico (comparável à ópera e ao ballet do século XIX) (ELSAESSER, 1991, p.78).

Nesse sentido, o melos se constitui não apenas em componente de um todo na obra melodramática, mas como o componente orgânico de um modo de representação baseado na ação e na emoção, a música sendo um elemento característico da mise-en-scène, mas também, como veremos a seguir, sendo utilizada por Petzold e outros realizadores enquanto lugar de comentário à encenação em si, bem como um elemento expressivo da narrativa que chega a substituir o próprio diálogo dos personagens.

O cinema de Petzold, caracterizado por sua contenção emocional, alterna entre o uso pontual de trilha musical e sua total ausência, seus filmes sendo preenchidos na maior parte do tempo apenas por som ambiente e ocasionalmente por canções evocadas pelo imaginário dos próprios personagens. Ao contrário do que é apontado por alguns críticos, que associam o cineasta ao rótulo “Escola de Berlim”, devido ao fato de que ele e seus colegas seguiriam o caminho de “um realismo que evita toda forma de efeitos manipuladores, desde narrativas orientadas por enredos até o frequente uso de música para o som” (KNÖRER, 2013, p. 27), a obra de Petzold se aproxima justamente das matrizes populares do melodrama, convencionadas pelo cinema de Hollywood, para dar um sentido de comentário ao próprio excesso que marca o gênero.

Conforme observamos anteriormente, os personagens desses filmes trazem à cena a retórica do melodrama ao adotarem a postura de narradores, abrindo a possibilidade de expressão de sentimentos excessivos em um cotidiano de frieza e desconfiança. A música exerce semelhante função nas narrativas de Petzold, expondo a natureza dos vínculos que serão estabelecidos entre eles e se eles caminham em direção uns aos outros ou se aumentam sua desconfiança e assim voltam a conter o excesso tipicamente melodramático. Logo no início de Pilotinnen, Karin, a revendedora de cosméticos que protagoniza o filme, encontra duas colegas de frente para uma televisão onde é exibido o vídeo de uma apresentação de Frank Sinatra. Elas comentam que ele morreu, pois dedicaram a programação às suas músicas. Karin diz que Audrey Hepburn também morreu e a colega confirma que foi de câncer e que exibiram Sabrina. Em outro momento, Karin está sentada em frente ao balcão de um bar e escuta na rádio a

seguinte mensagem, antes da apresentação de “Strangers in the night”: “Sinatra merece todas as homenagens, mas acima de tudo, suas canções sempre retratam a classe alta”.

Essa constatação a respeito do eu-lírico das canções de Sinatra e da vida que elas retratam mostra a incompatibilidade delas com a vida de suas personagens, impossibilitadas de vivenciar o pathos romântico expresso nas letras. A voz e a imagem do cantor reaparecem em outros momentos do filme em vídeos ou na rádio. Em uma cena, Karin e sua agora assistente Sophie estão na estrada no carro, tentando entender como será a configuração do trabalho das duas juntas. Sophie liga a rádio e a voz de Sinatra surge cantando Moon River, no que um plano da estrada aparece. O tom onírico e romântico da canção contrasta absolutamente do cenário vazio que surge à frente, bem como da rispidez e grosseria que marcam os diálogos entre as duas. Em outro momento, Sophie está no quarto de hotel e joga um livro na parede. Sinatra está na televisão cantando. Karin entra, vê o livro no chão e pergunta “sem citações?”, no que ambas começam a trocar frases aparentemente sobre estratégias no mercado de trabalho, provocando- se. Karin vê o cantor na televisão. O seguinte diálogo se segue, alternando observações sobre Sinatra e trocas de farpas (Figura 97):

Sophie: Em breve você estará sozinha novamente Karin: Ele morreu?

Sophie: Acho que sim. E vendeu suas unidades? Karin: Acho que sim. E gostava dele?

Sophie: Encantador. Obrigada.

Figura 97: a discussão diante da imagem de Sinatra em Pilotinnen

A suposta morte de um ícone de canções de amor parece pautar a desconfiança latente entre os personagens, fruto do ambiente competitivo de trabalho. Não é possível o amor dessas canções, como era pautado por seu uso em melodramas clássicos, como é o caso de Serenata Prateada (George Stevens, 1941), onde os discos e as canções teriam um impacto direto na narrativa ao comentar momentos marcantes das vidas dos personagens. Assim, o dado da

canção em Pilotinnen joga constantemente contra o melodrama, ao contrário dos outros filmes de Petzold, onde serve de comentário a diversas de suas matrizes narrativas.

Conforme comentado no capítulo anterior, o melodrama familiar, convencionado como um dos principais gêneros de Hollywood (Schatz, 1985), é impossível de se mostrar nos filmes de Petzold, uma vez que neles a família se mostra totalmente fragmentada ou mesmo inexistente. No entanto, por meio da canção, os personagens evocam em algumas cenas as dimensões do maternal e do paternal, que não podem se concretizar no resto da narrativa. Um dos casos é o do uso de canções de ninar, por meio das quais os personagens buscam estabelecer uma relação de familiaridade uns com os outros. Em Barbara, a médica protagonista está à beira do leito onde Stella se recupera e lê um trecho de As aventuras de Huckleberry Finn para a jovem garota. Seu cansaço se torna claro durante a leitura e Stella pergunta qual o problema. Barbara conta que está cansada e a paciente aconselha carinhosamente que ela descanse. Ela canta lentamente a canção de ninar “Der Mond is aufgegangen” de Thomas Schmid, como se embalasse o sono da médica (Figuras 98 e 99). André entra e convida Barbara para um café. Ela caminha em direção à porta, mas no caminho Stella conta a ela que não pode voltar para o campo de trabalho pois está grávida, confirmando o que a médica já sabe. Ela pergunta se Stella quer abortar, mas ela diz que não, que gostaria que ele fosse levado dali. A cena evoca o desejo maternal tanto na relação que começa a se estabelecer entre Barbara e Stella quanto na gravidez da segunda. Ao contrário do convencional, é a jovem que canta a canção para que a figura maternal possa dormir tranquilamente e logo em seguida revela que precisa resolver sua situação política para que seu filho viva em paz.

Figuras 98 e 99: Stella canta para Barbara

Em Em Trânsito, por sua vez, a canção de ninar evoca um desejo de paternidade no protagonista, que visa estabelecer um vínculo afetivo em meio a um contexto de ocupação nazista e perseguição étnica. Ao chegar em Marselha junto de Heinz, um amigo alemão que não sobrevive à viagem, tentando fugir da crescente violência das tropas alemãs na França, Georg vai à casa da família do amigo para contar a notícia para sua esposa Melissa e seu filho

Driss, ambos imigrantes do Magreb. Ele sai da casa em direção a seus outros objetos, porém após ver a família sem a figura paterna sente compaixão de ambos e começa a se afeiçoar ao menino. Driss lhe mostra seu rádio quebrado e Georg diz que consegue consertar. Após abrir o rádio e ajeitar algumas peças, o alemão liga o rádio e escuta a melodia uma canção de ninar alemã de Hanns Dieter Hüsch, a qual canta para o menino. Melissa chega em casa e questiona Driss sobre a presença do adulto. Ele explica que eles iam jogar bola juntos e ele consertou seu rádio. Ela pergunta se essa é a profissão dele e Georg confirma, dizendo que é técnico de rádio e TV. Driss pede que ele cante a canção de ninar mais uma vez, dizendo que sua mãe quer vê- lo cantando e ele assim o faz. Mesmo surda, Melissa o observa atentamente, assim como Driss (Figuras 100-102).

Figuras 100-102: Georg canta para Melissa e Driss em Em Trânsito

Tanto em Barbara como em Em Trânsito as narrativas se dão em um contexto de perseguição política e autoritarismo. No primeiro filme, Stella e Barbara, respectivamente uma prisioneira de um campo de trabalho forçado e uma médica que vive sob a vigilância da polícia socialista, estabelecem um vínculo afetivo que se assemelha à relação de mãe e filha, o qual ao final do filme resultará em Barbara abrindo mão de sua fuga para livrar a jovem dos abusos vividos no campo. Já em Em Trânsito, Georg é um fugitivo das tropas alemãs e a mãe e o filho que conhecem são imigrantes do norte da África, portanto todos sujeitos a serem mandados para campos de concentração. No entanto, diferentemente de Barbara, a relação deles é abruptamente interrompida pela fuga da família, Georg não tendo mais contato com eles. A canção de ninar, característica de um momento de afeto entre pais e filhos é evocada para que em meio a toda a barbárie vivida pelos personagens, possa existir algum laço familiar que os permita sobreviver. O melodrama familiar surge por um instante fugaz, projetando núcleos afetivos que não existirão.

Em Fantasmas, por sua vez, o desejo por esse familiar é evocado não pela interlocução entre uma figura parental e um filho, e sim pelo espaço vazio que essa ausência deixa no imaginário da protagonista Nina. Após um casting bem-sucedido junto a sua companheira Toni, as duas estão na mansão do produtor e dançam juntas enquanto são olhadas por ele. A canção que toca ao fundo é Mãe Solteira, um samba de Tom Zé cuja letra diz:

Cada passo, cada mágoa Cada lágrima somada Cada ponto do tricô Seu silêncio de aranha Vomitando paciência Prá tecer o seu destino Cada beijo irresponsável Cada marca do ciúme Cada noite de perdão O futuro na esquina E a clareza repentina De estar na solidão Dorme dorme Meu pecado Minha culpa Minha salvação Os vizinhos e parentes A sociedade atenta A moral com suas lentes Com desesperada calma Sua dor calada e muda Cada ânsia foi juntando Preparando a armadilha Teias, linhas e agulhas Tudo contra a solidão Prá poder trazer um filho Cuja mãe são seus pavores E o pai sua coragem

Dorme dorme Meu pecado Minha culpa Minha salvação

Em meio a uma cena de desejo junto à mulher que ama, ao mesmo tempo em que é objetificada pelo olhar atento de um homem burguês (Figuras 103 e 104), Nina escuta uma canção que reflete as angústias de Françoise, a qual a procurara mais cedo dizendo ser sua mãe. Nesse pequeno ambiente do quarto onde todos se encontram, diversas camadas do melodrama vêm à tona – a diferença de classes; o momento da dança, onde há mais expressão de excesso do que o resto do filme; o gesto do tapa que o produtor leva de sua esposa quando ela o encontra contemplando o casal de mulheres –, mas o dado da canção evoca a principal matriz melodramática do filme: o pathos maternal. Ao dançar as dores de uma mãe e a dificuldade de trazer uma filha sozinha ao mundo, Nina reitera, sem saber, dado o desconhecimento da língua portuguesa e do significado da letra da canção, sua crença nas palavras de Françoise e antecipa o sentimento familiar ao qual se engajará mais tarde e que culminará mais uma vez em seu abandono. Mais uma vez, a família surge no horizonte enquanto significado de uma peça artística que carrega emoção, apenas para se esvaziar mais uma vez.

Figuras 103 e 104: Nina e Toni dançam enquanto são observadas em Fantasmas

Zamour (2016) observa que, por meio da manifestação do melos, pode-se chegar a uma “estilística da reunião”, esta sendo marcada pela música, mais precisamente pela canção95. A

autora observa que:

Muitas vezes, quando se trata de uma música que preexiste ao filme, ela permite ao espectador um mergulho na memória comparável ao do personagem, e provoca um estado emocional que une em emoção o público e a história (ZAMOUR, 2016, p. 226).

Assim, por meio da canção une-se o individual e o coletivo, o íntimo e o geral96. O apelo popular de músicas já conhecidas pelo espectador mobiliza seu emocional, de modo que se estabeleça ao mesmo tempo uma empatia com a situação encenada quanto trazer para a cena suas próprias experiência emocionais, compondo assim o que Zamour chamará mais tarde “comunidade afetiva”97.

Ao trazer pontualmente o uso de canções de ninar conhecidas na Alemanha ou música internacional de maior ou menor conhecimento popular, Petzold evoca a consciência do espectador para trazer à tona não apenas sua memória afetiva do texto musical, mas também do próprio melodrama. Uma vez que o mundo apresentado é tomado pela desconfiança e pela contenção dos sentimentos, essas canções surgem para trazer à tona o melodramático, tal como no uso da retórica das narrações, como uma breve lembrança desse modo de expressão, o qual não pode se concretizar efetivamente na vida daquelas pessoas.

Além do componente afetivo que envolve personagens e espectadores nessa partilha típica do melodrama, o uso do melos por Petzold comenta a própria estrutura de narração melodramática, em um comentário autoconsciente das modulações do pathos por meio desse dado emocional. Ainda em Fantasmas, a canção surge de modo a “emoldurar” o filme, a partir de seus personagens, os quais por meio de suas escolhas estéticas, expõem a estilística reflexiva do realizador. O filme inicia-se, ainda nos créditos iniciais com um trecho da cantata de Bach “Bäche von gesalznen Zähren”, a qual traduz-se para “Riachos de lágrimas salgadas”. Ao som da canção, surge um plano da estrada, aparentando esta ser um áudio extradiegético, revelando- se na realidae música diegética proveniente do carro do personagem que surge dirgindo-o (Figuras 105 e 106): é Pierre, que está na estrada em Berlim indo em direção à clínica onde sua esposa Françoise se encontra e cuja letra segue:

Riachos de lágrimas salgadas,

inundações fluem continuamente para frente. Tempestades e ondas pressionam contra mim, e este mar cheio de problemas

enfraquecerá meu espírito e vida, vai quebrar mastro e âncora, aqui eu me afundo no chão

96 Ibid. p. 229 97 Ibid. p. 234

lá eu olho para a boca do inferno.

Figuras 105 e 106: a introdução musical de fantasmas

O caráter lacrimoso da letra da cantata antecipa a atmosfera de luto e abandono, apresentados logo no início do filme pela manifestação do melos. Ao mesmo tempo, uma vez que a canção fora escolhida pelo motorista do carro visto em cena, cuja esposa, conforme já vimos, recorre ao melodramático constantemente como maneira de tentar lidar com a dor da perda de sua filha, seu uso revela a consciência do lugar de encenação e engodo que o melodramático opera nessa narrativa. O uso diegético de música clássica se repete em dois momentos dentro do carro do casal. No primeiro deles, Françoise está no carro após Pierre buscá-la na clínica e pergunta se pode ligar o som do carro, no que seu marido diz que sim. A música que toca é uma melodia que ela tenta identificar, presumindo ser da autoria de Gardiner, Pierre a corrigindo que na verdade é de Richter. Ela elogia a música e deita no ombro de seu marido, pedindo desculpas a ele.

Em outra cena, Françoise conta para Pierre pelo telefone do hotel de seu encontro com Nina e que eles não podem ir embora de Berlim, pois ela é Marie, sua filha perdida. Em seguida, pega o carro e sai pela cidade. Anoitece e, em paralelo à cena de Nina e Toni com a canção de Tom Zé, já descrita acima, Françoise dirige o carro ao som da cantata de Bach que mais uma vez aparenta ser uma música extradiegética. Um flashback traz à tona uma imagem de uma câmera de vigilância onde um homem não-identificado leva embora o carrinho de bebê onde Marie está, roubando de Françoise sua filha, e ao voltarmos para o presente, vemos a mãe tomada de uma expressão angustiada e pivotando a cabeça para os lados. Inicialmente temos um plano médio no qual vemos a expressão seus gestos (Figura 107), mas a imagem corta para um plano geral onde vê-se um supermercado, presumidamente o mesmo onde o sequestro aconteceu e ela, em frente aos anúncios, que volta para seu carro (Figura 108). Ao entrar, ela desliga o som e a cantata de Bach desaparece, revelando que esta é na verdade música diegética.

Figuras 107 e 108: a performance do sofrimento de Françoise em Fantasmas Essas cenas evidenciam tanto o refinamento burguês do casal no conhecimento de música erudita quanto o tom dramático que a personagem insiste em reiterar em sua vida, como se simulasse em seus pequenos gestos a encenação de um melodrama. O uso da música e da gestualidade por Françoise complementam aquilo que já foi comentado a respeito da retórica da narração no tópico anterior: como uma presença assombrada, ela se porta como um personagem de melodrama dentro de uma narrativa melodramática, sendo ela mesma um elemento de reflexividade de tais matrizes do excesso.

Essa “performance” de Françoise pode ser relacionada àquela de Tina em A Lei do Desejo (Pedro Almodóvar, 1987). No filme, Tina, uma transsexual irmã do protagonista diretor de cinema, porta-se a todo tempo como uma personagem de melodrama. Rejeitada por homens com quem se relacionou no passado e buscando apagar todo o rastro de masculino dentro de si, Tina performa sua feminilidade através do excesso, agindo constantemente como uma personagem de melodrama. Ela é chamada por seu irmão para atuar em uma adaptação de “A Voz Humana”, de Jean Cocteau, e em meio à peça, além de interpretar o monólogo de amor não-correspondido, tem a parceria de sua filha Ada, que interpreta o número musical de Ne me quitte pas, na voz de Maysa. Assim, além dos gestos excessivos convencionados em seu cotidiano, Tina traz à cena teatral seus próprios dramas e a música comenta sua própria relação com o amor (Figura 109). Tanto ela quanto Françoise são mulheres que vivem através do drama para dar sentido a suas próprias narrativas.

Ao final do filme, após ser abandonada por sua companheira e pelos seus supostos pais, que revelam a narrativa familiar ser tudo uma mentira e encontrar na carteira de Françoise que fora jogada no lixo após ser roubada por Toni fotos que deixam dúbia a possibilidade de ela ser de fato a Marie tão procurada por sua mãe, Nina segue seu rumo em meio a uma floresta que se assemelha ao Tiergarten do início do filme. Ao fundo surge a melodia de Richter apreciada por Françoise e Pierre no início do filme, agora enquanto música não-diegética, a primeira vez que essa configuração da música é utilizada. Assim, o filme que inicia-se com a cantata de Bach

No documento O melodrama fantasma de Christian Petzold (páginas 92-116)

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