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A perspectiva do fanatismo de Walter Laqueur

Capítulo 2 O debate acadêmico

2.1 Teorias sobre o novo terrorismo

2.1.1 A perspectiva do fanatismo de Walter Laqueur

Em seu artigo The Terrorism to Come (O terrorismo futuro), Laqueur (2004) apresenta de forma sintética sua compreensão do problema do terrorismo.

Apesar de reconhecer que o atraso socioeconômico pode facilitar o surgimento de respostas violentas, Laqueur refuta a tese de que a pobreza, o desemprego, o atraso e a desigualdade estão nas bases do terrorismo. Estudos mostram que nos 50 países mais pobres do mundo praticamente não existe atividade terrorista (LAQUEUR, 2004). A correlação entre conflitos nacionalista, étnicos, religiosos e tribais parece ser muito mais palpável do que a correlação entre violência política e pobreza. Por outro lado, continua, seus ideólogos e muitos militantes terroristas provêm de classes abastadas, provando que a riqueza e o conforto não eliminam o terrorismo da sociedade. Para Laqueur (2004), as raízes do problema são culturais e intelectuais.

Laqueur (2004) alerta para a grande diversidade e multiplicidade que caracterizam os conflitos em todo o mundo. Não há soluções mágicas para o que o autor denomina “agressão flutuante" que, sugere, pode deslocar-se a qualquer momento para outras direções respondendo a novas estratégias ou motivações.

Apesar da grande prevalência do terrorismo islamista nos dias atuais, Laqueur lembra que, há apenas 30, anos eram outros modelos de violência política que se destacavam. Observa ainda que a probabilidade de que pequenos grupos ou indivíduos utilizem armas de destruição em massa amplia significativamente o leque de formatos e motivações que podem facilmente transcender a preponderância atual do islamismo radical.

Com base em lições da história e com o fanatismo como um dos principais fatores de causa do terrorismo, Laqueur (2004) acredita que é pouco provável que o fervor do islamismo radical dure para sempre, ficando sujeito à rotina, ciclos de gerações, mudanças políticas e a mudanças súbitas ou graduais de intensidade da crença religiosa. É provável que esse declínio advenha do aprendizado do fracasso ou ineficácia da estratégia terrorista.

A frustração e o fracasso podem também provocar dissidências no interior de grupos terroristas (o autor destaca que na última década morreram mais muçulmanos do que ‘infiéis’, por exemplo). O fracasso de experiências como a revolução iraniana levou alguns estudiosos a afirmar, há alguns anos, que o islamismo radical havia entrado em declínio. Para a maioria das sociedades muçulmanas, entretanto, o governo do Islã ainda é um sonho e o enfraquecimento de tais crenças é uma perspectiva de longo prazo. No curto prazo, adverte Laqueur (2004), o perigo permanece iminente e ascendente. O padrão, tipologia e locais de futuros ataques dependerão de onde o terrorismo poderá encontrar a debilidade do inimigo. Como exemplo, o autor oferece a penetração do islamismo radical nas instituições sociais do estado paquistanês, que se fundou como Estado secular, mas que hoje possui, nas suas madrassas, incubadoras prósperas do fundamentalismo.

Laqueur (2004) identifica a Europa como o campo de batalha mais vulnerável. A liberdade democrática facilita a penetração e atuação de radicais em suas missões de doutrinamento. Além disso, a atuação em território ocidental possibilita um maior

conhecimento do inimigo e de suas debilidades, de maneira que os imigrantes radicados na Europa são instrumentos táticos em potencial.

O fenômeno da radicalização da segunda geração de imigrantes é apontado pelo autor como um fenômeno comum. Parcialmente integrada à nova sociedade, a segunda geração parece experimentar um recrudescimento dos ressentimentos e hostilidade causados pela integração incompleta e pela diferenciação. Essa radicalização causa temor nos não muçulmanos, que por sua vez podem desenvolver reações xenófobas ou racistas. Laqueur (2004) não questiona, entretanto, a possibilidade de que a sociedade receptora ofereça de antemão certo rechaço inicial ao recém chegado baseado na ameaça à estabilidade econômica e maior concorrência no mercado de trabalho, por exemplo. Para ele, esse terreno tumultuado é solo fértil para o enraizamento dos ativistas islamistas e ainda que o número de extremistas seja pequeno, é suficiente para o surgimento de atividades terroristas. E a disponibilidade e facilidade de acesso a armas de destruição de massa unidas ao fanatismo colocam em pauta o perigo iminente do hiperterrorismo.

As explosões que tiveram lugar no sistema metroviário de Londres em julho de 2005 foram perpetradas por terroristas londrinos, não por imigrantes, servindo talvez de exemplo para o fenômeno de radicalização da segunda geração descrito por Laqueur.

Para Laqueur (2004), o terrorismo é a manifestação contemporânea do conflito. Compara-o à guerrilha e sugere que suas características dependerão das motivações dos envolvidos e do contexto. O terrorismo contraria as regras do conflito bélico e ao mesmo tempo rejeita os conceitos do crime de guerra. Sem poder aderir às regras dos jogos de guerra, o terrorismo investe contra a fragilidade da população civil.

Os governos não podem reagir com soluções violentas que seriam consideradas bárbaras, mas aceitar a assimetria os deixa debilitados diante do terrorista. Se o grupo é pequeno (e não opta pela destruição em massa), possivelmente o problema da assimetria torne-se insignificante e os instrumentos legais civis sejam suficientes para combater o problema. Mas se a integridade da população civil estiver em risco, a defesa dos governos ficará limitada a normas e leis pertencentes a uma era que então fará parte do passado.

Destacando que o perigo terrorista não está na ideologia ou nos motivos de seus perpetradores, mas sim no uso de armas e na ameaça à segurança, Laqueur (2004) sugere que a resposta branda só é suficiente no enfrentamento de grupos pequenos (ou que não representam grandes ameaças). O uso da força massiva costuma ser efetivo, mas traz conseqüências. Assim, o governo só deve lançar campanhas terroristas se estiver disposto (e capacitado) a usar a força e o terrorista deve avaliar se realizar atos capazes de provocar retaliações importantes compensa.

Para o autor, as grandes potências sempre serão temidas, invejadas e possivelmente odiadas simplesmente pelo fato de que por ser potências ameaçam o mais fraco. A benevolência política pode despertar simpatia entre similares e rechaço profundo entre aqueles que não cultivam os mesmos valores. A benevolência de um é imperialismo para o outro.

Se não podem ser amadas, continua, é necessário que as potências sejam ao menos respeitadas. Como é possível ver nas declarações de bin Laden anteriores aos atentados de 11 de setembro, lembra Laqueur (2004), a motivação e a certeza de êxito estavam baseadas na falta de respeito e temor aos Estados Unidos.

As reações da opinião pública contra a resposta dos Estados Unidos ao 11 de setembro foram inflamadas, invocando a violação aos direitos humanos e às liberdades democráticas. Para Laqueur (2004), há motivos suficientes, entretanto, para que as medidas de combate ao terrorismo sejam ainda mais estritas (é provável que as reações da opinião pública fossem diferentes se as armas de destruição em massa fossem utilizadas ao menos uma vez).

Laqueur (2004) adverte que o risco do hiperterrorismo é iminente e real e que concentrar as atenções apenas no islamismo radical faz ignorar que o problema é bem maior. Na atualidade, pequenos grupos cuja motivação não precisa ser necessariamente política representam uma grande ameaça devido a seu grande potencial destrutivo. Apesar da existência das armas de destruição massiva, a decisão de uso dependerá sempre de nós, humanos. E no futuro as ondas de terrorismo poderão variar em intensidade e grau de êxito, mas não desaparecerão. Afinal, para Laqueur o terrorismo é a forma de manifestação contemporânea do conflito, algo inerente à natureza humana.

2.1.2 O conflito bipolar entre o Islã e o liberalismo ocidental de Paul

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