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Capítulo 2 O debate acadêmico

2.2 Terrorismo e mídia pelos teóricos

2.2.1 Revisão de literatura sobre mídia e terrorismo

2.2.1.4 Cobertura midiática

Nesta categoria encontram-se estudos que freqüentemente proporcionam dados originais. De um modo geral, são estudos que acabam por questionar de alguma forma se a mídia facilita ou dificulta a consecução de objetivos por parte dos terroristas. Alguns estudos avaliam o valor noticioso do terrorismo, enquanto outros provam que a cobertura não é representativa da prevalência e incidência do terrorismo por ator, tática, região e alvos. Hoje, mais do que nunca, o foco da cobertura midiática está no terrorismo internacional. Segundo Paletz e Boiney (1992, p. 17), os problemas regionais, a perspectiva das vítimas, o problema do terrorismo doméstico, do terrorismo de Estado e do terrorismo insurgente na América Latina, Extremo Oriente e África estão infra-representados e infranoticiados. Embora hoje exista grande preocupação com o hiperterrorismo, a maior parte dos incidentes relatados envolvem métodos tradicionais e uso de explosivos. E com exceção dos acontecimentos verdadeiramente espetaculares, a maior parte dos relatos consiste em breves pílulas.

Entre as subcategorias identificadas nos estudos cujo foco é a cobertura midiática estão os estudos de casos, estudos comparativos entre os diferentes meios de comunicação e a mídia no controle.

a. Estudos de casos

Em geral estes trabalhos preocupam-se pela influência da mídia no terrorismo e nas conseqüências dessa influência. Os dados reunidos por esses estudos apontam para provas de que a mídia auxilia ou não na causa terrorista e que fortalece os governos do Ocidente ao posicionar-se contra o terrorismo e os terroristas.

Um primeiro bloco de estudos aponta para um efeito de contágio entre cobertura e atividades terroristas e no terrorismo de um Estado para outro. Estudos como o de Midlarsky, Crenshaw e Yoshida (1980, apud PALETZ; BOINEY, 1992, p. 18) mostram que o contágio ocorre das unidades maiores e mais visíveis para as menores e menos respeitadas e que o processo se deve em parte pela contribuição da mídia. O estudo ainda sugere que existem diferenças no grau de contágio, dependendo da tática utilizada. Explosões e seqüestros são mais contagiosos que assassinatos, por exemplo.

Outros estudos sugerem que a cobertura midiática representa apoio para o terrorismo. Weimann (1983, apud PALETZ; BOINEY, 1992, p. 18) observou que, de certa forma, a exposição à mídia pode melhorar a avaliação que o público faz do terrorismo. Ao revisar o efeito de contágio Picard (1986, apud PALETZ; BOINEY, 1992, p. 19) não encontrou nenhuma relação de causa e efeito entre a cobertura e aumento da incidência do terrorismo. Em outro estudo realizado em 1990, entretanto, Weimann observou efeitos de agendamento, sendo que os sujeitos expostos à cobertura midiática do terrorismo tendem a considerar o assunto mais importante que os que não se submeteram à mesma exposição.

De modo geral, a maioria dos estudos de caso demonstra que a cobertura midiática não traz benefícios para o terrorismo. Ainda que os terroristas consigam captar atenção para suas causas e exigências, o êxito na obtenção de um tipo de cobertura que possa beneficiar suas estratégias é dúbio (KELLY, MITCHELL, NACOS, FAN e YOUNG apud PALETZ; BOINEY, 1992, p. 19). Em alguns casos, a cobertura

midiática prejudica claramente o perpetrador como demonstra Rapoport (apud NACOS, 1996) ao discutir o caso do Unabomber e de como foi capturado depois de conseguir forçar a publicação de seu manifesto em dois dos principais jornais norte-americanos.

b. Diferenças entre os meios de comunicação

Nesta subcategoria Paletz e Boiney concentram-se nos estudos que comparam a cobertura em diferentes tipos de mídia ou em mídia de diferentes regiões. Segundo Paletz e Boiney (1992, apud PALETZ; BOINEY, 1992, p. 20), os estudos analisados revelam que nem o terrorismo e nem os meios de comunicação são monolíticos, algo freqüentemente ignorado nos estudos que responsabilizam a mídia. Existem diferenças na mídia entre formatos, sistemas de propriedade, países ou empresas. De forma análoga, tampouco existe um único terrorismo, mas sim muitos terrorismos e o grau em que os terroristas conseguem obter benefício da cobertura midiática pode oscilar em função de muitas variáveis, geralmente parcamente exploradas na literatura acadêmica.

Além disso, sugerem que os diferentes públicos também devem ser considerados, pois os próprios terroristas podem organizar seus espetáculos em função dos públicos que lhes interessam. Por outro lado, o impacto no público dependerá também de muitos fatores, sendo que o mesmo acontecimento violento pode intimidar alguns e provocar em outros impulsos de retaliação.

c. A mídia no controle

Nesta categoria os autores deste estudo de revisão incluem os trabalhos que consideram que a mídia é responsável pela transmissão do que se considera realidade. Um estudo conduzido por Picard e Adams (1988, apud PALETZ; BOINEY, 1992, p. 22) sugere que a mídia impressa transmite informações de forma neutra, não tendenciosa e que, portanto, não se presta aos interesses governamentais ou dos terroristas.

De um modo geral, os dados apresentados na literatura acadêmica em estudos de análise de conteúdo sugerem que a cobertura midiática não oferece muitos benefícios aos terroristas. Alguns dados mostram que o que sim pode ocorrer é que a mídia apóie os governos Ocidentais contra o terrorismo. Paletz e Boiney (1992, p. 22-23) alertam

para o fato de que tais estudos são limitados por sua própria metodologia e porque se concentram no conteúdo publicado, raramente comparando os dados obtidos com dados reais da opinião pública, entrevistas ou outros métodos experimentais.

No que concerne à literatura acadêmica como um todo, Paletz e Boiney (1992, p. 23-25) chamam a atenção para o fato de que a maioria dos trabalhos não apresenta dados objetivos, concentrando-se em apelos propagandísticos e exemplos tendenciosos. Muitas afirmações simplesmente não são documentadas e os argumentos freqüentemente carecem de verificação. As recomendações basicamente concentram-se em um excesso de responsabilização da mídia. Poucos trabalhos apresentam os pontos de vista dos terroristas ou seu raciocínio no que diz respeito às estratégias e táticas empregadas.

A verificação do impacto real sobre os públicos também é negligenciada. Como diagnóstico, pode-se dizer que faltam dados empíricos, rigor na pesquisa e riqueza nas abordagens. Como recomendações para a pesquisa acadêmica, os autores sugerem que se analise cuidadosamente a confiabilidade das fontes, que se realizem estudos comparativos entre diferentes formatos, que se observem as metas e estratégias dos terroristas, interesses estatais e as respostas ao problema. Estudos comparativos sobre a cobertura em diferentes tipos de regimes no mundo também podem revelar dados valiosos sobre os processos midiáticos, bem como sobre influência governamental, em suma, é necessário ampliar a pesquisa de forma que seja possível obter dados de todas as facetas do conflito.

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