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2.2. Raciocínios dos alunos em Probabilidades

2.2.1. A perspectiva de Piaget e Inhelder

Piaget e Inhelder (s/d) realizaram estudos para analisar detalhadamente as etapas na aquisição das ideias de aleatoriedade e probabilidade, o raciocínio combinatório, a distribuição e a convergência, assim como da quantificação de probabilidades em crianças e adolescentes. Com estes estudos, os autores concluíram a existência de três estádios de desenvolvimento sequenciais: pré-operacional, operações concretas e operações formais, como se mostra no quadro 3.

Quadro 3 – Estádios dos alunos na compreensão do conceito de acaso

Idade / Estádios Capacidades dos alunos

4– 7 anos (Pré-operacional)

As operações propriamente ditas estão ausentes; os raciocínios em jogo permanecem pré-lógicos e são regulados apenas por sistemas de regulação intuitivas, sem encaixes hierárquicos, sem

mas com uma articulação progressiva das relações intuitivas, levando pouco a pouco ao nível operatório.

Neste estádio os alunos não distinguem o possível do necessário, movendo-se portanto numa esfera de acção tão afastada do acaso como da própria operação. O seu pensamento oscila entre o previsível e o imprevisto, mas nada é para ela nem seguramente previsível, portanto dedutível segundo um elo de necessidade, nem seguramente imprevisível, portanto fortuito. Não se deve portanto considerar como julgamentos de probabilidades as suas

antecipações atacadas por um grau maior ou menor de certeza subjectiva.

Podemos então concluir que as crianças neste estádio rejeitam a ideia de acaso ou concebem-na de uma forma determinista, têm dificuldade em diferenciar a certeza da incerteza, carecem de estratégias combinatórias e ao compararem probabilidades só tomam em atenção os casos favoráveis.

7– 11 anos (Operações concretas)

Este período caracteriza-se pela construção dos agrupamentos operatórios de ordem lógica e grupos numéricos, porém apenas num plano essencialmente concreto, ou seja, relativo a objectos manipuláveis representáveis no detalhe de suas relações reais. Com o aparecimento das operações lógico-aritméticas começa um segundo período que marca o primeiro desenvolvimento da ideia do acaso. Por um lado, a descoberta da necessidade dedutiva ou operatória permite ao sujeito conceber, por antítese, o carácter não dedutivo das transformações fortuitas isoladas e distinguir entre o necessário e o simplesmente possível. A descoberta da existência do acaso, como um facto, decorre por contraste da construção das necessidades operatórias, e o início da estruturação das relações de probabilidades deve-se à possibilidade de conceber os

conjuntos de elementos misturados como totalidades formadas de partes quantificáveis.

Neste estádio, as crianças adquirem progressivamente uma compreensão de acaso, mas ainda confiam demasiado na

possibilidade de o controlar. Começam a ser capazes de enumerar situações combinatórias simples, embora a estratégia não seja sempre completa ou consistente. As estratégias de comparação de probabilidades ampliam-se, usando tanto os casos favoráveis como os desfavoráveis, sem chegar a um raciocínio proporcional

completo. Não reconhecem a lei dos grandes números.

Mais de 12 anos (Operações Formais)

Este período é caracterizado pelo pensamento formal, quer dizer, pela possibilidade de ligar um ao outro um ou vários sistemas de operações concretas ao mesmo tempo e traduzi-los em termos de implicações hipotético – dedutivas, isto é, de lógica de

proposições. Só neste estádio é que o julgamento de

probabilidades se organiza, por uma espécie de choque em volta da operação sobre o acaso. Progressivamente concebem o acaso como ausência de padrões e imprevisibilidade. Adquirem a

intuição de convergência, usando proporções nas comparações de probabilidades e alcançam a capacidade de utilizar a combinatória para enumerar.

Resumindo, no estudo efectuado sobre a aquisição da ideia do acaso na criança Piaget e Inhelder consideram que se pode caracterizar o terceiro estádio em relação aos outros dois:

durante o primeiro período, não há diferenciação entre o dedutível e o não dedutível, ficando a antecipação intuitiva a meio caminho ente a operação e o próprio acaso; no segundo período, existe a diferenciação e, portanto existe inicialmente uma antítese entre o acaso e as operações, determinando este o domínio do dedutível, e aquele definindo o domínio do dedutível e do irreversível, ou seja, do imprevisível; no terceiro período, há a síntese entre o acaso e as operações, permitindo estas estruturar o campo das dispersões fortuitas em um sistema de probabilidades, por uma espécie de assimilação analógica do fortuito ao operatório. Para este resultado, concorrem dois processos correlativos. Por um lado, a construção dos sistemas combinatórios, por outro lado o pensamento formal que permite a construção de tais sistemas combinatórios, leva igualmente à descoberta das proporções: a lei dos grandes números, que aplica as relações de proporcionalidade a essas mesmas operações combinatórias, leva então o sujeito a conceber a legitimidade de uma composição probabilista das modificações fortuitas, no sentido de uma dispersão proporcionalmente sempre mais regular, e por conseguinte à previsão racional. (p. 296)

Carvalho e Fernandes (2005), analisando os estudos desenvolvidos por Piaget e Inhelder (1951), consideram que para estes últimos

o desenvolvimento da noção da probabilidade resulta de uma amálgama entre factos e sequências causa-efeito, fruto das próprias acções do sujeito, bem como da noção de acaso e de estimações espontâneas que vai formando com base no carácter mais ou menos provável dos acontecimentos esperados ou receados que vai vivenciando através das suas experiências quotidianas.

O desenvolvimento cognitivo consiste numa sequência de transformações onde esquemas sensório-motores elementares são progressivamente integrados em estruturas complexas. O conceito de probabilidade, tal como acontece com outros, segue uma ordem de diferentes níveis até à sua aquisição. (p. 3)

Para estes autores, a noção de acaso e as suas implicações no desenvolvimento do conceito de probabilidade são a continuação da evolução das operações lógicas e consideram que apenas quando a criança compreende as relações de causa-efeito dos fenómenos físicos é que a criança consegue compreender os fenómenos aleatórios.

Fernandes (1990) considera que com a compreensão da lei dos grandes números atinge- se o conceito de probabilidade enquanto limite da frequência relativa e sintetiza os estádios da aquisição do conceito de probabilidade considerando que ‖este decorre da racionalização dos

processos estocásticos através das operações (p. 31). Durante o primeiro estádio a ideia de acaso ou de probabilidade não é observada, pois a as operações formais, enquanto sistema de referência não estão formadas. No segundo estádio, a ideia do acaso impõe-se por oposição às operações concretas e a ideia de probabilidade racionaliza-se para o caso dos ―pequenos números‖ servindo-se, como apoio, da disjunção concreta. No terceiro estádio, temos a racionalização da ideia do acaso e do conceito de probabilidade para o caso dos grandes números, a partir das operações combinatórias.