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A Pesqueira industrial e o contexto econômico nacional

2 PATRIMÔNIO INDUSTRIAL: ENTENDIMENTOS E INSTITUIÇÕES DE

4.2 A Pesqueira industrial e o contexto econômico nacional

Não é objetivo deste trabalho investigar o processo de industrialização do Brasil e de Pernambuco, porém, objetivando uma melhor compreensão da temática aqui abordada, faz-se necessário apresentar um breve histórico dos fenômenos que permitiram a industrialização do município de Pesqueira.

Até o século XIX, o Brasil passou por três ciclos econômicos distintos: o da cana-de- açúcar, o do ouro e o do café. Este último ciclo teria sido o responsável pelo crescimento da economia brasileira no final do século XIX, o qual permitiu um acúmulo de capital, que resultou no desenvolvimento da indústria, especialmente nas regiões Sul e Sudeste58.

Segundo Galindo (2007), nesse primeiro momento, a indústria brasileira apresentou duas características marcantes: a primeira, com a predominância de bens de consumo (produtos têxteis e de alimentos) e a segunda, com uma industrialização de cunho descentralizado, que levou à criação de uma reserva de mercado regional, devido aos altos custos de transportes e impostos

57 Martins, 2011. 58 Galindo, 2007.

interestaduais. Nesse contexto, a indústria brasileira se consolidou nas primeiras décadas do século XX, todavia esse desenvolvimento aconteceu de diferentes formas nas regiões do país.

Em Pernambuco, assim como ocorreu no contexto nacional, o primeiro momento da industrialização pode ser identificado no final do século XIX e início do século XX. Nesse momento destacaram-se as usinas da cana-de-açúcar na zona rural e a indústria têxtil no perímetro urbano. Segundo Andrade (1961), o processo de industrialização local foi fortalecido por essas indústrias. No caso específico de Pesqueira, o processo industrial ocorreu em razão da existência de um pequeno grupo detentor de capital, que com o intuito de diversificar as suas atividades e fontes de renda, passou a investir em outros segmentos. Assim surgiram as primeiras fábricas no município.

Como foi relatado, ao longo do século XIX, Pesqueira vivenciou um forte desenvolvimento comercial, transformando a localidade em um importante polo mercantil no interior de Pernambuco. O auge dessa atividade se estabeleceu com a chegada da estrada de ferro no ano de 1907, quando Pesqueira se tornou a última cidade do eixo ferroviário ligando a capital ao interior do estado. Nesse sentido, o município passou a ter uma posição de destaque no comércio nordestino, ficando conhecido como a “Dispensa do Sertão”59. Em 1920, os trilhos foram

prolongados até o distrito de Olho D’Água dos Bredos, hoje o município de Arcoverde. A extensão da estrada de ferro fez com que Pesqueira perdesse força no seu papel de entreposto comercial60.

Em razão disso, o fim da hegemonia mercantil provocou o surgimento de uma nova atividade econômica. Assim, com uma base econômica consolidada pela intensa atividade comercial foi possível o desenvolvimento da atividade industrial ao longo das décadas de 1890 e 1910, tendo seu apogeu nas décadas de 1930 a 1950.

A gradativa transformação da economia comercial em industrial veio por meio da instalação de diversas fábricas, com destaque para a Fábrica Peixe (1897), a Fábrica Rosa (1906) e a Fábrica Tigre (1919)13. Além do capital acumulado pela atividade mercantil, essa

transformação proporcionou o desenvolvimento industrial bem como a presença de uma mão-de- obra barata, a abundância da matéria prima61 e a existência de um mercado local. A falta de

concorrência na fase inicial, levou a indústria pesqueirense a assumir um caráter regional.

59 Cavalcanti, 2005. 60 Cavalcanti, 2005.

O ramo industrial dominante era o alimentício. As fábricas de outros artigos, como calçados e malas, tinham uma influência econômica local, vendendo os seus produtos entre os municípios vizinhos. As produções de laticínios possuíam um maior alcance, chegando ao Recife. Já as fábricas de doces de conserva possuíram um grande poder comercial, comercializando seus produtos com os estados do sudeste do país, além do exterior14. A adoção de uma comercialização

inter-regional pelas indústrias alimentícias, possibilitou o seu forte desenvolvimento. Não havia na época uma concorrência forte aos seus produtos, fazendo com que houvesse um constante escoamento da produção.

Segundo Cavalcanti (2005), nesse período, os industriais foram se apropriando de parte do território e de alguns imóveis do município, determinando como deveriam ser utilizados. Este fato teria feito dos industriais os verdadeiros donos da cidade. Assim, a história das indústrias se confunde com a de Pesqueira. Junto ao desenvolvimento das fábricas, observa-se também uma nova paisagem no município, que passou por uma acentuada urbanização. Uma série de edificações especiais foram surgindo, como relata Maciel (1980) em um dos seus artigos para A Voz de Pesqueira, em 1948:

Os principais edifícios da cidade são: o palácio episcopal, a catedral de Sant’Águeda, colégio e capela das Irmãs Dorotéias, convento e igreja dos Franciscanos (inaugurado em 1908), capela episcopal de N. S. Mãe dos Homens (fundada em 1822 pelo capitão-mor Manuel José de Siqueira, reconstruída em 1920 pelo bispo D. José Lopes), Municipalidade e Fórum (o mais antigo prédio da cidade erguido em 1800 pelo capitão-mor Siqueira, fundador da cidade), seminário diocesano e capela (1947), colégio <<Cristo Rei>>, grupo escolar rural <<Rui Barbosa>>, fábricas de conserva <<Peixe>>, (Carlos de Brito & Cia), <<Rosa>> (José Didier), <<Tigre>> (Rocha & Irmãos), prefeitura municipal (ex-grupo escolar), cinema <<Moderno>>, Correios e Telégrafos, hospital regional, <<Serviço Nacional de Peste>>, <<Dispensário dos Pobres>>, Cooperativa agro-pecuária, <<Clube dos 50>>, grupos escolares municipais <<Zeferino Galvão>>, <<D. Vital>> e <<Amauri Medeiros>>, <<Casa de S. Francisco>>, <<Pia União>>, estação ferroviária, prédios comerciais: agências <<Ford>> e <<Chevrolet>>, <<Taça de Ouro>> (bar e sorveteria), A. B. Cavalcanti & Cia. Casas José Araújo, <<Lojas Sant’Águeda>> (José de Almeida Maciel), J. Freitas & Cia, fábrica de laticínios (Paulo Brito & Cia), igrejas Cristo-Rei e S. Sebastião (bairros da Pitanga e São Sebastião), casa de saúde Sta. Virgínia (atualmente fechada). Acha-se em construção a séde do <<Clube dos Radicais>> que vai ser um prédio de realce. (MACIEL, 1980, p. 318)

Com isso, percebe-se que a indústria alimentícia em Pesqueira influenciava em vários sentidos na vida urbana do município. Como será visto no próximo item, além da economia, os industriais influenciavam na política, elegendo seus candidatos para o cargo de Prefeito e,

consequentemente, no desenvolvimento urbano local; na educação, com as escolas dedicadas ao ensino dos filhos dos operários; no setor de comércio e serviços, atendendo às demandas da fábrica; nas manifestações culturais, incluindo a religiosidade. Dessa forma, a identidade pesqueirense foi construída tendo por base a cultura industrial e os seus impactos, sendo a Fábrica Peixe aquela com maior influência no município.