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2 PATRIMÔNIO INDUSTRIAL: ENTENDIMENTOS E INSTITUIÇÕES DE

4.1 Situando Pesqueira

Pesqueira, cidade do Agreste pernambucano, está localizada ao Sopé meridional da Serra do Ororubá, distante 215 km do Recife. Com uma população estimada de 65.374 habitantes52, o

município ocupa uma área de 995,536 Km2 e é banhado principalmente pelos rios Ipanema e

Ipojuca. Embora os eventos anteriores à fundação de Pesqueira não sejam objeto de estudo deste trabalho, faz-se necessário relacionar os fatos que condicionaram o surgimento e desenvolvimento do município. Para tanto, será feita uma breve exposição do momento de interiorização do território da então Capitania de Pernambuco.

51 Para melhor entendimento consultar o capítulo 2 desta pesquisa. 52 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 2013.

Imagem 4 - Mapa de Pernambuco, detalhe para a área correspondente ao município de Pesqueira em vermelho

Fonte: SUDEN/ITEP, maio/2007.

Por volta do fim do século XVIII e início do XIX, houve em Pernambuco um processo de ocupação rural das regiões a oeste da capitania a partir da doação de sesmarias nas regiões hoje conhecidas como Agreste e Sertão. Essas sesmarias foram divididas em lotes menores onde funcionariam as fazendas de gado, cuja produção de carne e derivados daria origem ao Ciclo do Couro. Os estabelecimentos das sesmarias e das fazendas de gado originaram diversas vias de escoamento de produção, conhecidos como “os caminhos das boiadas”, ligando os sertões até Recife, Olinda e Salvador (NEVES, 2003). Dentre esses caminhos, dois cortavam as sedes de fazendas de gado no Agreste: o Caminho do Capibaribe e o Caminho do Ipojuca.

Os Caminhos das Boiadas eram uma rede de distribuição de gado e produtos derivados que geralmente acompanhavam os percursos de rios e cruzavam as sedes das fazendas, que serviam de rede de pouso para o descanso do gado e dos tangedores. Foi do Caminho do Ipojuca que teve origem ao sopé da Serra do Ororubá, o povoado Poço da Pesqueira, proveniente de uma fazenda de gado pertencente a Manuel José de Siqueira e datada simbolicamente de 1802.

O início da ocupação do território onde hoje está situada Pesqueira teve sua forma primordial definida pela própria estrada das boiadas, que cortava a localidade, tendo sido as primeiras casas erguidas à margem dessa estrada, dando a esse núcleo uma forma linear semelhante a uma espinha dorsal. Nessa longa espinha dorsal foi estabelecido o núcleo inicial de Pesqueira, que se configurava em um povoado detentor da Casa Grande, de alguns casebres, de uma capelinha e de um largo de comércio. Na Imagem 6 observa-se a existência da Casa Grande, indicada pelo número 01; de três sobrados, números 02, 03 e 04; e da ermida, número 05.

Imagem 5 - Ilustração do núcleo inicial de Pesqueira

Fonte: Frederico B. Maciel. Apud Bezerra, 2011. Adaptação da autora.

Próximo a este núcleo primitivo estabeleceu-se o Largo da Feira53, fruto do entroncamento

de seis caminhos distintos, os quais serviam de passagem de tropas e diligências indo para diversas localidades, como: o Recife, o Sertão, a Vila de Cimbres, entre outras54. Segundo Cavalcanti

(2007), era neste Largo que se desenvolvia a feira de rua, cujas principais mercadorias eram do gênero alimentício, mas também havia o comércio de roupas, animais, ervas medicinais e utensílios domésticos55. A Imagem 7 mostra o Largo em 1928, já sob a denominação de Praça

Buarque de Macêdo, rodeado por casas residenciais e comerciais.

53 Posteriormente denominado de Pátio do Comércio, Largo da Matriz, Praça da Matriz, Praça Buarque de Macêdo,

e, por fim, Praça Dom José Lopes.

54 Martins (2011).

55 Esta tradição perdurou durante séculos, tendo seus domínios se ampliado para além dos limites da praça. Na década

de 2000, a feira passou a ser acomodada dentro do pátio da antiga Fábrica Peixe, onde é realizada até hoje todas as quartas-feiras.

Imagem 6 - Praça Buarque de Macedo, atual Dom José Lopes, 1928

Fonte: Maciel, 1987.

Nesse período de instalação, a Fazenda Poço da Pesqueira pertencia à Vila de Cimbres. Porém, a sua aproximação com os caminhos das boiadas, fez com que a localidade se transformasse num importante ponto de apoio para viajantes e tropeiros, o que gerou fortes relações comerciais desde o Recife até o Sertão. Este fato acabou favorecendo o desenvolvimento da propriedade, que logo se transformou em povoado e em 1836 foi elevada à categoria de vila, sob a denominação de Vila de Santa Águeda.

Apenas em 1913 o município passou a ser denominado Pesqueira. Com o título de sede do município, Pesqueira se tornou a 15a cidade pernambucana e a primeira do semiárido.

A cidade de Pesqueira quando povoação teve a categoria de vila, transferida de Cimbres a cujo município pertencia, em virtude da lei nº 20 de 13 de Maio de 1836, decretada pela primeira Assembléia Provincial reunida em Pernambuco após a Independência. [...] Posteriormente, isto é, depois de longo período de 44 anos, foi Pesqueira elevada à cidade, ex-vi da lei 1.484 de 20 de Abril de 1880. Pela ordem cronológica, Pesqueira alcançou então o 15º lugar na lista das cidades pernambucanas e na região sertaneja onde se achava encravada antes da atual divisão de zonas, era a única cidade existente. (MACIEL, 1980, p.269.)

Em meio a um já próspero crescimento, teve início no ano de 1852, nas imediações do Largo da Feira, a construção da Matriz de Santa Águeda56, porém a igreja foi inaugurada somente

em 1889. Nessa Imagem 8, a Igreja pode ser observada com suas características originais. Na imagem de 1910 também chama a atenção a presença de calçadas e postes de iluminação pública, o que retrata a existência de uma estrutura urbana desenvolvida para o momento.

Imagem 7 - Vista parcial de Pesqueira, 1913. Destaque para a Catedral de Santa Águeda ao fundo

Fonte: Wilson, 1980.

Dessa maneira, a ocupação do território foi acontecendo principalmente no sentido leste- oeste, acompanhando o relevo e caracterizando uma “espinha dorsal” ou, como ressalta Martins (2011), “uma espécie de crista margeada por dois fundos de vale”. O Mapa 01 retrata esse momento e nele pode-se observar a linha de força matriz da espinha dorsal (em vermelho), correspondente a um dos seis caminhos das boiadas que cortavam a região. Há ainda a retratação do núcleo inicial (linha tracejada amarela) e do Largo da Feira (linha tracejada verde), onde,posteriormente, foi desenvolvida a construção da Igreja Matriz de Santa Águeda.

Mapa 1 - Ilustração indicando o núcleo inicial de Pesqueira, com destaque para o Largo da Feira, os seis caminhos e as primeiras habitações. Em destaque na cor vermelha a linha de força de desenvolvimento matriz (leste-oeste) e em

azul a linha de força secundária (norte-sul)

Fonte: Frederico B. Maciel. Apud Martins, 2011. Adaptação da autora.

Essa linearidade da espinha dorsal permaneceu ao longo do desenvolvimento do município, como pode ser observado na Imagem 9, datada da década de 1920. A imagem mostra a Catedral de Santa Águeda (canto esquerdo da Imagem) e a Rua Duque de Caxias, parte integrante da referida espinha dorsal. Percebe-se que até a data da fotografia ainda não havia se iniciado a ocupação efetiva no sentido norte-sul.

Imagem 8 - Fotografia panorâmica do eixo principal onde se iniciou a ocupação de Pesqueira na década de 1920. Detalhe para a Catedral de Santa Águeda (seta vermelha)

A distribuição do casario apresentada na Imagem 9 revelava a concentração de renda do município, dessa forma as famílias mais ricas residiam na via principal e no seu entorno imediato, enquanto a população de baixa renda se estabelecia nas demais áreas. Nesse momento, a divisão funcional da espinha dorsal começava a se estabelecer, assim, na parte correspondente ao centro da cidade (2), onde se encontra a então Praça Buarque de Macêdo, era predominante o uso comercial, já a parte mais a oeste (3), referente à Rua Duque de Caxias, caracterizava-se pelo uso residencial. Enquanto que nas áreas localizadas nas extremidades leste e oeste (1 e 4), se estabelecia o uso fabril.

Como será visto neste capítulo, no início do século XX, Pesqueira passou por um significativo desenvolvimento industrial que modificou o caráter da cidade. Na data da fotografia (apresentada na Imagem 9) já existiam as instalações das principais fábricas que provocaram esse desenvolvimento, porém elas não são contempladas na imagem. Com a ajuda do Mapa 02, observa-se que as fábricas (na cor amarela) aparecem “ancorando” as duas extremidades desse eixo principal (na cor vermelha), o que provavelmente acentuou a expansão urbana ao longo desse sentido.

Mapa 2 - Planta funcional de Pesqueira (1956) com destaque em amarelo para as fábricas Peixe e Rosa (hachura da autora)

A instalação das fábricas dentro do eixo principal acabou marcando a paisagem da urbe. Seus monumentais edifícios se destacavam do entorno de casas térreas e suas chaminés marcavam a skyline do município, que logo se tornou um exemplar de cidade industrial do Agreste pernambucano, conhecida como Cidade das Chaminés57.

Dessa forma, o município de Pesqueira nasceu da instalação de uma fazenda de gado que surgiu no século XVIII nas estradas de boiadas do Ipojuca. Essa fazenda estava associada às atividades pecuaristas e comerciais. O papel de entreposto comercial fez de Pesqueira detentora de uma das mais importantes feiras de gado da região, que atraía centenas de pessoas, vindas de diversas localidades para comercializar vários produtos, sendo um elo entre a capital e o Sertão.

O forte desenvolvimento na localidade fez com que, em 1950, Pesqueira já possuísse um rico patrimônio: casario, sobrados imponentes, cinco templos religiosos, várias fábricas, centro educacionais, hospital regional, um diversificado comércio, além de clubes e cinemas. O progresso alcançado por Pesqueira na primeira década do século XX foi impulsionado por um forte surto industrial, como será relatado no item a seguir.