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O marco legal para os recursos hídricos no Brasil foi a criação do Código das Águas, estabelecido pela Lei nº 24.643, de 10 de julho de 1934, que trata das atribuições e competências sobre recursos hídricos. A princípio, os recursos hídricos ficavam a cargo do Ministério da Agricultura (MA), pois apresentava vocação agrícola. No entanto, a partir da década de 1950, as competências encontraram lugar específico no âmbito do setor elétrico, no Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE), órgão de administração direta do Ministério das Minas e Energia (MME) (PEREIRA, 2005; HORJA, 2005).

O Código das Águas é um instrumento legal que disciplina as atividades nesse setor e continua em vigor até hoje. Sendo que, a partir da década de 1970, quando aconteceu a Conferência Mundial de Meio Ambiente de Estocolmo, em 1972, cresceu no Brasil as discussões ecológicas, contribuindo para a criação da Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA), vinculada ao Ministério do Interior, mas somente nos anos 80 estas discussões se acentuaram, culminando com a criação do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) que estabeleceu a classificação das águas doces, salobras e salinas, em todo o território brasileiro, em nove classes, segundo seus usos preponderantes (BORSONI e TORRES, 1997).

A partir de um processo participativo originário dos movimentos sociais na tentativa de resolver os problemas que vinham ocorrendo em função dos conflitos de usos dos recursos hídricos, foi sancionada a Lei 9.433, de 08 de janeiro de 1997 que estabeleceu a Política Nacional dos Recursos Hídricos (PNRH). Essa política é de longo prazo, pactuada entre o poder público, os usuários e a sociedade civil, visando fundamentar e orientar a implementação da política de recursos hídricos, propondo diretrizes e grandes metas, reconhecendo que o gerenciamento dos recursos hídricos só pode ser feito de forma integrada mediante a participação de grupos organizados (SOARES, 2003).

O Sistema Nacional para o Gerenciamento de Recursos Hídricos (SNGRH) atua com um conjunto de órgãos e entidades, públicas e privadas, adotando a bacia hidrográfica como unidade de planejamento e de gestão. O SNGRH é

composto pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), Agência Nacional das Águas (ANA), os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal, os Comitês de Bacia Hidrográfica, os órgãos de governo, cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos, Agências de Bacias Hidrográficas (TUNDISI, 2005).

O SNGRH baseia-se em seis princípios fundamentais, que são: a água é um bem público; é um recurso finito que apresenta valor econômico; quando escassa, a prioridade é o abastecimento humano; o gerenciamento deve contemplar usos múltiplos; as bacias hidrográficas devem atuar como unidade básica de gestão; a gestão deve ser descentralizada, com a participação do poder público, dos usuários e das comunidades (TUNDISI, 2005).

Os principais instrumentos da PNRH envolvem os Planos de Recursos Hídricos elaborados pela bacia hidrográfica e pelo Estado e compreendem: o enquadramento dos corpos d'água em classes, segundo os usos preponderantes da água, que envolve avaliação inicial para balizar ações de recuperação e manutenção da qualidade da água disponível; a outorga de direito de uso que é a garantia de equidade para utilizar a água, tendo como base a afirmação da água enquanto bem público, relacionando sua disponibilidade em relação ao tempo e ao espaço; a cobrança pelo uso dos recursos hídricos; compensação aos municípios; sistema de informações sobre recursos hídricos (BRASIL, 2001; TUNDISI, 2005).

As diretrizes da PNRH buscam adequar a gestão às diversidades físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais das diferentes regiões do país, para tanto o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos adota a bacia hidrográfica como unidade territorial (ANA, 2003).

Na perspectiva de contemplar estas diretrizes, tornando a gestão participativa, descentralizada e que contemple uso múltiplo, foram criados os comitês de bacia hidrográfica, fóruns de decisão consultivos, com poder de deliberação sobre qualquer ação que possa afetar as águas da bacia hidrográfica em sua quantidade ou qualidade (ANA, 2003).

Os Comitês de Bacia Hidrográfica abrem uma nova lógica no gerenciamento dos recursos hídricos, posto ser a participação de diversos setores – governamentais e não governamentais – a incorporação da

sociedade civil no processo de discussão e decisão, um espaço para a gestão compartilhada.

O Comitê de Bacia Hidrográfica pode ser considerado como o principal instrumento da gestão participativa dos recursos hídricos. Pois, segundo a Lei n° 9.433/97, compete aos Comitês de Bacias Hidrográficas, no âmbito de sua área de atuação: promover debates das questões relacionadas a recursos hídricos e articular a atuação de entidades intervenientes; arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos; aprovar o plano de recursos hídricos da bacia, proposto pela Agência Nacional da Água (ANA); acompanhar a execução do plano de recursos hídricos da bacia e sugerir as providências necessárias ao cumprimento das metas; propor ao conselho nacional e aos estaduais de recursos hídricos as acumulações, derivações, captações e lançamentos de pouca expressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga de direitos de uso de recursos hídricos, de acordo com os domínios destes; estabelecer mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados; estabelecer critérios e promover o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo (TUNDISI, 2005).

Para a implementação desses instrumentos, a Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, cria a Agência Nacional de Águas (ANA), órgão gestor dos recursos hídricos de domínio da União. A ANA é uma autarquia especial com autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, sendo um órgão representativo dos recursos hídricos federal, dirigido por uma diretoria escolhida pela presidência da república (BRASIL, 2001; MACHADO, 2003).

O principal objetivo desta agência é disciplinar a utilização dos rios da União, controlar a poluição para garantir a disponibilidade das águas para as futuras gerações e elaborar estudos técnicos para auxiliar o Conselho Nacional de Recursos Hídricos em articulação com os comitês de bacias, para a determinação dos valores a serem cobrados pelo uso do recurso hídrico de domínio da União (BRASIL, 2001).

O Ceará, considerando as singularidades regionais e locais, estruturou o Sistema Estadual dos Recursos Hídricos, tendo a Secretaria dos Recursos

Hídricos – SRH como órgão responsável pelo desenvolvimento das políticas públicas nesta área, auxiliada pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos – COGERH e pela Superintendência de Obras Hidráulicas – SOHIDRA, sendo um dos primeiros estados brasileiros a instituir a sua política estadual, através da Lei nº 11.996/92, e institucionalizar o Sistema Integrado de Gestão de Recursos Hídricos do Ceará, antes mesmo da criação da ANA (CEARÁ, 2002; MACHADO, 2003).

A missão da SRH-CE é promover a oferta, a gestão e a preservação dos recursos hídricos de forma integrada, participativa e descentralizada, contribuindo com o desenvolvimento sustentável do Estado, sendo missão da COGERH-CE a gerência dos recursos hídricos de domínio do Estado e da União, por delegação, de forma integrada, descentralizada e participativa. Dessa forma, a SRH-CE desenvolve políticas que venham otimizar a oferta e a distribuição de água no Estado, sendo esta oferta tanto quantitativa como qualitativa (CEARÁ, 2002).

Para garantir a gestão participativa, a COGERH-CE também vem desenvolvendo um trabalho junto às comunidades formando os comitês de bacia hidrográfica. O Estado do Ceará conta com onze bacias hidrográficas, sendo estas a Bacia do Rio Coreaú, Acaraú, do Litoral, do Rio Curú, Metropolitana, Baixo Jaguaribe, Baixo Parnaíba, Rio Banabuiú, médio Jaguaribe, Alto Jaguaribe e Bacia do Rio Salgado, conforme a Figura 1.

Figura 01 – Mapa das Bacias Hidrográficas do Estado do Ceará. Fonte: Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará – COGERH, 2008.

A Bacia do Rio Salgado apresenta importância singular por abranger municípios da região de maior população do Cariri cearense (Crato e Juazeiro do Norte) com a maioria urbana que tem seu sistema hidrológico originando-se na Chapada do Araripe. Esta condição envolve 23 municípios do Sul-leste do Ceará, com vistas a uma gestão mais abrangente dos recursos hídricos do Cariri. Compõe a sub-bacia os municípios de Abaiara, Aurora, Baixio, Barbalha, Barro, Brejo Santo, Caririaçu, Cedro, Crato, Granjeiro, Icó, Ipaumirim, Jardim, Jati, Juazeiro do Norte, Lavras da Mangabeira, Mauriti, Milagres, Missão Velha, Penaforte, Porteiras, Umari e Várzea Alegre (MELO e LOPES, 2005).

A composição do comitê é de 50 representantes de associações de usuários, de organizações da sociedade civil, dos poderes municipais, estadual e federal, que contribuem para o desenvolvimento regional, integrando-se a um dispositivo geral de gestão participativa dos recursos hídricos do Estado do

Ceará. Essa integração foi estabelecida pelo decreto 26.462 de 11 de dezembro de 2001, do governo estadual publicado no Diário Oficial do Estado do Ceará (MELO e LOPES, 2005).

O Comitê tem poder consultivo e deliberativo, sendo considerado como uma das instâncias mais importantes de participação e integração de planejamento e das ações na área dos recursos hídricos. Para tanto, é fundamental que seus membros estejam envolvidos e que todos entendam a relevância do processo participativo na tomada de decisão pelo melhor uso da água e pelos investimentos necessários em torno desta bacia, a fim de alcançar práticas conducentes para a promoção da saúde.