• Nenhum resultado encontrado

A política pública e a gestão educacional no novo contexto mundial

3 POLÍTICA PÚBLICA EDUCACIONAL, DESCENTRALIZAÇÃO, GESTÃO DEMOCRÁTICA E PARTICIPAÇÃO

3.1 A política pública e a gestão educacional no novo contexto mundial

Através da reconstrução dos principais períodos da trajetória do pensamento administrativo da educação latino-americana, Sander (1995) desvenda a grande influência exercida por modelos europeus e norte-americanos. Desde o período colonial até os anos 1950 do século XX, predominaram, na América Latina, conceitos e práticas de gestão da educação concebidos em outros contextos culturais. Apenas nas últimas décadas do século XX, surgem estudos e propostas especificamente latino-americanos, voltados à resolução dos nossos problemas e partindo da nossa realidade econômica, social, política e institucional. O longo período de adaptação de modelos alheios à realidade latino-americana conduziu as organizações à ineficiência, ao formalismo e à ambiguidade.

Com a intensificação dos processos de globalização econômica e de reestruturação produtiva a partir dos anos 1970, assistiu-se a um questionamento do Estado, no que diz respeito às suas funções econômicas e sociais. A fixação de um ideário neoliberal, baseado em critérios econômicos de produtividade e eficiência, contribuiu para que o Estado fosse denominado como uma instituição pesada, rígida e morosa, que precisaria ser reformada, tendo suas funções redefinidas. Nesse contexto, emergiram os discursos defensores de um Estado Mínimo, voltado à edificação de um ambiente de confiabilidade aos investimentos externos, deixando, num segundo plano, o atendimento às demandas de suas populações por maior bem-estar social. Isso tudo contribuiu para que a educação e os processos de ensino- aprendizagem fossem repensados tanto em seus aspectos didático-pedagógicos, quanto nos aspectos relacionados à gestão escolar.

Peroni (2003) distingue três períodos básicos para a compreensão de todo esse processo de mudança das políticas públicas, a saber: auge do Estado de Bem-Estar Social, crise do modelo de Bem-Estar Social e defesa generalizada do Estado Mínimo. Foi exatamente diante desse cenário de questionamento do formato do Estado e de pressão de diferentes setores da sociedade civil pela redefinição de suas tarefas e de seus papéis sociais e econômicos que se assistiu aos processos de reforma do Estado; orientados fortemente pela ideia de retirar o Estado da esfera econômica e de reduzir suas intervenções sociais somente aos setores sociais mais carentes10.

10 Esse conjunto de medidas ficou conhecido como “política neoliberal” e foi propalado em grande soma pelas

Com a intensificação da globalização econômica e os processos a ela subjacentes (reestruturação produtiva, desemprego estrutural, pressão pela redefinição dos papéis e funções dos Estados nacionais e desenvolvimento de novas tecnologias), surgiram novos desafios à educação e à sua gestão, quais sejam: a) como organizar os sistemas de ensino de modo que eles sejam capazes de formar os indivíduos para a vida na sociedade global, para a inserção produtiva, para o exercício da cidadania; b) como promover a gestão do ensino num contexto de fixação de valores de mercado e de questionamento da atuação do Estado na condução de políticas econômicas e sociais.

Nos anos 1990, atenta às transformações mundiais, a CEPAL propôs estratégias para a inserção dos países latino-americanos na economia global. Dessa forma, considerou que a equidade social deveria estar colocada como um imperativo moral que colocava limite ao crescimento, enquanto que a transformação produtiva deveria estar acompanhada de medidas redistributivas. A educação foi apresentada como central nesse contexto, pois permite a consolidação e o aprofundamento da democracia, promove a equidade e prepara as pessoas para a competitividade do mercado de trabalho. Segundo a CEPAL, os sistemas de ensino deveriam ser adequados no sentido de ofertar conhecimentos e habilidades específicos, requeridos pelo sistema produtivo em mudança, tais como: versatilidade, capacidade de inovação, comunicação, motivação, destrezas básicas e flexibilidade.

Sander (1995) enfatizou a necessidade de se criar organizações educacionais mais efetivas e relevantes, cidadãs e democráticas, o que exigiria a superação dos modelos tradicionais de gestão, expandindo as oportunidades de participação social na gestão da educação. Segundo o pesquisador, era o momento de estabelecer uma busca simultânea por autonomia e autossustentação das comunidades, adotando um pensamento democrático de gestão e estimulando a participação cidadã. Para o autor, caberia construir um modelo de

gestão democrática, o que significava estabelecer compromissos com a qualidade da educação para todos; com uma administração horizontal, por meio de redes interativas com a comunidade exterior; com uma descentralização que promoveria autonomia técnica e financeira às instituições e permitiria a resolução de problemas concretos; com uma ação racional e pertinente na busca da qualidade da vida humana.

Assim sendo, nos anos 1980 as políticas educacionais no Brasil tinham como eixo principal a democratização da escola mediante a universalização do acesso e a gestão

econômicas na América Latina, principalmente na década de 1990, como parte de um ajuste econômico. No entanto, acabaram por contribuir, em alguma medida, com o ajuste dos processos democráticos.

democrática centrada na formação do cidadão, num claro compasso com o processo de democratização em andamento e com os princípios da Constituição cidadã de 1988. Já nos anos 1990, as políticas passam a se centrar na questão da qualidade da educação, entendida como produtividade. O eixo das políticas se deslocou para a busca de maior eficiência e

eficácia via autonomia da escola, controle da qualidade, descentralização de responsabilidades e terceirização de serviços.

Peroni (2003) identificou, em seus estudos, os principais eixos das políticas públicas educacionais brasileiras dos anos 1990. É importante frisar que as políticas propostas nesse período estavam sintonizadas com as advertências das organizações internacionais, com as propostas da CEPAL e com as recomendações do Banco Mundial, a saber: a autonomia da escola; a definição de Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs; o estabelecimento de avaliações institucionais; e a descentralização do financiamento da educação. No entanto, entendemos que a autora apresentou uma visão unilateralmente negativa de todo processo de reforma da educação, transmitindo a impressão de que as mudanças fizeram com que o sistema nacional de ensino caminhasse para pior. Nesse sentido, todas as mudanças refletiram, segundo a autora, na desresponsabilização da União em relação à educação básica, transferindo, para os demais entes federados e para a sociedade, as responsabilidades pelo financiamento e pela gestão da educação no país.

Partindo de outra perspectiva sobre as mudanças nas políticas públicas brasileiras, Almeida (2005) e Gentilini (2010) apontaram que tais mudanças, ao conduzir o processo de descentralização, permitiram, em alguma medida, efeitos positivos no plano administrativo e nas inovações educacionais. Criou-se uma grande expectativa com a descentralização, quanto aos fins e aos meios de utilização dos recursos públicos. Esperava-se a cobertura e a ampliação dos direitos sociais, bem como dos diversos segmentos da sociedade, ao mesmo tempo em que esse processo de descentralização promoveria maior eficiência, flexibilidade e capacidade de inovação na gestão do sistema público. Além disso, ansiava-se pela possibilidade de ampliar a governabilidade e a participação de diversos grupos, segmentos e atores locais na tomada de decisão e na implementação das políticas públicas na localidade, muitas vezes constituídas por processos de centralização, descentralização, desconcentração e recentralização.

3.2 Políticas públicas: centralização, descentralização, desconcentração e