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2 APORTE TEÓRICO

2.4 A prática escrita e a leitura de gêneros textuais diversificados

Na contemporaneidade, ensinar a ler e a escrever é um desafio que ultrapassa definitivamente a alfabetização em sentido estrito. Hoje, o desafio da escola é o de incorporar os alunos na cultura do escrito e o de conseguir que todos cheguem a ser leitores e escritores,

que consigam utilizar as ferramentas de leitura e escrita nas mais diversas situações cotidianas.

Dessa forma, é necessário criar na escola uma comunidade de leitores que busquem nos textos respostas para todos os problemas que precisam resolver e encontrem neles informações para compreender melhor o mundo.

É preciso também transformar a escola em uma comunidade de escritores que produzam seus próprios textos para evidenciar suas ideias e opiniões, para informar sobre situações que os seus interlocutores necessitem e devam conhecer, e por motivos reais e importantes.

O necessário é construir na escola um ambiente no qual ler e escrever seja práticas reais e significativas, onde a leitura e a escrita sejam instrumentos importantes que possam permitir ao aluno repensar a forma como vê o mundo, reorganizar o seu próprio pensamento, e mais ainda, que interpretar e produzir textos sejam direitos legítimos e incontestáveis. Por isso, é importante preservar o significado do objeto de ensino para o sujeito da aprendizagem, ou seja, é necessário preservar na escola o sentido que a leitura e a escrita têm como práticas sociais. Assim indagamos quais gêneros são mais adequados para trabalharmos no Ensino Fundamental de 1º ao 5º ano.

Não existem precisamente os gêneros corretos, mas os PCN indicam os mais adequados para esse nível, tanto os orais quanto os escritos que contemplam os conteúdos necessários para o ensino-aprendizagem. Dessa forma, podemos organizar o planejamento integrando os conteúdos pertinentes ao currículo e usando critérios de escolha dos textos que proporcionarão aos discentes entrar em contato com uma diversidade textual e de mídias significativas.

Tal escolha serve como referência para as práticas de produção de texto, como parte integrante das suas condições de produção. Outro ponto é articular práticas de leitura e escrita, de forma que a exploração dos gêneros, um pouco mais aprofundada, alimente a compreensão e a produção dos textos.

Segundo Lerner (2005, p. 23) o professor ao tentar instaurar as práticas de leitura e escrita na escola, deve fazer algumas perguntas, muitas delas, cujas respostas não são evidentes:

O que se aprende quando se ouve o professor lendo? Em que momento as crianças se apropriam da "linguagem dos contos"? Como ter acesso às antecipações e inferências que as crianças presumivelmente fazem ao tentar ler um texto por si mesmas? Quando se pode dizer que um aluno aprendeu a recomendar livros ou a confrontar diversas interpretações?... portanto não é

simples determinar com exatidão o que, como e quando os sujeitos aprendem essas práticas. (LERNER, 2005, p. 23).

Ainda segundo a autora, tais práticas sociais foram, e de certo modo continuam sendo, patrimônio de certos grupos mais que de outros, por isso que, levar à prática o necessário, é uma tarefa complicada para a escola. Dessa forma, o professor antes de pensar em soluções, antes de desdobrar o possível, é preciso analisar as dificuldades. Daí, Lerner (2005, p. 38) afirmar que:

Tentar com que práticas pertencentes a grupos sociais economicamente influentes como a leitura e a escrita sejam instauradas na escola supõe enfrentar e encontrar caminhos a resolver, entre eles: a tensão existente na escola entre a tendência à mudança e a tendência à conservação, entre a função explícita de democratizar o conhecimento e a função implícita de reproduzir a ordem social estabelecida. (LERNER, 2005, p. 38)

Na escola, devem vir em primeira instância os propósitos didáticos da leitura e da escrita, que são estabelecidos do ponto de vista dos alunos, porque estão relacionados com os conteúdos que eles precisam aprender para utilizá-los no futuro, como: escrever para manter contato e ler para conhecer outro (s) mundo(s) possível (is). O que infelizmente costuma ser relegado ou, até mesmo, excluído do ambiente escolar.

Esse conflito, conforme Lerner (2005, p. 41), nos leva a um paradoxo:

Se a escola ensina o aluno a ler e a escrever com o único propósito de que ele aprenda a fazê-lo, ele não aprenderá a função social da leitura e da escrita, se a escola abandona os propósitos didáticos e assume os da prática social, estará abandonando ao mesmo tempo a sua função. (LERNER, 2005, p. 41)

A autora nos diz que esta organização entra em contradição não apenas com o tempo da aprendizagem, mas também com a natureza das práticas de leitura e escrita. O que, segundo Lerner, também pode nos levar ao paradoxo:

Se para a escola tentar parcelar tais práticas é impossível para preservar a sua natureza e o seu sentido para o aprendiz, se ela não as parcelar, será difícil encontrar uma distribuição dos conteúdos que permita ensiná-las, o que prejudicará a forma como o discente percebe tais práticas. (LERNER, 2005, p. 44).

Neste ponto, podemos evidenciar um conflito de interesses entre o ensino e o controle da aprendizagem: se colocamos o ensino em primeira instância, é necessário

renunciar o controle de tudo; se pomos o controle da aprendizagem em primeira instância, é preciso renunciar ao ensino de aspectos fundamentais das práticas de leitura e escrita.

Diante disso tudo surgem duas perguntas: o que podemos fazer para preservar na escola o sentido que a leitura e a escrita têm fora dela? E, como evitar que se desvirtuem ao serem ensinadas e aprendidas?

Lerner (2005) nos evidencia algumas respostas para estas questões:

O possível é fazer o esforço de conciliar as necessidades inerentes à instituição escolar com o propósito educativo de formar leitores e escritores. O possível é gerar condições didáticas que permitam por em cena uma visão escolar da leitura e da escrita mais próxima da versão social (não escolar) dessas práticas. (LERNER, 2005, p. 50).

Possibilitar a escolarização dessas práticas sociais de leitura e escrita, para que os professores possam programar o ensino, um passo importante deve ser dado, que é: "explicitar, entre os aspectos implícitos nas práticas, aqueles que resultam hoje acessíveis graças aos estudos sociolinguísticos, psicolinguísticos, antropológicos e históricos". (Lerner, 2005, p. 52)

Ainda de acordo com Lerner (2005, p. 53) é importante formular como conteúdos do ensino, não só os saberes linguísticos, mas também as funções do leitor e do escritor: "fazer antecipações sobre o sentido do texto lido e tentar verificá-las recorrendo à informação visual, discutir diversas interpretações acerca de um mesmo material, comentar o que se leu e compará-lo com outras obras do mesmo e outro autor".

Também podemos citar outras, como: recomendar livros, compartilhar leituras com outros, tentar ler textos difíceis, tomar notas, planejar o que vai ser escrito, modificar o plano enquanto escrevemos, revisar, fazer alterações, dentre outros.

Por outro lado, outra tarefa que ajuda o professor a realizar práticas de leitura e escrita na sala de aula é a organização por meio de projetos, que permite resolver dificuldades como: favorecer o desenvolvimento de estratégias de autocontrole da leitura e da escrita pelos alunos e abrir as portas da classe para uma nova relação entre o tempo e o saber. Sobre os projetos, Micotti (2009, p. 21) diz que:

preenchem as condições prévias imprescindíveis e favoráveis a toda aprendizagem. Mas condiz, particularmente, com a aprendizagem da leitura e da produção de escritos porque cria situações autênticas de comunicação com interlocutores verdadeiros, sendo necessário, para dar conta dessas situações, aprender a ler e a escrever.

A autora ainda apresenta as infinitas possibilidades de prática da linguagem através de projetos que contemplem a leitura e a produção de escritos e que implica ação de:

 Comunicar-se oralmente: dialogando, discutindo, expondo, argumentando, descrevendo, analisando, resumindo, sintetizando etc.;

 Comunicar-se por escrito: lendo e escrevendo (cartas, artigos de informação, fichas técnicas, cartazes, contos, poemas etc.);

 Relacionar-se com interlocutores – pertencentes não apenas à própria classe, mas ao estabelecimento escolar – com pais, com outras escolas, vizinhança, comunidade, região, país, até atingir o que as crianças chamam ―o vasto mundo‖. (MICOTTI, 2009, p. 21) Nesses projetos, seja no ensino de língua materna, seja em outras disciplinas a utilização de sequências didáticas são muito oportunas, porque os alunos podem ampliar a competência comunicativa; utilizar diferentes linguagens e diferentes tipologias textuais; interatuar com dados, argumentos, fatos e informações contidos em diferentes textos. Interpretar textos orais a partir de histórias ouvidas e gravuras; expressar-se oralmente com clareza e objetividade; identificar aspectos sonoros da língua; reconhecer a representação escrita de cada letra identificando-as na formação das palavras; ler, e reconhecer, textos variados e diferentes gêneros; produzir textos de vários gêneros, obedecendo às estruturas e os mecanismos de articulação da língua, como também escrever textos lidos e ouvidos identificando os diferentes tipos de letra.

Em suma, os projetos, por sua natureza, dão significação às atividades de leitura e escrita, podendo, até, contextualizar sequências didáticas no sentido proposto Dolz e Schneuwly (2004). Para tanto, é necessário imaginar um projeto maior que presuma um produto final – um texto alusivo a determinado gênero -, que possa ser melhor explorado na forma de uma SD para que objetivos do projeto sejam alcançados. Assim, ao orientar suas ações para uma finalidade em comum, os alunos se comprometem na elaboração de um produto. É assim que o compromisso que eles estabelecem torna possível que progridam na aquisição de estratégias necessárias para revisar e aperfeiçoar seus próprios trabalhos.

Na próxima seção abordamos os conceitos básicos sobre sequência didática e sua contribuição para o ensino-aprendizagem de maneira concreta e eficaz.

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