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A presença do autor no acontecimento: BD verdade

ESTRATÉGIAS DO CINEMA NAS BANDAS DESENHADAS DOCUMENTAIS

2. A presença do autor no acontecimento: BD verdade

Nichols (1997) entende que o documentário participativo ou interativo, tam- bém chamado de cinema-verité por Eric Barnouw a partir do filme Crônica

de um Verão (Chronique d’un été, 1961) de Jean Rouch e Edgar Morin, assume

determinadas estratégias no seu fazer em contraponto a outras modalida- des de documentário por ele estabelecidas. É um tipo de filme possível a partir dos equipamentos portáteis dos anos 1950, em que o realizador, ao invés de permanecer oculto através de locuções em off ou buscar defender sua tese de acordo com as práticas do cinema expositivo, interage com o per- sonagem. Interferências, letreiros, uso de material de arquivo, entrevistas, testemunhos e mesmo as dúvidas com relação ao que é dito são revelados

Na verdade, a essência do filme está no diálogo com os entrevistados em que estes se equivalem com o realizador no “terreno do encontro social” (Nichols, 1997: 84). É este contato que define o filme e modifica o resultado. Essa modalidade de documentário assume, desse modo, um caráter subjeti- vo e opaco, em que a autorreferência e a manifestação da imagem enquanto discurso e não como o real, é permanentemente realçada. De acordo com Nichols (1997: 79), é a “sensação de parcialidade, de presença situada e de conhecimento local derivada do encontro real entre realizador e o outro”. Além de Rouch, Nichols cita o trabalho de outros cineastas adeptos de es- tratégias de um cinema participativo como Connie Field e Dziga Vertov no

kino-pravda. No Brasil, o cineasta Eduardo Coutinho pode ser considerado o

seu mais importante representante. São documentaristas que buscam não ser autoritários como realizadores, respeitar depoimentos e as imagens ori- ginais dos acontecimentos.

Naturalmente, não se pode fazer uma associação absoluta do cinema- -verdade ou de qualquer outra modalidade de documentário com as BDs. Como lembra Schmitz-Emans (2012: 55) “em processos de intermedialidade é preciso ver onde acontece a distinção, onde há um ‘meio’ entre as duas e pelo qual é reconhecível”, possibilitando aproximações em que se possa ob- servar estratégias semelhantes e conflitantes, estabelecendo o que a autora chama de um diagnóstico de transmedialidade. Desse modo é possível evi- denciar alguns trabalhos que se aproximam de um documentário interativo, como O fotógrafo (Didier Lefèvre, Emmanuel Guibert, Frédéric Lemercier),

Weisse Wolfe (David Schraven e Jan Feindt), com destaque para os reputa-

dos trabalhos de Joe Sacco (Palestina, Gorazde e Notas sobre Gaza) e suas práticas de documentação. Lefèvre (2013) ressalta, contudo, que mesmo o trabalho de Joe Sacco, mais contundente, ainda é muito diferente do do- cumentário cinematográfico, pois neste o espectador vê esse diálogo entre realizador e entrevistado acontecendo em tempo real.

Com formação de jornalista e influenciado pela leitura de Fateful Triangle de Noam Chomsky e The Question of Palestine de Edward Said, Joe Sacco come- çou a trabalhar com a temática das zonas de conflito, em especial no Oriente Médio, na histórica hostilidade entre palestinos e sionistas. Seu objetivo era buscar as vozes “do outro lado”, que não apareciam na mídia hegemônica dos Estados Unidos e que, de acordo com ele, deturpavam a compreensão e extensão do conflito. Sacco desenvolveu então uma dinâmica de trabalho que nomeia como BD jornalística, unindo sua prática de apuração jornalística à capacidade de contar histórias graficamente. Suas composições de página remetem a três tipos de influências imagéticas de acordo com Adams: de um lado segue uma tradição da ilustração de cotidiano que sempre buscou retratar o real, como as já citadas gravuras inglesas de George Cruikshank e James Gillray do século XIX, os comix da contracultura norteamericana de Robert Crumb e os populares cartuns do palestino Najel Ali.

De outro lado, é nítida a influência dos discursos audiovisuais documen- tais, tanto em estratégias do documentário participativo, no que se refere às entrevistas e a forma como Sacco retrata a si próprio, e seu contato com os personagens na própria história, como em uma série de artifícios que podem ser observados em estratégias audiovisuais e em especial do tele- jornalismo: closes, regra dos 180º, plano e contra-plano, over-shoulders,

zoom-ins, plongês e contra-plongês para enfatizar a dramaticidade da cena,

imagens distorcidas que sugerem o uso de lentes específicas e artifícios de composição que remetem a diferentes possibilidades de montagem. É bem verdade que essas influências estão presentes, em maior ou menor grau, em praticamente todas as bandas desenhadas, distinguindo-se apenas pela es- tilística particular de cada uma. Ou seja, de modo geral, muitas das regras de composição de uma narrativa imagética no cinema encontram similari- dades na estrutura narrativa das BDs.

impressões e documentos. Consulta fontes primárias e secundárias, mas, especialmente, vive o espaço que por ele será narrado. No caso de Palestina, Sacco permaneceu dois meses no local pesquisando e coletando material para voltar aos Estados Unidos e só então começar a produção da banda desenhada, que durou dois anos e meio – entre fevereiro de 1993 e agosto de 1995. Aqui reside a primeira tensão do documentário nas BDs: a obra ou mesmo os desenhos não são feitos no ‘aqui e agora’ do acontecimento. Sacco, inclusive, reforça que durante o período de apuração não desenha ou faz esboços, deixa tudo para o segundo momento. Se essa prática enfraque- ce, para muitos, a força do registro documental, por outro lado, é inegável que Sacco, ao viver intensamente o espaço narrado, fazer entrevistas e con- viver com situações de perigo junto com a população local que ele retrata, valida de maneira contundente a sua presença e seu estar fenomenológico na experiência de contato que tem com aquela comunidade.

O gesto de se auto-retratar, não apenas em presença, mas como persona- gem da narrativa, permite que a narrativa de Sacco contenha um efeito similar ao que Nichols (1997) chama, no documentário interativo, de metaob-

servação. Ele cita especialmente o filme Demon Lover Diary (1980) de Joel

DeMott, em que o diretor maneja uma câmera enquanto outro operador filma esse contato, dele filmando o personagem ou o acontecimento. Esse tipo de estratégia é válida, ainda que tenha, de certa forma, se banalizado em narrativas telejornalísticas menos tradicionais e que buscam de alguma maneira evidenciar a opacidade do seu próprio discurso. Ao desenhar sua própria ação dentro da história, não apenas Joe Sacco, mas outros autores como Art Spiegelman, Marjane Satrapi, e Guy Delisle, entre tantos outros, simulam o que seria essa segunda câmera e a possibilidade de uma metaob- servação, que é um recurso do cinema participativo.

Outra característica percebida nas BDs de Sacco é o que Nichols chama, no cinema, de pseudomonólogo. Para ele, é quando há a ausência visível do rea- lizador, mas o entrevistado olha para a câmera, compartindo impressões, ideias e pensamentos diretamente para o espectador, como se o autor esti-

vesse ausente. No caso de Sacco, não há câmera, apenas Sacco, que sempre está presente pelo fato de ser o seu desenho que dá corpo àquela entrevis- ta. Ou seja, enquanto o pseudomonólogo no cinedocumentário faz com que o entrevistado dialogue diretamente com espectador, “eliminando”, para Nichols, a mediação do realizador, no caso das BDs de Sacco, ainda assim, é impossível eliminar sua mediação: sua presença torna-se constante. São técnicas como essas e suas especificidades nas bandas desenhadas que rea- firmam a validade de determinados discursos de BDs como documentais. O que define o processo de Palestina, para Adams (2008), é justamente essa autenticidade da experiência de Sacco. Adams caracteriza a autenticidade como marca do trabalho do autor, baseado justamente na primazia da expe- riência. Poderia se dizer assim, que o que se considera a fase de pré-produção de um filme, que envolve pesquisa, preparação e coleta de dados, correspon- deria para Sacco “à verdadeira produção”. Não do registro da BD, mas da produção da experiência vivida sobre o qual o seu discurso documental se desdobrará a posteriori. Mas o registro da imagem neste momento, ainda que muitas vezes seja maquínico pelas referências fotográficas que faz, é especialmente feito em sua memória, e é chave para o entendimento não apenas do trabalho de Sacco como da BD documental.

Parece claro, desse modo, que as estratégias de produção de Sacco se as- semelham às do cinema verdade, em sua ética com o entrevistado, o relato do encontro entre os dois agregando informações contraditórias e mes- mo entrevistados duvidosos. O autor questiona o tempo todo o seu fazer documental, revela seus medos e dúvidas, eliminando qualquer tipo de transparência que sua narrativa poderia oferecer. Usando apenas caneta, bloco de notas e máquina fotográfica, Sacco tem um material ainda mais leve e, chamando menos atenção, pega a realidade mais desprevenida. Sua obra, enfim, não é sobre a Palestina, mas sobre a sua experiência de contato

Se as características do cinema verdade parecem claras, poderia se ar- gumentar finalmente sobre o impasse da presença do autor ou não no acontecimento, importante no ato documental. É indiscutível que, embora seu registro seja posterior e de uma imagem artesanal e não maquínica, a dimensão da presença do autor que configura o documentário ocorra no caso de Joe Sacco. O que poderia ainda criar um questionamento com rela- ção a sua validade enquanto documentário, seria, por fim, uma hipotética inexatidão não apenas do desenho e mesmo da memória, para representar o real.

Com relação ao uso de imagens fotográficas, é importante ressaltar que Sacco tinha uma preocupação ética em não dar margem para uma eventual contaminação da informação, e só fotografava seus entrevistados após a en- trevista concedida, justamente para que a foto não criasse qualquer tipo de interferência. É importante lembrar que o fato de ser apenas um anônimo, sem equipamento de filmagem, favorecia que os entrevistados representas- sem menos e fossem mais verdadeiros – ainda que isso nunca seja de fato uma certeza e algo que se possa controlar, especialmente em um registro de BD verdade. O autor, inclusive, em determinadas passagens de suas obras, questiona-se, indaga com o leitor sobre a veracidade do depoimento que ou- viu e mostra experiências distintas e contraditórias sobre o mesmo tema – reproduzindo algumas práticas caras ao cinema verdade.

Sacco também fazia inúmeras fotos dos lugares e ambientes, de variados pontos de vista, algumas vezes de ângulos inusitados, com o objetivo de re- construir os ambientes nas páginas de quadrinhos e criar, como o próprio afirmou em entrevista a Jeff Adams, uma sensação de familiaridade do es- paço retratado para seu leitor, ao longo da obra.

O segundo momento da sua metodologia de trabalho poderia ser chama- do de pós-produção, em que Sacco reúne as referências, as anotações, a experiência vivida e as imagens memória e organiza as suas páginas docu- mentais. Aqui se ressalta o componente híbrido para a composição de Sacco. Ainda que esse narrador não seja mais possível de fato, o autor faz uso da

memória, parecendo remeter à tradição oral e ao marinheiro de Benjamin, que viaja, volta e conta o que viu – neste caso, conta graficamente nas pá- ginas da BD. Assim, ele faz uso tanto de imagens maquínicas, fotografias, quanto de imagens memória para poder retratar detalhes, ambientes, fisio- nomias bem como uma reconstituição topográfica do espaço, podendo com isso modificar e reproduzir o espaço em ângulos pouco comuns. De acordo com Adams (2008: 151-152), a memória visual tem um importante valor no trabalho de Sacco:

[…] memória tem muito a ver com isso. Mas a referência fotográfica é muito útil. E teve algumas vezes onde eu desenhei exatamente o que eu fotografei. Mas muito poucas. Geralmente eu mudava o ângulo ou algo do gênero. Mas frequentemente as fotografias, como as que eu tirei na Faixa de Gaza, deram-me um bom sentimento real de como os lugares eram. Mas agora, nesse ponto [1995], eu desenho muito mais coisas da memória porque eu venho desenhando isso por dois anos e meio já. Não é realmente um problema para ver como uma torre d’água ‘se parece ou coisa assim’.

Desenhar é sempre se referenciar a algo. Só é possível desenhar um objeto ou uma paisagem se o artista tiver as referências visuais para tal. Essas re- ferências podem ser externas e materiais, através da presença do artista no espaço retratado, como um pintor que pinta uma paisagem; ou baseando-se em outras imagens prévias, como fotografias. A outra maneira é a utiliza- ção da memória, mais etérea e fugidia com relação a uma exatidão e a uma correspondência com as formas reais. A memória aparece eventualmente como um meio termo entre a presença e a fabulação. Nesta última, poderia se considerar a fabulação como um espaço de liberdade em que o ilustrador especula universos, objetos, ambientes, paisagens, com essa capacidade de fabricação da imagem vistos em maior ou menor grau.

possível fabular paisagens, pessoas, objetos, calcados na experiência fe- nomenológica do artista com o mundo, que o permite montar, remontar e elaborar novos espaços. Nesse sentido, desenhar de memória poderia ser uma inadequação ou um fazer que descaracterizasse o discurso documen- tal? Adams (2008: 152) acha que não e afirma que Joe Sacco:

apesar de suas extensas notas e fotos, ele está trabalhando através de suas ideias internalisadas pela sua experiência visual. Para Sacco o pro- cesso documentário não necessita fidelidade de registros escritos ou fotografados. Ao invés do registro visual da experiência se subordinar a um processo de orquestração, transformando seus registros em de- mandas técnicas específicas do meio graphic novel. Os pontos de vista que mudam, a combinação de figuras, arranjos de textos e caricaturas são todas modificações, experiências a posteriori feitas na aplicação do seu material para esse meio. Sacco não faz mistério disso, abertamente declarando a subjetividade do processo. Uma subjetividade, aliás, estru- turada politicamente. […] Memória tem um papel principal no conteúdo de narrativas informais que ele usa na reconstrução da experiência de ocupação Palestina. É a lembrança dos próprios palestinos que ele se baseia e ele reproduz essas lembranças por aderir à narrativa do con- tador de histórias, ainda modificado e mediado pelo seu controle como produtor e administrador do processo de visualização.

Ou seja, a memória aparece em dois níveis, em momentos distintos: na dos entrevistados e na de Sacco, autor do relato. Apesar de possíveis e prová- veis inexatidões, assim como no cinema participativo, a verdade está em assumir a subjetividade do seu relato e o seu processo de produção. Adams lembra que são vários os processos de mediação nas BDs de Sacco que possibilitam, contudo, inexatidões: são os depoimentos de testemunhas de acontecimentos, informações secundárias, que muitas vezes se distanciam dos eventos relatados; entrevistas que passem de um suporte para outro, por exemplo, da gravação para a linguagem verbal ou escrita das BDs, tra- zendo falsas interpretações; e a memória, pois, no caso do processo de Joe

Sacco, a pós-produção das suas BDs é feita muito tempo depois do encontro do autor com o acontecimento. Das três mediações, o cinema só evita a se- gunda, das imprecisões de interpretação do gravado para o escrito, porque, nesse caso, a matéria prima do filme é a própria imagem e não é necessário fazer mais uma mediação.

Citando a obra de Paul Ricoeur Memory, History, Forgetting, Adams (2008: 58) entende que o desenho de memória não compromete o registro das HQs documentais. A questão central de Ricoeur é que a imagem memória – ou seja, a imagem formada pela memória – traduz a ideia de presença do au-

sente. Ou seja, puxar uma imagem de uma pessoa ou acontecimento pela

memória seria a constituição de uma presença aparente desta pessoa ou acontecimento passado, e que a imagem memória presentifica. É como se a presença aparente do acontecimento, possibilitado pela imagem memó- ria pudesse de certa forma reproduzir o estado de presença do momento original.

É claro que, ainda assim, essa reprodução não é perfeita, não é a mesma coisa. E é nessa diferença que reside a imprecisão. Para Duchamp (2002), contudo, essa diferença nada mais é que o coeficiente artístico que carac- teriza uma obra de arte, no que o resultado final se difere do inicialmente planejado. Nesse sentido, poderia ser onde residiria o Belo em Baudelaire – em oposição ao que ele chamou de obsessão com o real. Se o planejado no documentário é, em princípio, uma maior proximidade com o real, são justamente os pequenos momentos em que o real escapa que garantem não apenas o documentário como arte, mas sua própria autenticidade, na medi- da em que diante de todas essas mediações, a autenticidade está justamente na impossibilidade do autor garantir uma total verdade dos fatos. É a auten- ticidade do autor.

das imagens memória, ou seja, reconstituem os momentos do passado, presentificando-os. O mesmo se passa com o desenhista que viveu o acon- tecimento ou a apuração. Assim, o próprio documentário participativo é permeado pelos mesmos mecanismos de reconstrução de imagem. Aí se estabeleceria um primeiro nível, inevitável, de uma presença do ausente. A outra variável de questionamento é se o desenhista testemunhou ou não o acontecimento. A BD sempre vai recontar, mesmo que haja o testemunho do realizador. Sempre é uma atividade de memória, junto com eventuais re- ferências externas. O cinema, por outro lado, congela o testemunho através da imagem maquínica. Assim como a memória, o cinema é uma mediação. Oferece imagens de um acontecimento, mas não o acontecimento. Então, a base para a constituição do discurso documental, tanto no cinema quanto nas BDs, são mediações: imagens-máquina e imagens memória, respecti- vamente, e que se complementam, oferecendo possibilidades distintas de documentários. Ao fim, todos recontam: quem esteve presente e testemunha através das imagens memória – como o marinheiro de Benjamim –, o que pesquisa e ouve o que contaram – o artesão –, e a máquina ao apreender a imagem.

Mas fundamentar a constituição de relatos documentais a partir de imagens memória é indesejado ou inadequado? Talvez no dispositivo cinema, com suas particularidades e propriedades sim. Nas HQs documentais, pelos mesmos motivos, talvez não: é a confluência entre testemunho, imagem me- mória e mesmo fabulação que talvez confiram o maior aspecto de verdade ao recontar das HQs. O importante é a compreensão do todo.

Art Spiegelman, ao fazer Maus, pesquisou exaustivamente sobre a realida- de dos campos de concentração, nos quais não esteve, para contar a história de Vladek, seu pai. A resposta mais contundente sobre a fidedignidade da sua BD foi justamente de parentes que estiveram nos campos de concentra- ção. Ou seja, é possível fazer um quadrinho documental sem estar diante do acontecimento, mas concatenando as inúmeras possibilidades de mo- delos documentários, sem que o uso da imaginação possa ser considerado

uma contaminação problemática e sem deslegitimar o caráter de real do documentário nas bandas desenhadas. Nesse caso, pode-se ressaltar que as estratégias do documentário interativo ou participativo aplicadas às BDs não apenas são possíveis como legitimam, ainda mais, o seu discurso docu- mental, por se referir primordialmente no encontro entre o entrevistado e o documentarista.

Ou seja, podemos dizer que a metodologia de Sacco é híbrida; reúne não apenas a sua presença no momento de produção, mas o uso de imagens maquínicas auxiliares para a fase de pós-produção e, por fim, o uso da me- mória para complementar, ligar e aprofundar as percepções anteriores. Esse amálgama de mediações tornam o relato de Joe Sacco não apenas váli- do como registro documental, mas, possivelmente, mais completo.

Para Adams, o trabalho de Joe Sacco, por tensionar mediações e os níveis técnicos da mídia BD, em que a representação envolve uma série de media- ções que podem manipular totalmente a informação “força um repensar das políticas do documentário visual” (2008: 153). Ou seja, conclui-se que a única validade possível deste registro documentário nos padrões formula- dos pela massa crítica cinematográfica se dá justamente pelo fato da BD, por não ser uma imagem maquínica, mas uma imagem artesanal, carregar em si, indelevelmente, a opacidade e o caráter de representação, em se assumir como uma leitura, subjetiva, possível, como um tipo de documentário parti-