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CONSIDERAÇÕES FINAIS

2. A QUESTÃO DAS REDES

No primeiro capitulo desta dissertação, partiamos do pressuposto de que o discurso de redes possuia uma tríplice dimensão. A primeira enquanto estratégia dos atores coletivos da sociedade civil, e a segunda enquanto categoria analítica e metodológica.

Em um segundo momento, a categoria de redes nos forneceu os elementos necessários para construir a tipologia da prática política de redes. É a partir deste modelo, que procuramos evidenciar as mudanças de posicionamento político do CEDEP.

Como conclusão, buscamos comprovar não só que se podia demonstrar mudanças na entidade, mas que elas se aproximavam das tendências expostas naquele modelo ideal (prática política de redes). Além disso, demonstramos que o discurso de “redes”, expresso através do tema das parcerias, era ainda um dos valores a direcionar este processo.

Como conclusão fmal, podemos dizer que o discurso e as novas práticas surgidos no CEDEP, se aproximam , de fato, do modelo que havíamos proposto como guia da pesquisa: o modelo ideal de prática política de redes.

Neste momento, porém, gostaríamos de avançar ainda algumas considerações em relação ao tema. Para tanto, levaremos em consideração tanto o conceito de “redes sociais” como o conceito de “redes de movimentos” .

A riqueza das redes sociais que sustentam o trabalho do CEDEP já foi demonstrada quando analisamos as diversas “comunidades” de atuação da ONG . Vimos também como estas redes foram sendo construídas ao longo de toda a década de 80 e 90, especialmente devido á penetração da igreja popular nas áreas periféricas da cidade. Trabalhando em especial as carências materiais destas áreas, e despertando o senso de organização das populações (com base em sua matriz religiosa) , o CEDEP motivou importantes ações de reinvindicação e de conquista da terra.

Todavia, com o declínio da matriz política da teologia da libertação, a ONG parece viver um momento de dilema. Embora o discurso tenha perdido a hegemonia enquanto diretriz política do CEDEP, continua a servir como uma das bases para sua inserção junto às comunidades. Porém, mesmo no âmbito das comunidades não é mais o problema das carências materiais o princípio aglutinador da organização política. Isto os membros do CEDEP deixaram bastante claro. A desagregação do setor de oganização comunitária, entre outros fatores, parece dever-se também a este motivo.

Construídas com base nas áreas carentes da cidade e motivadas por um discurso de matriz politico-religiosa, poderíamos falar de um risco de desagregação das redes sociais nos quais o CEDEP está inserido'^ A conclusão nos parece apressada. Todavia, ela chama a àtenção para a necessidade que a ONG ainda sente de remodelar a “identidade política” que parece sustentar estas redes sociais.

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Embora não tenhamos tido tempo de examinar a questão com maior profundidade, parece estar havendo na ONG a construção de outros parâmetros de definição de identidades coletivas. Nas falas de seus membros, além da constatação de um certo esgotamento das necessidades materiais enquanto princípio de motivação para a ação politica, alguns elementos novos aparecem nas entrelinhas. Entre eles, um nos chamou a atenção, a questão da identidade étnica!

Morros, periferia, comunidades de base! O que estes termos definiam era uma rede social fundada na condição de excluído dos bens materiais da cidade, especialmente a terra. Mas, uma vez “assentados” e com condições mínimas de vida, outras necessidades e carências são despertadas. Aparece então o “negro” e o “caboclo” . Sua exclusão, mais do que material está fundada em sua condição social e étnica. Sua exclusão não está apenas no bolso, mas na cor!

Como conclusão de nossa reflexão, gostaríamos de fixar dois elementos. Em prímeiro lugar, a constatação de que a “rede católica popular” vive um momento de declínio, dada a erosão das premissas que fixavam sua continuidade. Percebida pela ONG, existe a tendência na entidade em buscar novos rumos e valores que dêem sentido e sustentação a estas redes. É o que parece indicar a preocupação em torno da identidade étnica das populações dos morros. O que demonstra, entre outras coisas, a capacidade da ONG em perceber os desafios do momento e buscar encaminhar novas saídas para os problemas constatados.

Mas, o que dizer do CEDEP na rede de movimentos, ou mesmo na sociedade civil']’

Em nosso segundo capítulo, buscamos demonstrar como há na América Latina, um processo pelo qual as ONGs constroem uma identidade própria e tornam-se um dos principais atores da sociedade civil. Neste processo, as ONGs primam especialmente por colocar entre seus objetivos primordiais o fortalecimento da sociedade civil. Neste

sentido, a construção de redes dos mais diversos tipos torna-se um dos elementos centrais para a compreensão destas entidades.

No CEDEP, o mesmo processo de abertura pode ser verificado. Aos poucos, a entidade constrói sua identidade enquanto ONG e passa a atuar como uma articuladora de outras entidades na viabilização de seus projetos. Suas articulações a nivel internacional e as parcerias com outros atores locais são os maiores indicativos desta tendência. Nestes intercâmbios, pode-se perceber a existência de uma verdadeira “rede de movimentos”, que contribui assim para o fortalecimento da sociedade civil de Florianópolis.

Deste modo, o CEDEP exerce um verdadeiro papel de mediação entre suas comunidades alvo e outros atores da sociedade civil. Vimos como o CEDEP procurou articular o seu trabalho nas periferias com diferentes atores. Em nível local, seu papel no processo de ação da cidadania constitui um de seus melhores exemplos. Em nivel global, ele se encontra conectando com o movimento inter-cultural italiano. Isto indica que há, efetivamente, nesta ONG, a intenção e a iniciativa de interligar as redes nas quais ela está inserida, com outras redes. Embora haja alguns fatores que limitem este processo, podemos afirmar que se trata não só de um valor fundamental do CEDEP, mas uma tendência efetiva e real de sua ação política.

Naturalmente, o processo de costura entre estas diferentes redes e o modo como ela contribui para o fortalecimento da sociedade civil necessitaria de uma pesquisa mais ampla. Por ora, basta-nos indicar a tendência dos atores da sociedade civil neste sentido. E por outro lado, indicar ainda o papel chave que as ONGs exercem nesta tarefa. Entre estas ONGs, o CEDEP apresenta claros sinais que apontam nesta direção.