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1.2 O Realismo metódico para fundamento da Ciência Filosófica

1.2.1 A racionalidade metódica transcendental: Realismo objetivo ou

Na questão metódica do conhecimento o modelo kantiano da razão se desenvolveu, face às diversas formas de Realismo111, mediante a

110 Essa abordagem lógico-transcendental também não chegará a ser compreendida em um método

(sistema) da razão em geral, mas estará limitada àquilo que Kant identifica, no Apêndice da Dialética transcendental na Crítica da razão pura e, posteriormente, na Crítica da faculdade de

juízo, como necessidade transcendental. Veremos adiante (Unidade 1.2.4) como Kant realiza à

base da faculdade reflexionante do Juízo a fundamentação da necessidade transcendental da razão. O fato de não haver extraído daí demais conseqüências, como a exposição do caráter finalista como contido já no ato constitutivo do objeto, a ser garantido pela preservação do caráter indeterminado da faculdade reflexiva, da unidade transcendental da faculdade judicativa, será tematizado na sequência (Unidade 1.2.5). Em vez de conceder isso Kant fornece o sentido negativo (crítico) da razão, mas que, no fundo, só subsiste preservado pelo sentido positivo, tal como expressa nos Prolegomena mediante o conceito de coisa-em-si e na Crítica da faculdade pelo pressuposto de um Intellectus Archetypus.

111 O problema do realismo está em admitir “que uma realidade nos é dada; quer seja de ordem sensível (para os empiristas), de ordem inteligível (para os racionalistas), e que nosso conhecimento deve modelar-se sobre essa realidade”. Conforme isso, conhecer “consiste simplesmente em registrar o real, o espírito, nesta operação, é meramente passivo”(Pascal, G., O Pensamento de Kant, p.36). Entretanto, a impossibilidade de especificar ‘que tipo’ de realidade é

refutação do Monismo como modelo metódico, na relação sujeito-objeto como estrutura da realidade (propositiva científica).

Entretanto, na tarefa ativa a ser realizada pelo sujeito do conhecimento, de distinguir na série das pressuposições transcendentais entre aquelas dadas arbitrariamente e aqueles dadas com a possibilidade de dedução das suas condições, como poderá o modelo Dualista112,

adotado por Kant na Crítica da razão pura, ser defendido como realismo objetivo, se tanto a separação sujeito-objeto como a disjunção entre o empírico e o apriorístico representam uma idealização das relações, à respeito da qual falta fundamento à doutrina Idealista para reconhecer isso, sair deste estado de indiferenciação, como caso já de uma disponibilidade técnica dos objetos?

Se em face da necessidade de distanciamento crítico como condição verdadeiramente vital e necessária humana113 no operar da essa, demonstra-a como hipótese incongruente e sem legitimação, do ponto de vista crítico. Só admite defesa uma hipótese ou postulado que tem claro o que ele já é, por definição, a saber, uma construção teórica, passível de problematização.

112 Segundo Cichero Sieczkowski, J.B. (Sobre uma possível interpretação das condições de possibilidade de todo o conhecimento de Kant à luz do realismo objetivo, p. 214-215), entende-se

ainda o modelo Dualista, que privilegia em dado momento o sujeito e em outro o objeto, como Dualista paralelista. Entretanto, para Chicero Kant teria proposto um modelo dualista interacionista; mais do que isso, o Kant da Crítica da razão pura deveria ser entendido como um “interacionista pluralista”, enquanto uma forma de realismo na qual são deslocadas “as condições

a priori de possibilidade de todo o conhecimento do mundo do sujeito” para um mundo que não

seria nem mental, nem material, mas sim um “mundo objetivo”.

113 N.Luhmanm (Sobre os Fundamentos Teórico-sistêmicos da Teoria da Sociedade, p. 64)

identifica nesse comportamento o problema da circularidade, segundo a qual a teoria do “fechamento operacional” apresenta-se como condição “real” de qualquer conhecimento. A possibilidade de um observador fixar-se numa perspectiva “assimétrica” de controle do objeto tem a ver com sua escolha prévia de uma direção causal.. Como fundamento “a diferenciação entre

auto-referência e referência externa”, mediante a qual “não apenas a diferenciação do sistema frente ao resto do mundo, que se torna então ambiente, é realizada através de operações próprias, e que sem [isso] (...) ela não ocorreria; mas (..) também (..) a diferenciação entre auto-referência e referência externa, que é tornada assim possível, [como] uma diferenciação de si mesmo e [que]

razão na totalidade do pensamento, evidenciada como construção dos condicionamentos na especificação de uma racionalidade autônoma, segundo a imanência conceitual fundada em princípios, devem os limites da razão ser encarados sem ignorar a necessidade intrínseca de melhoramento da teoria fundada, como critério, no método filosófico a possibilidade de problematizar os resultados obtidos e para alternativa114

ao modelo realista empírico, a tentativa de buscar fazer corresponder, através disso, fatos a princípios, a exposição do princípio ao objeto fundado, encarado igualmente como fato, designa a aceleração arbitrária do recurso de colar princípios a fatos, à base de um realismo ingênuo.

Por isso, no aprofundamento dos fundamentos de todo Realismo, à base do qual deve subjazer um conceito de experiência115 que refute a busca da identidade finita na consciência (os elementos da intuição e do conceito, ou sensibilidade e entendimento), tem de ser encontrado o recurso alternativo e condicionante de um único modelo sistemático.

demanda operações próprias”. Luhmann evidencia que “só se pode conhecer o ambiente porque não se pode manter com ele nenhum contato operacional”(p. 63).

114 Segundo Robert B. Pippin (Avoiding German Idealism: Kant, Hegel and the reflective

Judgement Problem, p.132. In: Idealism as Modernism. Hegelian Variations, 1997, p. 129-153), a saída kantiana de Kant, através do qual se compreenderia melhor o elemento “transcendental” da razão, se daria nas reflexões sobre a necessidade de uma intuição intelectual (Intellectus

Archetypus) na Crítica da Faculdade do juízo. Entretanto, diferentemente para nós, a fim de

pensarmos um “modo kantiano de sair de Kant”, teria de se pensar a concessão kantiana ao empirismo cético – com sua vertente prática no estoicismo – no confronto com pressupostos dados através da possibilidade da demonstração das suas condições dedutivas. Pois, unicamente aqui a razão não se mostra sujeita, de modo arbitrário, à antecipação imanente (de modo exclusivamente lógico-teórico, conforme juízos a priori analíticos, independentes da experiência) definida como consequência transcendental.

115 Aqui tem de ser pensado o conceito de experiência de um modo amplo, evitando procurar

imediatamente adotar o conceito de experiência sensível, fenomênica, fornecido por Kant. O próprio Kant, de modo mais evidente nos Prolegomena, busca o conceito que sirva de fundamento para todo o fenomênico na investigação científica. Adiante (Unidade 1.2.6) expomos o contexto dessa fundamentação.

Visando expressar-se pela razão concebida como faculdade crítica do conhecimento, que devia ocupar-se – segundo a doutrina Idealista transcendental – com “o nosso modo de conhecer os objetos”, a edificação filosófica kantiana tem de arcar com as exigências heterogêneas dos dois diferentes pilares do conhecimento, as faculdades de sensibilidade (imaginação transcendental) e entendimento, cuja invisibilidade do vínculo manifesta a falta da unidade da razão a um ponto de partida único, um único princípio incondicionado.

Aparecendo a faculdade do entendimento, também ela, sob o prisma meramente fenomênico, a teoria do conhecimento de Kant revela sua dependência ao modelo realista, sem conciliar a afirmação – só pressuposta mas não demonstrada – da realidade como dada ao investigador da natureza, no pressuposto da autonomia teórica da razão face à natureza, como hipótese que torna reversível à situação em que a razão é subjugada pela experiência.

Assim as questões: a) de que modo podem ser extraídas de uma mesma racionalidade metódica a postura tanto da faculdade representacional como da faculdade do pensamento? e, b) quais os limites que circunscrevem a tematização da razão, como faculdade do pensamento, de modo definitivo, na exposição fornecida por essa racionalidade metódica? – são adiante perseguidas na evidenciação de que o elemento ontológico, à base do questionamento do fundamento da razão teórica, é o verdadeiro fundamento da Metafísica do conhecimento.

1.2.2 Elementos sistemáticos na Crítica da razão pura: a Idealidade em