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Partindo da ideia de que Pernambuco era uma das principais capitanias da América portuguesa, e sendo os colégios de Olinda e Recife importantes instituições do patrimônio jesuítico no Estado do Brasil no século XVIII, torna-se significativo compreender o destino de seus bens e como a Coroa conduziu todo o processo pós-expulsão.

Através dos decretos régios de confisco dos bens dos Jesuítas em pesquisa realizada no Arquivo Histórico Ultramarino (AHU) e no Arquivo Nacional Torre do Tombo, podemos perceber não só o destino dos bens dos colégios, mas a abrangência de atividades e aspectos da manutenção do extenso patrimônio fundiário, bens urbanos e escravos da Ordem na Capitania de Pernambuco212.

Antes do decreto da expulsão, em 3 de setembro de 1759, em reunião no paço episcopal, a Junta da Fazenda213, tendo recebido os documentos que acusavam os Jesuítas de

arquitetarem o atento contra o Rei, deliberou que os bens dos colégios da Companhia de Jesus fossem “sequestrados” e que as ações dos confiscos fossem dirigidas pelos chanceleres da Casa de Suplicação e da Relação do Porto214.

212 Há uma série de pesquisas recentes que tiveram como foco o destino do patrimônio jesuítico na Bahia, Rio de janeiro e até mesmo em Goa, na Índia portuguesa. Ver PEREIRA, Edgar. Terra jesuítica e a administração do confisco de Goa: a política de concessões fundiárias no final de setecentos. Revista 7 Mares. n. 4, jun.2014. Disponível em: <http://www.historia.uff.br/7mares/wp-content/uploads/2014/10/v02n04a02.pdf>. Acessado em 27 de março de 2017.

213 Sua criação está relacionada as reformas implementadas por Sebastião José de Carvalho e Melo no sistema de arrecadação das rendas reais, e objetivava a centralização de todos os assuntos fazendários na tesouraria geral. Ver MAXWELL, Kenneth R. A devassa da devassa : a Inconfidência Mineira, Brasil-Portugal, 1750-1808.

214 Recife. OFÍCIO do [governador da capitania de Pernambuco], Luís Diogo Lobo da Silva, ao [secretário de estado do Reino e Mercês], Sebastião José de Carvalho e Melo, sobre o sequestro dos bens dos religiosos da Companhia de Jesus e a suspensão da Ordem feita pelo Bispo de Pernambuco, [D, Francisco Xavier Aranha]. 10 de Maio de 1759. Fonte/chamada: AHU_CU_015, Cx. 91, D. 7275 (Ver Anexo H).

Após a proscrição da Companhia dos domínios portugueses, várias medidas foram tomadas para proceder com o inventário e confisco dos patrimônios. Em Pernambuco, o processo foi levado a cabo sob a responsabilidade da Junta da Fazenda,de acordo com a ordem régia de 22 de outubro de 1761, que atuaria por meio de uma equipe para administrar os bens dos colégios de Pernambuco (Olinda e Recife), Paraíba e Aquiraz, na Capitania do Ceará 215. Segundo a documentação lida, o sequestro dos bens deveria ser geral, ou seja, de todos os bens móveis e de raiz, rendas, ordinárias e pensões que os Jesuítas possuíam ou cobrassem nas áreas de jurisdição da Capitania de Pernambuco. Esses procedimentos de confisco, adotados pelos funcionários régios no Brasil, deveriam cumprir-se para, assim, estarem em acordo com as determinações régias para todo o território ultramarino e deveriam iniciar pelo levantamento dos bens, organizados por classes216.

[...] E porque pelas sobreditas desnaturalização, proscripção, extermínio, e total expulsão dos mesmos Regulares, ficarão vagos nos Meus Reino e Domínios, todos os bens temporaes consistentes em móveis (não dedicados imediatamente ao Culto Divino) em mercadorias de commercio, em fundos de terras, e casas, e em rendas de dinheiro, de que os mesmos Regulares tinhão domínio, e posse como livres, sem serem gravados com os encargos de capelas, ou algumas outras obras pias: E tendo ouvido sobre esta matéria muitos Ministros Theologos, e Juristas do Meu Conselho, e Desembargo, muito doutos, e zelosos do serviço de Deos, e Meu, com o parecer dos quaes Me conformei: Sou servido, que todos os bens de referida natureza, como bens vacantes, sejão logo incorporados no Meu Fisco, e Camara Real, e lançados nos livros dos Proprios da minha Fazenda Real. E conformando-me também com os mesmos pareceres: Sou servido outro sim declarar revertidos à minha Real Coroa todos os outros bens, que dela havião sahido para os sobreditos Regulares proscriptos, e expulsos com os seus Padroados. Pelo que toca ao outros bens por sua natureza seculares, que se achão gravados com encargos de capelas, sufrágios, e semelhantes obras pias: Sou servido outro sim (conformando-me também com os mesmos pareceres) ordenar, que dela se faça logo huma Relação, em que distinctamente se declarem os que forem pertencentes à disposição de cada hum dos Testadores, ou Doadores com as pençoes nelles impostas. Para Eu lhes dar administradores, que conservem os referidos bens, e bem cumprão com os encargos deles, de sorte que não pereção por estarem vacantes [...] (Alvará de 25 de fevereiro de 1761217)

Como observado por Jorge Couto218 (1990), a orientação régia determinou a organização dos bens em três classes. Na primeira classe, estavam incluídos os títulos de bens

215 OFÍCIO do [governador da capitania de Pernambuco], conde de Povolide, [Luís José da Cunha Grã Ataíde e Melo], ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar], Francisco Xavier de Mendonça Furtado, sobre a execução às ordens para se fazer instalar uma Junta para se tratar dos negócios e pendências pertencentes aos bens dos Jesuítas. Fonte/chamada: AHU_CU_015, Cx. 106, D. 8226.

216 Alvará de 25 de fevereiro de 1761. Disponível em: <http://www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt>. Acesso em 08 de abril de 2016.

217 Alvará de 25 de Fevereiro de 1761. Disponível em: <http://www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt>. Acesso em 08 de abril de 2016.

218 José Jorge Couto desenvolveu uma pesquisa sobre o Colégio dos Jesuítas do Recife e o destino do seu Patrimônio, que resultou em uma dissertação de Mestrado na Faculdade de Letras de Lisboa em 1990. Atualmente, ele atua na mesma Universidade e sempre ministra uma disciplina sobre história do Brasil.

móveis, as casas, juros de empréstimos a particulares e atividades de crédito dos Jesuítas (não incluindo aqui os bens relacionados ao culto divino). Os bens móveis que não estavam vinculados às atividades litúrgicas deveriam ser colocados à venda ou leiloados nas localidades onde se encontravam os colégios, as residências ou qualquer outro estabelecimento dos religiosos. Os imóveis menores seriam vendidos na presença da Junta, em praça pública, deveriam ser entregues a quem oferecesse o maior valor e pagos em uma parcela; já o pagamento dos engenhos e fazendas219, imóveis maiores, poderiam ser parcelados em até cinco prestações, considerando seu alto valor financeiro.

A segunda classe era constituída pelos bens e rendas doadas pela Coroa, como era o caso das mercês, ou as concessões em bens dadas pelo Rei à Companhia de Jesus. Para a Coroa, esses bens, por direito, não pertencia aos Jesuítas e sim a ela, e, por isso, deveriam voltar ao Rei em forma de contos de réis.

A terceira classe agrupava os bens das capelas — esmolas recebidas, bens e rendimentos de obras pias fundadas por colonos e passadas aos Jesuítas. A lista dos bens e rendimentos das obras pias deveriam ser enviadas para Lisboa e lá é que se tomariam as decisões sobre esses bens, respeitando “a vontade expressa nos testamentos dos fundadores”220

para o fim em que a obra foi criada.

O confisco do dinheiro (bens em espécie) que estava na posse dos Jesuítas foi a primeira medida tomada pela Junta. Em julho de 1759 foi registrado no livro de receitas, a soma 1:623$590 réis que estava na posse do Reitor do Colégio de Recife, sendo esse dinheiro distribuído nos cofres régios de acordo com o previsto nas definições das classes, ou seja 1:387$590 réis, relativos à manutenção do colégio, pertenciam a primeira classe; 860$000 réis, destinados ao culto divino e 150$000 réis destinados à manutenção da igreja do colégio, pertencentes à terceira classe. Foram encontrados 114$040 réis com os Jesuítas, 96$000 por “um soldado que estava na guarda do colégio” e 18$040 no cubículo do padre reitor221.

219“Estas fazendas congregavam centenas de escravos que produziam para abastecer os aldeamentos/missões, as cidades próximas, ou mesmo outras localidades, mas acima de tudo, eram responsáveis pela geração de lucros para os Colégios dos jesuítas e para a Companhia de Jesus, que aumentava cada vez mais o seu poder local através do controle de mão-de-obra e terra”. AMANTINO, Marcia. Fazendas, engenhos e haciendas: Os bens materiais e os escravos dos Jesuítas na Capitania do Rio de Janeiro e na Província Jesuítica do Paraguai, século XVIII. São Paulo, 2011, Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH, Julho/ 2011, p. 6.

Nesse sentido, existência do “lucro”, apontado por Amantino, abre margem para muitas discussões em torno da

questão. Pombal acusava a Companhia de Jesus de fazer “lucro”, enquanto ela se defendia dizendo que não havia

lucro e que as vendas dos produtos eram exclusivamente para manutenção das missões e colégios, uma vez que as ordens religiosas eram proibidas pela Santa Sé de tirar vantagens financeiras com suas vendas.

220 Fonte/chamada: A.N.T.T., Documentos das Capitanias do Brasil. L° 578.

O livro de receitas e despesas com as vendas dos bens e o valor alcançado distintamente pelas três classes deveriam ser depositados em um cofre de três chaves, ficando cada uma delas com pessoas diferentes — uma com o ouvidor, outra com o provedor da Fazenda e a terceira com o tesoureiro222. O valor total obtido deveria ser levado para Lisboa em um navio escoltado e aos cuidados do tesoureiro geral, o qual deveria ter consigo uma relação, a ser apresentada na presença de D. José I, dos valores pormenorizados e o total do dinheiro presente no cofre223.

Muitas terras foram concedidas pela Coroa para sustento das missões, como em Ibiapaba, no Ceará, que, em seu entorno, concentrava três fazendas com suas fábricas, ferramentas, lavouras, gados e escravos224, tudo pertencente ao Colégio de Olinda, que, entre as instituições jesuítas atuantes em Pernambuco, foi aquele que mais concentrou propriedades agrícolas e pecuaristas. Já o Colégio do Recife, por sua vez, teve maior posse de prédios urbanos e recebimentos de foros relacionados a propriedades urbanas como terrenos e imóveis, quase todos situados no Recife e adjacências. O quadro abaixo apresenta números do inventário do ano de 1772:

Quadro 13 — Prédios urbanos e rústicos da Companhia de Jesus em Pernambuco e capitanias anexas 225

Colégio de Olinda Colégio do Recife Colégio da Paraíba Prédios Rústicos 06 06 01 Prédios Urbanos 07 26 10 Foros 14 29 - Partido de Cana - 1 -

Fonte:Avulsos da Capitania de Pernambuco

Essas propriedades estão enquadradas nas classes já referidas anteriormente. Para os números indicados do ano de 1772, os prédios urbanos e rústicos do Colégio do Recife foram descritos na primeira classe, ou seja, propriedades deixadas aos Jesuítas por meio de

222 Idem

223 Ver Anexo E, Documentação do Invéntário.

224 Fonte/chamada: AHU_CU_Inventário dos bens confiscados aos jesuítas em Pernambuco, cód. 1964.

225 OFÍCIO do [governador da capitania de Pernambuco], Manoel da Cunha Meneses, ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar], Martinho de Melo e Castro, sobre a arrematação dos bens confiscados aos Jesuítas na dita capitania. 1772, fevereiro, 3, Recife. Fonte: Anexos: 9 docs. Fonte/chamada: AHU_CU_015, Cx. 112, D. 8627.

testamentos e doações. Ainda nesse sentido, os 10% das propriedades do Recife (seis propriedades, entre terras e prédios) obtidas por meio de compra, direito de cobrar foros, créditos e outras fontes de financiamento, foram também enquadrados na primeira classe. O Colégio de Olinda, da mesma forma, obteve a maior parte de suas receitas por meio de bens da primeira classe, sendo principalmente foros e as fazendas existentes na Capitania do Ceará.

Segundo Fabrício Santos (2007), as propriedades urbanas dos jesuítas demonstram um pouco da malha urbana de onde estavam inseridas. Para Salvador, por exemplo, a Companhia de Jesus possuía 184 prédios de aluguéis, sendo 128 assobradados e 56 casas térreas distribuídas entre a parte baixa e alta da cidade, ou seja, de um lado, imóveis inseridos na principal área comercial e, de outro, na parte alta, casas no entorno da elite senhorial. (SANTOS, 2007 p. 180). O Colégio do Recife possuía imóveis e sítio de terras na Boa Vista, bairro do Recife e Santo Antônio, zonas de intensa atividade econômica e social da Vila do Recife durante o século XVIII. Os inacianos do referido colégio contavam também com um regime de parceria, por meio de um “partido de cana” na Freguesia do Cabo, avaliado em 800 mil réis em 1772.226

Outros inventários foram produzidos ao longo da década de 1770, no qual encontramos a relação de várias propriedades não relacionadas na documentação apresentada acima. Um exemplo era o Engenho Monjope, em Igarassu, pertencente ao Colégio de Olinda, arrematado em novembro de 1768 a 16 contos e 260 mil réis pelos sócios Cristóvão de Holanda Cavalcante (capitão de ordenança e proprietário de terras na Vila de Igarassu227), Antônio Coelho Furtado, José da Cunha Pedrosa e Antônio Coelho Furtado. Entre as fazendas já citadas pertencentes ao Colégio de Olinda, a Santa Maria Madalena, vendida em hasta pública a 28 de agosto de 1763, alcançou o valor de 8 contos e 260 mil réis, arrematada por Francisco Resende de Carvalho, mas devedor de 1.674$300 em 1774. Essa propriedade torna-se relevante porque relaciona o número de escravos lançados nesse negócio228. A fazenda Santa Maria Madalena contava com aproximadamente 83 escravos, dos quais 53 cativos foram arrematados pelo capitão Antônio Dantas Correia, senhor de engenho em Olinda.229 É difícil especular sobre a

226 FÍCIO do [governador da capitania de Pernambuco], Manoel da Cunha Meneses, ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar], Martinho de Melo e Castro, sobre a arrematação dos bens confiscados aos Jesuítas na dita capitania. 1772, fevereiro, 3, Recife Anexos: 9 docs. Fonte/chamada: AHU_CU_015, Cx. 112, D. 8627.

227 REQUERIMENTO do capitão de Ordenança do Recife, José Alemão de Cisneiros, por seu procurador coronel pago Antônio José da Silva Coelho, ao príncipe regente [D. João], pedindo que devolva ao seu procurador os documentos enviados em requerimentos anteriores. Anexos: 2 docs. 26 de julho de 1084. Fonte/chamada: AHU_CU_ 015, Cx. 249, D. 16724.

228 Idem.

229 REQUERIMENTO do capitão de Ordenança de Olinda, Antônio Dantas Correia, ao rei [D. João V], pedindo confirmação da carta patente. 1742, outubro, 8 Anexo: 1 doc. Fonte/chamada: AHU_CU_015, Cx. 58, D. 4984.

dimensão da escravaria dos Jesuítas em Olinda, Recife e Paraíba, além daqueles escravos que serviam nas antigas missões do Ceará e Rio Grande do Norte e no Hospício de Aquiraz no Ceará. Mas de acordo com um relatório enviado a Roma pelo Provincial do Brasil, Pe. Francisco de Matos (1697-1702), os colégios de sua província possuíam 2238 escravos, sendo estes distribuídos entre os diversos colégios230.

Quadro 14 — Mostra de posse de escravos pelos Jesuítas

Colégios Número de Escravos

Colégio da Bahia 738

Colégio do Rio de Janeiro 950

Colégio de Olinda 70

Colégio de Recife 200

Colégio do Espírito Santo 200

Colégio de São Miguel Santos 10

Colégio de São Paulo 50

Seminário de Belém 20

TOTAL 2.238

Fonte: Catalohus tertius ex Triennales Brasilae Roman missus a P. Provincialis Francisco de Mattos, Anno MDCCI. Catálogos dos Bens da Porvíncia do Brasil 1701. ARSI, BRAS. 3;

LEITE, 2004.

Outra dificuldade encontrada pela maioria dos pesquisadores é calcular o total arrecadado pela Coroa portuguesa com o sequestro dos bens. O quadro abaixo, de 1774, o qual tem como base a relação das dívidas dos contratos firmados com os arrematantes, demonstra que, entre a venda e o pagamento, entre a dívida administrada pela Junta da Fazendo e o que de fato entrava nos cofres régios, havia um trajeto das dívidas até se transformarem em receitas. As dívidas não significam o valor total arrecadado pela Coroa por cada colégio, apenas demonstram os saldos que o fisco ainda deveria receber em relação aos contratos estabelecidos com os arrematantes.

230 Desde do século XVI ao XVIII houve uma querela entre os Jesuítas sobre a escravatura de africanos. No Brasil Pe. Manuel da Nóbrega, primeiro Provincial do Brasil, defendia a escravidão argumentado que sem ela a Companhia não poderia se expandir. Outro grupo de Jesuítas, liderado por Luís de Grã que foi Reitor do Colégio de Olinda e sucessor de Nóbrega, como provincial, defendia a pobreza e o asceticismo, estes Jesuítas advogavam que a Companhia não deveria aceitar bens de raiz para não necessitar recorrer a mão-de-obra de escravos. Em 1568 a Congregação Provincial do Brasil decidiu por ter escravos e esta decisão foi aprovada pelo Provincial de Portugal e pelo Geral de Roma, mas as discordâncias, sobre o tema, entre os Jesuítas no Brasil continuaram. Ver LEITE, T. II, L.II, cap. II, 2004.

Quadro 15 — Desenvolvimento das receitas e despesas relativas aos bens confiscados aos Jesuítas proscritos231 Nome dos Colégios Total das dívidas Lançamentos feitos Resto a Vencer (a pagar) Restos Vencidos (atrasado) Total dos Restos das dívidas Colégio de Olinda 30679$130 6227$805 16931$800 7519$525 24451$325 Colégio de Recife 25905$446 7305$740 13158$000 5441$706 18599$706 Colégio da Paraíba 1416$040 517$017 _____ 899$023 899$023 Hospício do Ceará 3$320 ______ _____ 3$320 3$320 Hospício do Penedo 7600$000 2100$000 700$000 4800$000 5500$000 TOTAL 65:603$936 16:150$562 30:789$800 18:663$574 49:453$374 Fonte: BELO, Albertina, 2000, p.220.

Chama a atenção o quadro acima que as dívidas a serem pagas em 1774 constituíam um montante de 49:453$374, ou seja, 75% do total do que deveria ser arrecadado com as vendas de bens dos Jesuítas. Do total das vendas, 65.603$936, só foi pago, até aquele ano, 25%. O quadro nos mostra outros dois aspectos importantes: o primeiro é a quantidade de bens que os colégios da Capitania de Pernambuco e suas anexas possuíam; o segundo é o alto valor produzido pela venda desses bens, o que nos leva a concluir que a arrecadação da Coroa com a venda das propriedades imóveis e bens móveis dos colégios de Pernambuco era promissora e, por isso, causava tanto interesse e minuciosa organização em torno desse negócio financeiro. O

231 Recompillação dos Sinco Rezumos dos Inventários dos bens confiscados aos Jezuítas per tencentes a primeira clace. 1774, Janeiro, 7, Recife de Pernambuco apud Belo, 2000, p. 220. Ainda sobre a Relação das Dívidas aos bens Confiscados aos Jesuítas em Pernambuco, cód. 1863, 1864, 1834, 1835, 1836, 1837, 1838, 1842, 1840, 1846, 1845, 1847, 1867

tipo das vendas também beneficiava os colonos, uma vez que o pagamento das dívidas era facilitado por prolongamento em parcelas, atraso (restos vencidos) ou não pagamento.

Na Paraíba, os bens sequestrados incluíam uma fazenda comprada pelo militar e ex-governador do Ceará, Antônio José Victoriano Borges da Fonseca, natural do Recife, com elevado prestígio entre os contemporâneos na metade do século XVIII. Incluía ainda o Colégio da Paraíba, com moradas de casas de onde se tiravam aluguéis como fonte de financiamento. Segundo Serafim Leite, a população se recusou a administrar o dinheiro arrecadado com a venda dos bens pertencentes aos Jesuítas. “Foi preciso tirar à sorte, um, a quem se incumbisse, quase forçado, tão ingrata comissão” (LEITE, 2004, T.V, p.360).

O trato de confisco dos bens móveis seguiu uma sistematização específica e gerou uma considerável arrecadação, tendo este confisco um caráter mais rápido (entre os anos 1759- 1763) para com os bens móveis devido as características dos bens. O primeiro bem móvel confiscado, como vimos, foi o dinheiro em posse dos religiosos. Em seguida, a cobrança das rendas das terras, engenhos, os rendimentos dos foros e aluguéis das casas. Mas chama atenção um grupo de bens móveis pertencentes aos colégios que passaram a ser confiscados entre os dois primeiros anos de sequestro: a receita da botica, o gado, os móveis de madeira dos colégios e residências, as ferramentas, os livros, as roupas e o couro.

Já em relação aos valores totais das dívidas referentes ao Colégio de Olinda, mais de 15 contos relacionam-se ao recebimento de uma côngrua de 900 arrobas de açúcar, concedidas pelo Cardeal-Rei Dom Henrique para sustento das aulas de gramática e que deveriam ser incorporadas ao Erário Régio232, o que significa que muito deveria ser vendido para se chegar a esse valor. No final da década de 1780, a Junta da Fazenda de Pernambuco ainda levou a leilão um conjunto de propriedades que pertencera aos inacianos, contando com 1094 cabeças de gado, 5 moradas de casas e 17 escravos, tendo como comprador Faustino Vieira de Sandes.233

O aparelhamento administrativo, a sistematização das arrecadações, os depósitos das receitas e as políticas financeiras criadas em torno dos sequestros dos bens móveis e imóveis da Companhia de Jesus, leva-nos a concluir que, para Portugal, essa arrecadação era de fundamental importância para a recuperação de sua economia.

Entre os grandes déficits portugueses estava a dívida da Coroa com a Grã-Bretanha.