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2 ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL E A GESTÃO EMPRESARIAL

2.1 A RELAÇÃO DE EMPREGO E O PODER EMPREGATÍCIO

Adriano Reis Araújo (2006) afirma que, desde o início dos tempos, existe a exploração de um indivíduo por outro, podendo esta ocorrer de diversas formas, tais como pela escravidão ou pela servidão. O trabalho assalariado, na Idade das Trevas, era esnobado, de modo que a ele se submetiam apenas os que precisavam de uma complementação na receita.

O tratamento distinto dado ao trabalho na civilização moderna se deveu à extinção dos privilégios de classe ou de origem, o que foi tão apoiado pelas revoluções ocorridas na Inglaterra, nos Estados Unidos e na França. Somente na sociedade moderna o trabalho seria

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considerado uma mercadoria que poderia ser negociada pelo próprio detentor da força laboral (ARAÚJO. 2006).

No atual contexto juslaboral, trabalhador e empregado são termos distintos que denominam situações jurídicas diferentes. Trata-se, em verdade, de uma correlação de gênero e espécie, sendo o trabalhador um indivíduo que empresta sua força de trabalho em troca de uma contraprestação.

Para que se exista uma relação empregatícia, necessário se faz o atendimento a alguns requisitos essenciais, quais sejam: trabalho realizado por pessoa física, pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação. O requisito de especial relevância para o assunto em questão é a subordinação, pois dela derivam os poderes empregatícios.

Sob o ponto de vista etimológico, a palavra subordinação advém de sub, que se remete a baixo, e ordinare, que se reporta ao verbo ordenar, consubstanciando-se, assim, em uma condição de submissão em relação a um indivíduo, ou grupo de indivíduos, que se encontram em um patamar superior na escala hierárquica (DELGADO. 2017).

Ela pode ser analisada sob dois ângulos diferentes, sendo um deles o objetivo, o qual preceitua que a subordinação recai sobre a maneira como se é empregada a força de trabalho, não recaindo, portanto, sobre o sujeito da relação empregatícia (DELGADO. 2017).

O outro é o subjetivo, o qual afirma que a submissão existe sobre o empregado enquanto pessoa natural. A visão sobre este fenômeno jurídico encontra-se absolutamente obsoleta, posto que o objeto do contrato de emprego é a forma da prestação do serviço e não a pessoa do empregado, resumindo-se, assim, a uma limitação autorizada à autonomia deste no que tange ao cumprimento dos serviços pactuados (NASCIMENTO. 2011).

Ao longo da história da teoria da subordinação foram idealizadas algumas dimensões quanto a este fenômeno, também chamado de dependência, que consistiriam em interpretações quanto a sua origem, quais sejam, técnica, econômica, social e jurídica.

A primeira delas foi a dependência técnica, na qual se afirmava que a submissão do empregado ao empregador adviria do fato deste possuir conhecimento global das técnicas de execução do trabalho e, por isto, aquele estaria a suas ordens. Tal dimensão encontra-se atualmente superada, já que é possível que um empregado seja detentor de um conhecimento especializado alheio ao empregador, o qual, exatamente por este motivo, o contratou (MELO. 2013).

Em seguida, surgiu o entendimento de que a subordinação seria oriunda da dependência econômico-financeira que o empregado teria em relação ao seu patrono, visto que o trabalho oportunizado por este seria o seu meio de subsistência. Tal entendimento

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também não reflete a realidade, pois é possível que haja a subordinação entre os integrantes do contrato empregatício sendo o empregado aquele de maiores condições econômicas, como no caso de um professor de cursinho que leciona em uma universidade federal e é magistrado (MALLET. 2012).

Segundo Liana Holanda de Melo (2013) é necessário perscrutar o sentido da dependência social levando em consideração o conceito da subordinação econômica, visto que aquela implicaria na existência de uma sujeição na relação empregado-empregador em razão de o trabalho realizado por aquele ser necessário para subsistir com dignidade. Contudo, tal ponto de vista não sobreviveu tendo em vista que não é considerado instrumento hábil a distinguir a relação empregatícia do trabalho autônomo.

Amauri Mascaro Nascimento (2011) assevera que a teoria da subordinação jurídica é a que guarda maior aceitação na doutrina e jurisprudência pátria, consistindo ela em uma situação jurídica de dependência, decorrente de um contrato de emprego, que sujeita o prestador de serviço aos comandos e às ordens do empregador em razão deste negócio jurídico bilateral constituído.

Maurício Godinho Delgado considera que o poder empregatício é uma decorrência do contrato empregatício, mais especificamente que ele é um efeito próprio, conceituando-o como um poder que:

“[…] concentra um conjunto de prerrogativas de grande relevo socioeconômico, que favorecem, regra geral, a figura do empregador, conferindo-lhe enorme influência no âmbito do contrato e da própria sociedade” (GODINHO, Maurício Godinho. 2017. pág. 748).

Consoante Rúbia Zanotelli de Alvarenga (2010), a subordinação jurídica é a responsável pela submissão do empregado à vontade do empregador, de modo que, em razão disto, este torna-se titular dos poderes diretivos, regulamentares, fiscalizatórios e penalizadores.

O conteúdo do poder diretivo é de jaez intuitiva, podendo ele ser entendido como a prerrogativa atribuída ao empregador, oriunda do contrato de trabalho, de dirigir a maneira como o serviço prestado pelo empregado deverá ser executado.

Segundo Eraldo Gurjão da Silva (2014), pode-se extrair a fundamentação normativa deste poder do art. 2º da CLT que traz o conceito de empregador, in verbis:

“Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação

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Alguns autores como Amauri Mascaro Nascimento e Rosamaria Novaes Freire Lopes, diferentemente de Maurício Godinho Delgado, entendem que o conceito de poder diretivo engloba o de poder regulamentar, que é aquele que faculta ao tomador de serviço editar um conjunto de normas que deverão ser obedecidas no ambiente organizacional.

O poder fiscalizatório, ou de controle, consiste na possibilidade atribuída ao patrono de fiscalizar e controlar as tarefas realizadas pelos empregados para se sustentar um patamar mínimo de produtividade hábil a manter a atividade empresarial competitiva no mercado (VINAGRE. 2015).

Por fim, o poder disciplinar, ou penalizador, é o que autoriza o credor da relação empregatícia a instituir e a concretizar restrições ao empregado, no âmbito da empresa, pelo fato de ter ocorrido transgressão das normas anteriormente estipuladas pelo empregador.

Até aqui, constatou-se que é necessário que se exista a subordinação jurídica na relação entre os sujeitos do contrato de trabalho para a configuração do vínculo empregatício, o que dá origem a determinadas prerrogativas ao tomador dos serviços para melhor gerir os colaboradores a fim de possibilitar a consecução dos objetivos empresariais.

Como veremos adiante, tais faculdades estão intrinsecamente entrelaçadas com o conceito de assédio moral organizacional e, por consequência, com a casuística de tal fenômeno violador dos direitos fundamentais do empregado, porém, antes de adentrar neste assunto, mostra-se necessário discorrer sobre as formas de gestão da força de trabalho criadas pela ciência da administração.

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