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2 ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL E A GESTÃO EMPRESARIAL

2.4 MÉTODOS DE GERENCIAMENTO ABUSIVO

Anteriormente, foram analisadas algumas teorias da ciência da administração utilizadas como modelos de gestão empresarial. A mera aderência a uma destas na tentativa de otimização organizacional não configura qualquer tipo ilícito, visto que não se encontram em sua estrutura quaisquer características aptas a lesionar o patrimônio, em sentido amplo, do empregado.

Contudo, numa sociedade supercompetitiva, algumas formas de gerenciamento da força de trabalho foram criadas em paralelos para a ampliação dos rendimentos. Estas, por sua vez, podem violar um gama de direitos dos empregados e configurar o assédio moral organizacional, como se verá a seguir.

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Segundo Karina da Silva Menezes e Thiago Lima Carneiro (2016), o gerenciamento da força laboral por injúria consiste na introdução metódica, de maneira excessiva e imoderada, de condutas opressoras que resultam na lesão à dignidade e aos direitos personalíssimos do empregado, através de humilhações e da criação de situações vexatórias a alvos indefinidos.

Assim, pode-se entender que o assédio moral coletivo seria aqui caracterizado pelo contínuo comportamento agressivo e despeitoso dos empregadores, e de seus prepostos, em detrimento da classe empregatícia, de forma indistinta, e com o intuito de alcançar as metas empresariais.

Nota-se que se trata da utilização desvirtuada de um tipo de motivação que utiliza de maneira simples e excessiva o reforço negativo, concretizado através do aviltamento no ambiente de trabalho de forma difusa, relegando, assim, ao ostracismo as normas protetivas constantes no ordenamento jurídico pátrio.

A jurisprudência nacional reconhece a existência desta conformação lesiva, senão vejamos:

“ASSÉDIO MORAL, RIGOR EXCESSIVO E GESTÃO POR INJÚRIA - DISTINÇÕES E CARACTERIZAÇÕES. […] Assim, a sobrecarga de trabalho, por si só, não significa assédio, a não ser quando é extremamente exagerada com o objetivo deliberado de prejudicar o empregado. Por outro lado, a gestão por injúria

pode se caracterizar por atos de empregadores ou por prepostos que se comportam agressivamente, e que constantemente insultam e pressionam seus empregados. Porém, a gestão por injúria não visa, via de regra, a um empregado específico e, sim, a todos os empregados, indistintamente, que passam a ser injuriados, para que produzam mais, para que atinjam

determinadas metas. […]” (TRT 3 – RO 960407 00840-2005-100-03-00-7, 4ª

Turma, Luiz Otavio Linhares Renault, DJ 28/07/2007).

Assim, verifica-se que este tipo de gestão é fruto do desvirtuamento do poder diretivo, de controle e disciplinar do empregador, que se vale de sua prerrogativa de mando, de fiscalização e de punição para insultar, ofender e pressionar o subordinado para a obtenção de melhores resultados.

Exemplos deste tipo de gestão foram presenciados enquanto uma supervisora incutia o medo nos colaboradores através de constantes críticas em forma de xingamentos, tais como “Vocês são muito descansados. O que vocês achavam que estão fazendo aqui?”, enquanto a equipe almoçava dentro do horário previamente estipulado; ou como “Vocês são umas lesmas caquéticas mesmo!”, frase dirigida ao corpo de cozinheiras que estavam com o almoço dentro do cronograma.

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2.4.2 GESTÃO POR ESTRESSE

Este recurso administrativo paralelo pode ser entendido como um conjunto de condutas estruturalmente estabelecidas no ambiente empresarial que fomentam o sentimento de necessidade de produtividade acelerada, que pode ser atingido através de cobranças recorrentes, estabelecimento de plano de metas que não possibilita o integral cumprimento, criação de prazos diminutos para a execução de tarefas, implantação sistema de rankeamento de produtividade (SOBOLL. 2008).

A constante imposição de situações desenhadas para deixar o trabalhador sob pressão com o objetivo de aumento da eficiência e da eficácia e com a consequente sobreposição de humilhação e de submissão a situações vexatórias pelo seu descumprimento é considerada como a principal expressão do assédio moral organizacional (GUIMARÃES. 2012).

Karina da Silva Menezes e Thiago Lima Carneiro (2016) ressaltam a inexistência de finalidade de comprometimento do ambiente de trabalho e de violação dos direitos do empregado, mas que as suas características trazem sérias consequências para a saúde psicológica e física deste.

O straining, como também é conhecido, atinge indistintamente o trabalhador e sua autoestima. É patente a violação do direito à honra, à imagem e à dignidade dos empregados alvejados pelo conjunto de práticas abusivas.

Um exemplo particularmente alarmante, tanto pelo notório mau gosto quanto pela grande recorrência com que esta situação ocorre no cotidiano empresarial é o caso de utilização de humilhações coletivas em reuniões para avaliação de resultados, que se dizem motivacionais, como no julgado abaixo transcrito:

“WMS SUPERMERCADOS DO BRASIL. REUNIÕES MOTIVACIONAIS COM DANÇA E REBOLADO. ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL. As reuniões motivacionais com dança e rebolado, submetendo os trabalhadores a "gritos de guerra", com exposição ao ridículo, implicam assédio moral organizacional. Hipótese em que caracterizada a conduta patronal genérica composta pela denominada gestão por estresse ou straining. Indenização devida” (TRT 4 – RO 0001048-74.2013.5.04.0301, 6ª Turma, Roberto Antônio Carvalho Zonta, DJ 09/12/2015).

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Outro exemplo é o caso dos analistas de crédito de alguns bancos privados, como o Santander, os quais têm uma meta de análise inexequível, qual seja o de análise de um contrato de concessão de crédito a cada três minutos, a fim de pressionar ao máximo seu empregado para a obtenção de melhores resultados.

2.4.3 GESTÃO POR MEDO

A gestão por medo ocorre com a utilização da intimidação, da atemorização, do amedrontamento, de maneira implícita ou explícita, como principal instrumento de motivação para que o empregado adote os objetivos empresariais como os seus próprios.

Lis Andrea Soboll (2008) adverte que este tipo de gestão poderá se concretizar, por exemplo, com a constante ameaça de desligamento do trabalhador da empresa. Desta forma, o empregado é manipulado a se submeter às determinações do superior hierárquico sem questionamentos, pois, se assim não for, poderá perder a fonte de seu sustento.

A autora ainda elenca a possibilidade de ameaça de submissão do trabalhador a situações constrangedoras como mecanismo apto a condicioná-lo a cumprir, independentemente de quanto tempo leve, as metas preestabelecidas (SOBOLL. 2008).

Karina da Silva Menezes e Thiago Lima Carneiro (2016) asseveram que também caracteriza a gestão por medo a prática de incutir no colaborador o sentimento de ameaça e o incentivo à competição antiética, além do fomento de relações destrutivas, para melhor controlar o empregado em prol da produção.

A jurisprudência do colendo Tribunal Superior do Trabalho encara a gestão pelo medo e a gestão pelo estresse como o mesmo fenômeno, como é possível depreender do julgado abaixo:

“[…] Tal prática corresponde ao que se convencionou denominar de "administração por estresse" ou ''gestão pelo medo", uma forma de assédio moral coletivo que reduz cada empregado a uma peça de engrenagem a ser descartada no primeiro momento em que, por qualquer motivo, não atender às expectativas do empregador, tornando- o, de um mês para o outro,"um "perdedor", uma "pessoa limitada, que não sonha, não cresce, não proporciona nada de muito interessante para os demais integrantes da equipe" e uma "laranja podre", para se utilizar de algumas das várias expressões depreciativas constantes dos comunicados em apreço […]” (TST – AIRR 114400- 95.2009.5.06.0009, 7ª Turma, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DJe 21/06/2013) .

Estas três formas de gestão paralelas são reflexo da supercompetitividade e da superconcorrência existente na sociedade moderna em razão da internacionalização

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econômica. Infelizmente, incorporam-se ao discurso economicista como essenciais para a sobrevivência empresarial.

Apesar da perpetuação dessas práticas no cotidiano brasileiro, não existe qualquer dispositivo legal específico destinado à tipificação do assédio moral, seja interpessoal ou organizacional. A tensão entre as fontes materiais tem pendido para os interesses patronais, contudo necessário se faz uma análise da necessidade, ou não, de tipificação para a efetiva proteção dos direitos fundamentais do empregado.

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