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Capítulo 4. A Nova Fronteira do Capital no Limite do Crescimento

4.4 O problema da renda fundiária

4.4.1 A Renda Absoluta

O valor variável contido numa mercadoria, constitutivo do lucro, só pode ser modificado pela força subjetiva viva que a compõe e assim mesmo não contar totalmente no preço de produção; em contrapartida toda parte fixa e circulante da fração constante de um capital pode apenas transferir o seu valor imutável mediante a atividade do trabalho vivo. Ora, a disposição de ambas as partes, seja do trabalho vivo – capital variável - ou morto – capital constante -, em uma mercadoria, depende da composição orgânica do capital individual que a produziu. Ao confrontá-lo com a composição social média dos capitais, é crível derivar para um capital que explora mais força de trabalho que esta média de todos os capitais – dada a

161 taxa de exploração do trabalho constante –, e por isso detém um desenvolvimento menor das forças produtivas, que a sua mercadoria terá uma proporção de valor superior ao preço de produção estabelecido. O contrário também é verdadeiro, isto é, para uma parte alíquota do capital total com maior desenvolvimento das forças produtivas o preço de produção da mercadoria que lhe é equivalente deve estar acima do seu valor. Interessa para a discussão da renda verificar esta diferença de composição entre os setores agrícolas e não agrícolas, isso porque depende dela a existência ou não de uma renda absoluta.

“Se a composição do capital na agricultura propriamente dita fosse inferior à do capital social médio, isso expressaria prima facie que em países com produção desenvolvida a agricultura não progrediu no mesmo grau que a indústria de transformação. Abstraindo das demais circunstâncias econômicas, em parte decisivas, tal situação já se esclareceria a partir da evolução anterior e mais rápida das ciências mecânicas, e, especificamente, de sua aplicação, em comparação com o desenvolvimento posterior e, em parte, bastante recente da Química, da Geologia e da Fisiologia, especialmente, mas uma vez, com a aplicação destas na agricultura. É, aliás, um fato indubitável e há muito conhecido que os progressos da própria agricultura se expressam sempre no crescimento relativo da parte constante do capital em comparação com a variável. (...) Em todo caso, é teoricamente certo que só sob esse pressuposto o valor dos produtos agrícolas pode estar acima de seu preço de produção; ou seja, a mais-valia gerada na agricultura por um capital de certa grandeza, ou, o que dá na mesma, o mais-trabalho por ele mobilizado e comandado (portanto o trabalho vivo empregado em geral), é maior do que no caso de um capital de mesma grandeza e composição social média.

Basta, portanto, para a forma de renda que examinamos aqui, e que só pode ocorrer sob essa suposição, estabelecer tal pressuposto. Quando se descarta esse pressuposto, descarta-se também sua correspondente forma de renda.” (MARX, 3 V, p. 213).

A diferença entre a composição social média dos capitais nos setores não-agrícolas, determinantes da taxa de lucro médio, e a composição orgânica nos setores agrícolas é o parâmetro a partir do qual se explica o excedente de mais-valia dos produtos da terra. Por esse pressuposto é factível que o valor produzido nas mercadorias agrícolas ultrapasse o preço de produção estabelecido pelos ramos com maior investimento em capital constante. Daí que este excedente, ou parte dele, o proprietário recebe como a renda absoluta que todo capitalista deve pagar pelo desfrute de propriedade alheia. Deduz-se daí que é o monopólio da propriedade fundiária o fator responsável por determinar a inclusão do excedente de valor sobre o preço de produção no preço geral de mercado das mercadorias.

(...) os produtos agrícolas serão sempre vendidos por um preço de monopólio, não porque seu preço esteja acima de seu valor, mas por ser igual a seu valor ou por estar abaixo deste, estando, contudo, acima de seu preço de produção. Seu monopólio consiste em não serem nivelados ao preço de produção, como ocorre com outros produtos industriais cujo valor se encontra situado acima do preço de produção geral (Ibid., p. 215).

A condição mínima, portanto, para o cultivo do solo é que o preço regulador de mercado dos produtos de todos os tipos de solo deve exceder o preço de produção (P), deve ser igual ao preço de produção mais uma renda (r) que remunere o proprietário do solo, ou P

162 + r. Com isso, para a renda absoluta, ela – a renda - não entra no preço da mercadoria como um imposto que nada tem a ver com o valor, mas sim é constituída por uma fração do valor contido na mercadoria. Seus limites estão entre o preço regulador de mercado e o preço de produção do produto agrícola. Discorda-se, consequentemente, da posição de Oliveira (2007, p. 55), que atribui a renda absoluta a uma elevação artificial dos preços dos produtos agrícolas sem relação com o trabalho excedente de um capital em particular. Concebe-se aqui exatamente o oposto, que só existe renda absoluta quando há excedente de trabalho acima do lucro médio, incorporado no preço final dos produtos por exigência da propriedade da terra177.

A essência da renda absoluta consiste, portanto, no seguinte: capitais da mesma magnitude em diferentes esferas da produção produzem, conforme sua distinta composição média, com a mesma taxa de mais-valia ou a mesma exploração do trabalho, diferentes massas de mais-valia. Na indústria, essas diferentes massas de mais-valia se nivelam para constituir o lucro médio e se distribuem uniformemente entre os diferentes capitais como partes alíquotas do capital social. A propriedade fundiária, assim que a produção precisa da terra, seja para a agricultura, seja para a extração de matérias-primas, impede essa nivelação dos capitais investidos na terra e intercepta parte da mais-valia, que, do contrário, entraria na nivelação para formar a taxa geral de lucro. A renda constitui, então, uma parte do valor, mais especificamente da mais-valia das mercadorias, só que, em vez de reverter para a classe capitalista, que a extraiu dos trabalhadores, reverte para os proprietários de terras, que a extraem dos capitalistas. Pressupomos aqui que o capital agrícola mobilize mais trabalho do que uma parte de igual magnitude do capital não agrícola. Até que ponto vai a divergência ou se ela existe mesmo depende do desenvolvimento relativo da agricultura em face da indústria. De acordo com a natureza da questão, com o progresso da agricultura essa diferença deve reduzir-se sempre que a proporção em que a parte variável do capital diminui em relação à constante não for maior no capital industrial do que no agrícola (MARX, 3 V, p. 221).

Embora estas sejam as características da renda absoluta, percebe-se que, nos termos de Marx, independentemente das formas de renda - às quais logo abaixo ele denomina de normais e a derivada do preço de monopólio - e do poder social que a captação deste tributo propicia aos proprietários de terras, elas constituem sempre um modo, ainda que distinto, de apropriação da riqueza social. O solo ou a propriedade privada não produzem por si valor, embora sejam pressupostos para a sua produção.

(...) essa renda absoluta, originária do excedente do valor sobre o preço de produção, é apenas parte da mais-valia agrícola, metamorfose dessa mais-valia em renda, captação dela pelo proprietário da terra; exatamente como a renda diferencial se origina da metamorfose de sobrelucro em renda, captação da mesma pela propriedade fundiária, havendo um preço geral de produção regulador. Essas duas formas de renda são as únicas normais. Fora delas, a renda só pode basear-se num

177 Segundo Oliveira,”A renda da terra absoluta é, pois, obtida mediante a elevação (artificial, pois ao contrário

as terras não são colocadas para produzir pelos capitalistas) dos preços dos produtos agrícolas acima do preço de produção geral (que sempre deveria ser o preço do „pior‟ solo). Dessa maneira, o lucro extraordinário obtido, ao contrário da renda da terra diferencial I e II, não é a fração do trabalho excedente dos trabalhadores daquela terra em particular, mas sim, fração da massa de mais-valia global dos trabalhadores em geral da sociedade. Ou seja, toda a sociedade é obrigada a pagá-lo (este lucro extraordinário chamado renda da terra absoluta) aos proprietários de terras.”

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autêntico preço de monopólio que não é determinado nem pelo preço de produção nem pelo valor das mercadorias, mas pela necessidade e pela capacidade de pagar dos compradores (MARX, 3 V, p. 216).

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