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Capítulo 4. A Nova Fronteira do Capital no Limite do Crescimento

4.4 O problema da renda fundiária

4.4.2 A Renda Diferencial

Até aqui se considerou o preço de mercado para os produtos agrícolas como sendo formado pelo preço de produção (P) + renda (r). Este seria o preço regulador pelo qual as mercadorias podem ser fornecidas e, de acordo com a lei da renda diferencial desdobrada por Marx, cabe ao solo com menor fertilidade, chamado por ele de solo A, tal regulação.

Pois se o preço do produto da classe A, e portanto o preço geral de mercado, fosse = P178 + r, então o preço das classes B, C, D etc. seria também = P + r. Mas já

que para a classe B temos P – P‟ = d179, então (P + r) – (P‟ + r) também seria = d, e

para C, P – P‟‟ = (P + r) – (P‟‟ + r) = 2d; finalmente, para D, P – P‟‟‟ = (P + r) – (P‟‟‟ + r) = 3d etc (Ibid., p. 206).

As gradações em “d” correspondem aos possíveis sobrelucros, ou seja, às partes do valor que são distribuídas aos proprietários mediante sua metamorfose em renda, decorrentes, neste caso, das diferenças de produtividade nos solos. Nas demonstrações matemáticas, eliminando-se a renda absoluta (r), observa-se que a diferença entre P e os demais P‟, P‟‟ e P‟‟‟, tem como resultante d, 2d e 3d. Estas equações deixam claro que é a diferença entre o preço de produção do solo A, = P, regulador do mercado, e os demais preços de produção P‟, P‟‟ e P‟‟‟, a responsável pela grandeza do sobrelucro (d).

O conceito geral da renda diferencial, abstraindo a renda absoluta, se baseia nos resultados desiguais de investimentos proporcionais de capitais numa esfera da produção, isto é, para quantidades iguais de capital e trabalho. Os exemplos de Marx são, sobretudo, relacionados à agricultura, no tocante à diferença de fertilidade dos solos cultivados, seja pelas qualidades naturais pedológicas ou pela sua transformação mediante sucessivos investimentos de capital. Entretanto, é importante notar que o primeiro caso tratado pelo autor, a fim de esclarecer o caráter geral da renda diferencial, baseia-se nas distintas fontes energéticas em que capitalistas ativos recorrem para impulsionar as fábricas no interior de um país: força motriz da queda d‟água – recurso natural mais produtivo - e força motriz do carvão. A localização dos solos também é levada em consideração como fator para resultados desiguais, não obstante a seguinte ressalva: “(...) fica claro que o progresso da produção social atua sobretudo (...) de forma niveladora sobre a localização como causa da renda diferencial

178 A letra “P” representa o preço de produção do solo menos fértil e regulador A. Já os solos B, C e D,

considerados em crescente produtividade, são representados respectivamente por P‟, P‟‟ e P‟‟‟.

164 ao criar mercados locais e ao melhorar a localização, estabelecendo meios de comunicação e de transporte (...)” (MARX, 3 V, p. 136).

Percebe-se que todos esses elementos de determinada parcela do globo, geradores de uma renda diferencial e que podem constar como itens monopolizáveis de um proprietário fundiário, têm em comum o fato de reduzirem de alguma forma os preços de custos. O sobrelucro é justificado porque as mercadorias de uma mesma espécie podem ser produzidas com um quantum variado de trabalho global – trabalho vivo + morto -, daí as nuances dos preços de produção. Mas isso não basta, é preciso que as diferentes produtividades, geradoras de uma diversidade de preços individuais de produção, sejam igualadas por um preço geral de produção, regulador do preço de mercado para os produtos de uma esfera do capital, para que as mercadorias dêem um sobrelucro – quantum de valor que supera a taxa de lucro médio - a ser metamorfoseado em renda.

Do contrário, os produtos da força mais produtiva do trabalho não forneceria renda

Se os diferentes valores não se equalizassem em preços de produção e os diferentes preços individuais de produção em um preço geral, um preço de produção regulador do mercado, então a mera elevação da força produtiva do trabalho (...) apenas abaixaria o preço das mercadorias produzidas (...) sem elevar a parcela de lucro existente nessas mercadorias (...) (Ibid., p. 133).

Isso se esclarece na tabela abaixo180 em que Marx (Ibid., p. 143), a título de demonstração da categoria de renda diferencial, pressupõe quatro tipos de solos (A, B, C e D) com fertilidade crescente. Por um preço de produção de 60 xelins, o solo A, menos fértil e regulador do preço de mercado, é capaz de produzir 1 quarter. Na antípoda desta fertilidade, o solo D produz, com os mesmos custos e preço final de produção individual, 4 quarters. Observa-se no quadro que os 10 quarters produzidos na totalidade dos solos poderiam ser vendidos, já embutido os preços de custo mais o lucro médio, por 240 xelins, quando na verdade o são por 600 xelins, 250% mais caros em decorrência da equiparação dos preços individuais das mercadorias ao preço de mercado.

Quarters Xelins Quarter Xelins Quarters Preço final de Mercado A 1 = 60 B 2 = 60 C 3 = 60 D 4 = 60 1 = 60 1 = 30 1 = 20 1 = 15 1 = 60 2 = 120 3 = 180 4 = 240 10 = 240 Média 1 = 24 10 = 600

180 A última coluna foi inserida para acentuar os contrastes entre os preços individuais de produção e àqueles

165 A condição sine qua non para a apropriação de parte deste valor, representado por 360 xelins – a diferença entre 600 xelins e 240 xelins -, contido no preço final destas mercadorias, é o monopólio sobre determinado solo com fertilidade entre B e D, isto é, solos passíveis de gerar variações de fertilidade acima do solo A com sucessivos investimentos de capital. Ao mesmo tempo, o estatuto da propriedade sobre o solo não produz por si mesmo nenhuma parte do valor que vai compor o preço da mercadoria em geral, mas por não estar disponível a todos os sujeitos da sociedade capitalista permite àqueles que o possuem se apropriar de uma renda diferencial deduzida do preço final da mercadoria.

Assim sendo, a partir deste breve resgate com base no Livro III de O Capital, cabe perscrutar o conceito da renda propriamente dita e diferenciar esta forma de distribuição do valor socialmente produzido daqueles tributos que, embora constituam pagamentos como arrendamentos, não são compostos pelo excedente de valor definidor do que Marx entende como renda.

O percurso que vai da renda absoluta à renda diferencial pretendeu por em evidência a afirmação de que a renda fundiária, no modo de produção capitalista, é “(...) parte especial e específica da mais-valia (...)” (MARX, 3 V, p. 125). De acordo com a primeira forma da renda, a propriedade fundiária torna necessário que o preço de produção geral de mercado = P + r seja elevado o suficiente para incluir a parte da mais-valia que excede o lucro-médio da mercadoria e, desse modo, realizá-la na circulação transfigurando-a para o proprietário na forma de renda absoluta. Na linha deste raciocínio, a renda diferencial dos solos mais produtivos, em relação àquele que regula o preço de mercado, também seria constituída pela fração da mais-valia que excede o preço de produção individual de cada mercadoria. Todavia, para além do valor imediatamente produzido na mercadoria, o sobrelucro – diferença entre preço de mercado e preço de produção – também é formado por falso valor social, ou seja, os preços no mercado das mercadorias podem abrir uma margem entre todo o valor realmente produzido na mercadoria e a sua expressão monetária. “Essa é a determinação pelo valor de mercado, como ele se impõe na base do modo de produção capitalista por meio da concorrência, que gera falso valor social (Ibid., p. 143)”.

Não obstante ser esse valor de mercado dos produtos um ato social e, igualmente, baseado na inconsciência e não-intencionalidade dos partícipes, esta determinação executa, mediante o consumo dos produtos portadores de renda – setores consumidores de matérias- primas agrícolas e minerais, reposição diária da força de trabalho, etc -, a distribuição de parte do valor gerado na totalidade dos processos produtivos e que recai ao proprietário fundiário.

166 Portanto, quanto maior o desenvolvimento da sociedade produtora de mercadorias – investimentos de capital na agricultura, divisão campo-cidade, necessidades crescentes de matérias-primas, etc. -, tanto mais se eleva a capacidade da propriedade fundiária captar o produto do desenvolvimento do trabalho social.

O que a sociedade, considerada como consumidor, paga demais pelos produtos agrícolas, o que constitui um déficit na realização de seu tempo de trabalho em produção agrária, constitui agora o superávit para uma parcela da sociedade, os proprietários de terra (MARX, 3 V, p. 144).

Se há, como se viu até agora, uma parcela da substância social que compõe a renda da terra propriamente dita, não é menos verdade que as outras formas de pagamento que aparecem como tal, embora não o sejam no sentido categorial, também influem no poder social do proprietário e no processo produtivo capitalista.

4.4.3 Os Outros Tributos Pagos ao Monopólio da Propriedade e as Determinações

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