• Nenhum resultado encontrado

Os Outros Tributos Pagos ao Monopólio da Propriedade e as

Capítulo 4. A Nova Fronteira do Capital no Limite do Crescimento

4.4 O problema da renda fundiária

4.4.3 Os Outros Tributos Pagos ao Monopólio da Propriedade e as

Marx trata das condições e resultados práticos que falsificam e obnubilam a renda fundiária propriamente dita. A naturalidade das relações transforma todo o tributo pago, como dinheiro de arrendamento ao proprietário das terras, em renda fundiária. A despeito disso, os pagamentos de diferentes tributos, “(...) quaisquer que sejam as fontes das quais provenha (...)”, mantém relação com a renda fundiária por serem uma taxa cobrada pelo uso do monopólio de outrem, isto é, do proprietário, sobre a terra. Ademais, os tributos pagos também têm em comum o fato de determinarem o preço da terra (Ibid., p. 118).

Sobre as diferentes fontes dos pagamentos e os seus resultados práticos, Marx adverte que

(...) os juros pelo capital incorporado ao solo podem constituir um dos componentes estranhos da renda fundiária, um componente que, com o progresso do desenvolvimento econômico, precisa constituir um adicional sempre crescente à renda global de um país. Mas, abstraindo-se desses juros, é possível que, por baixo desse dinheiro de arrendamento, em parte se esconda, e em certo casos inclusive de modo total e absoluto – isto é, no caso da ausência total da renda fundiária propriamente dita e, portanto, de uma falta real de valor do solo -, uma dedução, seja do lucro médio, seja do salário normal, ou de ambos ao mesmo tempo. Esta parte do lucro ou do salário assume aqui a figura da renda fundiária, porque ao invés de, como seria normal, recair para o capitalista industrial ou para o assalariado, é paga em forma de dinheiro de arrendamento ao proprietário da terra. Economicamente falando, nem uma parte nem a outra constituem renda fundiária: mas na prática constitui o rendimento do proprietário da terra uma valorização econômica de seu monopólio, exatamente do mesmo modo que a verdadeira renda fundiária, influindo sobre o preço da terra de maneira tão determinante quanto a renda (Ibid., p. 118-19).

Tão importante quanto a teoria da renda para este trabalho são as determinações, algumas vezes a ela ligadas, do preço de compra ou do valor do solo. Esta categoria que “(...)

167

prima facie, é irracional, exatamente como o preço do trabalho, já que a terra não é produto

do trabalho, não tendo, portanto, nenhum valor.” (MARX, 3 V, p. 117). Todavia, por debaixo desta irracionalidade estão, de acordo com Marx, relações reais que se apresentam na forma do preço de compra das terras.

No caso inglês, esboçado pelo autor, tal preço estaria vinculado à renda por determinado número de anos, numa medida atrelada à taxa média de juros. Marx elucida a relação entre renda anual, taxa média de juros e preço do solo com um exemplo numérico:

(...) pressupondo-se a renda fundiária como uma grandeza constante, o preço das terras pode subir ou descer na razão inversa da subida ou queda da taxa de juros. Caso a taxa de juros corrente caísse de 5 para 4%, então uma renda fundiária anual de 200 libras esterlinas representaria a valorização anual de um capital de 5000 libras esterlinas, em vez de 4000 libras esterlinas (como aconteceria com uma taxa de juros de 5%), e, assim, o preço da mesma fração da terra teria subido de 4000 para 5000 libras esterlinas de 20 years‟ purchase181

para 25. E vice-versa. Esta é

uma dinâmica do preço da terra que independe da dinâmica da própria renda fundiária e que só é regulada por meio da taxa de juros (Ibid., p. 117).

Esta prática demonstra que na realidade o que se paga não é o preço do solo, “(...) mas da renda fundiária que ele proporciona, calculada de acordo com a taxa média de juros.” (Ibid., p. 117) e, por conseguinte, por um número circunscrito de anos. Tem-se que nesta compra da renda fundiária o comprador a confunde com juros, pois ele investe um montante monetário a espera de uma remuneração equivalente à taxa de juros vigente, portanto, o preço da terra é esta receita em dinheiro capitalizada.

Embora para os fins e limitações desse trabalho não seja possível a verificação da dinâmica recente dos preços da terra em relação às taxas de juros ou mesmo a atualidade desta hipótese de Marx, muito menos a da tendência ascendente do preço da terra em consonância à demonstração lógica apresentada a seguir, é importante a exposição destes aspectos da sua teoria para compreender a irracionalidade de algumas categorias – como a do preço de compra ou valor do solo, ou a confusão da renda fundiária por juros - e os mecanismos complexos e inextricáveis dos tributos pagos pelo monopólio da propriedade fundiária. A seguir, a relação entre queda das taxas de lucro e juros e subida do preço do solo:

(...) a taxa de lucro tem, com o progresso do desenvolvimento social, uma tendência à queda e, daí, também a taxa de juros, à medida que é regulada pela da taxa de lucro; que, além disso, mesmo abstraindo da taxa de lucro, a taxa de juros tem uma tendência à queda devido ao crescimento do capital monetário emprestável: daí decorre que o preço da terra tem uma tendência ascendente, independente mesmo do movimento da renda fundiária e do preço dos produtos da terra, do qual a renda constitui uma parte (Ibid., p. 117).

Também relacionado à subida do preço da terra, há um movimento na exposição de Marx no sentido de mostrar o aumento do nível da renda fundiária atrelado ao

181 Segundo os tradutores, a expressão em itálico significa: “Renda (de determinado número) de anos” (MARX,

168 desenvolvimento do trabalho social global. Com o crescimento da produção de mercadorias aprofunda-se a divisão entre a produção não agrícola e de produtos agrícolas, eleva-se com isso a demanda por alimentos e matérias-primas, inclusive a procura por terras, isso sem mencionar as constantes inversões de capital que tendem também, dentro de certos limites, a aumentar a renda diferencial. Quanto maior o desenvolvimento do modo de produção capitalista intensifica-se ao mesmo tempo os investimentos sucessivos sobre o solo, portanto, avança o nível da renda por acre e o “valor” do solo182 - dentro de certas circunstâncias

delimitadas por determinados preços de produção e produtividade no solo. Este preço da terra, que é a condensação da capacidade do solo gerar renda por um certo número de anos183, não é prerrogativa apenas dos solos cultivados, mas as terras até então fora da produção ou do mercado têm seus preços determinados a priori por àquelas com condições de fertilidade e de localização equivalente, dentro da média de investimentos por acre. (A reflexão aqui vale para a renda diferencial crescente com o aumento da massa de capital e produtividade).

(...) forma-se assim o preço nominal das partes do solo não-cultivadas e, desse modo, tornam-se mercadoria, fonte de riqueza para seus proprietários. (...) A especulação com terras (...) baseia-se apenas nesse reflexo, que o capital e o trabalho lançam sobre o solo não-cultivado (MARX, 3 V, p. 149).

Não obstante o crescimento da renda média por acre, na continuidade do argumento é possível vislumbrar também a contradição que avança pari passu ao desenvolvimento da renda em geral. A natureza do modo de produção capitalista impõe por sua própria lógica uma barreira à expansão da renda que é, como já visto, frações do trabalho social. Se até certo ponto o desenvolvimento das forças produtivas corporificado no aumento do capital constante significa expansão absoluta do valor, há um momento em que os investimentos em trabalho morto derrubam a mais-valia socialmente produzida. Essa desproporção entre capital variável e constante, fruto do engano na cabeça do capitalista, traz a necessidade de pensar os limites da renda fundiária na sociedade capitalista.

182 “Portanto, quanto mais” capital é investido no solo, quanto maior for o desenvolvimento da agricultura e da

civilização em geral num país, tanto mais se elevam as rendas por acre, assim como a soma global das rendas, tanto mais gigantesco se torna o tributo que a sociedade paga, na forma de sobrelucros, aos grandes proprietários rurais – isso enquanto todos os tipos de solo que tenham sido incorporados ao cultivo continuem em condições de competir (Parte das conclusões de Engels ao complementar a exposição de Marx sobre a renda diferencial II, 3 V, p. 189)”.

183 “O preço do solo é apenas renda capitalizada. (...) nas terras cultivadas somente são pagas rendas futuras no

preço, por exemplo, paga-se antecipadamente de uma só vez a renda de 20 anos, quando a taxa de juros vigente é de 5% (MARX, 3 V, p. 149).

169 Na citação a seguir fica evidente os limites para a produção de valor na agricultura184, ainda que, neste momento da exposição de Marx, a contradição se expresse através da expansão do cultivo sobre novas terras.

É da natureza do modo de produção capitalista que ele continuamente diminua a população agrícola em relação à não agrícola, porque na indústria (em sentido estrito) o crescimento do capital constante em relação ao variável está ligado ao crescimento absoluto, apesar da diminuição relativa, do capital variável; enquanto na agricultura diminui em termos absolutos o capital variável exigido para a exploração de determinado pedaço de terra, só podendo, portanto, crescer à medida que novas terras são cultivadas, isso, porém, pressupõe por sua vez crescimento ainda maior da população não agrícola (3 V, p. 127).

Documentos relacionados