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A responsabilidade dos administradores nomeados pelo Estado

1 A CONVOLAÇÃO DA SOCIEDADE ANÔNIMA EM SOCIEDADE DE

4.4 A responsabilidade dos administradores nomeados pelo Estado

O art. 37 da Constituição Federal e o art. 239 da Lei das S.A. atribuem aos administradores das sociedades de economia mista os mesmos deveres e responsabilidades dos administradores das companhias abertas. Aduz ainda o art. 155 da mesma lei que o administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios – é o dever de diligência.

Também prevê o art. 155 o dever de lealdade com que deve agir o administrador, mantendo reserva sobre seus negócios, sendo-lhe vedado I - usar, em benefício próprio ou de outrem, com ou sem prejuízo para a companhia, as oportunidades comerciais de que tenha conhecimento em razão do exercício de seu cargo; II - omitir-se no exercício ou

proteção de direitos da companhia ou, visando à obtenção de vantagens, para si ou para outrem, deixar de aproveitar oportunidades de negócio de interesse da companhia; III - adquirir, para revender com lucro, bem ou direito que sabe necessário à companhia, ou que esta tencione adquirir.

O § 1º deste artigo traz também a obrigatoriedade do administrador de companhia aberta de guardar sigilo sobre fato relevante que ainda não tenha sido divulgado para conhecimento do mercado, obtida em razão do cargo e capaz de influenciar de modo ponderável na cotação de valores mobiliários.

Caso interessante envolvendo o uso de informação privilegiada relacionada a fato relevante é aquele envolvendo a COPEL – Companhia Paranaense de Energia, sociedade de economia mista controlada pelo Governo do Paraná, cujo Processo Administrativo Sancionador 18/01 foi instaurado perante a CVM dando conta que, em meio a determinadas providências com o objetivo de privatizar a Companhia, era possível que fosse realizada oferta pública de compra das ações ordinárias em circulação de sua emissão, com vistas a proporcionar aos titulares de tais ações as mesmas condições de negociação que viessem a ser praticadas pelo Estado do Paraná com o BNDESPAR. No dia da divulgação do fato relevante a cotação do papel subiu cerca de 14,01%, passando a ser negociado a R$ 20,51, enquanto o volume médio de negociação, apurado nos 60 dias anteriores, aumentou 246%, de R$ 1.566 mil para R$ 5.428 mil. Conforme a decisão da CVM chama a atenção, este foi um caso exemplar de insider trading, posto que a informação relevante não aconteceu “nos negócios da companhia” emissora, a Copel, ao contrário: seus administradores eram completamente alheios ao processo de discussão de estatização da companhia, e não pertenciam à organização dentro da qual surgiu o fato relevante – o grupo Fator, fundo de investimentos que comprou ações da Copel. 122

Pelo art. 157 e seus parágrafos, o administrador de companhia aberta tem o dever de informar; conforme lição de Arnoldo Wald,

O dever de informar que incumbe ao Diretor, ex vi do art. 157 da nova lei, ainda não tem sido bem compreendido pelos nossos administradores que não se adaptaram ao regime da ampla informação, da full disclosure, que constitui condição essencial para o desenvolvimento do mercado de ações. Trata-se de

122 Dados retirados do site da Comissão de Valores Mobiliários. Disponível em:

<http://www.cvm.gov.br/port/inqueritos/2004/rordinario/inqueritos/18_01.asp>. Acesso em: 15 set. 2009.

matéria mais diretamente vinculada às sociedades de capital aberto, mas, no caso, existe a equiparação às mesmas, para tal fim, das sociedades mistas.123

Desta forma, as infringências aos deveres impostos pela Lei das S.A. ao diretor ou administrador das sociedades de economia mista enseja sua responsabilização pessoal pelos danos causados à sociedade com culpa ou dolo, ou com violação da lei ou do estatuto.

No entanto, silenciou a Lei das S.A. quanto à responsabilização pessoal do administrador quando do cumprimento de ordens superiores; como há vinculação da sociedade de economia mista a um Ministério, na esfera federal, ou a uma secretaria, na esfera estadual, não nos parece que os administradores que tenham realizado atos de acordo com as determinações do acionista majoritário possam ser responsabilizados. Neste sentido, já entendeu o E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro124, em sede de Apelação Cível n° 2007.001.00201, proposta pela Companhia Docas do Estado de São Paulo – CODESP em face de Pedro Batoli, Diretor-Presidente da companhia, em ementa que segue abaixo:

Ação indenizatória proposta por sociedade de economia mista federal, em face de seu ex-presidente. Pleito fundamentado na prática de atos, sem a devida competência para tal. Acordos provisórios relativos a questão salarial que envolvia pretensa reposição salarial (URP), que acabou decidida em prol da companhia. Obrigação assumida pelos então empregados, de restituir o que viessem a receber indevidamente. Obrigações cujo cumprimento, na prática e face ao decurso do tempo, não puderam ser exigidos. Alternativa voltada então contra o ex-administrador. Improcedência corretamente decretada. Ato de normal gestão do Diretor-Presidente, que não dependia de autorização de qualquer órgão da administração da companhia. Ademais, estando esta vinculada ao Ministério dos Transportes, tais acordos tiveram o beneplácito do então Ministro. Inexistência do dever de reparar qualquer prejuízo. Aplicação dos preceitos da Lei das S/A. Sentença que se prestigia. Não conhecimento do 1° recurso. Improvimento do 2°.

Logo, não são responsáveis pessoalmente os administradores de sociedades de economia mista pelas obrigações por ele contraídas em nome da sociedade, desde que decorrente de ato regular de gestão. Assim, se perante terceiros a sociedade de economia mista responde objetivamente, nos termos no artigo 37, §6° da Constituição Federal, já seus administradores só podem ser responsabilizados no caso de prova de culpa dos mesmos

123 As sociedades de economia mista e a nova lei das sociedades anônimas. Revista de Informação Legislativa, Brasília, a. 14, n. 54, pp. 99-114, abr./jun. 1977, p. 112.

124 Dados retirados do site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://srv85.tjrj.jus.br/ConsultaDocGedWeb/faces/ResourceLoader.jsp?idDocumento=000329DB BF3F4333747FA5D0D6F5AFB08740B0FEC35C2808>. Acesso em: 15 set. 2009.

(isso tanto perante terceiros, mas, principalmente, em ações regressivas que a empresa pode promover contra seus administradores).