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3. A PRESCRITIBILIDADE DA SUSPENSÃO DO PROCESSO

3.2. A Retroatividade da Lei 9 271, de 17 de abril de

Primeiramente, cumpre gizar que a mencionada Lei não disciplina, em nenhum de seus artigos, a respeito de sua aplicabilidade aos processos em andamento.

Aparentemente, a interpretação correta seria de que sendo a revelia questão de ordem processual, do ponto de vista técnico, aplicar-se-ia às normas processuais desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.

Contudo, além da revelia como questão de ordem processual, o artigo 366, do Código de Processo Penal, traz a prescrição que é de conteúdo de Direito Material. Assim, a interrupção e as causas impeditivas da prescrição, estão, sistematicamente, disciplinadas no Código Penal.

Segundo a renomada doutrina nacional, o artigo 366, do Código de Processo Penal, com a nova redação em vigor, é norma que apresenta natureza mista abrangendo a processual e a material. O artigo 5º, inciso XL, da Constituição da República Federal, dispõe que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. Conseqüentemente, quando se trata de norma mista, tem-se admitido a retroatividade da lei desde que favoreça o acusado.

Considerando que o réu, citado por edital, não tem condições de exercer plenamente sua ampla defesa, contraditando a prova, que, eventualmente, lhe seja desfavorável, aparentemente, significa que o fato de ficar o processo suspenso pode ser considerado benéfico ao acusado. Portanto, devem permanecer suspensos os processos em andamento na

42 vigência da Lei 9.271, de 17 de abril de 1996, em que o réu, citado por edital, não tenha constituído advogado, o que representaria a aplicação imediata da lei mais benéfica.

Sobre a retroatividade da nova lei, surgiram diferentes opiniões entre os renomados doutrinadores, entre eles, Capez (2001, p. 534), que sublinha três posições distintas:

1ª) A Lei nova retroage por inteiro, nas partes penal e processual penal, de modo que, nas ações em curso com réu revel citado por edital, deve o juiz sobrestar o andamento do processo, ficando também suspenso o prazo prescricional.

2ª) A Lei nova, na parte processual penal, é de aplicação imediata (artigo 2º do Código de Processo Penal); o preceito penal, entretanto, não tem efeito retroativo (Constituição Federal, artigo 5º, inciso XL; Código Penal, artigo 2º, parágrafo único). Para essa corrente, o juiz deve declarar suspenso o processo; o prazo da prescrição da pretensão punitiva, contudo, tem curso normal. Suspende-se o processo, mas não a prescrição.

3ª) A Lei 9.271, de 17 de abril de 1996 é irretroativa por inteiro, não tendo aplicação aos processos em curso de réus revéis citados por edital que praticaram infrações penais antes de 17 de junho de 1996.

Todavia, compartilhando do mesmo entendimento, a doutrina majoritária afirma que não importa se a lei traz conteúdo penal ou processual, importando mesmo saber se um substancial direito do acusado, na sucessão de leis, foi ou não atingido. Daí se vislumbra que é irretroativa a lei nova que afeta um direito substancial e, por conseguinte, é retroativa a lei nova que beneficia o autor da infração de qualquer modo.

Nucci (2003, p. 553) assevera que :

Tendo em vista que se trata de lei de conteúdo misto, tornou-se jurisprudência pacífica que ela não pode retroagir, levando-se em conta ser o aspecto penal da norma prejudicial ao réu, pois impede o curso da prescrição. Logo, somente deve ser aplicada, por inteiro, aos fatos criminosos cometidos após a sua entrada em vigor, sem possibilidade de se suspender o feito, mas não a prescrição, como alguns magistrados começaram a fazer à época.

Sob a ótica de Machado (2000, p. 176):

A estrutura preconizada pela Lei 9.271, de 17 de abril de 1996, compõe um todo harmônico, constituído tanto por regras de Direito Penal quanto de Direito Processual Penal, e não podem ser separadas em partes autônomas, sem prejuízo de sua organicidade que contém normas interdependentes.

Complementa ainda Machado (2000, p. 177): “[...] Para o seguimento doutrinário que assim firma sua convicção, o dispositivo normativo somente será aplicável aos processos decorrentes de fato típico ocorrido a partir de 17 de junho de 1996”.

43 Sobre essa matéria é possível identificar pelo menos três posições, quais sejam: a) os processos e a prescrição deveriam ser suspensos, minoritária, uma vez que a norma prescricional é de direito material e não pode retroagir para prejudicar o réu, por força da Constituição Federal e do Código Penal; b) os processos seriam suspensos, mas não a prescrição, que continuaria a fluir; c) nem processo nem prescrição seriam suspensos, prosseguindo o feito em seus ulteriores atos.

Ressalta Demercian (1999, p. 304) que:

O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça firmaram o entendimento de que para os crimes pretéritos não há a incidência da nova redação do artigo 366, do Código de Processo Penal, uma vez que a situação é mais gravosa ao réu, que terá contra si uma causa de suspensão da prescrição, não prevista anteriormente na legislação.

E ainda complementa Demercian (1999, p. 304) sustentando que: “[...] Por ser uma norma de caráter misto, não se poderá suspender unicamente o processo e não a prescrição ou vice-versa”.

Na lição de Mirabete (2000, p. 440):

Tem-se decidido que não se aplicam as novas regras se a infração penal foi cometida antes da entrada em vigor da nova redação dada ao artigo 366, do Código de Processo Penal, uma vez que o citado dispositivo legal, norma mista de direito processual e direito penal, passou a regular a suspensão não só do processo, em caso de revelia, mas também do prazo prescricional, sendo justamente nesse ponto mais gravoso que o ordenamento legal anterior.

Capez (2001, p. 533) não discrepa, aduzindo que: “[...] Trata -se de uma norma mista que possui uma parte de direito processual e a outra de direito material”.

Complementa ainda Capez (2001, p. 534) que: “[...] De acordo com o p rincípio constitucional, inserto no artigo 5°, XL, a nova regra não poderia alcançar as infrações perpetradas antes de sua entrada em vigor, sob pena de configurar inaceitável retroatividade em prejuízo”.

Segundo Bitencourt (2003, p. 722),

Sendo a suspensão do curso prescricional de efeito automático, como o artigo 366 tem natureza mista processual e penal, convém ser mencionado expressamente que a prescrição não está suspensa, em razão de sua irretroatividade, quando se tratar de crimes praticados antes da vigência da lei.

Na mesma Trilha Damásio (2002, p. 74) sublinha: “[...] A suspensão do prazo prescricional em face do sobrestamento da ação penal era desconhecida em nossa legislação. Logo, o artigo 366, nesse ponto, é mais gravoso que o ordenamento legal anterior”.

44 Acentua Damásio (2002, p. 74), afirmando que: “[...] Pela razão citada acima, deve ser, a nova lei, irretroativa por inteiro, não se aplicando às infrações penais cometidas antes de sua vigência”.

Para Tourinho Filho (1999, p. 624/625):

Considerando que o artigo 5°, inciso XL, da Lei Maior prescreve que a Lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu, parece claro que o artigo em análise, no seu aspecto penal, somente poderá ser aplicado às infrações que, se verificaram, a partir do dia 17 de junho de 1996, data em que começou a vigorar a Lei 9.271, de 17-4-1996.

Assevera ainda Tourinho Filho que: “[...] Sua aplicação na integralidade dos seus termos, aos processos em curso, fere o princípio proibitivo da retroação da lei penal severa”.

Por todo o exposto, o que tem suscitado maior controvérsia jurídica é à parte da disposição normativa que se refere ao seu aspecto material, qual seja, aquela que diz respeito à suspensão do curso do prazo prescricional.

E a conclusão segura é de que, inequivocamente, as normas processuais, embora de aplicação imediata, não terão incidência retroativa, ou seja, não terão capacidade para desconstituírem situações já consolidadas sob o manto de Lei anterior.

O entendimento acerca da irretroatividade da lei penal mais severa já está consagrado na doutrina e na jurisprudência pátrias, pois não se admite retroatividade em prejuízo ao réu.

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